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O turbilhão de mudanças que vem ocorrendo na sociedade da informação impõe uma dinâmica de adaptação aos órgãos públicos. Por isso foi importante investir nesse tema de pesquisa e propor um modelo de análise mais completo, embora mais complexo. Toda trajetória percorrida de pesquisa atende a apontamentos de que há muito que avançar nos estudos de aprendizagem organizacional (ANTONACOPOULOU e CHIVA, 2007) e interorganizacional (HOLMQVIST, 2009), especialmente no setor público. O futuro da Administração Pública caminha no sentido do uso intensivo da tecnologia da informação e da aprendizagem

interorganizacional para alcançar inovações abertas. Assim, toda contribuição com a exploração do campo pode ampliar a compreensão mais ampla do fenômeno.

Diversos autores propõem a articulação conceitual entre inovação, aprendizagem organizacional (COHEN e LEVINTHAL, 1990; GARCIA-MORALES, LLORENS- MONTES, e VERDÚ-JOVER, 2006; CHIVA, GHAURI e ALEGRE, 2014; ISIDRO-FILHO e GUIMARÃES, 2010; GUIMARÃES et al., 2011), relacionamentos interorganizacionais (NOOTEBOOM, 2014) e competências (ARAÚJO, DA SILVA e BRANDÃO, 2015). Cabe, entretanto, uma discussão sobre o contexto da inovação no setor público e as dificuldades verificadas para pesquisas sobre o tema.

Se levarmos o princípio da legalidade do Direito Administrativo ao sentido estrito, inovar no setor público seria, por definição, ilegal. Isso porque esse princípio determina que a Administração Pública está estritamente vinculada à lei, podendo fazer somente o que a lei autoriza. Na ausência de previsão legal, nada pode ser inovado, ficando a Administração Pública engessada. Esse é o primeiro desafio para promover mudanças no setor público. Além de ilegal, inovação no setor público não gera incentivos positivos, porque não há previsão de remuneração para o empreendedor público inovador, seja qual for sua origem. Daí a impressão generalizada de que a Administração Pública está parada no passado e que não se transforma (GRAEF e SALGADO, 2012).

A partir de 18 de novembro de 2011, a administração pública brasileira passou a se deparar com um desafio transformador. A partir da vigência da Lei nº 12.527, chamada Lei de Acesso à Informação (LAI), a administração se viu confrontada com uma mudança não apenas institucional, mas cultural. A LAI regula o acesso a informações públicas previsto no inciso XXXIII do art. 5º, no inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da Constituição Federal, é válida para a União, estados, Distrito Federal e municípios, bem como para os três poderes, Executivo, Legislativo e Judiciário. Este instituto vem colocando em xeque, nos últimos quatro anos, um dos principais pilares de dominação racional-legal, conforme tipificado por Weber: o fortalecimento da burocracia pelo domínio do conhecimento, da documentação de Estado e do segredo oficial. Trata-se de um passo decisivo na direção de uma gestão pública focada não somente nos resultados para o cidadão, mas também em uma nova relação entre estado e sociedade. Em plena era da informação, considerando a afirmação de que informação é poder, na linha de Weber, o poder está um pouco mais nas mãos do povo, mais efetivamente. O amplo acesso que a LAI garante ao cidadão comum, independente de motivação, vem trazendo um amadurecimento da cultura burocrática vigente e mudanças comportamentais dos servidores

públicos e dirigentes. Desde o Plano Diretor da Reforma do Estado, de 1994, este pode ser considerado um novo marco para a Administração Pública, a despeito das resistências e da implementação ainda parcial em diversos setores.

Nesse contexto de transformações, mudanças e resistências a mudanças (aparentemente ameaçadoras), a Administração Pública carece de investigações relacionadas ao tema da colaboração interorganizacional para aprendizagem, um foco crescente das pesquisas do campo de públicas. Colaboração implica trabalho conjunto, compartilhamento de conhecimento e geração de ideias (inovação) por meio de desenvolvimento colaborativo. Neste cenário em que a abertura de dados públicos se populariza, as possibilidades de criação de soluções pelo governo ou pela própria sociedade serão incrementadas, favorecendo o aparecimento de novas oportunidades para elaborar alternativas inovadoras para melhoria da prestação de serviços públicos (NAZÁRIO et al., 2012). Portanto, a disponibilização de dados públicos de interesse coletivo ou geral tem grande potencial para agregar valor à administração pública e à própria sociedade, com ampliação da participação social e empoderamento do cidadão (BRASIL, 2014).

A pesquisa realizada também corrobora com Olsen e Peters (1996), que mostraram que processos de aprendizagem no setor público são afetados por fatores políticos (instituições políticas e legados) a partir dos estudos de oito reformas administrativas ocorridas em oito democracias: Austrália, França, Alemanha, Japão, Noruega, Suíça, Reino Unido e Estados Unidos. Portanto, as pesquisas realizadas se alinham a esses autores no sentido de recomendar a inclusão dessa dimensão ao framework proposto por Mozzato e Bitencourt (2013), para o estudo de aprendizagem no setor público.

Consistente com literatura prévia, estudo de Wofford, Ellinger, Watkins (2013) reforça a importância da interação entre líderes, gestores, colegas e pares no processo de aprendizagem informal. O estudo revela elementos de destaque para a aprendizagem informal, como as interações sociais e a cultura colaborativa, baseada em confiança, comunicação aberta e oportunidades para o engajamento na prática reflexiva. Assim, o estudo recomenda aos gerentes investir tempo necessário para oferecer suporte ao desenvolvimento de ambiente colaborativo no trabalho para potencializar a aprendizagem informal. Na mesma linha de análise, Lipshitz, Popper e Friedman (2002) destacam, em seu modelo multifacetado de aprendizagem organizacional, o aspecto político, representado pelas etapas formais e informais tomadas pela administração para promover a aprendizagem organizacional, indicando particularmente o engajamento para contrabalançar as considerações políticas que inibem os gerentes na promoção da transparência, segurança e responsabilidade. Para os autores, três políticas são

particularmente importantes para promover a aprendizagem: (a) compromisso com as pessoas, com política voltada a reduzir diferenças hierárquicas, promover tratamento justo aos subordinados e garantir segurança; (b) tolerância a erros, com a contribuição dos gerentes à segurança psicológica; (c) compromisso com a aprendizagem, representado pela forma como a organização aloca recursos (tempo, orçamento e pessoas).

Nesse diapasão, o caminho mais curto para a criação de ambientes que favoreçam a inovação no setor público é o fomento e desenvolvimento de relacionamentos interorganizacionais ativos. Gerar esferas de experimentação e trocas, realizar alianças estratégicas, seja com terceiro setor nacional ou internacional, seja por meio da cooperação técnica internacional, potencializa o surgimento de ideias, reconfiguração de recursos, aprendizagem interorganizacional, aumento da confiança e possibilidades de laboratórios. Deve-se aproveitar também as linhas de interação de menor resistência, como as organizações públicas de propósitos similares, geralmente vinculadas em associação não-governamental (Consad, Conseplan, Conaci, Confaz, Fonsea, Conass etc.). Por fim, não se pode ter preconceitos com o setor privado, desde que a interação seja em benefício público, com propósitos claros e transparentes. Apesar de tudo, reconhece-se o desafio de estimular a pesquisa sobre inovação no setor público, e é notória a predominância do setor privado nas pesquisas do tema. Há que transformar a cultura, para uma efetiva gestão pública pró-inovação. O mesmo teve que ocorrer para a efetivação da transparência e da participação no setor público. Um portfólio de possibilidades está disponível para uma gestão pública inovadora, especialmente no uso intensivo de tecnologia em substituição ao uso intensivo de controles redundantes e caros que as administrações públicas costumam gerar para o fornecimento de serviços. O uso de big data e de ferramentas de georeferenciamento ainda podem produzir inovações capazes de mudar a forma de prestar serviços e informações, como, por exemplo a disponibilização de trajetórias e horários dos ônibus aos usuários com smartphones. As comunidades de práticas e o diálogo interdisciplinar precisam ser fomentados na Administração. Ferramentas da nova geração da internet podem ser aplicadas ao terceiro setor e, eventualmente, ao setor público, como: cross-fertilization; crowdfunding; enabling

institutions; venture capital, entre outros.