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Abordagens comportamentais da internacionalização da firma

3 ESTRATÉGIA INTERNACIONAL: CONTEXTO, MOTIVAÇÃO E CAMINHOS

3.5 Modelos Teóricos de Internacionalização de Empresas

3.5.1 Abordagens comportamentais da internacionalização da firma

A primeira linha de trabalhos acadêmicos sobre internacionalização de empresas – a chamada escola processualista – refere-se aos estudos sobre o ciclo da internacionalização. Tais análises indicam que existem etapas a serem seguidas a fim de efetivar o sucesso nos empreendimentos empresariais além-fronteiras. Esta corrente de autores (VERNON, 1966; CAVUSGIL, 1980; REID, 1981; JOHANSON; VAHLE, 1990), chamada de processualista, defende um processo de aprendizado em estágios que se inicia pela exportação indireta e culmina na instalação de plantas no exterior. O quadro abaixo resume as principais contribuições teóricas nesta vertente:

Quadro 4.4.5: Principais Teorias Comportamentais sobre Internacionalização Fonte: Dib; Carneiro, 2006:3

As etapas a serem seguidas e sua ordem dependem de cada autor, mas o pressuposto básico é o mesmo: é preciso que as empresas evoluam sua participação internacional através da aquisição crescente de conhecimento, controle e, concomitantemente, a assunção de mais risco (SACRAMENTO, et al. 2003).

Em se tratando da escola processualista, o trabalho do grupo da Uppsala Business School, em especial Johanson e Vahle, que por ser especialmente contributivo levou o nome de modelo de Uppsala, ou U-Model - foi um dos primeiros esforços para o entendimento dos estágios do ciclo de internacionalização de uma empresa. Uma das argumentações mais comumente encontradas nos textos desta escola é que, durante a materialização das operações internacionais, frequentemente, as empresas encontram oportunidades e ameaças não previstas (QUINN,1988). O modelo de Uppsala, ou modelo dinâmico de aprendizagem, foi inicialmente desenvolvido por Johanson & Wiedersheim-Paul (1975), ao estabelecerem os conceitos nucleares de cadeia de estabelecimento e distância psíquica; estes implicam a premissa de que quanto maior o grau de conhecimento da firma sobre um determinado mercado, mais ela tenderá a investir recursos nesse mercado.

Segundo o modelo de Uppsala, o processo de internacionalização se dá em quatro estágios: (a) atividades de exportação irregulares; (b) atividades de exportação via intermediários e/ou representantes; (c) estabelecimento de subsidiária de vendas no mercado externo e (d) estabelecimento de unidades de produção/manufatura no mercado externo. Johanson e Vahlne (1977, 1990, 1992, 2003) apresentaram um modelo reformulado, afirmando que as empresas definem seu processo de internacionalização a partir das variáveis conhecimento do mercado – referente à familiaridade com o mercado-alvo - e comprometimento com o mercado, que diz respeito ao montante e ao grau de especificidade de recursos investidos em determinado mercado internacional.

Ainda segundo Rezende; Versiani (2005), o modelo de Uppsala contém “um pressuposto importante sobre o papel dos relacionamentos entre matriz e subsidiárias em processos de internacionalização; [...] à matriz caberia o papel de gerar conhecimentos para posteriormente serem explorados pela subsidiária (VERNON, 1966; HYMER, 1972, apud REZENDE; VERSIANI, 2005). Zander (1999) afirma que a expansão dos negócios internacionais ocorre de forma gradual, “both in terms of distance to markets served and the modes of foreign operation (Aharoni, 1966; Johanson & Wiedersheim-Paul, 1975; Johanson & Vahlne, 1977, 1990; Luostarinen, 1979;also, Mudambi, 1998).” Este autor enfatiza que os estágios iniciais se caracterizam pela busca da redução da incerteza e do risco, “by concentrating on

geographically close and familiar markets, limiting the initial investments or building flexibility into the ways in which foreign markets are penetrated.” À medida que o conhecimento da organização evolui, cresce o comprometimento com os negócios internacionais:

À medida que a organização desenvolve um melhor entendimento sobre como fazer negócios no estrangeiro, os compromissos estabelecidos com os mercados tornam-se cada vez maiores e mais a busca de novos clientes amplia-se para ainda mais longe de casa. Nos mercados mais importantes, compromissos crescentes envolvem a substituição das exportações e agentes independentes por filiais de vendas e fabricação. Estas alterações refletem ambições para um melhor serviço para clientes locais, bem como as aspirações de que a gestão local ganhe controle sobre recursos operacionais e de tomada de decisão (Zander, 1999:263).24

Por outro lado, Calof; Beamisht (1995) argumentaram ser o conhecimento sobre como e por que as organizações evoluem ao longo dos estágios de internacionalização deficiente, afirmando que os estudos sobre o tema não oferecem “any insight into explaining either the pattern of change or the ensuing strategic choice.” Assim sendo, estes autores realizaram um estudo sobre decisões de mudança de modo, (121 decisões, descritas pelos principais executivos de 38 manufaturas canadenses de médio porte), tendo obtido “a fascinating, diverse set of answers”. Estes autores concluem que a evolução da empresa no seu processo de internacionalização constitui um fenômeno complexo, no qual as atitudes dos gestores exercem papel determinante:

Os possíveis motivos para mudar o modo [de internacionalização] são variados e complexos. A mudança de modo pode ser atribuída aos estímulos em cujos efeitos os executivos crêem […]. O padrão de subsequente internacionalização (desinvestimento, investimento de um passo múltiplo), depende da natureza dos estímulos, atitudes e outras variáveis associadas com a mediação interna e externa dos ambientes. Mas, principalmente, parece […] que a atitude dos executivos e não necessariamente os fatores ambientais objetivos dirigem a internacionalização" (CALOF; BEAMISHT, 1995:129, Grifo do autor).25

Essas reflexões indicam que, embora o modelo de Uppsala seja considerado o principal marco teórico da internacionalização de empresas - de forma semelhante ao modelo H-O (Hecksher- Ohlin) para o comércio internacional – o modelo não explica todas “as expansões de cada firma e a sequência de entrada em um determinado mercado, uma vez que as características

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As the organization builds a better understanding of doing business abroad, commitments to established markets are increased and the search for new customers extends further away from home. In the most important markets, increasing commitments involve the replacing of exports and independent agents by sales and manufacturing subsidiaries. These changes reflect ambitions to better service local customers as well as local management‟s aspirations to gain control over resources and operational decision making (ZANDER, 1999:263). 25The possible reasons for changing mode are varied and complex. Mode change can be traced to stimuli which effect executives' beliefs […]. The ensuing internationalization pattern (de-investment, one-step and multi-step investment), depends on the nature of the stimuli, attitudes, and other mediating variables associated with the internal- and external- environments. But, primarily it appears […].that attitudes of executives and not necessarily objective environmental factors, drive internationalization (CALOF; BEAMISHT, 1995:129, grifo do autor).

específicas das empresas, das indústrias e dos fatores de localização também exercem forte influência sobre o processo” (FORTE; SETTE JR, 2005).

Entre as limitações do U-Model (Modelo de Uppsala), contam-se (a) “as etapas do processo sequencial, previstos no modelo, em determinadas indústrias, estariam sendo eliminadas em decorrência da entrada de novos entrantes no processo” (HEDLUND; KVERNELAND, 1984

apud HILAL; HEMAIS, 2001, apud FORTE; SETTE JR, 2005); (b) “para indústria de serviços, firmas em setores de alta tecnologia e/ou cujas operações não estejam motivadas pela busca de novos mercados, o modelo mostra-se menos válido” (Andersen, 1993, apud FORTE; SETTE JR, 2005).

A esse respeito, Carneiro; Hemais (2005) apontam que as características dos serviços, a saber, “maior grau de inseparabilidade, heterogeneidade, intangibilidade e perecibilidade (Grönroos, 1990; Kotler, 2000; Lovelock e Wright, 2001; Zeithaml e Bitner, 2003) [...] têm importantes implicações sobre a aplicabilidade dos pressupostos do Modelo de Uppsala.” Os autores destacam que (a) “no caso de serviços, modos de entrada com maior grau de envolvimento [...], quando comparados aos respectivos modos de entrada de produtos significam um montante de investimentos consideravelmente menor”; (b) os recursos comprometidos (habilidades pessoais e capacidades gerenciais) “exibem um grau de flexibilidade muito maior” e “podem ser mais facilmente revertidos de um país para outro”, ou seja, (c) “os modos de entrada com maior envolvimento não apresentariam a mesma percepção de risco”, sendo portanto provável que, em operações de serviços, “as empresas não se sintam tão propensas a seguir os estágios sequenciais de comprometimento gradualmente crescente de investimentos (Erramilli, 1991, apud CARNEIRO; HEMAIS, 2005). Embora sem base empírica, o estudo destes autores sugere que o U-Model provavelmente não seja plenamente aplicável a operações de serviços.

As críticas ao modelo de Uppsala indicam a existência de outras possíveis rotas de internacionalização, além das previstas pelo modelo. Não obstante, parece inquestionável que conhecimento, experiência, potencial do mercado e estrutura industrial, constituem influências importantes no processo de internacionalização.

Ainda no âmbito do enfoque processualista, as críticas e limitações do U-Model deram origem a linhas de pensamento alternativas que enfocaram o papel da inovação no processo de internacionalização das empresas, resultando no chamado modelo de inovação (I-Model):

No modelo I-model o processo de internacionalização acontece numa sequência determinada de estágios, rumo aos mercados que apresentem distância psíquica cada vez maior. Cada estágio é considerado como uma inovação da firma (ANDERSEN, 1993). Tais inovações propiciam vantagens competitivas, antecipando as necessidades dos mercados internos e externos. Entendem-se por inovação as melhorias na tecnologia, na maneira como as coisas são feitas e nos métodos adotados, além das vantagens competitivas, obtidas mediante todo o processo de inovação, antecipando as necessidades do mercado externo (FORTE; SETTE JR, 2005:3)

Os principais representantes dessa abordagem sugerem modelos de exportação em quatro estágios, sintetizados no quadro abaixo:

Quadro 4.4.1: Estágios de Internacionalização segundo o I-Model Fonte: ANDERSEN, 1993, apud FORTE; SETTE JR, 2005:3

Já a teoria de Networks conceitua as iniciativas internacionais da empresa como modos de aproveitar, aperfeiçoar ou ainda para criar novos relacionamentos dentro da sua rede de negócios – clientes, parceiros de negócios (ou mesmo competidores), instituições de

financiamento ou agências governamentais. Nesta perspectiva, as decisões quanto a produtos, mercados, países e outras seriam tomadas de acordo com as influências das redes internacionais estabelecidas ou almejadas pela empresa, ou seja, “a internacionalização depende tanto da própria empresa quanto do mercado (network)” (DIB; CARNEIRO, 2006). De forma quase oposta, a perspectiva do Empreendedorismo considera o perfil do empreendedor tomador de decisões como o principal fator determinante dos movimentos internacionais; o “empreendedor de mercado” vai ao estrangeiro em busca de novos mercados, enquanto o “empreendedor técnico” busca atender a demandas inéditas em função da sua posse de processos, produtos ou tecnologias inovadores e finalmente o “empreendedor estrutural” almeja a consolidação de sua indústria em diferentes países (Andersson, 2000,

apud DIB, CARNEIRO, 2006).

Finalmente, a teoria sobre Estratégia lato-sensu oferece contribuições importantes ao descrever a necessidade de sinergia entre as unidades empresariais diferentes, notadamente aquelas situadas em outras nações. Ainda sobre esta maneira de pensar a internacionalização de empresas, vale citar os escritos da área de Recursos Humanos e Cultura Organizacional que ressaltam as características interculturais existentes nas atividades de tal natureza (LI, 1983; ROSENTEIN; RASHEED, 1993; LENWAY; MURHA, 1994). Esta temática será retomada no próximo capítulo, após a discussão das abordagens da internacionalização com enfoque econômico e uma discussão geral dos modelos apresentados, tópicos estes desenvolvidos nas seções a seguir.