• Nenhum resultado encontrado

Os administrativos do Bispo

No documento O Porto em Cortes : 1331-1406 (páginas 53-55)

Percentagem de respostas dadas em função dos pedidos apresentados

11. Os administrativos do Bispo

Um dos funcionários mais importantes da estrutura clerical era o mordomo. A referência a este aparece-nos quase na generalidade dos diplomas régios importantes e nas cartas de couto, atribuídas por reis, nobres ou clero. Desempenha funções de carácter económico, nomeadamente as referidas a impostos. Debaixo da sua dependência e jurisdição estariam um leque variado de funcionários que se encarregariam, entre outras funções, de penhoras, execuções e atestações. Numa carta régia dada pelo rei D. Dinis, datada de 1331, surgem-nos referências a "...moordomos e

ouençaees.."154 "...o moor domo...por todas as penhoras e execuçoões que fizer na dita

cidade auerá de cada marauevi dous djnheiros.."155 "...os moordomos fazem as

testaçoões..."156

Estariam na sua dependência um conjunto de funcionários encarregues do recebimento de impostos devidos ao senhorio e referentes a portagens, ancoragens e aforamentos de barcas (designavam-se porteiros, dizimeiros, sacadores, relegueiros, etc.). A tributação de produtos entrados ou saídos na cidade, tais como a carne, o peixe, pão, vinho, frutas, roupas, etc. pertencia aos"...moordomos e ofiçiaaes na dita

1 cn

Cidade...sacam os dereytos do Senhoryo da dita Egreja".

Sobre os abusos deste funcionário clerical encontramos, pelo menos, uma referência numa sessão camarária de 1403, em que o mesmo é acusado de levar mais do

1 S Si que aquilo que devia levar e que se encontrava estipulado no foral.

12. Os Reis

À semelhança do que aconteceu noutros locais, como por exemplo, em Aveiro,159 também o poder intervencionista da Coroa se começou a verificar desde cedo, no burgo Portuense. Isso fez-se em detrimento dos interesses do senhorio pela administração, à época - o Clero, o detentor do Couto.

153 Ibidem, v. H, p. 16. 154 Ibidem, v. I p. 55. 155 Ibidem, p. 29. 156 Ibidem, p. 28. 157 Ibidem, p. 27. 158 Livro de Vereaçoens 1401-1449, p. 165.

159 SILVA, Maria João Violante Branco Marques da - Aveiro Medieval, pp. 68-74. Aveiro um pouco à semelhança

do que aconteceu com o Porto começou a ser "cobiçada" pela Coroa a partir do reinado de D. Dinis. A sua passagem do poder nobre para o régio só se efectivou em 1407.

Não podemos de forma alguma dissociar os interesses régios do crescimento urbano e do surto mercantil, que se operaram no período quatrocentista, no burgo portuense, tornando-se um dos mais importantes centros exportadores de produtos, oriundos sobretudo do sector primário, tais como cereais, vinho, peixe, azeite, sal, mel e fruta. Este comércio em nítido progresso originava proventos muito chorudos, que a Corte aspirava para si.

A primeira das contendas surgiu no reinado de D. Sancho I e teve como principal causa a divisão das prebendas da Igreja, na época em que era bispo D. Martinho Rodrigues. Ainda mal feitas as pazes, a recusa do prelado em receber, como era hábito, o Infante D. Afonso, viria de novo a acicatar os ânimos. No tempo de D. Sancho II os acontecimentos verificados a nível do país, também tiveram aqui o seu reflexo. Regressaram novas contendas com a Igreja. Com D. Afonso Hl e D. Diniz, o Bispo queixa-se, contra os abusos cometidos pela realeza, nomeadamente na incorporação dos cidadãos no exército; na obrigação do pagamento da fossadeira; na promessa que fazia, em defendê-los contra o seu prelado; na ocupação que faziam das moradas dos padres e burgueses; no apoio que davam ao seu porteiro; no penhoramento de vizinhos e ainda no impedimento do livre exercício da jurisdição da Mitra.

A resposta do bispo não se fez esperar e muito menos a contra-resposta régia, que entre outras medidas: obrigou o Prelado a pagar-lhe 6.500 libras; transferiu a actividade mercantil do interior do burgo episcopal para o burgo fronteiro; estipulou um novo regulamento no desembarque de mercadorias que descessem o Douro ou entrassem pela sua foz.161

No tempo de D. Dinis, marcado por avanços e recuos do monarca, as contendas com o bispo Fernando Ramires contribuíram sobretudo para abalar o poder episcopal, perdendo o Clero o direito exclusivo de nomeação de juizes, que passaram a ser feitos por eleição, escolhidos dentre os homens bons, segundo o acordado pela concordata de 1325.162

Com D. Afonso IV saliente-se a importante inquirição mandada realizar em 1339 e as medidas tomadas, com vista a apoderar-se gradualmente dos rendimentos do Porto. Entre essas outras medidas são dignas de nota a construção de vários prédios no lugar das Hortas, a construção de um armazém, a nomeação de magistrados régios, a escolha de um dos 4 pares de magistrados que, por recusa do bispo, passou para as mãos do Corregedor da Comarca, etc.

A dinâmica estava criada e, no tempo de D. Fernando, vamos verificar um acentuar do poder burguês em detrimento do poder clerical, até porque o país estava

160 SOUZA SOARES, Torquato Brochado de - Subsídios para o Estudo da Organização municipal da cidade do

Porto durante a Idade Média, p. 70.

161 Idem - Ibidem, pp. 70-79. 162 Idem - Ibidem, pp. 84-86. 163 Idem - Ibidem, pp. 105-135.

KA.

sedento dos pesados tributos resultantes do surto económico que se fazia sentir na capital nortenha.

Mercê do apoio burguês que recebeu, D. João, o Mestre de Avis, retribui aos seus apoiantes, por um lado, com a atribuição dos julgados de Bouças, Maia, Gaia, Penafiel, Vila Nova, Azurara e Mindelo e, por outro com a extensão dos poderes locais a essas terras que agora passaram a fazer parte do Porto. As disposições das concordatas de 1324 e 1325 são revogadas e inicia-se o sorteio dos elegíveis. É ainda neste reinado, em 1406, que é finalmente celebrado um acordo, em que o poder clerical abandona definitivamente a gestão da cidade e este passa para as mãos de D. João I, mediante o pagamento anual aos bispos de três mil libras, em moeda antiga, referentes a cerca de 300 mil da moeda então corrente. A garantia para este pagamento era feito com base em rendimentos régios existentes no Porto.164

Esta situação determinou um novo ritmo para a cidade e um surto cada vez maior nas múltiplas actividades relacionadas com a actividade marítima que aí se desenvolviam, contribuindo para a afirmação de se tornar em breve o segundo maior núcleo do país.

O Rei afírma-se sempre como a entidade que está acima de tudo e de todos. É ele ou os seus representantes que têm competência e poder para legislar e executar as leis, assim como exercer o poder judicial.

Este período parece-nos de graças, até porque existe uma quantidade substancial de deferimentos aos pedidos formulados pelos representantes populares. Todavia, e isso é um facto bem patente nos capítulos especiais, embora deferidos, os pedidos acabam muitas vezes por entrar em "esquecimento" e, por conseguinte, aos representantes populares não resta outra solução senão apresentá-los de novo. Algumas das queixas e sobretudo os abusos e as prepotências, são ainda o reflexo duma situação global a nível do país, como poderemos verificar pelos exemplos que ao longo do trabalho apresentamos.

O rei anula e revoga leis, pede empréstimos, cobra impostos, dá privilégios aos seus apoiantes e amigos, ignora algumas vezes leis consignadas em ordenações, dá origem à criação de novos lugares e nomeia funcionários cuja finalidade é controlarem o meio local, impedindo desta forma a fuga de impostos.

No documento O Porto em Cortes : 1331-1406 (páginas 53-55)