3 ESTRATÉGIA INTERNACIONAL: CONTEXTO, MOTIVAÇÃO E CAMINHOS
3.4 Modos de Internacionalização
3.4.1 Exportação
Este é o modo mais básico e frequente de internacionalização, e também aquele que será mais intensamente objeto de análise da pesquisa de campo desta tese. Entende-se por exportação a venda de produtos a um país no exterior sem que sejam necessários investimentos produtivos na nação onde serão comercializados os produtos (HITT et al., 1999). A maioria das empresas
inicia suas práticas internacionais através da exportação (PUNNETT e RICKS, 1994; NAIDU e PRASAD, 1994; entre muitos outros).
Segundo Jeannet e Hennessey (1995, apud SCHNEIDER, 2002), a alternativa da exportação pode ser dividida em exportações diretas e indiretas. As exportações diretas são aquelas realizadas “através de um intermediário localizado fora do país de origem, como, por exemplo, atacadistas, distribuidores, agente do fabricante, representante comissionado, filial de vendas, além das exportações realizadas diretamente ao consumidor final. Já as
exportações indiretas são realizadas através de um intermediário localizado no próprio país
do fabricante, como as trading companies, brokers e a comercial importadora/exportadora”. Sobre os intermediários, conhecidos como traders, Peng; Ilinitch (1998) afirmam que eles podem ser definidos como empresas de serviços especializados que “funcionam como o departamento de exportação de diversos fabricantes em linhas que não competem entre si” (RAIZ, 1994:102, apud PENG; ILINITCH,1998). Esses autores salientam a deficiência do referencial teórico existente para a pesquisa sobre a atuação dessas empresas, afirmando que “Esforços teóricos explicam a exportação dos desenvolvimentos intermediários como uma forma organizativa, […] foram amplamente , com pouco respeito a toda a gestão, marketing e negócios internacionais literatura”19.
Quanto às motivações para as atividades de exportação, Ferdows (1997, apud RUIZ, 2005) afirma que são fundamentalmente as mesmas da decisão de internacionalização e as classifica segundo sua tangibilidade:
19 “theoretical efforts to explain export intermediaries‟ development as an organizational form,[…] have largely
Figura 3.4-1 - Fatores motivadores da internacionalização Fonte: Adaptado de Ferdows (1997) apud RUIZ, 2005:22
MAIS TANGÍVEL Reduzir custos operacionais Reduzir custo de capital Reduzir impostos
Reduzir custos logísticos Superar barreiras tarifárias
Prestar melhores serviços aos clientes Diversificar riscos cambiais
Obter fontes alternativas de recursos Antecipar-se a concorrentes
Aprender com clientes e fornecedores internacionais Aprender com concorrentes internacionais
Aprender com centros de excelência estrangeiros Atrair talentos globalmente
MAIS
INTANGÍVEL
Ruiz (2005) também apresenta de forma sintética as principais motivações para a exportação, segundo diversos autores (Tabela 4.3.2 abaixo).
Tabela 3.4-2 - Fatores motivadores das exportações Fonte: Adaptado de RUIZ, 2005:24
Fatores Financeiros Diversificação de riscos de câmbio Aumento de margens
Redução de custos de capital
Fatores de Custos Obtenção de incentivos governamentais Reduções de custos diretos e indiretos Redução de impostos
Fatores de mercado Penetração em novos mercados (aumento das vendas) Melhora da imagem do produto no mercado doméstico Melhora na qualidade do produto
Melhora dos serviços prestados aos clientes Venda de estoques excedentes
Diversificação de mercados
Fatores de aprendizado Aprendizado com centros de excelência no estrangeiro
Aprendizado c/ clientes, concorrentes e fornecedores estrangeiros
Aquisição de conhecimento gerencial e operacional Aquisição de novas tecnologias
Outros fatores Antecipação a clientes potenciais Melhora das possibilidades de parcerias Obtenção de fontes alternativas de recursos
Ampliação global da rede de contatos (networking)
O mesmo autor apresenta um resumo dos principais obstáculos às exportações, classificando- os em Geográficos, Culturais, Mercadológicos; Ambientais e Setoriais; e Obstáculos Relativos à Firma. Os quadros a seguir oferecem uma visão geral dos obstáculos:
Tabela 3.4-3 - Obstáculos às Exportações: Aspectos Geográficos, Culturais e Mercadológicos
Fonte: Adaptado de RUIZ, 2005:27 e seg.
Geogr
áf
icos
Poucos países fronteiriços
Vasta área geográfica, dificuldades de acesso a outros países Relevo acidentado
Distância do país-sede dos principais eixos do comércio internacional Autossuficiência do país-sede em recursos naturais e matérias primas
Cul
turais
Grande distância cultural entre o país-sede e os mercados-alvo Língua do país sede de pouca importância no comércio internacional Orientação local dos colaboradores
“Empresa como família” (DA ROCHA, 2002, apud RUIZ, 2005) Diferenças religiosas (e/ou de costumes, tradições e etiqueta) Aversão ao risco dos colaboradores
Diferenças de gostos e hábitos
M
er
cad
ológi
cos
Alta demanda no mercado interno Ameaças presentes no mercado-alvo
Percepção pelos gestores de baixo crescimento do comércio internacional Baixa aceitação dos produtos nos mercados-alvo
Baixo potencial de compra dos mercados-alvo
Tabela 3.4-4 - Obstáculos às Exportações: Aspectos Ambientais Fonte: Adaptado de RUIZ, 2005:29
Ausência de políticas governamentais de incentivo às exportações Baixa disponibilidade de informações sobre mercados internacionais Barreiras comerciais nos mercados alvo (tarifárias e não-tarifárias) Questões cambiais
Custos e riscos das operações internacionais Deficiências de infraestrutura de transportes Nível de abertura ao comércio internacional Influências de blocos econômicos
Políticas de taxas de juros e financiamentos (dos dois países) Imagem negativa dos produtos do país-sede
Instabilidade política (dos dois países) Corrupção (nos dois países)
Inexistência de instituições (e/ou consultorias) de apoio à atividade exportadora Indisponibilidade de warehouses e/ou distribuidores no país-alvo
Dificuldades de acesso comercial a atacadistas e varejistas no país-alvo Dificuldades e/ou atrasos nos pagamentos pelo importador
Excesso de requisitos técnicos e legais no país-alvo, inclusive BNTs; Fragilidades nas relações diplomáticas entre os dois países
Tabela 3.4-5 - Obstáculos às Exportações: Aspectos Setoriais Fonte: Adaptado de RUIZ, 2005:32
Pressões competitivas
Ciclo de vida do produto desfavorável à exportação
Concentração (enfoque) da indústria (setor) no mercado doméstico Concentração da indústria (setor) nos mercados-alvo
Dinamicidade da indústria (setor)
Intensidade e dinamicidade tecnológica da indústria (setor) Estrutura setorial, regulações específicas.
Tabela 3.4-6 - Obstáculos às Exportações: Aspectos Relativos à Firma Fonte: Adaptado de RUIZ, 2005:31
Aumento da complexidade do gerenciamento da empresa Baixa capacidade de produção
Baixa orientação para o cliente
Baixo comprometimento da direção com as atividades de exportação Baixa competitividade
Baixo comprometimento da empresa com as atividades de exportação (% exportado) Comportamento não-oportunístico
Desconhecimento do funcionamento do COMEX, incentivos, órgão de apoio e outros Desconhecimento dos mercados internacionais
Rede de contatos (networking) internacional fraca
Necessidade de adaptação das práticas promocionais aos novos mercados Percepções negativas da direção quanto às oportunidades e riscos do COMEX Pouca disponibilidade de recursos financeiros, materiais e/ou de pessoal Pouca experiência internacional da empresa e/ou dos seus dirigentes Vantagens competitivas reduzidas (preço, qualidade etc)
Porte da empresa
Os aspectos da atividade exportadora ligados à firma são analisados em profundidade por Cavusgil (apud BRITTO, 2004), que estabelece o conceito de Prontidão para Exportar (Readiness to Export) da empresa. Entende-se por este termo como o grau de preparo que a empresa possui no sentido de ser mais ou menos capaz de atuar com sucesso no comércio exterior, caracterizado pelos atributos associados à preparação da empresa para as exportações.
Tais atributos são avaliados segundo duas dimensões independentes: (1) Prontidão Organizacional e (2) Prontidão de produtos. A dimensão de Prontidão Organizacional, que procura medir as características de gestão tanto sob o ponto de vista estrutural como comportamental, está subdividida em cinco outras subdimensões: (1) Competitividade no mercado doméstico, (2) Motivação para atividades internacionais, (3) Compromisso da alta gestão, (4) Competências, Recursos e Capacidades e, por fim, (5) Experiência e treinamento formal. A dimensão de Produto, também componente do conceito Prontidão para Exportar, refere-se às características do produto da empresa que podem conferir-lhe maior ou menor
competitividade em um contexto internacional. Assim, a Prontidão de Produtos mensura o preparo dos produtos em suas características intrínsecas. Ao contrário da Prontidão organizacional, discutida no item precedente, Cavusgil et al. (1998) não separa este elemento em subdimensões; segundo o autor, comumente a empresa apresenta Prontidão de Produtos antes da Prontidão Organizacional.
O conceito de Readiness to Export constitui a base conceitual da metodologia proposta por Cavusgil et al. (1998) para avaliar as possibilidades de sucesso e recomendar ações para a internacionalização de empresas industriais pela via das exportações. Sua operacionalização é suportada pelo software CORE, também de sua autoria20.
As empresas exportadoras podem ainda ser classificadas em relação às suas atividades exportadoras segundo as dimensões de (a) frequência de exportação, (b) experiência internacional, (c) mercado predominante e (d) setor de atuação (RUIZ, 2005). Enquanto esta última dimensão indica a turbulência, competitividade e complexidade do ambiente operacional da empresa, as três primeiras se relacionam ao seu nível de atividade internacional (tabela abaixo).
Tabela 3.4-7 - Características de empresas exportadoras Fonte: Adaptado de RUIZ, 2005:34 e seg.
Frequência (BILKEY, 1978; ORTEGA, 2003) Experiência (BILKEY, 1978; NAIDU;RAO, 1993; BODUR, 1996; SILVA;DA ROCHA, 2001) Mercado (KATSIKEAS; MORGAN, 2004; SEBRAE, 2004) Não-exportadora s/ interesse
(nunca exportou e não tem interesse em exportar) Não-exportadora (nunca exportou) Não-exportadora (nunca exportou) Não-exportadora c/ interesse
(nunca exportou mas tem intenção de exportar)
Exportadora iniciante
(um ano ou menos de atuação)
Mercosul
Ex-exportadora
(já exportou, mas deixou de exportar)
Exportadora pouco experiente
(dois a quatro anos de atuação)
Estados Unidos e Canadá
Exportadora esporádica
(exporta eventualmente)
Exportadora experiente
(cinco a dez anos de atuação)
Ásia
Exportadora contínua
(exporta constantemente, mantendo atividade
exportadora por vários anos)
Exportadora muito experiente
(mais de dez anos de atuação)
Resto do mundo
A exportação permite um rápido acesso aos mercados externos, uma grande flexibilidade de atuação e um baixo risco. Através da exportação, uma organização consegue rapidamente inserir-se em países os quais seriam muito mais difíceis de explorar de outra forma, especialmente contando com apoio de firmas especializadas nos mecanismos do comércio exterior. Em contrapartida, o exportador deve arcar com diversos tipos de taxas e outros gastos advindos dos sistemas portuário e alfandegário dos países de destino. (BRITTO, 2004). Segundo Keegan (2002, apud RUIZ, 2005), há quatro formas de entrada básicas para a exportação (figura abaixo):
Figura 3.4-2 - Formas de entrada para a exportação Fonte: Adaptado de Keegan (2002), apud RUIZ, 2005:
Formas de entrada Organização do Processo
LOCAL REMOTA E nvolvi m en to de te rc eiros NÃO Exportação direta (in-house) Representação direta
SIM Exportação por
intermediários
Representação Independente
Na exportação direta, a empresa realiza todas as atividades relativas às exportações, o que proporciona o máximo de controle sobre a operação, especialmente preços de venda e serviço ao cliente; em contrapartida, a empresa arca com gastos fixos em pessoal e estrutura que podem reduzir a atratividade da atividade exportadora, principalmente em períodos de “baixa” (câmbio apreciado, quedas de preços internacionais e outros exemplos).
Uma forma de evitar os riscos expostos acima é adotar a exportação por intermediários, que consiste em usar os serviços de empresas especializadas tais como trading companies, export
bokers, empresas de gerenciamento ou agentes de exportações, distribuidores de exportação
ou consórcios de exportação. Segundo Ruiz (2005), embora existam diferenças entre essas formas de intermediação, todas elas proporcionam “informação sobre o mercado-alvo, acesso a melhores canais de distribuição, menores riscos transacionais, aumento de vendas ou combinações destas vantagens”, todavia incorrendo em gastos e/ou redução de receitas “na forma de comissões, venda dos produtos ao intermediário a preços mais baixos ou taxas pré- determinadas.” Uma discussão mais aprofundada das formas de intermediação citadas acima ultrapassa o escopo do presente trabalho e pode ser encontrada (enfocando principalmente as
trading companies) em GRISI; MASINI; BRITTO, 2003.
A representação direta consiste no estabelecimento de escritório próprio no país-alvo e se proporciona maior controle e aprendizado muito mais rápido, por outro lado implica investimentos e custos operacionais maiores do que as formas já analisadas. Uma alternativa pode ser a representação indireta, ou seja, constituir uma representante local já estabelecida. Finalmente, vale notar que as atividades de exportação e representação podem combinar-se “em quatro configurações básicas: (a) exportação e representação própria, (b) exportação e
representação a cargo de terceiros, (c) exportação direta e representação independente e (d) exportação direta e representação independente, sendo esta última forma mais rara (RUIZ, 2005).
Leonidou; Katsikeas (1996, apud PENG; ILINITCH,1998), destacam que a escolha do canal de exportação é determinada primariamente por considerações relacionadas à questão dos custos de transação, entre três opções:
(i) a integração vertical da função do canal, ou seja, "a exportação direta" [...]; (ii) a contratação no mercado interno de "intermediários de exportação " (Perry, 1992); ou (iii) a adoção de “intermediários de importação" estrangeiros (Karunaratna e Johnson, 1997). Para ter sucesso, intermediários de exportação devem reduzir os custos de transação relacionados à exportação de seus clientes com em relação aos outros dois canais; caso contrário, não haverá razão para a sua existência (Peng, 1998). PENG; ILINITCH,1998:613, grifos do autor)21
Embora seja a forma mais comum de entrada no comércio internacional, a exportação apresenta dificuldades e riscos que podem ser evitados recorrendo a outras formas de entrada, entre as quais o licenciamento, que é discutido a seguir.