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4 DA POSSIBILIDADE DE UMA TRIBUTAÇÃO IDEAL PARA A

4.4 A extrafiscalidade e suas implicações

4.4.1 A tributação ambiental

Uma vez feitas as considerações sobre a extrafiscalidade, chega-se à conclusão de que o Estado pode utilizar os tributos como instrumentos de regulação que lhe permita intervir na direção da atividade econômica com o intuito de alcançar determinadas finalidades almejadas pela sociedade.

Atualmente, tendo em vista a crescente preocupação com a proteção ambiental e, consequentemente, com a própria proteção da dignidade humana,349 tem-se discutido acerca

347 BUFFON; MATOS, op. cit., p. 192. Sobre o tema, assevera também Carrazza: “Os tributos, no mais das

vezes, são instituídos com o fito de prover de dinheiro os cofres públicos, para que o Estado tenha os meios necessários à consecução dos fins que lhe são assinalados pela Constituição e pelas leis. A tributação, pois, quase sempre se desenvolve com finalidades arrecadatórias (fiscais). Não raro, porém, a tributação é utilizada para estimular ou desestimular condutas havidas, respectivamente, por convenientes ou nocivas ao interesse público. Este fenômeno há nome ‘extrafiscalidade’. Extrafiscalidade é, portanto, o emprego dos meios tributários para fins não-fiscais, mas ordinatórios, isto é, para disciplinar comportamentos de virtuais contribuintes, induzindo-os a fazer ou a deixar de fazer alguma coisa. A fazer, bem entendido, o que atende ao interesse público; a não fazer o que, mesmo sem tipificar um ilícito, não é útil ao progresso do País” (CARRAZZA, op. cit., 2009, p. 457).

348 CARVALHO, op. cit., 2013, p. 159.

349 Não é à toa que o Papa Francisco, na sua Carta Encíclica Laudato Si’, assevera: “O ambiente humano e o

ambiente natural degradam-se em conjunto; e não podemos enfrentar adequadamente a degradação ambiental, se não prestarmos atenção as causas que têm a ver com a degradação humana e social. De fato, a deterioração do meio ambiente e a da sociedade afetam de modo especial os mais frágeis do planeta: ‘Tanto a experiência comum da vida cotidiana como a investigação científica demonstram que os efeitos mais graves de todas as agressões ambientais recaem sobre as pessoas mais pobres’. Por exemplo, o esgotamento das reservas ictícias

da utilização da extrafiscalidade como um instrumento de concretização do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, de que cuida o artigo 225, da Constituição Federal, tema que uma proposta de tributação ideal não pode deixar de, ao menos, mencionar.

Germana Belchior assevera que o Estado tem obrigação constitucional de adotar medidas (legislativas e administrativas) de tutela ambiental que busquem efetivar o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. O constituinte incumbiu o Estado como principal (e não único) devedor de proteção ambiental, estipulando obrigações e responsabilidades positivas e negativas, que vinculam não apenas todos os entes federados no exercício de suas funções administrativas e legislativas, mas também o constituinte derivado, na medida em que o meio ambiente está no rol (embora não expresso) das cláusulas pétreas.350

Nessa esteira, surgem, então, os denominados tributos ambientais, que, segundo Carlos Peralta, “quando bem desenhados, são instrumentos que podem harmonizar os interesses econômicos e os objetivos ambientais com maior eficiência e eficácia, permitindo a internalização dos custos socioambientais de origem antrópica”.351 Sobre tributos ambientais, afirma Germana Belchior:

Os chamados tributos ambientais são institutos regidos pelo Direito Tributário, derivados do poder de tributar do Estado. Têm um sentido estrito e outro latu, conforme incidam em face da utilização direta do meio ambiente, ou em virtude de atos ou situações apenas indiretamente a ele conexos. Assim, em sentido estrito, tributo ambiental significa um tributo novo cobrado em razão do uso do meio ambiente pelos agentes econômicos, ou seja, seu fato gerador é uma situação que represente uma degradação ambiental em função do desempenho de uma atividade econômica lícita. Já em sentido amplo, tributo ambiental é um tributo tradicional ou ordinário adaptado para servir aos esforços da proteção ambiental.

Ao considerar a natureza jurídica tributária, verifica-se que os tributos ambientais em sentido estrito só poderiam ser impostos, haja vista que, apesar de as taxas e contribuições de melhoria poder ser graduáveis de acordo com critérios ambientais, seus fatos geradores não são o ato de poluir.

prejudica especialmente as pessoas que vivem da pesca artesanal e não possuem qualquer maneira de substituí- la, a poluição da água afeta particularmente os mais pobres que não têm possibilidades de comprar água engarrafada, e a elevação do mar afeta principalmente as populações costeiras mais pobres que não têm para onde se transferir. O impacto dos desequilíbrios atuais manifesta-se também na morte prematura de muitos pobres, nos conflitos gerados pela falta de recursos e em muitos outros problemas que não têm espaço suficiente nas agendas mundiais” (PAPA FRANCISCO. Carta Encíclica Laudato Si’. São Paulo: Paulinas, 2015, p. 38). 350 BELCHIOR, Germana Parente Neiva. Os incentivos fiscais como instrumento econômico da Política

Nacional de Resíduos Sólidos. In: 19o Congresso Brasileiro de Direito Ambiental, 2014, São Paulo. Saúde ambiental: política nacional de saneamento básico e resíduos sólidos [recurso eletrônico] / 19. Congresso Brasileiro de Direito Ambiental. São Paulo: Instituto O Direito por um Planeta Verde, 2014. v. 1, p. 96.

351 MONTERO, Carlos Eduardo Peralta. Tributação ambiental: reflexões sobre a introdução da variável

Não obstante muitos países adotarem impostos ambientais, visualiza-se com frequência a utilização do tributo tradicional, sobretudo o imposto, com uma roupagem especial (função extrafiscal), buscando a defesa do meio ambiente.352

Percebe-se, portanto, que é possível a utilização de tributos ambientais para assegurar o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, por meio da extrafiscalidade, com a adoção de alíquotas seletivas, conforme o grau de adequação da atividade, produtos ou serviços com o objetivo constitucional de assegurar a todos um meio ambiente ecologicamente equilibrado, conforme preceitua Marciano Buffon.353

A exemplo disso, o Estado do Ceará concede uma redução de base de cálculo de 58,82% para produtos resultantes de reciclagem de plástico, papel, papelão, resíduos sólidos da construção civil e outros materiais recicláveis, desde que possuam a Certificação do Selo Verde emitida pela Superintendência Estadual do Meio Ambiente (SEMACE) e contenham, na sua composição, no mínimo, o percentual de insumos reutilizados definidos em Ato conjunto do Secretário da Fazenda, Secretário do Meio Ambiente e Superintendente Estadual do Meio Ambiente, conforme dispõe o art. 41, I, alínea “z-1”, do Decreto nº 24.569/1997.

Dessa forma, faz-se imperioso que a tributação seja adequadamente utilizada, tendo em vista o momento dramático em que se vive, no qual se constata que o modo de vida ora adotado pode inviabilizar a própria convivência humana num tempo bem mais curto do que se esperava.

352 BELCHIOR, op. cit., 2014, p. 103. 353 BUFFON, op. cit., p. 250.