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A transição entre o pensar tradicional e o pensar crítico

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CAPÍTULO 3 MODO(S) DE PENSAR JURÍDICO EM CONCLUINTES DO CURSO

3.3. APREENSÃO DO MODO DE PENSAR E AGIR DO BACHAREL EM DIREITO

3.3.3 A transição entre o pensar tradicional e o pensar crítico

Estudantes concluintes da IES pesquisada acabaram demonstrando nas entrevistas um modo de pensar onde prevalece sim o tradicionalismo do Direito, mas nas suas falas aparecem traços do pensar crítico. Possivelmente o contato com uma matéria crítica como Antropologia Jurídica no final do curso os tenha feito refletir (mesmo que tardiamente) sobre sua postura como agente social. Pegue-se por exemplo (com grifos nossos):

Direito pra mim, hoje, acho que é uma ciência. Não é a parte técnica, que tem sido abandonada, por um intercâmbio de teorias. É uma ciência de transformação social. Tomando por paralelo a medicina, por exemplo, você intervém diretamente na vida de uma pessoa, e o direito também tem esse papel. Trabalha com a vida das pessoas de uma maneira muito mais imediata, próxima, mais do que algumas outras ciências. Isso porque como profissional do direito, você tem a vida de uma pessoa nas suas mãos, muitas vezes. Então acredito que direito seja uma ciência encarada com

responsabilidade, e compromissos éticos. (A1, entrevista 2010)

Na fala do estudante, está explícito o conceito tradicional de Direito, mas ao mencionar a responsabilidade e os compromissos éticos, parece transitar entre os dois principais modos de pensar levantados na pesquisa. Transparece uma formação positivista, mas com elementos de caráter crítico do Direito(mesmo que embrionário).

Quando perguntado sobre a finalidade do curso, respondeu, com grifos nossos:

Hoje o curso de direito, por entender que é uma ciência, deve ensinar a pensar como cientista. Acho que a faculdade peca muitas vezes por forçar aspectos técnicos, porque a universidade, principalmente particular, vem pra atender necessidades do mercado. Ela aparece depois do mercado, ela não aparece antes dele, e aparece pra

atender essa expectativa. Então acaba que ela se torna um centro de técnicas, de pragmatismos, mas não ensina o estudante a pensar, não. Então,creio que a

finalidade do curso de direito hoje é seu grande erro, pois forma só operadores, sem ensinar a pensar ou a pesquisar. Às vezes a pessoa não entende o que vê na

sala, porque não tem sua base bem formada, sobre o que está aprendendo, pra que vai usar, não estabelece relações com outras áreas. (A1, entrevista 2010)

Percebeu-se a postura tradicional, com preocupação crítica também na fala:

Em IED, o que mais me marcou foi o jus naturalismo e o jus positivismo. Esse, com o passar do tempo, o Estado foi fazendo com que nós fôssemos renegando nossos instintos naturais através da norma. Eu creio que o jus naturalismo não pode perder esse toque, e vice-versa. São institutos distintos, mas devem andar juntos. A sensatez se faz na união dos dois institutos. Alei muito seca, faz com que se perca as origens. (A4, entrevista 2010)

Até mesmo entre os professores, pode-se dizer que existe uma visão entre a tradicional, num primeiro momento, e a visão criticista num segundo. É o que se pode pensar refletindo sobre o trecho abaixo:

Tem que ser estudado como “real, ativo”. Instrumento ativo de organização e manutenção da ordem, de regulação de condutas. Mas pra mim, Direito tem que ser estudado como fato/valor/norma. O aluno Precisa aprender dentro da faculdade que existem leis, que essas regulam condutas, e que essas condutas regulam valores. (P2, entrevista 2010)

O reflexo nas habilidades e competências adquiridas também exacerba uma visão interfacial. O principal elemento perceptível é o vacilo entre a postura tradicional que aparece no início das falas, e após certa digressão, o questionamento ou a ponderação entre a lei e o justo. Pegue-se, por exemplo, as falas, com grifos nossos:

No meu caso, foi a questão da visão de Justiça, e da aplicação da lei. A possibilidade de se seguir princípios, e aprender a se colocar no lugar do próximo. Em estágio, quando você contesta ou inicial uma ação, você se coloca do outro lado. Você imagina como o outro vai se defender, presumindo como ele irá contestar, e vice-versa. Isso te dá uma visão maior de Justiça. Porque as vezes o

desconhecimento da norma e da lei te deixa imaturo e ignorante, e a visão de justiça se perde, porque nem sempre o que é direito é justo. Então você tem que

aprender a se colocar no pólo adversário. Foi o que aprendi.

O critério de justiça quando eu vejo na lei, as duas partes, quais são os direitos de cada um. Pondero na balança, quem mais ta próximo da lei e dos requisitos

legais. A parte da í, passo pra questão das circunstâncias. Me vem muito à

uma necessidade de frente a uma possibilidade. Quais são? Essa balança, coloca a

relação em desequilíbrio? Não se analisa só a lei, mas a possibilidade da outra parte. Eu acho que aprendi melhor pra solucionar conflito, a reflexão. (A4,

entrevistas 2010)

Fora do processo, percebi que as partes não podem esperar pra ter o direito satisfeito. Não agüentam o fenômeno da judicialização dos problemas. É tudo dano moral, agora! Briga de vizinho etc.... Namorada. Vou te processar! Percebi que esse

comportamento aliado ao pensamento de Capeletti do Amplo Acesso à Justiça e aquela coisa toda, acabaram pro facilitar essa postura judicial. A pessoa tem facilidade de entrar e agora é difícil de sair! Nesse raciocínio, a gente já pode usar a arbitragem, conciliação, mediação.... tenho essa noção teórica. Hoje eu usei mais processo e conciliação do núcleo de práticas. Repito: será que sei trabalhar com isso?... será que eu perdi dinheiro sem entrar na justiça? (A2,

entrevistas 2010)

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