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Parte I – Enquadramento Teórico

Capítulo 2 – Educação / Escola

2.7. Africanos em Portugal

A descolonização trouxe para o nosso país uma vaga contínua de refugiados e imigrantes africanos, na sua maioria ilegais, que se instalaram maioritariamente em Lisboa, embora se disseminassem um pouco por todo o país, à procura de melhores condições de vida. Os primeiros fixaram-se na Ajuda e S. Domingos

de Benfica, Carnaxide ou Alfragide, etc. (cf. Machado, 1994), com condições de alojamento precárias, fazendo com que aumentasse a construção desordenada de “barracas”. A situação foi-se agravando, uma vez que por parte das autarquias não houve uma preocupação inicial relativamente ao realojamento, levando a que a situação se tornasse difícil de controlar. Os bairros sociais onde esta população se instalou passaram a ser conhecidos como meios de pobreza onde imperava a delinquência, o tráfico de droga, a prostituição, a violência, sendo a desintegração uma das causas. Ao chegar ao nosso país, estes imigrantes tiveram que fazer a aprendizagem de uma nova cultura, de uma nova língua e instalar-se, como referimos anteriormente, em habitats degradados, inserindo-se num meio urbano, com ritmo de trabalho intenso para o qual não se encontravam preparados. Não devemos esquecer que uma grande maioria habitava, no seu país de origem, num meio rural. Em 1998, dos estrangeiros residentes em Portugal, os Africanos constituíam 46,4% (cf. Bastos, 1999:34).

Previa-se que estes imigrantes não fossem portadores de grandes dificuldades de aprendizagem, uma vez que a sua língua de origem era a língua portuguesa. O mesmo era esperado dos alunos africanos de “2ª e 3ª gerações”. Até à relativamente pouco tempo, este termo era utilizado para denominar os filhos dos imigrantes nascidos (ou pelo menos criados) no país que os seus pais escolheram como destino de migração. No entanto, este termo não será o mais correcto, já que muitos destes não são verdadeiros imigrantes, mas sim filhos de imigrantes nascidos já no país de acolhimento, não tendo por conseguinte estado sujeitos a uma movimentação de um país para o outro. É de salientar ainda que estes não apresentam algumas características próprias de ser imigrante, tais como: a presença transitória no país e a existência de um projecto de regresso, uma vez que estes nunca estiveram no país de origem dos seus pais (cf. Rocha-Trindade, 1995). Ao falarmos de imigrantes de 2ª geração tem implícito o princípio, segundo Machado (cf. 1994:120), de “uma concepção essencialista das identidades sociais”, em que a cultura de origem dos imigrantes é transmitida aos filhos na totalidade, sem interferências da cultura do país de acolhimento. Esta, é uma visão estática e inalterável de cultura, desta forma, vários investigadores

apresentam novas designações, como novos luso-africanos. Esta expressão inclui, além dos descendentes de imigrantes, “os africanos de nacionalidade portuguesa, de condição social média ou elevada e muitas vezes racialmente mistos, que optaram por se fixar em Portugal na sequência da descolonização” (cf. Machado, 1994:111).

2.7.1. Os alunos africanos na escola

Nos anos 90, "a presença nas escolas de alunos filhos de imigrantes africanos ou de populações regressadas das ex-colónias portuguesas pressionou os professores e a própria administração a agirem face a situações de exclusão a que esses alunos eram votados. As referências às relações entre o sucesso educativo e a atenção às especificidades dos alunos foi ganhando novos sentidos e foram incluindo aspectos de ordem cultural" (cf. Leite, 2002:80-81), levando, o poder central, à implementação de projectos que tinham por objectivo diminuir o insucesso escolar partindo do reconhecimento da diversidade cultural.

Os africanos são considerados frequentemente como vítimas de atitudes racistas e xenófobas e o seu desenraizamento é muito grande: ao chegarem ao nosso país, têm de fazer a aprendizagem de uma nova cultura e, por vezes, de uma nova língua, adaptar-se a um habitat, em muitos casos, degradante, suportar ritmos de trabalho intensos. Além disso, a maior parte são originários de meios rurais e têm que fazer a sua integração nas grandes cidades - ou na periferia destas - onde as probabilidades de encontrar trabalho são maiores. Todos estes factores tornam a inserção uma tarefa difícil, tornando-os por conseguinte, portadores de dificuldades acrescidas à entrada para a escola. (Matos, in http://www.aulaintercultural.org/print.php3?id_article=1585)

Devemos referir que aos primeiros se colocaram problemas de natureza institucional, como por exemplo na equivalência de diplomas, o que lhes trouxe grandes entraves uma vez que era generalizada a prática da "desclassificação", ou seja, a atribuição de notas inferiores às dos diplomas obtidos, ou mesmo a colocação num nível inferior àquele que o aluno

frequentava no seu país de origem. Além disso, os professores estavam, de um modo geral, pouco preparados para acompanhar este tipo de alunos; tendendo a classificar como "incapacidades intelectuais" as insuficiências linguísticas, os diferentes modelos culturais e o estado de desorientação e de conflito que os caracterizavam (cf. Charbit, 1988).

De acordo com Coard (1971), os alunos negros têm, em geral, três grandes desvantagens no sistema educativo: “as suas baixas expectativas em relação à sua progressão escolar num sistema educativo controlado por brancos; a sua baixa motivação para o sucesso educativo porque sentem que existem vários factores contra si; baixas expectativas dos professores afectando o seu empenho no processo de ensino e na auto-imagem e auto-confiança dos alunos”.

Alguns jovens africanos aparecem muitas vezes, referenciados pelos meios de comunicação social como apresentando comportamentos anti-sociais e falta de integração que têm como origem o facto de serem «…jovens que não se identificam com a cultura do país de origem nem com a de destino….» (cf. Céu Neves, 1999:20-22).

Trata-se, muitas vezes, de jovens que nasceram em Portugal e aqui foram socializados, não possuindo qualquer intenção de vir a fixar-se no país de origem dos pais e, acima de tudo, não se vendo a si próprios como imigrantes, mas como portugueses.

Para Machado (1991), a sua situação de “dupla cultura”, de se encontrarem divididos entre dois mundos e duas identidades contraditórias, é apresentada como a principal característica explicativa da sua falta de integração que se repercutirá na escola. Parafraseando Pereira (2005), as crianças africanas são mais penalizadas no aproveitamento escolar, porque apresentam dificuldades de integração social e cultural, as famílias são pouco estruturadas, evidenciam problemas na língua e são também vítimas de alguns preconceitos racistas. Tais situações devem ser encaradas de forma objectiva e devem ser valorizados os factores que favorecem a formação do auto-conceito de forma a diminuir sentimentos de inferioridade manifestados pelos indivíduos africanos.

Desta forma, é importante efectuar-se um trabalho que envolva toda a comunidade educativa. Como argumenta (cf. Santos, 2001), trabalhar no ambiente escolar, de forma satisfatória contra as ideologias que reforçam a discriminação, significa instituir novas formas de relação entre crianças negras, brancas e afro-descendentes, acabar com os velhos discursos eurocêntricos, promover situações de diálogo e de argumentação e favorecer uma interacção que permita a todos da comunidade escolar “garantir e promover o conhecimento de si mesmo, no encontro com o diferente” (p.106).

Pensamos ser importante que a escola promova o reforço da identidade destes alunos, podendo isso ser feito, entre outras coisas, através de histórias contadas ou dramatizadas, com personagens negros em situações positivas. Assim como, não devemos descurar que no relacionamento entre lusos, africanos e afro-descendentes, o conceito “cultura” revela o seu aspecto controverso uma vez que as relações de força se presenciam com frequência, tanto no campo social como no campo do saber.