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Distinção entre lei federal, estadual e municipal

Há que se fazer distinção entre as espécies normativas elaboradas pelo Poder Legislativo federal, estadual e municipal a fim de compreender que não há hierarquia entre as leis, apenas a superioridade da Constituição Federal. Destarte, decorre do próprio texto constitucional a atribuição de competência legislativa para que cada ente federativo atue em uma esfera predeterminada. Ou seja, a “autonomia das entidades federativas pressupõe repartição de competências para o exercício e desenvolvimento de sua atividade normativa” (SILVA, 2011, p. 477).

É interessante observar que o princípio da predominância do interesse é que determina a área de atuação no Poder Legislativo federal, estadual e municipal, que será enfocado com mais ênfase nesta pesquisa. Sobre este tema assevera Silva (2011, p. 478) que:

O princípio geral que norteia a repartição de competência entre as entidades componentes do Estado federal é o da predominância do interesse, segundo o qual à União caberão aquelas matérias e questões de predominante interesse geral, nacional, ao passo que aos Estados tocarão as matérias e assuntos de predominante interesse regional, e aos Municípios concernem os assuntos de interesse local, tendo a Constituição vigente desprezado o velho conceito do peculiar interesse local que não logrará conceituação satisfatória em um século de vigência.

À primeira vista parece que não há como diferenciar o interesse geral do nacional e o regional do municipal, pois muitas situações semelhantes perpassam todas as esferas públicas e políticas, afetando o Estado como um todo. Por essa razão, a Constituição Federal de 1988, nos arts. 21 a 24, reparte as competências entre a União, Estados e Municípios, num primeiro momento, para posteriormente explicitar no art. 30 as competências de interesse local pertencentes ao ente federativo municipal. Não se pode esquecer, entretanto, que os Estados, de acordo o art. 25, § 1º, possuem apenas competências reservadas, ou seja, tudo aquilo que não for enumerado taxativamente à União e aos Municípios é remanescente dos Estados.

Marlene Grasso Savóia ([s.d.], p. 25), ao analisar a diferença entre leis nacionais e federais informa que “as leis nacionais são aquelas que não se circunscrevem ao âmbito de qualquer das pessoas políticas. Ela transcende às três. Seu âmbito de incidência é geral, global.” Ou seja, as leis nacionais têm um campo próprio de atuação que exclui as demais pessoas políticas e incide sobre todas as pessoas que convivem no território brasileiro.

A referida autora continua sua análise ressaltando que as leis federais incidem sobre parcela da população, sendo sua ordem parcial, e cita como exemplo a Lei Federal nº 8.112/90, que trata do Estatuto do Servidor Público Federal.

Quando se afirma que a Constituição Federal de 1988 adota um sistema complexo quanto à repartição de competências está se afirmando que o constituinte teve o cuidado de deixar bem claro em quais campos de atuação cada ente federativo poderia atuar. Isso significa que a legislação federal estabelece normas gerais, diretrizes ou políticas gerais, cabendo privativamente à União, enquanto que a legislação regional, de matérias específicas compete concorrentemente aos Estados e Municípios. Para este último a competência é suplementar à legislação federal e estadual desde que presente o interesse local.

Neste sentido, Silva (2011, p. 479, grifos do autor) explica que:

A nossa Constituição adota esse sistema complexo que busca realizar o equilíbrio federativo, por meio de uma repartição de competências que se fundamenta na técnica da enumeração dos poderes da União (arts. 21 e 22), com poderes remanescentes para os Estados (art. 25, § 1º) e poderes definidos indicativamente para os Municípios (art. 30), mas combina, com essa reserva de campos específicos (nem sempre exclusivos, mas apenas privativos), possibilidades de delegação (art. 22, parágrafo único), áreas comuns em que se preveem atuações paralelas da União, Estados, Distrito Federal e Municípios (art. 23) e setores concorrentes entre União e Estados em que a competência para estabelecer políticas gerais, diretrizes gerais ou normas gerais cabe à União, enquanto se defere aos Estados e até aos Municípios a competência suplementar.

Isso permite afirmar que no Estado brasileiro não há hierarquia entre as espécies normativas federal, estadual e municipal, haja vista que cada ente federativo atua num campo específico de seu interesse e a autonomia federativa é o ponto nuclear do Estado Federal.

Para corroborar o exposto, Savóia ([s.d.], p. 37) afirma que:

Não tem cabimento falar-se em hierarquia das leis no nosso sistema constitucional. As leis, sejam federais, estaduais, ou municipais, são normas de igual natureza em decorrência da isonomia das respectivas fontes. Assim, o conflito é impossível, em virtude da harmonia interna do sistema constitucional de repartição de competências.

Assim, em decorrência da atuação do Poder Legislativo municipal na elaboração de leis que visam ao atendimento do interesse local é que, muitas vezes, no intuito de realizar suas atividades para efetivação das demandas sociais, são encaminhados projetos de lei que contrariam a Constituição Federal. Registra-se, também, que as espécies normativas municipais emanam do Poder Executivo e que este também encaminha projetos de lei com vício formal e material.

Tudo isso ocorre com a produção de atos legislativos ou administrativos contrários à CF/88, que violam o procedimento legislativo que se refere às formalidades impostas ao legislador para dar um bom encaminhamento ao projeto, e também as matérias de competência privativa do Executivo que os parlamentares utilizam como se fosse sua atribuição.

Cita-se como exemplo a Lei Municipal nº 4.766, de 19 de dezembro de 2007, cujo pedido de inconstitucionalidade é analisado logo a seguir. A seu respeito o Poder Executivo

municipal sustenta que a referida lei está eivada de inconstitucionalidade no seu processo de formação, que nada mais é do que um vício formal. Adianta-se que a referida lei também foi julgada improcedente pelo TJ/RS, ou seja, foi declarada inconstitucional.

Outro aspecto que deve ser destacado é com relação ao vício material detectado na Lei 4.450/05, isto é, objeto de Ação Direta de Inconstitucionalidade do Município de Ijuí, que fixa o valor mínimo do seu piso salarial. Nesse sentido pode-se afirmar que houve interferência do Poder Legislativo municipal em matéria de competência privativa do Executivo no que tange à alteração da remuneração mínima dos servidores públicos municipais, posto que tal medida tem reflexo negativo direto no orçamento municipal.

Desta forma, torna-se imprescindível o controle de constitucionalidade das leis municipais que violam preceitos constitucionais.