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ADI 70013069422 – Lei nº 4.450/05 – Fixa valor mínimo do piso salarial do

2.3 Análise de espécies normativas municipais declaradas inconstitucionais pelo

2.3.2 ADI 70013069422 – Lei nº 4.450/05 – Fixa valor mínimo do piso salarial do

Outra questão de todo relevante diz respeito à Ação Direta de Inconstitucionalidade da Lei nº 4.450/05, que fixa o valor do salário mínimo básico de percepção salarial no Município de Ijuí e dá outras providências. Após o Prefeito Municipal de Ijuí ter encaminhado o Projeto de Lei (PL) para apreciação da Câmara de Vereadores, estes o alteraram substancialmente por meio de emenda, especialmente quanto à remuneração mínima dos servidores municipais.

Seguindo o rito procedimental do processo legislativo, o Chefe do Poder Executivo, não concordando com a referida modificação, vetou o projeto em questão, entretanto, a Câmara de Vereadores “derrubou” o veto e, por meio da Resolução nº 5.578/05 e promulgou o texto da forma como se encontrava, resultando, portanto, na Lei n. 4.450/05.

Neste sentido, a ADI 70013069422 manifesta: “A toda evidência, o Legislativo, ao alterar a data para aumento da remuneração básica do Município, dispôs, diretamente, sobre o aumento da remuneração dos servidores, matéria, ainda, atinente ao regime jurídico dos servidores.” (MUNICÍPIO DE IJUÍ, 2005, p. 5). Denota-se, assim, vício formal referente à iniciativa, pois por força da CF/88, art. 29, bem como do art. 8º da Constituição Estadual, esta matéria é de competência privativa do Executivo.

Salienta Hely Lopes Meirelles (2000, p. 559) que:

As regras gerais que veiculam os princípios do processo legislativo são impositivas para as três esferas do governo. A legislação local não pode restringi-las nem ampliá-las. São dispositivos inarredáveis, considerados de importância primordial

para a regência das relações harmônicas e independentes dos Poderes. Dizem respeito à própria configuração do Estado, em seu modelo de organização política, retraçado pela nova ordem constitucional. Dele, o Município, como integrante da Federação, não pode se afastar.

Entende-se, assim, que o impulso oficial de uma lei é a iniciativa e, neste caso, houve usurpação da competência privativa do Chefe do Poder Executivo, e somente ele pode oferecer modificações substanciais. Meirelles (2000, p. 560) adverte nesse sentido que “[...] A usurpação de iniciativa conduz à irremediável nulidade da lei, insanável mesmo pela sanção ou promulgação de quem poderia oferecer o projeto.”

Percebe-se claramente que a norma que ora se discute (ADI 70013069422) desconsiderou os princípios constitucionais referentes às competências, “[...] ferindo de morte o princípio da independência e a harmonia dos poderes.” (MUNICÍPIO DE IJUÍ, 2005, p. 6). Confirmou, portanto, que aquilo que é exclusivo de um Poder não pode ser disposto por outro sobre a mesma matéria.

Assim, os ensinamentos de João Barbalho Uchõa Cavalcanti (1994, p. 72) são pertinentes à matéria em exame:

[...] E convém advertir aqui – para perfeita inteligência do que se refere ás atribuições de cada um desses ramos do poder público nacional, - que essas atribuições não passam alem das que estão expressamente consagradas na Constituição (poderes enumerados e limitados) e das que destas decorrem como condição necessária para que possam ser exercidas (poderes implícitos ou por compreensão). Isto resulta da própria índole do sistema do governo consagrado pela Constituição.

Observa-se que as atribuições consagradas no texto constitucional não podem ser violadas e estão sujeitas à apreciação do Poder Judiciário por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade.

É imprescindível esclarecer que a conduta da Câmara de Vereadores que modificou o Projeto de Lei encaminhado pelo Chefe do Poder Executivo está eivada de vícios, sendo que essa interferência do Legislativo em matéria privativa do Prefeito restará em aumento de despesa. Conforme o disposto no art. 61, I, da Carta Magna Estadual, há explícita vedação ao aumento de despesas previstas nos projetos de iniciativa privativa do Governador.

Para corroborar o exposto transcreve-se parte da petição do chefe do Poder Executivo do Município de Ijuí quando propôs a ADI 70013069422 (Pedido de Liminar):

Ainda, esta sendo ferido o disposto no art. 154, inc. X, da Constituição Estadual e 169, § 1º, da Carta Federal, que vedam “a concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração, a criação de cargos ou alteração da estrutura de carreiras, bem como a admissão de pessoal, a qualquer titulo, pelos órgãos e entidades da administração direta ou indireta” se não houver “prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimo dela decorrentes”; e “autorização especifica na lei de diretrizes orçamentárias, [...]”. Por óbvio, no orçamento do Município há, tão-somente, provisão de recursos para atender o reajuste a partir do mês de junho, conforme redação original do projeto encaminhado pelo Chefe do Executivo, ou seja, não houve a consideração da despesa decorrente do aumento no mês de maio, nos termos da redação dada pelo Legislativo. (MUNICÍPIO DE IJUÍ, 2005, p. 11, grifo nosso).

É bem verdade que a CF/88 deixa claro que não há como conceder aumento de remuneração, é oportuno destacar o posicionamento do Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul ao tratar do assunto no Pedido de Liminar:

De outra parte, a norma em comento deve merecer interpretação, sistematizada com os demais ditames constitucionais, descabendo sua análise isolada, competindo à autoridade responsável considerar, no exame da matéria, entre outros, a real capacidade do erário público em conceder a revisão e/ou os limites previstos para a remuneração dos servidores e das despesas com pessoal – também normas constitucionais – postos, respectivamente, no art. 37. XI e art. 169, caput. (12) Assim, inobstante tema delicado, a interpretação das normas constitucionais requer do analista atenção à integralidade da Constituição e, também às suas aparentes contradições. Nem sempre uma interpretação isolada do versículo legal nos autoriza a concluir seu perfeito sentido.

Neste particular, torna-se oportuno reproduzirmos doutrina de Canotilho, citada no Parecer da Auditoria nº 42/2000(13), no sentido de que “a interpretação da Constituição perpassa por ‘princípios tópicos de interpretação constitucional’, dos quais se destaca o princípio da unidade da constituição que ‘ganha relevo autônomo como princípio interpretativo quando ele se quer significar que a constituição deve ser interpretada de forma a evitar contradições (antinomias, antagonismos) entre suas normas’, obrigando o intérprete a considerar a constituição na sua globalidade e a procurar harmonizar os espaços de tensão existentes entre as normas constitucionais a concretizar [...]”. Daí que o intérprete deve sempre considerar as normas constitucionais não como normas isoladas e dispersas, mas sim como preceitos integrados num sistema interno unitário de normas e princípios. (MUNICÍPIO DE IJUÍ, 2005, p. 12-13).

Após as considerações efetuadas sobre a arguição de inconstitucionalidade pode-se afirmar que “[...] a lei sub examen é absolutamente INCONSTITUCIONAL sob o ponto de vista formal, visto padecer de insuperável vício de iniciativa, eis que a matéria legislativa no mesmo é de competência exclusiva do Chefe do Poder Executivo Municipal.” (MUNICÍPIO DE IJUÍ, 2005, p. 14, grifo do autor).

O Legislativo não pode encaminhar projeto de lei, seja para criação ou extinção de cargos públicos, seja para a admissão de pessoal, quando implicar em aumento de despesas ou interferência no orçamento municipal.

Por derradeiro, faz-se necessário colacionar o voto do relator Des. João Carlos Branco Cardoso, que deixa evidente no Despacho, que houve lesão ao princípio da harmonia e independência. Ao conceder a liminar pleiteada, o relator assim se manifesta:

Está configurada, na espécie, a plausibilidade da argumentação do Senhor Prefeito Municipal, contendo o diploma legal impugnado aos apontados vícios, na medida em que, conforme demonstrado na bem elaborada peça inicial, a emenda legislativa, ainda que observada a pertinência temática em relação ao projeto de lei, ocasiona aumento nas despesas previstas para os servidores.

O egrégio Supremo Tribunal Federal tem o entendimento de que nas matérias de iniciativa reservada, as restrições ao poder de emenda ficam reduzidas á proibição de aumento de despesas e á hipótese de impertinência da emenda ao tema do projeto, conforme se observa da decisão da Segunda Turma (Recurso Extraordinário nº 191191/PR, julgado em 12/12/97, relator Ministro Carlos Velloso): “EMENTA: COMSTITUCIONAL. PROCESSO LEGISLATIVO. PODER DE EMENDA PARLAMENTAR: PROJETO DE INICIATIVA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. SERVIDOR PÚBLICO: REMUNERAÇÃO: TETO. C.F., art. 96, II, b. C.F., art. 37, XI. I. – Matérias de iniciativa reservada: as restrições ao poder de emenda ficam reduzidas á proibição de aumento de despesa e á hipótese de impertinência da emenda ao tema do projeto. Precedentes do STF: RE 140.542-RJ, Galvão, Plenário, 30.09.93; ADIn 574, Galvão; RE 120.331-CE, Borja, “DJ” 08.04.94. II. – Remuneração dos servidores do Poder Judiciário; o teto a ser observado, no Judiciário da União, é a remuneração do Ministro do S.T.F. Nos Estados-membros, a remuneração percebida pelo Desembargador. C.F., art. 37, XI. III. – R.E. não conhecido.”

No caso concreto, a emenda legislativa implicou em aumento de despesa, configurando-se a inconstitucionalidade formal da lei impugnada, prevalecendo a reserva de iniciativa do Poder Executivo. (MUNICÍPIO DE IJUÍ, 2005, p. 1-2).

Na verdade, a emenda produzida pela Câmara de Vereadores do Município de Ijuí, alterando o projeto original do Executivo, apresenta-se inconstitucional. E, como tal, a Lei 4.450, de 25 de agosto de 2005, foi julgada procedente e declarada inconstitucional, sendo retirada do ordenamento jurídico.