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ADOLESCÊNCIA E CONSUMO DE SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS: UMA DISCUSSÃO SOB O ENFOQUE DO DIREITO À SAÚDE

Isabel Maria Sampaio Oliveira Lima; Vânia Sampaio Alves; Ludmila Cerqueira Correia

Considerando o amplo sistema normativo constituído pelo conjunto de documentos internacionais relativos aos direitos humanos e aos direitos da infância e da adolescência, junta- mente com os dispositivos específicos da Constituição Federal (CF), do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e os princí- pios do paradigma da proteção integral, identifica-se um gran- de elenco de possibilidades legais para articular a exigibilidade dos direitos dos adolescentes.

A concepção do direito à saúde vem sendo ampliada ao longo dos séculos e ganhou visibilidade político-jurídica quan- do inserida nas cartas constitucionais mediante um diferencia- do processo de conjuntura nacional, passando a ser um direito exigível tanto judicial quanto extrajudicialmente, em face das realidades específicas (LIMA, 2002).

A garantia do direito à saúde como afirmação das obri- gações do Estado deve ser implementada através de políticas públicas que contem com a participação da sociedade na sua formulação e execução, atentando-se para as especificidades dos grupos considerados vulneráveis, como o infanto-juvenil. A implementação da garantia do direito à saúde da adoles-

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cência implica não só o conhecimento das características das suas fases de crescimento e de desenvolvimento, mas, também, a atuação de operadores sociais e de operadores do direito de forma integrada.

Segundo Lima (2002, p. 105), o direito à saúde do seg- mento populacional infanto-juvenil se configura como:

o direito ao desenvolvimento integral do seu ser, sem restrição de qualquer espécie à sua potencialidade, com efetivo acesso a todos os meios, serviços ou programas que assegurem e promovam a sua saúde, com respeito e integração do seu acervo étnico, familiar, cívico, cultural no projeto que poderá cultivar para a sua vida pessoal e comunitária, ressignificando a sua existência pelo com- promisso com as gerações futuras.

Pode-se afirmar que houve melhoria em diversos indica- dores de saúde do Brasil, porém, ainda persistem situações que revelam a necessidade de se garantir o direito à saúde de adolescentes, conforme prevê a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança (CDC) e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (Pidesc). No presente ensaio, serão discutidos os desafios atuais na atenção à saúde de adolescentes usuários de álcool e outras drogas a partir da perspectiva da saúde pública e dos direitos humanos.

Diante da emergência de riscos à saúde e danos sociais para o indivíduo e coletividades associados à mudança do pa- drão de consumo de substâncias psicoativas na contempora- neidade, passou o Estado a atuar mediante a formulação e implementação de políticas públicas setoriais e intersetoriais. Para as pessoas que apresentam transtornos decorrentes do uso abusivo e/ou dependência de álcool e outras drogas, o de- safio atual se refere à conformação de uma rede assistencial sensível às suas necessidades sociais de saúde e comprometida com a garantia de seus direitos de cidadania.

O consumo abusivo de substâncias psicoativas compre- ende um relevante problema de saúde pública tanto no Brasil quanto internacionalmente. (DORN, 2002) A relação das pesso- as com tais substâncias perpassa a história da humanidade e as mudanças observadas quanto ao padrão de consumo refle- tem profundas transformações socioculturais.

Levantamentos epidemiológicos têm contribuído para a descrição do fenômeno do consumo de substâncias psicoativas na população brasileira, bem como para a análise de mudanças no padrão de consumo (BASTOS; BERTONI; HACKER, 2008; CARLINI et al., 2006; GALDURÓZ et al., 2005; GALDURÓZ; CAETANO, 2004).O álcool e o tabaco se destacam como as substâncias mais consumidas e com maiores prevalências de dependência. Entre as principais substâncias psicoativas ilíci- tas de consumo no país, o percentual estimado de dependentes de maconha, benzodiazepínicos e de solventes corresponde a 1,2%, 0,5% e 0,2%, respectivamente. Entre os usuários de dro- gas lícitas e ilícitas predominam os jovens do sexo masculino, mas os levantamentos epidemiológicos apontam o crescimento do consumo de todas as substâncias entre as mulheres (CAR- LINI et al , 2006). Evidencia-se, ainda, o início, cada vez mais precoce, do consumo entre adolescentes, consequência, entre outros fatores, do fácil acesso às substâncias, circunstância muitas vezes proporcionada por pessoas da rede social do jo- vem, a exemplo de familiares e amigos (BASTOS; BERTONI; HACKER, 2008).

A despeito da complexidade e da magnitude que o consu- mo abusivo de substâncias psicoativas representa para o país, a atenção à saúde de usuários e de suas famílias ainda se de- fronta com significativas lacunas assistenciais. Com a formu- lação de políticas públicas que, historicamente, enfatizaram as ações de repressão da oferta e da demanda, apenas no início

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da última década, a questão do consumo abusivo de álcool e outras drogas foi claramente inscrita na agenda das políticas públicas de saúde (ALVES, 2009; MACHADO, 2006). Em um cenário marcado pela predominância de um modelo de atenção centrado na internação e na abstinência como meta terapêu- tica exclusiva, o setor saúde se alinha ao discurso emergente da abordagem de redução de danos e, em conformidade com o processo de reforma psiquiátrica (ROTELLI; AMARANTE, 1992), preconiza um modelo de atenção à saúde do usuário de subs- tâncias psicoativas de base comunitária.

MARCO LEGAL E INSTITUCIONAL DO DIREITO À SAÚDE DO