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5.2 TÉCNICAS PARA COLETA DE DADOS

5.2.1 Abordagem qualitativa

A metodologia qualitativa permitiu a construção de um conjunto de informações que complementaram e, ao mesmo tempo, problematizaram as obtidas por meio da pesquisa exploratória nos dados secundários. A pesquisa qualitativa deriva do entendimento de que as questões propostas expressam pontos de vistas individuais e coletivos, de uma realidade dialeticamente complexa, que não pode ser analisada somente de modo quantificado.

Com essa abordagem procuramos compreender a realidade social como construção, no tempo e no espaço, e reconstrução na memória, que acrescenta significados. Ao mesmo tempo, essa perspectiva metodológica promoveu a valorização da processualidade e da reflexão sobre a própria realidade, reelaborada pelos sujeitos; reconhecendo que a história é construída sob determinadas condições que não são controladas pelos sujeitos coletivos, mas que sofrem intreferência da práxis humana.

Na abordagem qualitativa predomina a comunicabilidade entre os sujeitos acerca da realidade social, há um conflito de percepções do real que se alinham ou não durante o processo de pesquisa. Assim, ao compreendermos a realidade social como resultado de uma complexa relação dialética entre os mais diversos sujeitos sociais, temos que ela só pode ser abarcada a partir dos significados que estes atribuem a essas mesmas relações e seus desdobramentos. Na medida em que captamos os significados dessas relações aos olhos dos sujeitos é que entendemos as relações do Conselho Tutelar com os demais integrantes da rede de proteção.

Uma ampla série de subcategorias, quando cruzadas entre si, suscitam questionamentos de diversas ordens, fundamentais, por exemplo, para a superação de alguns preconceitos e, por vezes, análises equivocadas. É o caso da relação que, em geral, se atribui ao espaço da rua como sendo determinante na conduta criminosa de uma criança ou adolescente, sobretudo quando se tratam das ruas das periferias da cidade (SPOSITO, 1994; ZALUAR, 1994). Ou ai da,à ueàaà fa íliaàdesest utu ada àse iaàaào ige àdaài o alidadeàeàdaà

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p opagaç oàdosà í iosà ueàu aà so iedadeàhigie izada àgosta iaàdeàsa ea .à TEIXEI‘á,à ;à LONDOÑO, 1995; CORRÊA, 1997). Ou mesmo, de que as situações de abuso sexual se justificam na medida em que a própria criança é que exibe sua sexualidade aos adultos do sexo masculino, membros do grupo familiar ou não, ou seja, a criança e o adolescente se tornam responsáveis – e culpadas – pelo abuso que sofreram. E ainda, de que as situações de exploração sexual se devam, exclusivamente, à negligência e ao abandono da criança e doàadoles e teàpelaà fa íliaàdesest utu ada .à FE‘‘IáNI;àGá‘BIN;à‘IBEI‘O,à

A isso também se associam as ações de policiamento ostensivo e repressão, criando a atmosfera social da reprodução da marginalidade em alguns espaços da cidade. Estes preconceitos e suas respectivas ações reforçam o caráter excludente do viver na cidade para as crianças e adolescentes de áreas socialmente vulneráveis, como aponta pesquisa produzida com o auxílio do geoprocessamento, elaborada pelo Programa de Ações Integradas e Referenciais de Enfrentamento à Violência Infanto-Juvenil (PAIR) no Estado de Minas Gerais. (IWAMOTO; MIRANZI, 2008).

As entrevistas revelaram, assim, o conflito latente ou explícito existente nas relações sociais em que estão imersos os sujeitos entrevistados. Assim, entendemos que os conselheiros tutelares são produto das contradições das relações estabelecidas, por exemplo, no campo político, e que seus discursos acerca do desempenho das atividades do Co selhoà eflete à ouà ef ata à osà o flitosà eà asà o t adiç esà p p iasà doà siste aà deà do i aç o .à O mesmo pode ser dito em relação aos demais sujeitos do setor saúde, p oteç oàso ialàeàoà te ei oàseto .à(MINAYO, 2000, p.110).

A abordagem qualitativa permite o questionamento constante das verdades arraigadas no senso comum e recai sobre o cotidiano das relações sociais, seja no interior dos grupos familiares, seja na relação entre as instituições componentes da rede de proteção, defesa e promoção de direitos, seja na relação destas com o poder público.

Segundo Lang (1999), o depoimento oral, obtido como entrevista semi-estruturada, é uma boa estratégia para pesquisas qualitativas cuja intenção é obter informações com o intuito de complementar e/ou ampliar a pesquisa. Uma pesquisa cujos métodos são estritamente quantitativos requer o depoimento oral – ou de outras fontes – para permitir a abrangência da complexidade inerente aos fenômenos sociais. Entendemos os depoimentos orais dos sujeitos – ou dos documentos por eles produzidos – em sua dimensão histórico- dialética e o momento de encontro entre pesquisador-pesquisado como de interação.

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O depoimento oral é obtido em uma entrevista direcionada para um determinado tema. É um tipo específico de documento, construído pelo pesquisador. Em sua construção há uma interação entre o pesquisador e o entrevistado. Diferentemente do documento escrito, o questionamento é possível durante a elaboração do depoimento. E o pesquisador escolhe quem irá entrevistar, podendo fazer uma amostragem, conforme o caso. (LANG, 1999, p.68)

As entrevistas semi-estruturadas com os integrantes do Conselho Tutelar (cinco conselheiros tutelares, uma recepcionista, uma assistente social e uma psicóloga) forneceram as percepções acerca do cotidiano do Conselho e suas relações com as demais organizações locais. (LAVILLE; DIONNE, 1999).

Nas entrevistas, tanto com os conselheiros e os funcionários do Conselho quanto com os trabalhadores do setor saúde e da assistência social, obtvemos dados primários acerca de relações de complementaridade ou de competição no interior da rede de proteção que, objetivadas pela exposição oral, adquirem sons, símbolos, metáforas, sensações, experiências particulares de cada sujeito.

Abarcamos essa realidade subjetiva na medida em que construímos u aà elaç oà so ialàdeàpes uisa à o àosà o selhei osà tutelares desde 2007, o que favoreceu o processo de pesquisa ao frequentarmos oàespaçoàdoàCo selhoàTutela .àáà ele iaàdessaà elaç o à reside em permitir uma maior aproximação com os sujeitos da pesquisa, colocando-os numa posição confortável e com menor resistência ao processo de entrevista e de consulta às fontes secundárias. (CARIA, 1999; PEREIRA DE QUEIROZ, 1999; 1991).

Como dito anteriormente, durante a entrevista, entrevistador/entrevistado estão em situação de interação, na qual podem emergir as relações de poder inerentes à sociedade capitalista. Se essa relação se reproduz no momento da entrevista, assistimos o indivíduo se converter em objeto de estudo, logo, se coloca imóvel, submisso e passivo ante os pressupostos teóricos e aos métodos do entrevistador.

Por outro lado, como assevera Caria (1999), a situação de interação requer do entrevistador muito mais que a mera objetividade empírico-positivista. Na relação com os informantes nem sempre se apresentam todos os elementos que o pesquisador julgara relevantes para os objetivos da pesquisa.

Aqui se colocam os desafios da situação de entrevista. Ainda que as questões ou temas estivessem previamente estruturados, não havia garantias de que o entrevistado

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relataria todas as informações e exteriorizaria somente aquilo que seria conveniente, ou seja, não se exporia nem se fragilizaria com o grupo. (MINAYO, 2000, p.117).

A relevância da entrevista com os profissionais da rede assistência social e de saúde em Uberaba residiu na obtenção de dados que não estão registrados nas fontes secundárias: sensações, sentimentos, avaliações pessoais sobre o trabalho realizado, políticas públicas municipais, relações com Conselho Tutelar dentre outros. Assim, os métodos qualitativos procuram captar a maneira de ser do sujeito pesquisado, isto é, tudo o que o diferencia dos demais, aquilo que o identifica singular e coletivamente. (PEREIRA DE QUEIROZ, 1999).

A pesquisa qualitativa permite, pois a incursão num universo de subjetividades que requer uma análise objetiva, assim, cabe ao pesquisador o desenvolvimento de uma atitude analítica equilibrada ante as informações fornecidas pelos sujeitos.

A qualidade, composta pelos aspectos sensíveis de uma coisa ou de um fenômeno naquilo que a percepção pode captar, constitui assim o que é fundamental em qualquer estudo ou pesquisa, pois é o ponto de partida para qualquer um deles. Todo cientista, ao determinar o tema de sua pesquisa se encontra inserido num universo físico, social e intelectual que a delimita; é também por meio da percepção do que neste universo existe que formula o que pretende investigar. Nesta fase primordial domina o diferenciável, isto é, aquilo que é plenamente qualitativo, e não a uniformidade quantificável. (PEREIRA DE QUEIROZ, 1999, p.15)

Por essa afirmação de Maria Isaura Pereira de Queiroz (1999) podemos compreender que a qualificação – qualidade – das informações obtidas junto aos sujeitos pesquisados por meio da entrevista semi-estruturada demonstra a complexidade do otidia oàdoà se à o selhei o ,à deàse àdaà ede eàdoà faze à ale àosàdi eitos de crianças e a adolescentes, por exemplo. Cada dimensão está dialeticamente imbricada na outra.

Pelo exposto, a situação de interação potencializada pela entrevista semi- estruturada permitiu u aà des iç oà doà asoài di idual ,à ouàseja,à oàpes uisado àp o u ou apreender os significados subjetivos das objetividades das relações cotidianas que o mesmo estabelecia com os demais sujeitos, individuais ou coletivos. Ao mesmo tempo, essa estratégia permitiu aà o pa a ilidadeà deà di e sosà asos à ue,à oà p ese teà estudo,à seà apresentou nas diversas formas de recepção das demandas do Conselho Tutelar na cidade e seu posterior encaminhamento aos integrantes da rede de proteção. (MINAYO, 2000, p.122)

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