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ABORDAGEM COGNITIVA E NECESSIDADES DOS USUÁRIOS: RELAÇÃO BIBLIOTECÁRIO / USUÁRIO

5 BIBLIOTECA UNIVERSITÁRIA E DEFICIÊNCIA

5.2 ABORDAGEM COGNITIVA E NECESSIDADES DOS USUÁRIOS: RELAÇÃO BIBLIOTECÁRIO / USUÁRIO

É na década de 1980 que os estudos voltados para as necessidades e uso da informação se aperfeiçoam, segundo Silva (2012), não apenas numa perspectiva quantitativa, mas também qualitativa e cognitiva. Dessa forma, o conhecimento sobre o pensar do usuário e de como ele se apropria do conhecimento, passa a ser valorizado. Ocorre, assim, uma aproximação da Ciência da Informação com as Ciências Cognitivas.

Segundo Rozados (2003), essa aproximação começa com teóricos anglo- saxões: Bertram C. Brookes, fundador da abordagem cognitivista, seguido por Nicolas Belkin, que apresenta essa abordagem como única capaz de resolver as questões informacionais, e Peter Ingwersen, que segue uma linha semelhante. A autora menciona também a americana Brenda Dervin e sua teoria do sense-making, que propõe tratar a necessidade de informação com foco na relevância (no que produz sentido). T. D. Wilson relaciona as necessidades de informação ou comportamento informacional às exigências da pessoa no trabalho, na vida social e política e sugere que as barreiras que impedem a busca de informações surgirão a partir do mesmo conjunto de contextos. Outro pesquisador, D. Ellis, procurou identificar características comuns de comportamento informacional de pesquisadores nas Ciências Sociais, em seguida, nas Ciências Físicas e, também, na Engenharia (WILSON, 2000).

De acordo com Rozados (2003, p. 87), “As Ciências Cognitivas preocupam-se em entender a forma como se dá a apropriação do conhecimento pelos indivíduos.” Para explicar o fenômeno cognitivo, ela se apropria da teoria da significação. Segundo essa teoria, o novo conhecimento nunca é internalizado literalmente, devido ao componente idiossincrático da significação. Portanto, a estrutura cognitiva se reestrutura constantemente durante a aprendizagem significativa e as estruturas de conhecimento de um indivíduo vão sendo permanentemente alteradas. Rozados continua:

A abordagem cognitiva na Ciência da Informação percebe e busca trabalhar com essa constante reestruturação do conhecimento individual do usuário, especialmente na busca da satisfação de suas necessidades de informação. (ROZADOS, 2003, p.87).

Assim, de acordo com essa abordagem, o conceito de “necessidades de informação” se constitui em um dos aspectos mais importantes, e segundo Silva (2012), as necessidades de informação estão relacionadas ao pensamento e construção dos sentidos, que envolvem aspectos quantitativos/objetivos, qualitativos/subjetivos e interacionistas/sociais, o que denota uma mudança no paradigma:

[...] o usuário não deve ser visto apenas como ponto central/cognitivista, mas como ponto central no âmbito das interações que conduzem ao paradigma social que contempla uma perspectiva de trazer unidade aos contextos do pensamento e da construção de sentidos. (SILVA, 2012, p. 105).

Silva (2012, p. 108) observa também que a necessidade de informação não é um fenômeno isolado, “[...] mas um procedimento com fundamentos finalísticos.” O autor considera, acertadamente, que a satisfação do usuário é um desses principais fundamentos.

Os estudos sobre a satisfação do usuário surgem por volta da década de 1940, mas se destacam no âmbito da Ciência da Informação a partir da década de 1970, na Inglaterra e Estados Unidos. Para Silva,

[...] os estudos de satisfação surgiram da insatisfação da sociedade com serviços e produtos, o que deliberou a necessidade de estudos que vislumbrassem a possibilidade de fortalecer a tríade avaliação-qualidade- satisfação. (SILVA, 2012, p.110).

Assim, percebe-se que essa nítida ligação de complemento entre necessidade de informação e satisfação dos usuários está diretamente relacionada ao uso da informação.

Para Le Coadic (1996), o uso da informação é o produto final de um ciclo que se inicia com a necessidade da informação, conforme a Figura 19.

Figura 20 – Usos e necessidades de informação

De acordo com Le Coadic (1996, p. 39), portanto, necessidades e usos são interdependentes, “[...] se influenciam de uma maneira complexa que determinará o comportamento do usuário e suas práticas.”

Assim, muitos autores têm tentado chegar a uma definição sobre o termo “necessidade de informação”, todavia, trata-se de um tema bastante complexo e subjetivo, o que dificulta alcançar uma definição satisfatória. Bettiol (1990) afirma que as dificuldades na aplicação das descobertas no campo ocorrem frequentemente em decorrência da falta de uma teoria única, padronizada. “Necessidades”, “Demandas” e “Desejos”, por exemplo, são termos distintos, mas usados frequentemente de forma semelhante, demonstrando o caráter volátil do termo, o que impossibilita uma conceituação mais precisa e uniforme.

Segundo Araújo (2009), os estudos de usuários se desenvolveram, sendo os primeiros estudos, considerados “estudos funcionalistas” que objetivavam conhecer as características de cada população, visando oferecer informações mais adequadas a elas. Em seguida esses estudos se voltaram para a avaliação dos sistemas de informação e nas décadas de 1940 e 1950 o foco se voltou para a comunicação científica. Até meados de 1970 os estudos se preocupavam com o uso do sistema e não com o comportamento dos usuários (WILSON, 2000). Somente no final da década de 1970 é que passaram a adotar abordagens voltadas para o usuário da informação. Essa teoria dá ênfase às percepções dos usuários em relação à sua própria carência de conhecimento e, dessa forma, “[...] a informação passa a ser vista como algo na perspectiva de um sujeito.” (ARAÚJO, 2009, p. 200). Assim, não se valoriza mais apenas o autor e o texto, mas a inserção do receptor, o usuário no processo.

Em artigo precursor da abordagem cognitiva na Ciência da Informação, Belkin e Robertson (1976) apoiam essa perspectiva do sujeito ao afirmarem que a informação é o que é capaz de mudar ou transformar estruturas mentais do ser humano. Para Belkin (1980), o conhecimento que cada pessoa tem sobre um determinado assunto, ou o seu saber pessoal, varia de pessoa para pessoa, ou seja, cada pessoa se encontra em um estágio de conhecimento sobre determinado assunto. Quando se constata que existe uma anomalia ou deficiência nesse sentido, diz-se que o indivíduo se encontra num estado anômalo de conhecimento. Na tentativa de corrigir essa deficiência ou anomalia, busca-se obter a informação de

forma a alcançar um novo estado de conhecimento. Assim se constitui o acesso e uso da informação.

Wersin e Neveling (1975) vêm a necessidade de transferência de conhecimento para aqueles que dele necessitam como uma responsabilidade social, contudo, se referem a essa ligação da informação ao conhecimento como uma abordagem perigosa, tendo em vista que o termo “conhecimento” pode assumir sentidos variados. Na análise desses autores sobre a definição da informação, outras abordagens são consideradas: a estrutural (para a matéria), a da mensagem (baseada na teoria matemática), a do significado (orientada para a mensagem), a do efeito (orientada para o receptor), e a do processo (a informação é o próprio processo que ocorre na mente humana).

Segundo Ribeiro (2010, p. 64), a prática profissional de bibliotecários, arquivistas e documentalistas, historicamente tem se associado à ideia de “[...] disponibilizar a documentação a quem dela precisa.” Para a autora, essa ideia evoluiu a ponto de se tornar crucial na atuação de profissionais com a função de mediadores da informação. Para Ribeiro (2010, p. 66), o chamado paradigma custodial, patrimonialista e historicista, consolidado em meados do século XIX, começou a adquirir uma característica mais tecnicista por volta da virada do século XX, favorecendo “[...] o surgimento de uma mediação menos passiva e mais direccionada para os interesses dos utilizadores.” A atitude passiva e reativa em relação ao acesso a informação começa a mudar após a Segunda Guerra Mundial, quando ocorre também uma “explosão da informação”, profundamente impactante para a área de informação técnico-científica. A partir dos anos 1970, se delineia uma transição paradigmática, na qual “[...] a importância do utilizador passa a ser uma questão essencial para os serviços de informação.” (RIBEIRO, 2010, p. 66).

Assim, percebe-se a necessidade da prática de uma mediação voltada para o usuário, que valorize a leitura como meio de apropriação da informação e sua transformação em conhecimento.