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Capítulo 3 – A Comissão Administrativa da Câmara Municipal do Funchal

3.1 A tomada de posse e a primeira reunião da Comissão Administrativa

3.1.4 A situação financeira da Câmara Municipal do Funchal

Durante o “Estado Novo”, as câmaras municipais estiveram condicionadas às suas próprias receitas, na maioria dos casos provenientes de rendimentos de bens

58 Diário de Notícias, Funchal, 25 de maio de 1975, últ. p. 59 CMF, L.º de Atas, n.º 100, f. 55 e 56.

próprios, taxas, juros de mora e multas. Dos diversos impostos arrecadados pela edilidade funchalense, um deles era o imposto denominado “roda de caminho”, que foi extinto pela vereação da CA presidida por Virgílio Pereira, porque o mesmo era “odiado pelas pessoas” e através de um estudo feito sobre o mesmo, chegou-se à conclusão que “ afinal que o que recebíamos desse “maldito” imposto nem dava para pagar as despesas com papel e pessoal”61. Outro dos impostos extintos, por deliberação da edilidade, na

sua reunião efetuada a 10 de outubro de 1974, foi o da prestação do trabalho, a partir do ano de 1975, por ser considerado, um imposto muito impopular e por não existir “nestas condições razoável compensação do odioso tributário e perturbação causada nos serviços da secretaria sobretudo na época presente”62. Na maioria dos casos, as câmaras,

para poderem executar as obras que garantissem o mínimo de qualidade de vida para as suas populações, dependiam das “comparticipações do Estado”, do Fundo de Desemprego e do Fundo de Melhoramentos Rurais, sendo que, em 1954, ”229 municípios entre os 303 existentes tinham receitas ordinárias anuais inferiores a 2000 contos” (Oliveira, 1996: 312).

As câmaras e juntas de freguesia eram as instituições que mais perto estavam das pessoas e tinham a função de responder minimamente às suas solicitações, sendo, no caso do arquipélago, a Câmara e o regedor da freguesia. No entanto, a situação financeira das câmaras estava muitas vezes dependente, de personalidades locais, possuidoras de “capacidade de influência sobre os organismos da administração central sobre governantes ou membros da União Nacional e acabavam por ter maior peso do que as câmaras municipais” (Oliveira, 1996: 313).

Um dos grandes objetivos das câmaras, após o 25 de abril de 1974, foi procurar fazer face aos enormes problemas que afetavam os seus munícipes e ao mesmo tempo à situação financeira em que se encontravam. Era demasiado importante dotar as câmaras de meios financeiros que pudessem responder às exigências que o novo poder político instituído com o novo regime se propunha concretizar. Assim, sabendo ”do descontentamento gerado pelas populações em numerosos concelhos pela forma como estavam a ser geridas as respectivas câmaras” e merecendo esta situação muita atenção da JSN, esta decidiu, “que vão ser distribuídos às municipalidades por se tornar indispensável”, através do Ministério do Interior, liderado pelo tenente-coronel Lemos

61 Entrevista a Virgílio Pereira – Anexo XI. 62 ABM, CMF. Lº de Atas, n.º 97, f. 169.

Pires, uma verba de “200 mil contos às câmaras municipais para o normal funcionamento dos seus serviços”63.

Destes 200 000 000$00, provenientes do subsídio concedido nos termos do artigo primeiro do Decreto-Lei n.º 475/74 de 24 de setembro64, coube à CMF 2 242 000$00, tomando a Câmara conhecimento da entrada desta verba, nos cofres da autarquia, através do chefe de secretaria, Arlindo Barbosa, na reunião de 14 de novembro de 197465. A situação de crise financeira permanente da Câmara obrigou a ter de empreender frequentemente “uma luta em todas as frentes, com os parcos recursos financeiros e técnicos de que dispúnhamos, optando muitas vezes, tal era a grandeza das necessidades, por soluções precárias e tecnicamente inaceitáveis” (Pereira, 2011: 77).

Na generalidade, as câmaras estavam dependentes do poder político e das diretrizes do Estado Central. No caso específico da CMF, os projetos, num primeiro momento, tinham de passar pelo governador civil e Junta Geral, para poderem usufruir de financiamento e só depois podiam ser concretizados. Como é possível constatar, as decisões camarárias relativamente à execução de obras dependiam, na maior parte das vezes, da subsidiodependência. Tal facto constituía um obstáculo e aumentava as dificuldades para a concretização destas. Face a estes constrangimentos, todos os anos as câmaras viam-se obrigadas a socorrer-se de orçamentos suplementares para operacionalizar os seus projetos. No último trimestre de cada ano civil, era da competências das câmaras apresentar o plano e orçamento para o ano seguinte. Dando e cumprimento a este parâmetro, no dia 11 de setembro de 1975 foi apresentado, pela CA da CMF, o plano de atividades para o ano de 1976, bem como o respetivo orçamento, documentos esses elaborados nos termos dos números 4.º e 5.º do artigo 77.º do Código Administrativo ainda em vigor. Estes documentos, depois de detidamente analisados pelos vogais da Comissão Administrativa, foram aprovados por unanimidade66.

Em outubro de 1975 e no intuito de colmatar os gravíssimos problemas que a edilidade enfrentava relativamente à falta de habitação, o FFH, concedeu um

63 Diário de Notícias, Funchal, 12 de maio de 1974, p. 12.

64 O Decreto-Lei n.º 475/74, de 24 de setembro de 1974, definia no seu Artigo 1.º: “É aberto no Ministério das Finanças a favor, do Ministério da Administração Interna, um crédito especial de 200 000 contos”, o qual seria lançado como Capítulo 4.º «Administração local», Direcção Geral, Despesas correntes: Artigo 58.º, “Transferências – Sector Púbico», n.º 3. «Subsídios diversos às autarquias locais……200 000 000$00».

65 ABM, CMF, L.º de Atas, n.º 97, f. 198 e 199. 66 ABM, CMF, L.º de Atas, n.º 99, f. 25.

empréstimo à autarquia, destinado a financiar o encargo resultante da construção de oitenta e três fogos, em Santo Amaro e São Roque, no valor de 30 280 000$0067.

A CA da CMF, perante este cenário, caracterizado por um leque vasto de necessidades, concluiu que era necessário recorrer a todos os meios para poder satisfazer e corrigir as assimetrias com que o município se deparava. Na opinião de Virgílio Pereira “reagimos ao esmagamento que nos provocava o facto de não termos dinheiro para resolver capazmente os problemas graves concelhios, (…) enorme pobreza e significativos focos de miséria, desemprego e sem apoio social”, salientando, ainda, o esforço desenvolvido pela CA da CMF para tentar solucionar “este quadro negro e na tentativa de melhorar, sem mais demoras, certas situações desumanas em que viviam alguns funchalenses (…) ”68.

A CMF apresentou e analisou o seu orçamento ordinário para o ano de 1976, na reunião de 18 de dezembro de 1975, deliberando colocá-lo em reclamação. Determinou, simultaneamente, que fossem inseridas todas as dívidas passivas entretanto apuradas, para além das consignadas no referido orçamento, conforme informação da secretaria da Câmara. No entanto, somente, foi aprovado, na reunião ordinária da edilidade, no dia 29 de dezembro de 1975, com um valor total de “quarenta e seis milhões e seiscentos sessenta dois mil duzentos e quarenta e três escudos e setenta centavos”69.

O ano de 1976 apresentou-se como o período das grandes alterações no panorama politico-constitucional do país e do arquipélago. Neste ano, foi aprovada, na Assembleia da República, a nova CRP, em 2 de abril, realizando-se depois eleições para os principais órgãos do Estado, tais como: Assembleia da República, Presidente da Republica, Assembleias para as Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores e para as Autarquias Locais.

As autarquias locais, até o ano de 1979, continuaram a viver de “subsídios e comparticipações, situação herdada do “Estado Novo”, processado através de vários serviços da administração central, em que predominava uma distribuição casuística e discricionária” (Silva, 1996: 434). Estando o princípio do ano a decorrer, o DN, na sua edição de 23 de janeiro de 1976, informava que, pela Portaria de 19 de novembro de 1975, a Direção dos Serviços de Equipamento (DGSU), concedeu à CMF, uma comparticipação para pavimentação dos arruamentos no Funchal, Ruas Mãe dos

67 ABM, CMF, L.º de Atas, n.º 99, f. 70.

68 Pereira, Virgílio, “40 anos do poder autárquico: II”, Tribuna da Madeira, Câmara de Lobos, 20 de janeiro de 2017, p. 11.

Homens e Rochinha, o reforço de 819 000$00 com o seguinte escalonamento: 1975 – 157 000$00; 1976 – 400 000$00 e 1977 – 262 000$00, prazo até 31 de Dezembro de 197770.

A JGM “concedeu dois subsídios, um de 100 mil contos para a Junta Geral e Municípios, cabendo à CMF a verba de 14 966 contos”, segundo deu conhecimento o

DN em 3 de abril, de 197671. Passado um mês, foi novamente, atribuída nova comparticipação financeira, no valor de “1600 contos para estradas do Arquipélago”, através do Ministério das Obras Públicas, ficando o Funchal beneficiado com “a quantia de 334 200$00”72.

Neste mesmo ano, voltou a dar entrada nos cofres da Câmara, no dia 11 de novembro de 1976, por Portaria de 26 de outubro deste mesmo ano, através da Direção Geral dos Serviços de Urbanização, as seguintes comparticipações: para a obra de demolição e reconstrução de um muro de suporte ao caminho de São Martinho – 11 200$00: largo de António Nobre – 420 000$00 e Ribeiro Seco de Cima – 203 000$0073.

Como é possível constatar, graças a estes subsídios financeiros, a CMF conseguiu realizar algumas obras e fazer face aos problemas que a cidade enfrentava. Como capital do arquipélago, a cidade do Funchal, também enfrentou a migração de muitos madeirenses das zonas rurais que, procurando fugir ao isolamento e tentando melhorar as suas condições de vida, aqui se fixaram, ampliando as dificuldades da edilidade funchalense.