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3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

3.4 A Teoria da Relevância

O processo de construção e confirmação de hipóteses só será possível, no entanto, se o leitor apresentar um mínimo de familiaridade com o assunto tratado no texto, de modo a tornar sua leitura relevante. Nesse sentido, a Teoria da Relevância, proposta por Sperber e Wilson (2001) serve de base para justificar a afirmação anterior, pois, segundo essa teoria, numa comunicação, os seres humanos tendem a prestar atenção aos estímulos ou informações que lhes são mais relevantes, de modo a adquirir uma grande quantidade de informações novas com o menor custo de processamento possível (SPERBER; WILSON, 2001).

Assim, faz-se necessário apresentar a noção de relevância proposta por esses autores para, posteriormente, tratarmos da justificativa da existência de dificuldades relacionadas à identificação das informações que estão para além da superfície do texto, ancorados nos aspectos constitutivos da Teoria da Relevância, que defende que “a comunicação explícita não é simplesmente uma questão de descodificação, mas que existe nela também um elemento de inferência” (SPERBER; WILSON, 2001, p. 14), ou seja, que a compreensão vai muito além da simples análise do sentido literal das palavras ou enunciados. Porém, para que essa compreensão aconteça, é necessário que a informação apresentada seja relevante para quem a recebe. Caso contrário, o objetivo inicial da comunicação poderá ficar prejudicado.

Segundo Sperber e Wilson (2001), uma informação é relevante quando é capaz de gerar novas informações, provocando, dessa forma, um efeito de multiplicação de conhecimento, ou seja, novos conhecimentos são gerados a partir da relação criada entre os conhecimentos que o interlocutor tem armazenado e as informações que lhes são apresentadas. Assim, “quanto maior for o efeito de multiplicação, maior é a relevância” (SPERBER; WILSON, 2001, p. 92) da informação para quem a recebe e melhor será a compreensão alcançada no momento da comunicação.

Podemos perceber, a partir do exposto, que o ser humano sente-se mais atraído e dispensa mais atenção a informações que sejam capazes de gerar novos conhecimentos. Levando isso para a leitura, compreende-se que, quanto mais atrativo e mais desafiador apresentar-se um texto para o leitor, mais este se sentirá estimulado a desvendar seus sentidos e obter novos conhecimentos a partir de sua leitura.

Para que isso ocorra, porém, não basta apenas apresentar um novo texto para o leitor, pois se a informação nele presente não fizer parte do seu repertório sociocultural e não houver uma mediação por parte do professor, de modo a contextualizar a nova informação apresentada, durante a leitura de textos escritos, ela será vazia de significado e, por sua vez, irrelevante para quem a recebe.

Relevante, por sua vez, “é a informação que modifica e aperfeiçoa uma representação total do mundo” (SPERBER; WILSON, 2001, p.123) e para que isso ocorra, faz-se necessário um compartilhamento entre os conhecimentos de quem comunica com os conhecimentos de quem interage e essa ponte deverá ser construída através da mediação do professor.

Como a Teoria da Relevância está ancorada no estudo do esforço realizado pelos interlocutores para processar uma informação no ato de comunicação, ela caracteriza-se por ser uma teoria pragmático-cognitiva que tem como base um modelo inferencial, tendo em vista que o processamento das informações não é baseado apenas no que se encontra na superficialidade, mas na relação estabelecida entre as informações explícitas e as intenções pretendidas pelo emissor e identificadas, ou não, pelo receptor.

Assim, a construção de inferências começa a partir de um conjunto de premissas e resulta num conjunto de conclusões a que chegam logicamente das premissas ou que são, pelo menos, confirmadas por elas (SPERBER; WILSON, 2001). Essas conclusões constituem as inferências, que têm a função de preencher as lacunas deixadas pelo autor– no caso da leitura - completando o sentido e contribuindo para a compreensão.

Sobre a construção de inferências no momento da leitura, Kleiman (2007, p. 26) afirma que “o conhecimento adquirido determina, durante a leitura, as inferências que o leitor fará, com base em marcas formais do texto”, o que significa dizer que esse conjunto de premissas, apresentado por Sperber e Wilson (2001) é determinado pelo conhecimento prévio que o leitor apresenta, no momento da leitura.

Para que a compreensão das informações se efetive, a Teoria da Relevância defende a existência de uma postura ostensiva por parte de quem emite uma mensagem, ou seja, ele precisa tornar visível sua intenção de modo a facilitar o efetivo processamento da informação por parte daquele que irá receber a informação. Assim, “é necessário o reconhecimento da intenção que fica por trás da ostensão para que haja um processamento eficiente da informação: uma pessoa que falhe no reconhecimento dessa intenção, poderá não reparar nas informações que são realmente relevantes.” (SPERBER; WILSON, 2001, p. 95).

Segundo os autores, é a partir da descoberta das intenções do comunicador que o interlocutor pode descobrir, indiretamente, a informação básica que ele tencionou tornar manifesta, caracterizando esse processo como uma comunicação inferencial ostensiva, sendo a comunicação inferencial e a ostensão componentes do mesmo processo, em que o ato de ostensão está ligado ao emissor, que tenciona ter sua mensagem compreendida e a inferência ligada ao receptor, que forma significados relacionando a informação apresentada ao seu contexto, visto aqui como a bagagem de conhecimentos que possui.

Sobre isso, Kato (2007, p. 69) afirma que o leitor: “[...] deverá compreender o objetivo do autor, acreditar em sua sinceridade, procurar a relevância dos subjetivos em relação ao objetivo central e esperar que os objetivos venham codificados através de recursos linguísticos mais simples.”.

Entende-se, portanto, que a Teoria da Relevância, postulada por Sperber e Winson (2001) defende a ideia de que, no ato de comunicação, o interlocutor mostra-se mais receptivo às informações que apresentem relevância ao aprimoramento de seus conhecimentos e que, para que isso ocorra, faz-se necessário que o autor adote uma postura ostensiva, no sentido de que, através do discurso utilizado no momento da comunicação, precisa apresentar motivos que façam com que o interlocutor se sinta atraído pelas informações que lhes forem apresentadas, gerando, através de um processo inferencial, novos conhecimentos que serão acrescidos ao conhecimento prévio que já possui.

O mesmo acontece em relação ao ato de ler, visto que constitui um modo de comunicação. Os leitores precisam se sentir motivados para a leitura e acreditar que as informações a serem apresentadas no texto contribuirão para acrescentar, efetivamente, mais conhecimentos em sua vida e que eles possuem um conhecimento mínimo acerca do assunto para poder conseguir apreender seus significados. Nesse caso, além do discurso do autor do texto e da existência de elementos visuais que facilitem a compreensão, tem importância também o papel do professor como mediador do processo e como corresponsável pela motivação da leitura por parte de seus alunos.

Tanto o modelo de comunicação ostensiva inferencial, apresentado por Sperber e Winson (2001) quanto a definição de inferências apresentada por Marcuschi (1985) e os apontamentos sobre implícitos apresentados por Ducrot (1987) apresentam subsídios que servem para nortear o trabalho com a identificação de inferências em textos, durante as aulas de leitura e compreensão, uma vez que são relevantes para o processo de compreensão.

Ao comparar a definição de inferência apresentada por Marcuschi (1985, p.22) como “uma operação cognitiva que permite ao leitor construir novas proposições a partir de

outras dadas”, à definição de Sperber e Winson (2001), que considera a inferência como um processo que “começa a partir de um conjunto de premissas e resulta num conjunto de conclusões que seguem logicamente das premissas ou que são, pelo menos, legitimadas por elas”; e à definição de implícito como “o que os fatos implicam”, apresentadas por Ducrot (1972, p. 20), percebemos que suas definições são semelhantes e que partem do mesmo princípio: o fato de que as inferências são geradas a partir das informações explícitas que podem confirmar, ou não, as hipóteses geradas no início da comunicação.

Tal fato demonstra o quão relevante é o trabalho com a construção de inferências em sala de aula, pois, a partir do momento em que os alunos conseguirem estabelecer relações entre seus conhecimentos e o que está escrito no texto, adquirindo novos conhecimentos, conseguirão, posteriormente, resgatar esses conhecimentos adquiridos em outras situações de comunicação e desenvolver a habilidade de reflexão e análise de textos, confirmando a afirmação de Kleiman (2002a, p. 10) de que a leitura é uma “prática social que remete a outros textos e a outras leituras”, promovendo, dessa maneira, a aprendizagem do leitor em diversas áreas do conhecimento.

Dando continuidade à nossa abordagem, trataremos a respeito do gênero textual utilizado em nossa pesquisa: a Literatura de Cordel.