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A sociedade de consumo

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Capítulo III – A criança vista como target

1. A sociedade de consumo

Trabalhamos, para fins didáticos, com três estágios de desenvolvimento, marcado por características bastante peculiares. No entanto, sabemos que, em se tratando de ciências humanas, classificações desse tipo não são estanques mas constituem processos em contínua transformação. Da mesma forma, entendemos que o surgimento de um novo estágio não significa a completa exclusão do antigo, por sobreposição. O que notamos é que, a cada avanço - se é que assim podem ser chamados -, novas experiências somam-se aos conhecimentos adquiridos.

De acordo com Joseph Straubhaar e Robert LaRose (2004, p. 26) no livro Comunicação, Mídia e Tecnologia, “a maioria das sociedades atuais tem uma mistura de componentes agrários, industriais e de informação nas suas economias”.

Nesse sentido, podemos usar como exemplo a continuidade das atividades agrícolas, mesmo após o amplo desenvolvimento de processos e máquinas para o meio rural proporcionado pela revolução industrial. Da mesma forma, a sociedade em que vivemos não deixou de ser industrial, porém, o desenvolvimento de novas tecnologias possibilitou o surgimento de indústrias de computadores, processamento de dados, semicondutores, de comunicação avançada, entre outras, que modificaram sensivelmente o modo de vida das sociedades. Mas talvez a grande diferença da fase atual, a da sociedade da informação ou pós-moderna, como conceituam alguns autores, seja a nova forma de poder que inaugura. Segundo Daniel dos Santos Galindo (2002, p. 59) no livro Propaganda inteira&ativ@, “o domínio da informação traz em si uma nova estrutura de poder e de circular por um novo espaço necessariamente sem fronteiras e até mesmo sem limites, afinal, a informação é e será dentro desse contexto uma moeda forte”.

Feita esta ressalva, ainda nos resta destacar que, além de discorrer sobre os principais fatores sociais e econômicos que tiveram impacto sobre o comportamento de consumo, em cada uma das fases de desenvolvimento, dedicamos especial atenção às transformações ocorridas na religião, na família, na escola, nos meios de comunicação e nas relações de trabalho. Elas trazem particularidades que facilitam a compreensão do processo histórico-social de que tratamos, uma vez que mantêm relação direta com a cultura de produção e de consumo de cada fase.

1.1 Sociedade pré-industrial

Durante esse estágio de desenvolvimento, as comunidades produziam o suficiente para suprir todas as suas necessidades e dependiam da terra para tudo, pois ela era a “base da economia, da vida, da cultura, da estrutura da família e da política”. Nessa fase, havia uma divisão simples do trabalho, o poder era autoritário e a sociedade dividida em algumas castas e classes: nobreza, sacerdócio, guerrreiros, hilotas, escravos e servos. Era o nascimento que determinava a posição que o indivíduo teria na sociedade por toda a sua vida (TOFLER, 2005, p. 35).

Na época, poucas pessoas sabiam ler e escrever. Apenas os indivíduos ligados ao sacerdócio tinham essa oportunidade, pois cabia a eles a função “de manter arquivos, escrevendo e lendo correspondências, copiando e mantendo livros religiosos” (STRAUBHAAR; LAROSE, 2004, p. 29). Nesse contexto, a comunicação era principalmente oral e bastante lenta, pois se dava por meio de mensageiros. Segundo Straubhaar, LaRose (2004, p. 29) “a notícia da tomada de Constantinopla pelos turcos, em 1453, levou um mês para chegar a Veneza e dois meses para chegar a Roma”.

Embora nesse período - antes do advento da impressão - os livros já começassem a ser um meio de massa2, vários fatores impediram sua expansão e a alfabetização da sociedade, como descreve Straubhaar e Larose (2004, p. 30):

Primeiro a reprodução de livros, antes da invenção do tipo móvel e da imprensa mecânica, era muito díficil. Em segundo, pessoas no poder não estavam particularmente interessadas que as massas pudessem ler. Terceiro, a necessidade econômica de uma força de trabalho amplamente alfabetizada ainda não havia se tornado aparente. [...] Em quarto, já que a leitura até então havia sido limitada à elite especializada, os tipos de livros produzidos destinavam-se apenas a esse grupo.

Outro aspecto deste estágio de desenvolvimento da sociedade é que as famílias faziam parte de grandes grupos multigeracionais, “todos vivendo sob um mesmo teto e trabalhando em uma mesma unidade econômica de produção [...] A família era imóvel... enraizada no solo” (TOFLER, 2005, p. 41). Tios, avós, primos e netos moravam juntos, a família era grande e havia uma divisão do trabalho artesanal, braçal, entre eles, um precisava do outro para sobreviver.

2 Os livros só começaram a ser disponibilizados à população no século XVI. E o impacto foi profundo, pois a

Nota-se que, nesse estágio do desenvolvimento social, as necessidades dos indivíduos eram básicas, essenciais para a sobrevivência. O trabalho existia apenas para garantir a subsistência e os indivíduos não tinham a possibilidade de ascensão de classe social. Estavam inseridos em um mundo autoritário, impregnado de deveres e preconceitos, onde o prazer era restrito apenas a algumas pessoas, principalmente àquelas ligadas à igreja. Ao povo, só restava o trabalho.

1.2 Sociedade industrial

Quando as máquinas começam a avançar sobre a sociedade agrícola, instaura-se um grande conflito, caracterizado, inclusive, pela violência armada. Foi assim que aconteceu nos Estados Unidos, em 1861. Travestido em uma batalha contra a escravidão e a cobrança abusiva de tarifas, o interesse de uma nova classe começava a despontar. A grande questão, segundo Tofler (2005, p. 37), era saber quem iria governar o rico e novo continente: fazendeiros ou industrializadores? Como a guerra foi vencida pelos que defendiam a industrialização, o que se viu foi o desenvolvimento de máquinas e a produção de bens em grande escala, fase que ficou conhecida como a do capitalismo de produção.

Porém, o trabalhador da terra que migrava para a cidade ainda tinha que se adequar às regras das empresas, respeitar hierarquias, ser pontual. Essa mudança de comportamento era difícil de ser aceita pelas pessoas já na fase adulta, como afirma Andrew Ure (apud TOFLER, 2005, p. 42), “era quase impossível converter pessoas passadas da puberdade, tiradas de ocupações rurais ou de ofícios artesanais em operários de fábrica úteis”.

Passou-se, então, a investir nos jovens, que estavam em processo de formação, que estavam crescendo já inseridos nessa lógica, a da indústria. Assim, a Revolução Industrial veio acompanhada da educação em massa. De acordo com Tofler (2005, p. 43) “as escolas da era industrial padronizaram gerações e gerações de jovens, transformando-os numa força de trabalho arregimentada, maleável, do tipo exigido pela tecnologia eletromecânica e pela linha de montagem”. Neste sentido, os mais novos foram tirando espaço dos mais velhos. Os jovens já cresciam moldados na engrenagem da sociedade industrial, prontos a produzir e a consumir.

Entretanto, nessa época o consumo ainda era bastante restrito, principalmente porque a ética religiosa protestante defendia o trabalho como forma de elevação ao plano superior. Para Maria de Fátima Vieira Severiano (2001, p. 62) no livro Narcisismo e publicidade: uma análise psicossocial dos ideais de consumo na contemporaneidade, essa postura religiosa, do ponto de vista das relações com o consumo, implicou em “uma

racionalização rigorosa de todos os aspectos da vida cotidiana, uma conduta ascética, trabalho árduo e sistemático, domínio de si e recusa do luxo e gozo dos bens, o qual era visto com freqüência como obra do diabo”. Seguir esta crença significava estar entre os eleitos de Deus. O consumo era praticado apenas para atender as necessidades básicas do homem. Segundo Severiano (2001, p. 65), trata-se de uma fase na qual o fundamento é o da produção sobre o consumo, o que naturalmente ocasionou uma superprodução e uma grande crise, já que havia muitos produtos e um consumo freado.

Então, para que o sistema não entrasse em colapso, foi preciso criar mecanismos capazes de estimular a compra. “A venda em massa de produtos representou um ponto de saída para a enorme capacidade podutiva que as indústrias modernas estavam criando” (STRAUBHAAR; LAROSE, 2004, p. 34). E foi a partir dessa lógica que nasceu o capitalismo de consumo ou, na denominação de Gilles Lipovetsky (2007, p. 32), “a sociedade da abundância”. Para Severiano (2001, p. 66), o que possibilitou, em termos técnicos e industriais, essa transformação do capitalismo de produção para o de consumo, foi o advento da ordem industrial fordista, a qual instaurou a produção em série e a redução dos preços unitários.

Outro fator importante para a expansão do consumo foi a distribuição dos produtos. Se antes eles estavam disponíveis apenas nas pequenas mercearias de uma determinada localidade, a era industrial permitiu que circulassem ultrapassando fronteiras, expandindo- se principalmente nas grandes lojas de departamento, por meio de estradas de ferro e serviços postais, tecnologias fundamentais para o crescimento do consumo.

Da mesma forma, se durante a era agrícola se produzia apenas para suprir as necessidades básicas - já que não havia a prática de estoques de mercadoria, a produção era manual e não havia meios de distribuição em massa -, na fase da industrialização era preciso vender mais e mais para evitar o prejuízo. Partindo dessa lógica mercantil, os grandes magazines passam a estimular o indivíduo, a “impressionar a imaginação, despertar o desejo, apresentar a compra como um prazer” (LIPOVETSKY, 2007, p. 31). Segundo o autor, graças a uma política de vender barato, o grande magazine transformou os bens antigamente reservados à elite em artigos de massa destinados à burguesia.

Os líderes industriais começam a perceber que precisam de um esforço grande de vendas para que seus produtos sejam adquiridos pelas pessoas. Assim, o consumo também passa a ser incentivado por meio da propaganda, que informa as pessoas sobre os novos bens disponíveis no mercado. É nessa fase, aliás, que a propaganda começa a crescer como uma indústria, pois passa a ser vista como parte fundamental dos negócios. Segundo Leiss;

Kline; Jhally (apud STRAUBHAAR; LAROSE, 2004, p. 35), em 1920, dois terços das rendas de jornais e revistas vinham de anúncios.

Uma outra poderosa aliada do consumo foi a chegada da televisão - três décadas após a Segunda Guerra Mundial –, numa época caracterizada pela explosão dos meios de comunicação de massa. De acordo com Manuel Castells (1999, p. 418), “nos EUA, no final dos anos 80, a TV apresentou 3.600 imagens por minuto, por canal [...] A casa americana média mantinha o aparelho ligado cerca de sete horas por dia”. Era tempo suficiente para vender padrões de comportamento e consumo.

Além da produção em série, dos grandes magazines, da propaganda, da evolução dos meios de transporte e de comunicação, há ainda um outro fator que deve ser levado em consideração quando falamos em comportamento de consumo nas sociedades marcadas pela industrialização.

Se, na fase agrícola, era a condição de nascimento que determinava o que a pessoa seria para o resto da vida - não havia mobilidade social -, na era industrial a situação é diferente. O consumo passa a ser o porta-voz do indivíduo, os objetos que ele adquire acabam funcionando como uma espécie de segunda pele, e mostram a que classe social ele “pertence”. Para Douglas (apud SLATER, p. 149), “o estilo de consumo é explicado como forma de mostrar o status social, o desejo de dispor de certos bens é um desejo de imitar o estilo de grupos de status mais elevado”. Esse uso do consumo pode ser visto, de certa forma, como uma maneira de resposta às condições do passado, quando a sociedade não tinha meios de ascensão social.

Grant McCracken (2003, p. 37) em Cultura & Consumo, destaca algumas características do comportamento de homens e mulheres nessa fase industrial:

Aquilo que homens e mulheres uma vez esperaram herdar de seus pais, agora tinham a expectativa de comprar por si mesmos. Aquilo que uma vez foi comprado sob os ditames da necessidade, agora era comprado sob os ditames da moda. Aquilo que antes era comprado uma vez na vida, agora podia ser comprado várias vezes [...] as luxúrias passaram a ser vistas como meros “bons costumes”, e os “bons costumes” passaram a ser vistos como “necessidades”.

Porém, essa “democracia” do consumo pode esconder uma desigualdade social, como relata Jean Baudrillard (1995, p. 48):

O princípio democrático acha-se então transferido de uma igualdade real, das capacidades, responsabilidades e possibilidades sociais, da felicidade

(no sentido pleno da palavra) para a igualdade diante do objeto e outros signos evidentes do êxito social e da felicidade. É a democracia do standing, a democracia da TV, do automóvel e da instalação estereofônica, democracia aparentemente concreta, mas também inteiramente formal, correspondendo para lá das contradições e desigualdades sociais à democracia formal inscrita na constituição.

Outro fator que também pode ter contribuído para impulsionar o consumo foi a transformação da instituição família. A partir da Revolução Industrial, a estrutura familiar mudou, pois as necessidades passaram a ser outras. Da terra, o trabalho migrou para a indústria. De grupos multigeracionais (tios avós, primos e netos), a família passou para uma organização mais enxuta.

O individualismo começou a crescer dentro dos lares. Cada um tinha que procurar seu trabalho fora de casa e isso fez com que as funções básicas da família passassem a ser terceirizadas. A educação da criança foi relegada à escola e boa parte dos idosos passou a ser entregue a asilos.

A imagem da família grande foi desfalecendo em favor dos imperativos dos tempos modernos. Se a estrutura familiar continuasse sob a mesma configuração de antes, repleta de parentes sob um mesmo teto, provavelmente não teria sido possível sobreviver aos novos desafios da era industrial. De multigeracional, a família moderna passou então a ser “nuclear – pai, mãe e algumas crianças” (TOFLER, 2005, p. 42).

De acordo com Galindo, Marin (1999, p. 94):

[...] em gerações anteriores, as crianças, além dos pais, contavam com outros modelos de adultos: tios, padrinhos, avós, vizinhos. Após a Revolução Industrial, a vida nas cidades e o individualismo tendem a diminuir o tamanho das famílias e o número de adultos disponíveis para elas.

E quem preencheu grande parte do espaço deixado pelos adultos foi a mídia eletrônica, na época principalmente a tevê, que passou a ser companheira de várias horas, com programação repleta de propagandas direcionadas a esse público.

A era industrial, pelo que se pode notar, significou uma grande ruptura na forma organizacional da sociedade, provocou uma mudança nos hábitos de consumo, nas relações familiares e de trabalho. Instalou-se uma nova maneira de enxergar o mundo e de ser visto por ele, numa fase em que o consumo passa a ser uma espécie de passaporte para a vida.

Nesse estágio, as indústrias de carvão, trilhos, aço, automóvel, borracha e de fabricação de máquinas - as clássicas do pós Revolução Industrial - começaram a ficar decadentes, a partir de meados da década de 50, nas nações industriais como os Estados Unidos . Assim, esse tipo de indústria começou a migrar para os chamados países em desenvolvimento, onde a mão-de-obra era mais barata e a tecnologia menos avançada (TOFLER, 2005, p. 146).

Nos países desenvolvidos, surgiam novas indústrias, que substituiriam as eletromecânicas, baseadas na ciência clássica da primeira fase da era industrial. De acordo com Tofler (2005, p. 146), “no seu lugar entrou a eletrônica do quantum, informática, biologia molecular, oceânica, nucleônica, ecologia e as ciências espaciais”. Elas possibilitaram o surgimento das fábricas de computadores, de processamento de dados, de semicondutores, de equipamentos aeroespaciais e de comunicação avançada, entre outras. Por isso mesmo, essa nova fase de desenvolvimento é também conhecida como a da sociedade da informação, pois embora se tenha fortes componentes da agricultura, da indústria e de serviços, “todos esses setores agora estão sendo alterados pelo uso das tecnologias da informação” (STRAUBHAAR; LAROSE, 2004, p. 42).

Assim como ocorreu na transição da era agrícola para a fase industrial, os postos de trabalho começam a exigir um outro tipo de mão-de-obra, mais qualificada. Segundo Straubhaar, LaRose (2004, p. 45):

O conhecimento passa a ser recurso-chave, e não mais as fontes naturais. [...] Conforme mais indústrias e serviços requerem uso da informação e da tecnologia, a necessidade de educação no mercado de trabalho continua a crescer [...] Companhias como a Hewlett-Packard dão preferência a contratar jovens universitários.

Nessa nova sociedade, onde a engrenagem dá lugar ao chip, a mídia passa a desempenhar papel fundamental. E, como toda a transformação provoca mudanças e adaptações em diversas áreas, os meios de comunicação também começam a sofrer um processo de desmassificação. Surge aí a mídia segmentada. São títulos de revistas especializadas, programas e canais de televisão voltados a um público específico, jornais que privilegiam a cobertura de uma área - a econômica, por exemplo – em detrimento das outras. O indivíduo passa, enfim, a contar com um leque bem maior de possibilidades, de escolhas, para satisfazer suas necessidades individuais.

Nessa realidade, fortemente marcada pelo desenvolvimento da tecnologia da informação, aumentam as possibilidades de que o receptor da mensagem possa ser emissor

de suas produções e pontos de vista. Para Tofler, (2005, p. 171), “[...] em vez de massas de pessoas recebendo todas as mesmas mensagens, grupos desmassificados menores recebem e enviam grandes quantidades de suas próprias imagens de uns para os outros”. A internet reduz as distâncias, elimina as fronteiras. A notícia da tomada de Constantinopla, que demorou dois meses para chegar em Roma, em 1453, precisaria hoje de alguns segundos para se espalhar mundialmente: a rapidez com que a notícia se propaga cabe no instante de apenas um clique no mouse.

Por meio da world wide web ou da rede mundial de computadores, surgem as comunidades sociais, os blogs, enfim, meios de enviar e receber conteúdo que de fato tenham a ver com o interesse de pequenos ou grandes grupos que participam daquele fórum. Na internet, as pessoas primeiro se conhecem, depois se apresentam, pois estão lá por afinidade, por gostos e interesses pessoais. “As comunidades virtuais são instrumentos para conectar as pessoas segundo a finalidade de interesses [...] não se pode pegar o telefone para conhecer alguém interessado em arte islâmica ou nos vinhos da Califórnia” (RHEINGOLD, 1999, p. 150).

Assim, a sociedade da informação representa uma nova revolução na maneira do sujeito se relacionar com o mundo. Enquanto na era agrícola a criança “construia seu próprio modelo de realidade tirado de imagens recebidas de um minúsculo punhado de fontes: o professor, o sarcedote, o chefe ou a autoridade oficial, sobretudo da família” (Tofler, 2005, p. 162), na pós-modernidade, para Straubhaar e LaRose (2004, p. 52), “não há uma verdade absoluta e o que você pensa depende de sua própria experiência, que, por sua vez, depende dos grupos aos quais você pertence, da mídia à qual você presta atenção, do que sua família lhe ensinou e assim por diante”.

As mensagens veiculadas pela mídia passam a ter um caráter normatizador relativo, ao passo que fornecem referenciais antes impostos pelo espírito nacional, pela família ou pelas igrejas. A mídia, para Lipovetsky (2004, p. 42), contribuiu no processo de dissolução das forças tradicionais, das morais rigoristas e das grandes ideologias políticas, permitindo a emancipação dos indivíduos, agora centrados em valores como a celebração da autonomia individual, do amor ao corpo, dos prazeres e da felicidade privada.

Lipovetsky vê a mídia como instrumento que possibilita acesso à informação cada vez mais diversificada, caracterizada por pontos de vista individuais e que não se integram, necessariamente, ao redor de um mesmo discurso ideológico. Ela não se autointitula mais como uma autoridade universalmente reconhecida, não quer contribuir para a formação de um consenso, mas, ao contrário, dá espaço para o antagonismo dos discursos, estimula o

debate permanente. “A homegeneização dos gostos e dos modos de vida não desemboca numa vida social e política consensual; perduram os conflitos, mas por meio de uma pacificação individualista do debate coletivo, para o qual a mídia contribui” (LIPOVETSKY, 2004, p. 43).

Do ponto de vista do consumo, principalmente nas nações mais desenvolvidas, ele passa a ser mais íntimo. É a era do “consumo emocional”, na qual se consome mais para satisfazer o eu e menos para provar status. A opinião do outro, nesse momento, começa a ser relegada a segundo plano (LIPOVETSKY, 1989, p. 173).

Mesmo os novos bens de consumo que chegam no mercado [...] não chegam a impor-se como material carregado de conotações de standing; cada vez mais rapidamente são absorvidos por uma demanda coletiva ávida não de diferenciação social mas de autonomia, de novidades, de estimulações, de informações.

Para o autor, um Homo consumericus de terceiro tipo está vindo à luz, imprevisível em seus gostos e em suas compras (LIPOVETSKY, 2007, p. 14):

De um consumidor sujeito às coerções sociais da posição, passou-se a um hiperconsumidor à espreita de experiências emocionais e de maior bem- estar, de qualidade de vida e de saúde, de marcas e autenticidade, de imediatismo e de comunicação. O consumo intimizado tomou o lugar do consumo honorífico, em um sistema em que o comprador é cada vez mais

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