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Adequação de nomenclaturas

No documento thais argollo (páginas 58-62)

CAPÍTULO 3: COMUNICAÇÃO INTERNA NÃO É ENDOMARKETING 3.1 Endomarketing existe?

3.1.2 Adequação de nomenclaturas

O conflito inicial do uso do termo endomarketing está no “sufixo” marketing. Bekin conhece bem o seu significado, definindo marketing como “o processo que envolve a concepção, a produção, a fixação do preço, a promoção e a distribuição de produtos ou serviços com a finalidade de satisfazer as necessidades e expectativas dos clientes” (BEKIN, 1995, p. 22). Porém, logo na sequência ele afirma que “é preciso ter marketing eficiente dentro da organização para que, a partir daí, como parte do trabalho de todos, ele se irradie para fora” (BEKIN, 1995, p. 38). O autor, que já foi gerente de Marketing, peca ao reduzir o conceito de marketing em um apenas um de seus quatro P’s: a promoção. YANAZE critica esse mau uso do termo, afirmando que:

tornou-se comum ouvirmos a afirmação de que determinado produto é ruim, mas seu "marketing" muito bom. Ora, não é necessário que façamos muitas análises para constatarmos que, se o produto é ruim, se seu preço é inadequado e sua distribuição ineficiente, seu marketing não pode ser "muito bom"; ao contrário, ele é, necessariamente, péssimo. O que pode ocorrer é de sua comunicação ser muito boa, não seu marketing. Essa é uma das confusões mais recorrentes entre Comunicação e Marketing, em que uma atividade chega a se reduzir e a se confundir com a outra, dificultando, às vezes, a apreensão da atividade do profissional de marketing; provavelmente dessa confusão decorre a identificação depreciativa "marketeiro". (YANAZE, 2001)

A adoção de terminologias da área de marketing para uso distinto do conceito original não para por aí. Em sua conceituação de endomarketing, Bekin afirma que uma das premissas para se criar um processo de endomarketing é: “Funcionários têm expectativas e constituem o primeiro mercado para a organização. Assim, funcionários devem ser tratados como clientes e valorizados como pessoas” (BEKIN, 2002, p. 26). Ora, se cliente é entendido como um consumidor frequente que adquire algum produto ou serviço para seu consumo, o funcionário não poderia ser encarado como um cliente para a empresa, pois na relação remunerativa entre a organização e o empregado o funcionário não compra o salário, ao contrário, ele vende a sua força de trabalho; logo, ele é um fornecedor. Em consequencia, chamar o funcionário de “cliente interno” denota uma visão totalmente distorcida da relação empresa-empregado: no lugar de se criar significados compartilhados, a idéia do “cliente interno” é vender os atributos da empresa para aqueles que justamente constroem esses atributos junto com a organização.

Em outro ponto, ao reforçar que a “noção de marketing” deve estar presente em todos os setores, Bekin afirma que “trata-se de fazer com que os valores da cultura de serviço possam se integrar ao cotidiano da empresa, de torná-la efetiva.” (BEKIN, 1995, p. 51). Essa efetivação, segundo o autor, passaria pela disseminação do conceito de marketing dentro da organização, conforme afirma:

A idéia central está baseada no marketing como uma realidade que deve atravessar toda a empresa, que deve conjugar os esforços de todos os setores. É fundamental, por exemplo, levar a consciência desta atitude até o setor de pesquisa e desenvolvimento de produtos. (BEKIN, 1995, p. 42).

Nesta proposição, poderíamos trocar a palavra “marketing” por “cultura organizacional”, que, como já vimos, é a bússola que deve conduzir os funcionários a uma mesma direção: a dos objetivos organizacionais. A cultura organizacional abarca em seu escopo o marketing e inclui outras premissas, como a missão, visão e valores de uma organização. O conhecimento dos produtos, portanto, seria uma consequencia da internalizarão da cultura da organização.

Percebe-se que Bekin utilizou a “cultura de foco no cliente”, que prevê ações específicas voltadas aos funcionários (comunicar, treinar, controlar etc.), como mote para a criação de uma nomenclatura que assumiria as responsabilidades da Comunicação Corporativa e do RH. Entretanto, o chamado endomarketing não se sustenta como conceito, já que não tem uma função clara, e isso gera um conflito interno de funções. Por exemplo, o papel de disseminação da cultura organizacional para o público interno já é da área de Comunicação Interna, que faz mais do que incutir no funcionário os valores de serviços. Ela trabalha as noções de ética, gestão de pessoas, saúde e segurança, sustentabilidade e outros aspectos que são fundamentais na relação empresa-funcionário e que refletem positivamente na relação com os clientes.

É devido a essas ambigüidades que Fasti escreveu o artigo “Esqueçam endomarketing”, em que afirma que o conceito é artificial. Fasti, inclusive, discorda da aplicação deste conceito pura e simplesmente para o trabalho de motivação do público interno. Ele afirma que:

marketing é um conceito único relacionado a mercado e trocas, a resultados relacionados a lucro e participação de mercado pelo atendimento eficaz de um grupo de consumidores. O ambiente interno de uma empresa não pode ser caracterizado como um mercado, mas como um organismo vivo que necessita de organização conduzida por impulsos nervosos de significado universal, de sorte que todos os

órgãos compreendam seus papéis e ajam em prol de sua perpetuação (Fasti apud KUNSCH, 2003, p. 155).

A Comunicação Interna, como vimos no capítulo anterior, é um processo de criação de vínculos e compromissos entre a organização e seus funcionários, e que visa não uma relação comercial com os funcionários, mas uma relação institucional baseada na promoção do equilíbrio na relação empresa-empregado. Além disso, como mostra o capítulo 1, essa relação não se baseia apenas no poder da compra do trabalho (remunerativo); as pessoas também se engajam pelos princípios e até mesmo pela pressão e medo de perder o emprego, reflexo, respectivamente, das relações normativas (valores e princípios) e coercitivas (punição). As organizações, portanto, devem trabalhar as relações produzidas por esses três tipos de poder, e a área responsável por isso é a Comunicação Interna.

Estamos diante, portanto, de uma confusão de papéis e nomenclaturas semelhante ao que ocorreu com o termo “merchandising”. Em inglês, merchand é mercador. Merchandising, portanto, significa destacar a mercadoria, ação que ocorre no ponto-de-venda para melhorar a visibilidade do produto ou da marca e estimular a decisão de compra dos consumidores. Entretanto, o nome é comumente usado para designar a prática da inclusão sutil de produtos, serviços, marcas e empresas em obras de entretenimento, principalmente audiovisuais, como novelas, filmes, games etc. Nestes casos a terminologia correta seria Merchandising Editorial ou Tie In (ONLY).

A origem desses tipos de equívocos costuma ser desconhecida, mas, uma vez popularizados, esses termos acabam desgastando os conceitos originais. É por isso que YANAZE (2000) discorda do uso do termo marketing para as mais diferentes práticas, como marketing de relacionamento, marketing promocional, marketing de incentivo e, mesmo, endomarketing. Ele esclarece que a confusão se dá porque cada vez mais as pessoas usam o marketing como forma de "agregar valor” (telemarketing, por exemplo, no lugar de televendas), fugindo do conceito original de ser uma ferramenta do planejamento estratégico das organizações. YANAZE afirma, por exemplo, que:

Marketing, antes de ser uma atividade do ‘Departamento de Marketing da empresa’, é uma responsabilidade que envolve todos os que compõem a organização. Entretanto, para entendermos o sentido dessa responsabilidade, seria necessário revermos a própria palavra Marketing, atualmente bastante desgastada por estar sendo utilizada, geralmente de forma inadequada, para designar atividades as mais variadas. (YANAZE, 2001)

Nota-se, portanto, que o termo endomarketing, que veio dar notoriedade a uma ação de comunicação interna – pelo “glamour” que o nome Marketing conquistou –, acaba confundindo e dificultando ainda mais o entendimento das atividades voltadas aos relacionamentos institucionais, e não comerciais. O endomarketing, portanto, não cabe como ferramenta da Comunicação Corporativa.

Como vimos, semanticamente e conceitualmente o endomarketing se resumiria a uma ação comercial de venda para os empregados. Dessa forma, a única área que poderia se apropriar do termo é o próprio Marketing, se assim quiser chamar a relação comercial da empresa com o seu público interno, na venda dos serviços e/ou produtos da companhia. Nestes casos, é comum haver privilégios, como descontos ou promoções exclusivas para os funcionários. O endomarketing, portanto, promoveria a interface com a área de Recursos Humanos (gerindo o benefício ao funcionário) e com a Comunicação Corporativa (ao transformar essa ação comercial em um conceito aliado à valorização do funcionário, à estratégia de privilegiá-lo como membro da empresa e formador de opinião). O termo passaria a designar uma ação – venda para funcionários -, não um conceito, e o papel e responsabilidades das três áreas (Marketing, Recursos Humanos e Comunicação Corporativa) estariam claramente definidos.

No documento thais argollo (páginas 58-62)

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