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A TMC e a Teoria Triárquica da Inteligência de Robert J Sternberg

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.8 Hipercultura

2.8.4 A TMC e a Teoria Triárquica da Inteligência de Robert J Sternberg

A Teoria Triárquica da Inteligência, proposta por Sternberg, defende que a inteligência apresenta três aspectos: aquele que trata da inteligência com o mundo interior da pessoa Sternberg, 2008; Sternberg, 2003); segundo, o que relaciona a experiência à inteligência e o terceiro aspecto, que a relaciona com o mundo exterior. Esta configuração propõe três facetas para a inteligência. A Faceta Analítica apresenta mecanismos responsáveis pela capacidade analítica, a relação da inteligência do indivíduo com o mundo interno, enfatizando o

processamento da informação, o que pode ser visto em três tipos diferentes de componentes: 1º - processos executivos de ordem superior (a metacognição é um exemplo), usados pelo indivíduo para planejar, monitorar e avaliar a solução de problemas; 2º - componentes de desempenho (de ordem inferior, utilizados para implementar os comandos dos

metacomponentes); 3º - componentes de aquisição de conhecimento (processos destinados à aprendizagem sobre como resolver problemas. Os três componentes são considerados interdependentes.

O segundo aspecto da Teoria Triárquica, indica como a inteligência está relacionada com a experiência. Este aspecto considera que cada indivíduo enfrenta tarefas e situações com níveis variados de experiência. Envolve insights, sínteses e a habilidade de reagir a novas situações e estímulos (Souza, 2004). Considera a ocorrência do pensamento criativo e constitui-se de: novidade, que são mecanismos responsáveis pela capacidade do indivíduo lidar com novas situações; automatização, constituída por componentes que tornam possível a automatização do processamento da informação.

O terceiro aspecto ou importante característica proposta pela teoria da inteligência de Sternberg é o da faceta Prática: esta envolve a habilidade de aprender. Sugere que os diversos componentes da inteligência são aplicados à experiência no cumprimento de três funções da vida real: o primeiro, significa a adaptação do indivíduo aos ambientes; o segundo é moldar os ambientes para criar ambientes novos e o terceiro é escolher novos ambientes (Sternberg, 2008). Este aspecto compõe não apenas habilidades mentais, mas também fatores emocionais, atitudinais e de sociabilidade. Compõe-se de: adaptação – capacidade de mudar a si mesmo em função do ambiente; modelagem – capacidade de mudar o ambiente e as pessoas; seleção – capacidade adaptativa, a qual cria alternativa de escolha de novo ambiente, quando a adaptação ou a modelagem não propicia o sucesso. Souza (2004), observa na definição da inteligência para Sternberg a consideração da capacidade de se obter sucesso e realização na vida real, o que coloca o fracasso na outra extremidade como falta de determinados atributos, como motivação, controle de impulsos e perseverança.

A relação que se apresenta da TMC com a Teoria Triárquica de Sternberg, é que a TMC considera a existência de mecanismos de processamento interno, que são estruturas cognitivas com a finalidade de coordenar e realizar operações lógicas. Esta capacidade básica funciona como promotora da elaboração, alocação e execução de algoritmos, o que viabiliza a criação e utilização dos mecanismos de mediação interna. De modo mais específico, pode-se observar a aproximação entre as duas teorias com a equivalência da mediação interna

proposta na TMC e a Faceta Analítica da Teoria Hierárquica (ou Triárquica) de Sternberg, na qual os Componentes de Aquisição de Conhecimento propiciam a assimilação de algoritmos, os Componentes de Desempenho permitem a implementação e os Metacomponentes podem controlar o funcionamento do sistema.

As facetas referentes à criatividade e à prática da Teoria Triárquica apresentam a interação do indivíduo com o mundo exterior, na realização de funções que possibilitam a

capacidade de adaptação ou resiliência por assimilação e/ou criação de sequências inéditas de operações lógicas (novos algoritmos). Comparativamente, a TMC adota a explicação da teoria de Sternberg sobre o surgimento e funcionamento dos mecanismos interno de mediação, apesar de que a TMC considera como função primordial das estruturas cognitivas propostas por Sternberg a viabilização do uso de sistemas externos (físicos, sociais, culturais e/ou hipercutlturais), como dispositivos computacionais (mecanismos externos), com as demais funções sendo secundárias (Souza, 2004).

Observa-se na Teoria da Mediação Cognitiva, o processo pelo qual os seres humanos dependem de estruturas externas, a fim de complementar o processamento de informações feito pelo seu cérebro biológico. Tal processo denominado de cognição extracerebral é o que constitui a mediação e pode ser descrito como tendo os seguintes componentes:

 Objeto: O item físico, conceito abstrato, problema, situação, e/ou relação em relação a

qual o indivíduo está tentando construir conhecimento;

 Processamento interno: a atividade cerebral fisiológica (sináptica, neural e endócrina),

que executa operações lógicas e básicas do indivíduo;

 Mecanismos internos: estrutura mental que gere algoritmos, códigos e dados que

permitem a conexão, interação e integração entre o processamento interno do cérebro e do processamento extracerebral feito pelas estruturas no meio ambiente, trabalhando tanto como um ''driver de hardware'' como um ''protocolo de rede'';

 Mecanismos externos: Podem ser de vários tipos e capacidades, que vão desde simples

objetos físicos, para os indivíduos e para grupos com atividades complexas sociais, sistemas simbólicos e ferramentas/ artefatos.

Um aspecto a ser ressaltado sobre a mediação cognitiva é o conjunto de mecanismos internos do indivíduo, porque é através desse processo que é possível o uso de estruturas externas, como dispositivos de processamento de informação auxiliares, mas além disso, também atua como máquinas virtuais internas, fornecendo novas funcionalidades cognitivas (ferramentas lógicas, técnicas e estratégias).

O que torna possível a integração entre o processamento de informação realizado pelo cérebro e um mecanismo externo é a ligação lógica entre os mesmos.

Conforme proposto por Souza et al. (2012), o processo de mediação produz vantagem ao permitir que o indivíduo melhore significativamente sua capacidade computacional, portanto, melhore suas competências cognitivas através de um processamento entre cérebro e uma rede sofisticada de apoio externo. Por outro lado, de acordo com este autor, pode-se também concluir que, dada a natureza das representações mentais (teoremas-em-ação), sua mera existência dota o indivíduo com um conjunto de ferramentas lógicas que aumenta a sua competência em domínios específicos, ainda que na ausência do correspondente sistema físico externo. Desta forma, padrões de um indivíduo de pensar, isto é, suas abordagens lógicas, estratégias, competências e raciocínio são definidas quase sempre pelos mecanismos de mediação formados por meio de uma história pessoal de interação com diferentes tipos de grupos sociais, ferramentas, instrumentos e outros elementos culturais, algo contemplado nas teorias sócio-construtivistas.

Conforme o modelo da Teoria da Mediação cognitiva, o papel da tecnologia da

informação e comunicação (TIC) no pensamento, pode-se considerar como algo que promove uma nova forma melhorada da mediação cognitiva, fato que promove um conceito de cultura diverso do habitual, porque considera mudanças culturais vinculadas ao uso de computadores e da internet. Assim, pode-se dizer que na Revolução Digital há o surgimento de uma

Hipercultura, na qual mecanismos de mediação externos incluem a si mesmo e seus impactos na cultura da tecnologia, enquanto mecanismos internos incluem competências necessárias para o uso efetivo dos mecanismos externos.

Souza e Roazzi (2009) desenvolveram um estudo, o qual reuniu quatro conjuntos de dados bastante abrangentes de uma mistura de variáveis culturais e relacionadas com as TIC coletada de crianças e adultos entre 1997 e 2003, a fim de analisar a relação estrutural entre as variáveis por meio de técnicas de escalonamento multidimensional e teoria da faceta. Os resultados apontaram para os quatro conjuntos de dados uma faceta claramente definida composta por variáveis relacionadas com as TIC, que se diferencia do restante das variáveis socioculturais. O achado foi considerado consistente pelos autores, uma vez que a existência de uma Hipercultura está surgindo a partir da Revolução Digital e seus impactos.

Outro estudo foi apresentado por Souza e Roazzi (2003) sobre um teste de QI aplicado a 3700 escolares, crianças com idades entre 11 e 19 anos a fim de analisar a relação entre escores brutos do teste, idade e contato com tecnologias digitais. Os resultados mostraram dois padrões diferentes para a progressão no teste de QI como uma função da idade. Aqueles que não usam computadores ou a Internet mostraram o que parece ser um padrão de logística, no qual a maior parte da variação parece estar entre as idades de 13 e 16. Já os que usavam computadores e Internet mostraram um padrão distinto onde apresentou uma diferença contínua como uma função da idade de pelo menos 11 a 18 anos. Além disso, a partir dos 16 anos de idade, utilizando os computadores e Internet superou o grupo que não usou nenhuma dessas tecnologias. Embora o estudo não tenha sido longitudinal, os autores atribuem os resultados à consistência da expectativa de que a Teoria da Mediação Cognitiva aponta para o desenvolvimento cognitivo imerso em uma Hipercultura.