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2 OS ESTUDOS SOBRE A NEGAÇÃO VERBAL NO PORTUGUÊS

2.9 A ABORDAGEM DA SINTAXE FORMAL

Primeiramente, é preciso esclarecer que esta seção não tem o objetivo de discorrer o histórico dos estudos sobre a negação verbal no PB no âmbito da Gramática Gerativa. Há várias propostas na literatura que propõem o locus da negação na estrutura da sentença no PB, bem como a derivação das sentenças negativas. A proposta de Hansen (2010) pareceu didática e adequada ao propósito da discussão sobre a sintaxe das sentenças negativas abordadas neste trabalho, qual seja uma breve exposição dos estudos de sintaxe formal sobre tais sentenças.

A Gramática Gerativa é uma teoria que vem se desenvolvendo ao longo de mais de meio século. Para um histórico da teoria e para uma melhor compreensão do que será explicado nesta seção, sugerimos a leitura do texto de Lasnik & Lohndal (2013). Após várias décadas de pesquisa, a partir da década de 1990 a teoria ruma a uma simplificação das representações com vistas à busca de uma adequação explanatória do funcionamento da Faculdade de Linguagem (FL). Apenas níveis de representação conceptualmente necessários são mantidos. Dessa forma, as estruturas profunda e superficial são eliminadas do modelo computacional da FL. A FL mantém uma interface direta com níveis cognitivos mais amplos, como o sistema Articulatório- Perceptual (A-P) e o sistema Conceitual-Intencional (C-I). A Forma Fonética (PF) é o nível representacional da interface entre a FL e o sistema A-P e a Forma Lógica (LF) é o nível representacional da interface entre a FL e o sistema C-I. A PF é a responsável pelo som/pronúncia da sentença e a LF é a responsável pela interpretação da sentença. Isso decorre do fato de que as sentenças são emparelhamentos de som e significado. Além dessa consideração, há ainda outros quatro importantes pressupostos sobre as sentenças. Conforme aponta Boeckx (2006, p. 73), elas:

(i) são unidades linguísticas básicas; (ii) são potencialmente infinitas;

(iii) são compostas de sintagmas hierarquicamente organizados;

(iv) exibem a propriedade de deslocamento, no sentido de alguns elementos serem interpretados numa posição diferente daquela em que foram pronunciados.

Tendo em vista essas considerações, o modelo de Gramática da abordagem minimalista é apresentado abaixo, segundo Davies & Dubisnky (2008, p. 287):

Lexicon (numeration)

Computational Principles PF representation Spell-Out system (e.g. Greed, (interpreted at the (Select, Merge, Procrastinate, articulatory-perceptual Copy, Check) Shortest Move) interface)

LF representation (interpreted at the conceptual-intentional interface)

Elementos lexicais são coletados a partir do processo de Numeração, passam por processos do sistema Computacional, como Selecionar, Juntar, Copiar e Checagem de traços, obedecendo a princípios como Greed, Procrastinar e Movimento mais curto, são mandados para PF para finalmente receberem uma interpretação em LF. As operações de movimento realizadas antes de Spell-Out são abertas, pertencentes à sintaxe visível, já os movimentos pós-Spell-Out são cobertos, pertencentes à sintaxe invisível. Os itens lexicais são compostos de três tipos de traços: fonológicos, semânticos e formais. Tais traços podem ser de natureza interpretável [iF] ou não-interpretável [uF], em que F representa algum aspecto morfossintático. Um traço interpretável possui interpretação em LF, diferentemente de um traço não-interpretável. O último deve ser eliminado antes de alcançar LF. A operação Agree é responsável pela checagem de um traço não- interpretável com sua contraparte interpretável, tornando-o invisível. Essa operação funciona como um sistema de sonda (probe) e meta (goal). Um traço não-interpretável é uma sonda que busca seu domínio sintático a fim de encontrar seu correspondente traço interpretável, atingindo dessa forma a meta. Assim que a sonda encontra sua meta, os traços são checados e eliminados. O movimento é engatilhado pela natureza do traço. Um traço forte não-interpretável necessita ser checado por um traço interpretável através de uma configuração de Spec-Head agreement. Um traço fraco não-interpretável pode ser checado por um traço interpretável através de uma configuração de c-comando, isto é, se [uF] c-comanda [iF].

De acordo com Hansen (2010), a posição da negação pré-verbal na estrutura da sentença em PB é entre AgrP e TP, conforme proposto pelo autor (HANSEN, 2010, p. 121): (1) AgrP subject Agr‟ Agr NegP Neg TP não T vP verb ...

Essa estrutura prevê que a negação (i) é pré-verbal, pois se encontra antes de TP, que (ii) é adjacente ao verbo e só pode ser separada por clíticos pronominais, como em

A Graciela não te quer, *A Graciela te não quer e que (iii) é uma categoria funcional

que permite elipse, como em orações coordenadas A Graciela viajou para Colômbia,

mas a Carolina não [viajou para a Colômbia]. Há casos em que nem sempre o

operador de negação precederá o verbo leve ou lexical. Dados em que o operador sucede um verbo modal é possível em português.

(2) Graciela pode não jogar tênis este semestre.

No entanto, o significado da sentença (2) é diferente do significado da sentença (3) abaixo.

(3) Graciela não pode jogar tênis este semestre.

Em (2), Graciela pode e tem a capacidade de jogar tênis, contudo não se tem certeza se ela jogará ou não. Já em (3), Graciela não jogará tênis este semestre por algum motivo que a impede de fazê-lo. A estrutura de (2) é apresentada em (4), seguindo o modelo de Hansen (2010):

(4) AgrP Gracielai Agr‟ Agr XP X‟ X NegP pode Neg TP não

ti jogar tênis este semestre

Hansen (2010) segue o modelo de restrição pragmática de Schwenter (2005) e diz sentenças que apresentam negação pós-verbal contém informação discursiva dada. Dessa maneira, o conteúdo de AgrP pode ser topicalizado, subindo para Spec de TopP. O núcleo de TopP aloja o operador de negação. Esse núcleo possui um traço interpretável [iNEG] e um traço forte não-interpretável [uTOP*]. Na derivação desse tipo de sentença, AgrP possui um traço interpretável [iTOP] que será checado em Spec de TopP, já que o traço [uTOP*] engatilha o movimento de subida de AgrP para Spec de TopP. Hansen (2010) segue o modelo de expansão do sistema CP de Rizzi (1997) e considera as categorias ForceP e TopP, por exemplo, na estrutura da sentença. Abaixo segue um exemplo da derivação de uma sentença que apresenta negação pós-verbal (HANSEN, 2010, p. 170):

(5) Gosto dele não.

(6) ForceP

Force TopP

Top‟

Top [uTOP*, iNEG] AgrP [iTOP]

(7) ForceP

Force TopP

AgrP [iTOP]i Top‟

gosto dele Top [uTOP*, iNEG] AgrP não ti

As sentenças que contêm negação dupla são derivadas da seguinte maneira, de acordo com Hansen (2010): o operador pré-verbal é gerado no núcleo de NegP e o pós- verbal no núcleo de TopP. Esse último possui um traço não-interpretável [uNEG] que deve ser checado com um traço interpretável [iNEG] de AgrP em Spec de TopP. Após a subida, AgrP c-comanda o núcleo de TopP, ocorrendo assim a checagem do traço. A derivação é ilustrada abaixo com exemplo de Hansen (2010, p. 174):

(8) Ela não viu os meninos não.

(9) ForceP

Force TopP

Top‟

Top [uTOP*, uNEG] AgrP [iTOP, iNEG] não Ela Agr‟ Agr NegP Neg TP não T‟ T VP viu ...os meninos

(10) ForceP

Force TopP

AgrP [iTOP, iNEG]i Top‟

Ela Agr‟ Top [uTOP*, uNEG] ti não Agr NegP Neg [iNEG] TP não T‟ T VP viu ...os meninos

A proposta de derivação de sentenças V Neg e Neg V Neg de Hansen (2010) leva em consideração as questões pragmáticas envolvidas no uso de tais sentenças. Esse é um ganho em relação a outras propostas que dispensam esse conteúdo.

2.9.1 Breve comentário sobre a abordagem da sintaxe formal

A proposta da sintaxe formal toma pressupostos da teoria da Gramática Gerativa (cf. CHOMSKY, 1995) para sua análise. Os trabalhos mais recentes focam na abordagem minimalista para a derivação das sentenças. Estudos mais recentes, como os de Sousa (2012) e Cavalcante (2012) propõem outros tipos de derivação. Como não é o objetivo deste trabalho aprofundar nas questões teóricas envolvendo a derivação das sentenças, não serão mostradas as propostas dos autores supracitados. Esses autores apresentam propostas interessantes sobre possíveis restrições sintáticas das sentenças negativas em PB. Algumas das hipóteses propostas nesses trabalhos serão exploradas na seção de análise dos dados.