• Nenhum resultado encontrado

4 A POSSIBILIDADE DE DESAPROPRIAÇÃO DA PROPRIEDADE RURAL PRODUTIVA QUE NÃO CUMPRE SUA FUNÇÃO SOCIAL

4.1.2 Acepção jurídica de propriedade produtiva

A Lei 8.629/93 considera como produtiva a propriedade que obedecer à utilização de, no mínimo, 80% da terra aproveitável ao imóvel, bem como atingir o grau de eficiência na exploração da terra de 100%, nos termos do seu artigo 6º18.

A mencionada lei define também a pequena propriedade agrária como sendo o imóvel rural que tenha área compreendida entre um e quatro módulos fiscais. A média propriedade é o imóvel rural de dimensão superior a quatro até 15 módulos fiscais (art. 4º). Estas propriedades (pequena e média propriedade rural) não poderão ser desapropriadas e destinadas à reforma agrária, desde que o seu proprietário não possua outra.

Albuquerque (2005, p. 177) lembra que:

[...] a CF não imuniza da desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária a pequena e a média propriedade rural em si. Ela torna insuscetíveis a esse tipo de desapropriação essas espécies de imóveis, desde que incidente o elemento subjetivo, que consiste em não possuir, o titular da propriedade, outro prédio rural. A insuscetibilidade do inciso I do art. 185 da CF permite entender como aludindo tanto a pessoa física, quanto à jurídica. Entretanto, interpretando esse mandamento como

18 Art. 6 da Lei 8.629/93. Considera-se propriedade produtiva aquela que, explorada econômica e

racionalmente, atinge, simultaneamente, graus de utilização da terra e de eficiência na exploração, segundo índices fixados pelo órgão federal competente. § 1º O grau de utilização da terra, para efeito do caput deste artigo, deverá ser igual ou superior a 80% (oitenta por cento), calculado pela relação percentual entre a área efetivamente utilizada e a área aproveitável total do imóvel. § 2º O grau de eficiência na exploração da terra deverá ser igual ou superior a 100% (cem por cento), e será obtido de acordo com a seguinte sistemática: I - para os produtos vegetais, divide-se a quantidade colhida de cada produto pelos respectivos índices de rendimento estabelecidos pelo órgão competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea; II - para a exploração pecuária, divide-se o número total de Unidades Animais (UA) do rebanho, pelo índice de lotação estabelecido pelo órgão competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea; III - a soma dos resultados obtidos na forma dos incisos I e II deste artigo, dividida pela área efetivamente utilizada e multiplicada por 100 (cem), determina o grau de eficiência na exploração. § 3º Considera-se efetivamente utilizadas: I - as áreas plantadas com produtos vegetais; II - as áreas de pastagens nativas e plantadas, observado o índice de lotação por zona de pecuária, fixado pelo Poder Executivo; III - as áreas de exploração extrativa vegetal ou florestal, observados os índices de rendimento estabelecidos pelo órgão competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea, e a legislação ambiental; IV - as áreas de exploração de florestas nativas, de acordo com plano de exploração e nas condições estabelecidas pelo órgão federal competente.

exceção à desapropriação do art. 184, forçoso reconhecer que o proprietário, apontado pelo mandamento constitucional de exceção, é aquele que tem a proteção da sua propriedade enquanto direito-garantia fundamental do ser humano. E, neste diapasão, dificilmente (não impossível) a pessoa jurídica poderia se configurar como destinatária da norma do art. 185, inciso I, da CF.

A dimensão da área isenta o imóvel rural de desapropriação, ainda que seja improdutiva. A razão para tal opção, adotada pelo legislador constituinte originário, foi a constatação de que o Brasil possui número suficiente de grandes propriedades que não cumprem a função social. Essas são capazes de possibilitar a realização de uma ampla e massiva reforma agrária, sendo desnecessária a utilização de pequenos e médios imóveis. (SOUZA, 2007).

Varella (1998, p. 247) acredita que essa previsão constitucional:

[...] condiz com a política de reforma agrária, pois é o entendimento dominante, que não se deve desapropriar pequenas e médias propriedades rurais, tendo-se à disposição um grande contingente de terras em grandes propriedades, suficientes para a implantação de um vasto programa de reforma agrária.

Para Mattos Neto (2005), o art. 185 foi o maior retrocesso da Constituição de 1988 em relação ao Estatuto da Terra. Segundo o referido autor, “houve um retrocesso no trato quanto à exigibilidade no cumprimento da função social da propriedade. A Constituição afrouxou a rigidez trazida anteriormente pelo Estatuto da Terra”.

Diametralmente oposto é o entendimento de Afonso da Silva (2005), segundo o qual a regulamentação da matéria na Constituição de 1988 representou a proibição da desapropriação da propriedade produtiva, para fins da reforma agrária, com pagamento da indenização mediante título da dívida agrária, neste sentido, afirma o autor que:

A sanção para o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social é a desapropriação por interesse social, para fins de reforma agrária, mediante pagamento da indenização em títulos da dívida agrária, nos termos do art. 184. Não quer dizer que a reforma agrária possa fazer-se somente por esse modo. A desapropriação por interesse social, inclusive para melhor distribuição da terra, é um poder geral do Poder Público (art. 5º, inc. XXIV), de maneira que a vedação de desapropriação, para fins de reforma agrária, da pequena e da média propriedade rural, assim definida em lei e desde que seu proprietário não possua outra, e da propriedade produtiva configurada no art. 185 deve ser entendida em relação ao processo de reforma agrária constante do art. 184. Ou seja: o art. 185 contém uma exceção à desapropriação especial autorizada no art. 184, não

ao poder geral de desapropriação por interesse social do art. 5º, XXIV. Quer dizer, desde que se pague a indenização nos termos do art. 5º, inc. XXIV, qualquer imóvel rural pode ser desapropriado por interesse social para fins de reforma agrária e melhor distribuição da propriedade fundiária. (SILVA, 2005, p. 820-821)

Em relação ao semblante da propriedade produtiva, Gomes da Silva (1989) cientifica que este foi inserido pelo Relatório da Comissão de Ordem Econômica, do Senador Severo Gomes, que marcou a primeira derrota do grupo de constituintes progressistas. O mesmo autor aduz que “produtivo” refere-se à fertilidade ou à capacidade da terra produzir, trabalhando o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) da seguinte maneira:

O IBGE trabalha com “terras produtivas não utilizadas” para identificar as superfícies dos estabelecimentos “constituídas pelas áreas que se prestam à formação de culturas, pastos ou matas e não estejam sendo usadas para tais finalidades”. Em outras palavras, trata-se de terras passíveis de aproveitamento agropecuário, mas que não estão tendo utilização econômica. Está claramente embutido na expressão o conceito de que o “produtivo” refere-se à fertilidade ou à capacidade de produzir (...). O antigo Incra, em suas estatísticas cadastrais, utilizava a expressão “área aproveitável não explorada” para caracterizar “a área total do imóvel, excluídas as terras de reserva legal, as terras inaproveitáveis e a área explorada”.

Segundo o Aurélio, “produtivo” quer dizer “que produz, fértil”, mostrando claramente uma conotação de capacidade de produzir, de fertilidade intrínseca. Não obstante, a terra, com essa qualidade, pode ter um potencial produtivo, mas não se encontrar sob uso econômico, ou “em utilização” como estabelece o IBGE, ou “em exploração”, como queria o Incra. Para Aulete, produtivo é o que produz ou pode produzir, fértil, mostrando novamente a conotação potencial e de fertilidade. (SILVA, 1989, p. 202)

Discorrendo sobre o assunto, Marés (2003, p. 119-120) assevera:

Esta ideologia tem uma forma estranha de se preocupar com a fome ou a má distribuição de riqueza, achando que elas não são frutos da acumulação cada vez mais concentrada, mas da maldade dos homens, especialmente dos pobres. Assim, quando a ideologia determina que a única razão jurídica possível é a defesa da propriedade privada absoluta, passa a ser aceitável a leitura literal do artigo 185, que conclui que a propriedade rural que produza riqueza e dê lucro seja insuscetível de desapropriação e de qualquer outra restrição legal, independente de exercer a função social [...]. Ditos de forma mais rude, para esta ideologia os termos da Constituição cidadã só têm eficácia enquanto possam ser interpretados como protetores da propriedade privada absoluta.

Desta forma, ainda que seja lucrativa, não pode ser considerada produtiva a propriedade que não aproveite racional e adequadamente o solo e os recursos naturais, não proteja o meio ambiente, não observe as disposições que regulam as relações de trabalho, nem favoreça o bem estar dos trabalhadores e proprietários. Marés (2003).

Corroborando no mesmo sentido, Albuquerque (2005, p.178) certifica que, “por todo o contexto da CF, só se pode considerar como imóvel produtivo aquele que cumpre a função social da propriedade, conforme o art. 186 e incisos”. Isso traduz que o art. 185 “é uma exclusão da possibilidade de desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária do imóvel rural que estiver cumprindo as dimensões econômica, social propriamente dita e ecológica da função social”.

Varella (1998, p. 253) enuncia que a interpretação que faz prevalecer o art. 185, II, não anula apenas os artigos 184 e 186 da Constituição Federal, mas também os artigos 7º19 e 22520 da Carta Magna, visto que cuidam dos direitos trabalhistas e da proteção ao meio ambiente, conforme aduz:

19 Art. 7 da CF: São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria

de sua condição social: I - relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos; II - seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário; III - fundo de garantia do tempo de serviço; IV - salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim; V - piso salarial proporcional à extensão e à complexidade do trabalho; VI - irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo; VII - garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que percebem remuneração variável; VIII - décimo terceiro salário com base na remuneração integral ou no valor da aposentadoria; IX - remuneração do trabalho noturno superior à do diurno; X - proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa; XI - participação nos lucros, ou resultados, desvinculada da remuneração, e, excepcionalmente, participação na gestão da empresa, conforme definido em lei; XII - salário-família pago em razão do dependente do trabalhador de baixa renda nos termos da lei; XIII - duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho; XIV - jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva; XV - repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos; XVI - remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinqüenta por cento à do normal; XVII - gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal; XVIII - licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias; XIX - licença-paternidade, nos termos fixados em lei; XX - proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei; XXI - aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei; XXII - redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança; XXIII - adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei; XXIV - aposentadoria; XXV - assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento até 5 (cinco) anos de idade em creches e pré-escolas; XXVI - reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho; XXVII - proteção em face da automação, na forma da lei; XXVIII - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa; XXIX - ação, quanto aos créditos resultantes das

[...] seria necessário afirmar que o art. 185, II, tem preferência sobre o art. 7º, com todos os seus 34 incisos, que tratam dos direitos dos trabalhadores rurais, pois o proprietário que não cumpre com suas obrigações trabalhistas e, portanto, não efetiva a função social da propriedade (art. 186, III), não poderia ser punido com a desapropriação. Ainda sob a mesma ótica, teria o inciso II do art. 185 preferência sobre o Capítulo VI, que trata do meio ambiente (art. 186, II).

Modesto (2005) entende que o conceito de produtividade prevista na norma que regulou os dispositivos da Constituição é composto por dois elementos que devem ser atendidos simultaneamente: produção econômica que atinja os índices mínimos de produtividade (GUT21 e GEE22), observado para tanto, a

relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho; XXX - proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil; XXXI - proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência; XXXII - proibição de distinção entre trabalho manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais respectivos; XXXIII - proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos; XXXIV - igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso Parágrafo único. São assegurados à categoria dos trabalhadores domésticos os direitos previstos nos incisos IV, VI, VII, VIII, X, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XXI, XXII, XXIV, XXVI, XXX, XXXI e XXXIII e, atendidas as condições estabelecidas em lei e observada a simplificação do cumprimento das obrigações tributárias, principais e acessórias, decorrentes da relação de trabalho e suas peculiaridades, os previstos nos incisos I, II, III, IX, XII, XXV e XXVIII, bem como a sua integração à previdência social.

20 Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do

povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. § 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente; VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade. § 2º - Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei. § 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.§ 4º - A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.§ 5º - São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais. § 6º - As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização definida em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas.

21 Grau de Utilização de Terra. 22 Grau de Eficiência na Exploração.

racionalidade, seja ambiental ou social. Ademais, no conceito de função social está contido o conceito de produtividade, mas que no conceito de produtividade também estão contidas parcelas dos conceitos de função ambiental, função trabalhista e função bem-estar, isto é, que a função social é continente e conteúdo de produtividade.

Valendo-se da mesma interpretação, D’Ávilla (2005, p. 13-14) assim entende:

A redação do artigo 185, inc. II, ao estabelecer que a propriedade produtiva é insuscetível de desapropriação para fins de reforma agrária, aparentemente teria esvaziado o conteúdo do princípio da função social, uma vez que, nestes termos, a propriedade produtiva (que atendesse, portanto, somente ao inc. I do art. 186) estaria imune à desapropriação- sanção, ainda que não cumprisse as demais especificações elencadas no artigo 186. Esta polêmica foi muito bem tratada por Marcelo Dias Varella (1998) que, utilizando-se das regras ensinadas por Norberto Bobbio, explicou os critérios para a superação da incompatibilidade entre os dois dispositivos constitucionais (art. 185, inc. II e art. 186). Neste aspecto, adotamos o entendimento pelo qual as normas constitucionais devem ser interpretadas de forma a coexistirem no ordenamento jurídico, mantendo-se a aplicabilidade de ambos os artigos, o que resultaria numa antinomia apenas aparente. Desta feita, para ser considerada produtiva (na forma do art. 185, inc. II), a propriedade deve, além de ser produtiva (no sentido puramente economicista – inc. I, do art. 186), observar os outros três critérios impostos para o cumprimento da função social da propriedade, atendendo ao meio ambiente, possuindo boas relações de trabalho e promovendo o bem-estar social.

Tepedino (2002, p. 15) se manifesta dizendo que:

A propriedade produtiva, a que se refere o art. 185, torna insuscetível de desapropriação não a propriedade apenas economicamente produtiva, meramente especulativa – não a propriedade com a qual talvez tenham sonhado os autores desse dispositivo; mas a propriedade que, sendo produtiva, esteja efetivamente cumprindo a sua função social, cujo exercício passa ser associado à da redistribuição de riqueza; que promova com a sua utilização os princípios fundamentais da República.

Franco Sobrinho apud Marquesi (2012) sustenta que a propriedade produtiva, avessa aos requisitos constitucionais funcionalizantes, pode ser desapropriada, pois o interesse social é definido por um plexo de condições positivadas, condições que retratam a função das coisas, protegendo os imóveis que a cumprem e sancionando os refratários, inclusive os que não observam as normas que tutelam o trabalho.

Se a produção é o valor fundamental e se, ao que parece, está ela muito atrelada à alta tecnologia e à capitalização, não faria sentido permitir-se o parcelamento daquelas unidades agrárias que se encontram em plenas condições de produção em um sem número de pequenas propriedades.

Diante de tais divergências, é oportuno mencionar a decisão do Supremo Tribunal Federal no Mandado de Segurança nº 22022-ES, contra decreto de desapropriação para fins de reforma agrária. O Tribunal Superior julgou que a propriedade produtiva, independentemente de sua extensão territorial e da circunstância de o seu titular ser ou não proprietário de outro imóvel rural, revela-se intangível à ação expropriatória, quando comprovado o grau de produtividade.

MANDADO DE SEGURANÇA - IMÓVEL RURAL - DESAPROPRIAÇÃO PARA REFORMA AGRARIA - OFENSA A COISA JULGADA - INOCORRÊNCIA - EXISTÊNCIA DE MAIS DE UM IMÓVEL RURAL EM NOME DOS IMPETRANTES - IMPOSSIBILIDADE DE INCIDENCIA DA CLÁUSULA CONSTITUCIONAL DE INEXPROPRIABILIDADE (CF, ART. 185,"IN FINE")- INVOCAÇÃO DA PRODUTIVIDADE FUNDIARIA COMO FUNDAMENTO AUTONOMO DE IMPUGNAÇÃO DO DECRETO PRESIDENCIAL (CF, ART. 185, II) - CONTROVÉRSIA SOBRE A PRODUTIVIDADE DO IMÓVEL - ILIQUIDEZ DO DIREITO ALEGADO - "WRIT" DENEGADO . - A CIRCUNSTANCIA DE HAVER SIDO ANTERIORMENTE CONCEDIDO MANDADO DE SEGURANÇA AOS IMPETRANTES, EM VIRTUDE DA AUSÊNCIA DOS ATOS LEGISLATIVOS RECLAMADOS PELOS ARTS. 184, PAR.3., E 185, I, DA CONSTITUIÇÃO, NÃO IMPEDE QUE O PRESIDENTE DA REPUBLICA, TENDO PRESENTE A EDIÇÃO SUPERVENIENTE DA LEI COMPLEMENTAR N. 76/93 E DA LEI N. 8.629/93 - E UMA VEZ OBSERVADOS OS PRESSUPOSTOS NELAS ESTABELECIDOS -, VENHA A RENOVAR, PARA FINS DE REFORMA AGRARIA, E SEM QUALQUER OFENSA A AUTORIDADE DA COISA JULGADA, DECLARAÇÃO EXPROPRIATORIA CONCERNENTE AO MESMO IMÓVEL RURAL . - PARA EFEITO DE REFORMA AGRARIA, A MEDIA PROPRIEDADE RURAL, AINDA QUE IMPRODUTIVA, CONSTITUI BEM OBJETIVAMENTE IMUNE A AÇÃO EXPROPRIATORIA DA UNIÃO FEDERAL, DESDE QUE O SEU TITULAR NÃO POSSUA