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2 ARQUIVOLOGIA, BIBLIOTECONOMIA, MUSEOLOGIA E CIÊNCIA DA

3.3 A trajetória do ensino da Museologia no Brasil

O primeiro curso de Museu foi criado em 1932, no Museu Histórico Nacional, com o objetivo de “... ser fonte de ensinamento e cultura, de devoção à história da Pátria e seminário de formação e aperfeiçoamento de funcionários técnicos”, segundo texto elaborado por Gustavo Barroso (Scheiner, 1994). A autora ressalta que:

O objetivo era formar conservadores de museus de História e de Belas Artes e não teóricos. No curso, estavam “... excluídos, a reflexão sobre museus de ciência e o estudo das coleções científicas não consideradas material arqueológico ou etnográfico”. O conteúdo do curso mostra a “concepção elitizada” de museu, no Brasil, da mesma forma em que o “saber museológico está orientado a determinados tipos de acervos: “arte, armaria, sigilografia, numismática, heráldica, indumentária, mobiliário, cerâmica, cristais, prataria, pintura, escultura, arte religiosa” e com estudos voltados para “Arquivologia, Arquitetura, História da Arte e História do Brasil.”

A trajetória de criação do curso inicia-se pelo Decreto nº 15.596, de 2 de agosto de 1922, que previa também a criação do Curso Technico com disciplinas que seriam distribuídas entre as instituições já existentes: Arquivo Nacional e Biblioteca Nacional, e o recém-criado Museu Histórico Nacional, este que é considerado a primeira instituição museológica voltada especificamente para a história da nação (SÁ, 2007).

79 O curso de Museu foi criado com dois anos de duração, previa, de acordo com o Decreto nº 21.129, de 7 de março de 1932, o ensino das seguintes disciplinas: no primeiro ano, História política e administrativa do Brasil (período colonial), Numismática (parte geral), História da arte (especialmente do Brasil), Arqueologia aplicada ao Brasil e, no segundo ano, História política e administrativa do Brasil, Numismática (brasileira) e Sigilografia, Epigrafia, Cronologia e Técnica de museus (BRASIL, 1932).

O curso era voltado para atender às necessidades do museu e quanto à formação de técnicos para à execução dos trabalhos de escrita ou outros a eles destinados, como a prestação de serviços na biblioteca e no arquivo de qualquer seção que o museu dele necessitar, em que auxiliariam os demais oficiais na colocação e conservação dos livros e documentos, na organização dos catálogos e na consulta pública.

Segundo Siqueira (2009), diferentemente do ensino da Biblioteconomia, que, desde seu surgimento sofreu influências externas mais marcantes de escolas estrangeiras, o desenvolvimento no ensino da Museologia teve, durante o funcionamento do Curso de Museus, um estilo próprio de seu idealizador, denominado estilo Barrosiano. Este estilo refere-se à forma de dirigir, ensinar e transmitir conhecimentos e conceitos, bem como as normas e técnicas empregadas e aplicadas. Tanus (2013) enfatiza que este estilo Barrosiano foi fortemente replicado por meio da disciplina idealizada e ministrada por Gustavo Barroso, denominada “Técnica de Museus”. Além disso, essa disciplina constitui até a atualidade a estrutura principal dos cursos de Museologia, na qual se engloba um vasto campo dos saberes como: museologia, museografia, museologia aplicada e conservação e restauro (SÁ, 2007). Assim, de modo geral, a figura de Barroso tornou-se indissociável da história do ensino da Museologia, tanto que ocorre iniciativas, ao longo dos anos 60, em prol de mudar o nome do Curso de Museus para Curso Gustavo Barroso, Instituto Gustavo Barroso e Escola Gustavo Barroso (SIQUEIRA, 2009).

80 Nos anos 1950 o Curso de Museus ganha status de curso universitário por meio de convênio firmado com a Universidade do Brasil, atual Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e em 1979 o curso foi transferido para a Federação das Escolas Federais Isoladas do Rio de Janeiro (FEFIERJ), atual Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). Assim, após essa transferência, o Curso de Museus teve sua denominação modificada para curso de Museologia, o qual desde 1991 vincula-se a Escola de Museologia da UNIRIO.

Ao longo das décadas de 1930, 1940 e 1950, há um considerável impulso na criação de museus, tendo o Curso de Museus do MHN, como o principal e único centro nacional de formação de conservadores. O fim dessa hegemonia do curso de museus do MHN termina com a criação do curso de graduação em Museologia da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Esse segundo curso de Museologia, único na região nordeste do país, fora instalado em 1970, por sugestão do arqueólogo e historiador de arte, Valentin Calderón, primeiro coordenador e idealizador do curso. Este curso busca se diferenciar do curso do MHN, cujo ensino possui um viés tecnicista pautando-se na aplicação de um conjunto técnicas, apresentando um conjunto de disciplinas de áreas como Sociologia, Antropologia, Filosofia e História, portanto, mais abertos a outras áreas. Acredita-se que essa abertura é facilitada ou mesmo incentivada pela proximidade com outras áreas, devido a sua vinculação universitária.

No final dos anos 1970 dá-se a criação do primeiro curso de pós-graduação lato sensu em Museologia em São Paulo configurando-se como o primeiro curso de pós- graduação na área, o que conduziu ao desenvolvimento de um pensamento museológico brasileiro e ao desenvolvimento conceitual da Museologia sob os alicerces da Sociologia, deslocando o objeto de estudo da Museologia, conhecido tradicionalmente como o museu, objetos e funções, para o fato museal ou fato museológico, e de uma Sociomuseologia.

81 O terceiro curso de Museologia, o primeiro da região sul, surge no ano de 2004, institucionalizado no Centro Universitário de Barriga Verde (UNIBAVE), em Santa Catarina. No entanto, nesse meio tempo, existiram outros cursos no intervalo do segundo para o terceiro curso de graduação, como o das Faculdades Integradas Estácio de Sá, hoje UNESA, além da vinculação do curso de Museologia de São Paulo à Escola da Sociologia e Política da USP, e a posterior implantação do curso de especialização.

Tanus (2013) percebe com essa trajetória, que, inicialmente, o ensino da Museologia está mais permeado por esforços individuais de seus idealizadores, cada qual em seu momento, como no Rio de Janeiro, com Gustavo Barroso; na Bahia, com Valentin Calderón; e em São Paulo, com Waldisa Rússio Guarnieri. Esses esforços foram decisivos para a criação e manutenção dos cursos, os quais sofreram uma menor influência externa e institucional (ao contrário do que ocorrera com os cursos de Biblioteconomia, que têm sua história marcada pelas influências francesa e norte- americana). Todavia, isso não significa que o ensino da Museologia encontrava-se alheio às influências de outros países, o que ocorreu foi uma diluição dessas influências, nas figuras de seus idealizadores, posto que todos eles possuíam conhecimento da área e do funcionamento de museus estrangeiros.

Atualmente, o cenário da Museologia comporta 14 cursos de graduação, além de programas de pós-graduação strictu sensu (Mestrado e Doutorado), tais como o programa implantado em 2006, Museologia e Patrimônio com parceria da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO) com o Museu de Astronomia e Ciências Afins (MAST); o mestrado em Museologia, criado em 2012, no estado de São Paulo, em parceria com quatro instituições; Museu de Arqueologia e Etnologia, Museu Paulista, Museu de Zoologia e Museu de Arte Contemporânea, e, mais recentemente, em 2013, foi aprovado outro curso de Mestrado em Museologia na Universidade Federal da Bahia (UFBA), primeiro na região nordeste do país.

82 Segundo Tanus (2013), a maioria dos cursos de Museologia, em funcionamento, está associada à implantação do REUNI, com exceção dos cursos da UNIRIO, criado na década de 1930, o da UFBA, criado da década 1970, e os cursos UNIBAVE, UPEL e UFRB, criados antes de 2007. O crescimento exponencial dos cursos de Museologia possibilitou a sua distribuição nas cinco regiões brasileiras, sendo quase todos os cursos públicos, com exceção de um único curso (UNIBAVE). Quanto à distribuição dos cursos de Museologia nas regiões, as regiões sul e nordeste concentram as maiores porcentagens, 29%, o que resulta em quatro cursos em cada uma dessas regiões. Na região sudeste encontram-se três cursos, 21%, no centro-oeste dois cursos, 14%, e, no norte um curso, o que equivale a 7%.

Diferentemente da Arquivologia e da Biblioteconomia, a Museologia não mantém a mesma força na relação institucional com Ciência da Informação. Os únicos cursos localizados nas escolas ou faculdades de Ciência da Informação, são na UnB, UFMG e UFRGS (Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação) os demais cursos de Museologia estão dispersos em diferentes espaços, relacionando-se ora mais com a História, ora com a Antropologia, ora com as Artes. Tanus (2013) destaca que em relação à proximidade dos cursos de Museologia com os de Arquivologia e Biblioteconomia, sabe-se que ela pode ser encontrada em sete instituições de ensino superior, a saber: UFRGS, UFPA, UNIRIO, UFSC, UFBA, UnB e UFMG. Nestas últimas quatro universidades encontram-se, ainda, os programas de pós- graduação em Ciência da Informação, os quais podem abrigar pesquisas no nível do mestrado e/ou doutorado referentes ao campo museológico. O quadro abaixo demonstra os vínculos institucionais dos cursos de Museologia no Brasil:

Quadro 4: Vínculos institucionais dos cursos de Museologia no Brasil

Universida

de Departamento Faculdade/Instituto/Centro

UNIRIO Escola de Museologia

Centro de Ciências Humanas e Sociais

UFRB Centro de Artes Humanidades e Letras

UFG Faculdade de Ciências Sociais

UnB Faculdade de Ciência da Informação

UFOP Museologia

83 UFRGS - Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação

UFPA Faculdade de Artes Visuais

UFPE Antropologia e

Museologia Faculdade de Filosofia e Ciências

UFPEL - Instituto de Ciências Humanas

UFMG - Escola de Ciência da Informação

UFS Museologia

UFSC Antropologia e História UNIBAVE-

SC Museologia

Fonte: Araújo, Marques e Vanz (2011)

O processo de institucionalização das áreas de Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia no Brasil demonstra que as primeiras iniciativas do ensino dessas áreas partem do desejo do suprimento de uma necessidade endógena, dos interesses e demandas institucionais do Arquivo, Biblioteca e Museu Histórico Nacional no início do século XX. Isso revela a primeira preocupação em torno da cooperação da formação dos profissionais de arquivo, biblioteca e museu. A medida que as áreas de Arquivologia, Biblioteconomia e Museologia se desenvolveram do ponto de vista institucional, com a criação de novos cursos e a regulamentação enquanto profissões percebe-se o distanciamento entre as áreas no que tange ao processo formativo com raros momentos de tentativa de harmonização. A Biblioteconomia por incorporar, como destaca (Souza) a missão da Federação Internacional de Documentação voltada para a Documentação e a Ciência da Informação de interesse mais cientifico e técnico possui uma relação mais próxima com essas duas áreas em seu modelo formativo. Já a Arquivologia e principalmente, a Museologia possuem modelos formativos que pouco se aproximam com a Ciência da Informação e com a Biblioteconomia, demonstrando certo isolamento entre as áreas no que tange a formação profissional.

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