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Solução e criação de problemas

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.5 Solução e criação de problemas

É notório que os dispositivos digitais ampliam a capacidade dos seres humanos sobre o sistema sensorial, sua memória, pensamento, possibilita a diversificação de perspectivas e experiências. Assim, um binóculo supera limites do olho humano e se este mesmo objeto possuir mecanismos especiais para visão noturna, além de ampliar o alcance da visão, também proporcionará novas formas de enxergar para a limitada visão noturna humana. Além de

possibilitar maior capacidade biológica, dispositivos digitais tornam possível a virtualização (Kastrup, 2000). Além desses aspectos generalistas a respeito da extensão de capacidades humanas, há autores que não consideram, por exemplo, o simples fato do uso do computador como algo que por si amplia as habilidades humanas. Para eles, a verdadeira aprendizagem no cenário tecnológico ocorre quando a pessoa incorpora de alguma forma a tecnologia no processo de construção do conhecimento (Valente, 1999).

Apesar de não ter registrado estudos mais profundos a respeito da criatividade, Skinner explicou o comportamento humano basicamente como proveniente de uma relação entre estímulo e resposta. Para este líder da linha comportamental, a criatividade era

compreendida como resultante de associações entre estímulos e respostas e que o comportamento criativo resultava de variações de comportamento, selecionados por

consequências reforçadoras (Wechsler, 1999); ou seja, um pintor que cria várias obras ou um compositor que cria várias músicas assim estaria se comportando pela busca de estímulos reforçadores. Em alguma medida, o indivíduo gera um ato criativo ao buscar a solução para seu objetivo.

Outra proposta teórica surgiu com a Gestalt, cuja contribuição consistiu na explicação de que o pensamento criador seria uma reconstrução de guestaltes, ou configurações

estruturalmente deficientes. Assim, o pensamento criador conforme a Gestalt, segundo Kneller (1978), apresenta-se com uma solução problemática que de certa forma se mostra incompleta. Na busca pela ordem do todo, o pensador percebe o problema, cuja dinâmica estabelece linhas de tensão a serem seguidas até se chegar a uma conclusão, que é a solução e em seguida o restabelecimento da harmonia.

Não foi apenas em estudos baseados em processos da consciência que se estabeleceu relações entre resolução de problemas e criatividade. Para Freud, a criatividade tem como

origem um conflito dentro do inconsciente (o id), que cedo ou tarde produz uma espécie de solução para o conflito, reforçando uma atividade pretendida pelo ego, ou parte consciente da personalidade, tem-se resultante o comportamento criador (Kneller, 1978). Se a solução ocorre independente do ego, será reprimida completamente ou surgirá uma neurose.

Para Piaget (1983), toda conduta é uma adaptação. Seja ela uma atividade possível de visualização, perceptível em um plano “exterior”, ou interiorizada em pensamento. Essa planificação também é utilizada por Vygotsky (2009), para explicar a atividade criadora. Para este renomado psicólogo, é denominada atividade criadora aquela que se cria algo novo, não importando se o que se cria é algum objeto do mundo externo ou uma construção da mente ou do sentimento, conhecida pela pessoa na qual tal construção habita e se manifesta.

Outras propostas teóricas também podem ser identificadas com as questões relativas à criatividade, como a proposta construtivista de Piaget e a visão sócio-histórica de Vygotsky.

Em Piaget (1983), o indivíduo age apenas mediante a necessidade, ou seja, por um rompimento do equilíbrio entre o meio e o organismo. Assim, qualquer ação tende a

restabelecer o equilíbrio entre o meio e o organismo. Diante disso, conduta significa um caso específico de intercâmbio entre o mundo exterior e o indivíduo e, de forma contrária aos intercâmbios biológicos de natureza material e implicações transformadoras dos corpos em questão, as condutas explicadas pela psicologia são de ordem funcional e se efetuam a distâncias cada vez maiores, no espaço (percepção, por exemplo) e no tempo (como a

memória), assim como em conformidade com trajetórias cada vez mais complexas (retornos e desvios).

Vygotsky (2009) destaca dois tipos de atividades principais do comportamento humano: um, que é denominado de reconstituidor ou reprodutivo. Esta é relacionada

produzidos e elaborados ou traz de volta marcas de impressões precedentes. O significado para tal conservação de experiências anteriores facilita a adaptação das pessoas em relação ao mundo, produz e elabora hábitos permanentes que são repetidos em condições iguais.

O outro gênero além da atividade reprodutiva é a combinatória ou criadora, que é fundada na imaginação. Esta pode ser ilustrada na situação em que se esboça para si mesmo um quadro do futuro sem reproduzir impressões que se teve a oportunidade de sentir alguma vez. A situação não seria caracterizada por uma simples restauração da marca de excitações anteriores chegadas ao cérebro por nunca se ter visto de fato nem tal passado (como a vida e luta de um homem de pré-história) nem o futuro. Apesar disso, pode-se ter uma ideia, uma imagem, um quadro.

As duas atividades, seja reprodutiva ou da memória e a outra, que é criadora, estão, na visão de Vygotsky (2009), relacionadas a atividades cerebrais, sendo que a primeira se constitui por uma base orgânica com propriedade plástica da substância nervosa que permite alterações e conservação das marcas alteradas. A segunda atividade é fundada pelo princípio de que o cérebro não é um órgão que apenas conserva e reproduz experiências anteriores, mas também que combina e reelabora, de forma criadora, elementos da experiência anterior, produzindo novas situações e novo comportamento com uma destacada razão:

Se a atividade do homem se restringisse à mera redução do velho, ele seria um ser voltado somente para o passado, adaptando-se ao futuro apenas na medida em que este reproduzisse aquele. É exatamente a atividade criadora que faz do homem um ser que se volta para o futuro, erigindo-o e modificando o seu presente. (Vygotsky, 2009). Se para Freud, uma pessoa cria do mesmo modo que come ou dorme, para aliviar certos impulsos, na visão de Carl Rogers, a pessoa cria também devido à sua procura pela realização, não procura apenas o repouso do equilíbrio, mas também a atividade, que é

geradora de tensão. Para Rogers, a criatividade implica em flexibilidade nas crenças da pessoa e em suas percepções, assim como tolerância diante da ambiguidade (Kneller, 1978).

Aproximando resolução de problemas e criatividade, observa-se o envolvimento da memória nessa articulação. Se a resolução de problemas é alicerce para a criatividade, então, na análise de Sterrnberg (2008) se uma pessoa diante da necessidade para solução de um problema puder recuperar rapidamente uma resposta imediata da memória então não se tem um problema a ser resolvido. Portanto, essa constatação representa dizer que para algo ser considerado criativo não poderá ser fruto de mera recorrência à memória. Mayers (1999) propõe uma definição ampla para resolução de problemas com ampla abrangência,

considerando atividades que vão desde o pensamento dirigido à resolução de problemas de matemática, de xadrez, para compor um poema, para a descoberta de um novo princípio científico ou até mesmo para resolver um dilema pessoal (p. 437). Assim, para Mayers, a resolução de problemas é um processamento cognitivo dirigido a transformar uma dada situação em uma situação de objetivo quando nenhum método de solução óbvia é disponível para o solucionador de problemas.

Na resolução de problemas há ainda um tópico que é relacionado à perícia, exortada por Eysenck e Keane (2007) como aspecto importante porque na visão destes autores há uma justaposição entre perícia e resolução de problemas devido ao fato de que especialistas são muito eficientes na resolução de muitos problemas em sua especialidade. A maior parte da pesquisa tradicional sobre resolução de problemas envolvia problemas que não requeriam treinamento ou conhecimento especial para sua solução. De modo contrastante, as pesquisas sobre a perícia têm tipicamente envolvido problemas que requerem muito mais conhecimento além do apresentado pelo próprio problema. Assim, o foco é maior nas diferenças individuais nos estudos sobre a perícia do que na pesquisa sobre resolução de problemas.

Um ponto também identificado como importante para Eysenck e Keane (2007) na pesquisa da perícia é identificar as principais diferenças (como exemplo, em relação ao

conhecimento) entre peritos e novatos. Além do que, tais autores identificam três aspectos importantes para a resolução de problemas:

1) é intencional (dirigida para objetivos),

2) envolve mais processos cognitivos do que automáticos,

3) um problema só existe quando alguém carece do conhecimento relevante para produzir uma solução imediata. Por isso, um problema para a maioria das pessoas (por exemplo, um cálculo matemático) pode não ser um problema para alguém com perícia relevante (por exemplo, um matemático profissional) (p. 416).

Diante do exposto, conclui-se que o problema é a essência axiomática da criatividade. Esta está intrinsecamente relacionada à resolução de um problema seguindo os aspectos da criação de um produto.