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1. INTRODUÇÃO

1.6 A teoria das representações sociais como fundamento teórico

A escolha da Teoria das Representações Sociais se adequou bem ao propósito desse estudo na medida em que tal proposição em seu desenvolvimento possui elementos que contemplam os aspectos sócio-culturais tão importantes para estudo sobre a temática dos consumidores regulares de maconha, e que são relativamente negligenciados como importante fonte de informação. Em definição descrita por Denise Jodelet, as representações sociais

concernem ao conhecimento do sentido comum, que se põe a disposição na experiência cotidiana; são programas de percepção, construções com status de teoria ingênua, que servem de guia para a ação e instrumento de leitura da realidade; sistemas de significações que permitem interpretar o curso dos acontecimentos e das relações sociais; que expressam a relação que os indivíduos e os grupos mantem com o mundo e os outros; que são forjadas na interação e no contato com os discursos que circulam no espaço público; que estão inscritas nas linguagens e nas práticas; e que funcionam como linguagem em razão de sua função simbólica e dos marcos que proporcionam para codificar e categorizar o que compõe o universo da vida (JODELET, 2000, p. 10).

Desta maneira, as representações sociais enquanto um conceito utilizado pela Psicologia Social, onde “o individuo só existe dentro da rede social e toda sociedade é resultado da interação de milhares de indivíduos” (ALEXANDRE, 2004, p. 130), mostra-se um lócus privilegiado de averiguação para a presente pesquisa.

É importante consideramos o apontamento feito por Jean-Claude Abric (1998), que postula que é crucial nessa teoria o abandono da clássica distinção entre sujeito e objeto, que autoriza, por conseguinte, a redefinição do que se convencionou chamar de “realidade objetiva”. A partir dessa consideração toda a realidade “é representada, quer dizer, reapropriada pelo individuo ou pelo grupo, reconstruída no seu sistema cognitivo, integrada no seu sistema de valores, dependente de sua história e do contexto social e ideológico que o cerca” (ABRIC, 1998, p. 27).

As representações sociais possuem duas características básicas:

Em primeiro lugar, elas convencionalizam os objetos, pessoas ou acontecimentos que encontram. Elas lhe dão uma forma definitiva, as localizam em determinada categoria e gradualmente as colocam como um modelo de determinado tipo, distinto e partilhado por um grupo de pessoas. (...) Em segundo lugar, as representações são prescritivas, isto é, elas se

impõem sobre nós com uma força irresistível. Essa força é uma combinação de uma estrutura que está presente antes mesmo que nós comecemos a pensar e de uma tradição que decreta o que deve ser pensado (MOSCOVICI, 2003, p. 34 e 36).

Entendendo as representações sociais como um conhecimento corrente, prático, relacionado diretamente ao senso comum, três propriedades podem caracterizá-las. 1. As representações possuem o caráter de serem socialmente elaboradas e compartilhadas; 2. “Tem uma orientação prática de organização, de domínio do meio (material, social, ideal) e de orientação das condutas e da comunicação; 3. Participa do estabelecimento de uma visão de realidade comum a um dado conjunto social (grupo, classe, etc) ou cultural” ( ALMEIDA, 2005, p. 122).

Consideramos ainda importante definir dois conceitos centrais na Teoria das Representações Sociais – Ancoragem e Objetivação.

Ancoragem é o processo pelo qual os indivíduos escolhem um quadro de referencia comum que lhes permita apreender o objeto social. Geralmente, este quadro de referencia corresponde a um domínio familiar. (...) Objetivação é o processo que os indivíduos vão utilizar para tentar reduzir a distância entre o conhecimento do objeto social que eles constroem e a percepção que eles têm deste objeto. Trata-se de transformar a crença ou a opinião em informação (DESCHAMP & MOLINER, 2009, p. 127)

São apontadas quatro importantes funções das representações: função de saber, que permite a integração de um saber novo a conhecimentos anteriores, tornando o novo acessível; função identitária, que permite os indivíduos se situarem no campo social através da construção de uma identidade social e pessoal positiva; função de orientação, já que definem o que é socialmente aceito, o que as torna prescritivas, como já sinalizado e; função justificadora, que permite fortalecer a diferenciação social, o que por sua vez, preserva, justifica e mantém a distancia social entre os demais grupos (ALMEIDA, 2005).

Gostaríamos de dar destaque para a função identitária de que nos fala Almeida (2005). Por sua característica de ser socialmente compartilhadas por determinado grupo, as representações permitem determinado grupo ser definido e diferenciado de outro, ocasionado os processos de comparação social, no qual “a representação do grupo é

sempre marcada por uma super avaliação de algumas de suas características ou de sua produção” (ABRIC, 1998, p. 29).

Fica patente a estreita relação, portanto, da Teoria das Representações Sociais com a

Teoria da Identidade Social, que possui seu conceito capital assim definido: “A identidade social será entendida, (...) como aquela parcela do auto-conceito dum

indivíduo que deriva do seu conhecimento, da sua pertença a um grupo (ou grupos) social, juntamente com o significado emocional e de valor associado àquela pertença” ( TAJFEL, 1983, p. 290).

Essa relação entre representações sociais e identidade social fica mais clara quando consideramos que

uma representação pode ser para um grupo um meio de afirmar suas particularidades e diferenças. (...) A especificidade do “nós” não se exprime somente através das características que o grupo se atribui ( a representação do endogrupo). Ela também pode exprimir-se na maneira pela qual este grupo representa um objeto social. Em muitos casos, esta representação se torna um meio de acentuar ao mesmo tempo as diferenças entre o endogrupo e exogrupo ( DESCHAMPS & MOLINER, 2009, p.133).

Assim, as representações sociais aparecem como elementos importantes na preservação e valorização da identidade grupal. Na teoria proposta por Tajfel (1983) fica evidente que no chamado processo de comparação social há uma tendência comum de atribuir ao “exogrupo” uma valoração negativa e positiva ao endogrupo. É digno de nota que se um determinado grupo, a princípio reconhecido como positivo, não oferece condições adequadas para preservar a identidade social de determinada pessoa, dois mecanismos, “mobilidade social” e “mudança social”, permitem a determinado sujeito buscar um status mais alto, aonde a identificação com grupo inicial é perdida.

“A categorização social permite ao indivíduo orientar-se e definir o seu lugar na sociedade. Dinamizando o processo de categorização social, temos a comparação social que permite evidenciar o conflito entre o endogrupo ( o “nós” ) e o exogrupo ( o “outro”) (SOUZA, BONONO, LIVRAMENTO, et., 2009, p. 30).