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Agricultura urbana no município de São Paulo Um breve histórico da agricultura no município de São Paulo

PERCURSO METODOLÓGICO Objetivos

1. AGRICULTURAS URBANAS: CONCEITOS E PRÁTICAS EM MOVIMENTO

1.4. Agricultura urbana no município de São Paulo Um breve histórico da agricultura no município de São Paulo

É difícil traçar um quadro histórico da agricultura no município de São Paulo, uma vez que o ímpeto da industrialização e da urbanização buscou minimizar a importância da prática agrícola, principalmente aquela de subsistência e anexa à grande lavoura exportadora, enquanto primitiva e destinada ao desaparecimento. No entanto, há alguns indícios, acontecimentos e políticas públicas que nos possibilitam verificar práticas de agricultura urbana que estiveram presentes ao longo do desenvolvimento da cidade e que resistiram frente ao impulso modernista

e urbanista que dirigiu o desenvolvimento das cidades. Não se pretende aqui delinear com profundidade a história da agricultura urbana no município de São Paulo, mas sim ressaltar algumas perspectivas na história do município que nos permitem entender e localizar as práticas atuais como um episódio dentro do longo trajeto de resistência da agricultura em um grande centro urbano e de sua importância no contexto mais amplo.

Em meados do século XIX, o município de São Paulo ainda era considerado um entreposto rural, com singela importância dada apenas pela sua localização privilegiada, próximo ao escoamento comercial marítimo e com estradas precárias que possibilitavam o desbravamento rumo ao interior. Diversos aldeamentos, dentre eles aldeias indígenas, missões jesuítas e vilas caipiras, constituíam os arredores da cidade em formação, assim como chácaras e fazendas de integrantes das classes mais abastadas e de oficiais do exército. São Paulo era uma região estéril, pouco propícia ao desenvolvimento da agricultura. "Eram os oleiros, e não os agricultores, que faziam da terra o melhor uso" (MORSE, 1954; p.118). Mesmo assim, chácaras estavam

distribuídas pela cidade, ao longo de estradas e rios, com pastos para pastoreio de animais, pomares diversos e produção de hortaliças que, num primeiro olhar, pareciam abundantes, mas pouco se comparavam com a produção do interior do estado (MORSE, 1954).

Estima-se que, em 1818 havia cerca de 1.640 agricultores na cidade, o que representava 52% da população na época (RIBEIRO, 1898). O cultivo era feito de forma primitiva (com ferramentas básicas, como foice, enxada e machado; arado só existia nas chácaras), com a prática de coivara e trabalho basicamente manual, o que levou, em 1835, ao abandono de áreas rurais para cultivar locais onde as colheitas poderiam ser mais abundantes, como no interior do estado (MAWE, 1812; MÜLLER, 1923).

Algumas iniciativas buscaram fortalecer a atividade agrícola no território, sem muito sucesso. Dentre elas, pode-se citar uma primeira tentativa de colonização alemã em Santo Amaro nos arredores de 1829, com o objetivo de trabalharem como artífices, serralheiros e agricultores. Na região, se cortava madeira para a construção de casas da cidade de São Paulo, se produzia carvão vegetal (principalmente na região de Itapecerica da Serra, com a presença de carvoarias e fornos) e se cultivava trigo, mandioca e algodão para comercialização em São Paulo e Santos. A colônia alemã possuía, em 1829, 62 famílias e 299 pessoas, mas o experimento entrou logo em decadência devido ao isolamento e a dificuldades de acesso à cidade de São Paulo, chegando a 157 colonos em 1838 e apenas 9 famílias em 1847. (ZENHA, 1950; MORSE, 1954;

PENTEADO, 1958). Outra iniciativa, promovida em 1836 pelo Governo da Província de São Paulo, buscava melhorar a agricultura por meio da criação de uma fazenda modelo em uma antiga propriedade jesuíta em Santana, onde órfãos estudariam a doutrina cristã, educação cívica,

geometria, mecânica, química, botânica e agricultura. Sem o devido apoio requerido pelo diretor da fazenda, a iniciativa foi abandonada em 1838 (MORSE, 1954, p.77).

Figura 3. Mapa de chácaras, sítios e fazendas ao redor do Centro – cidade de São Paulo, aproximadamente 1910.

Em 1825 até meados de 1833, o produto mais importante da agricultura paulistana era o chá, cultura introduzida pelo Marechal José Arouche de Toledo Rendon por ser uma cultura barata, de produção menos árdua e melhor para trabalhadores adolescentes. Em sua chácara, onde hoje se localiza a Vila Buarque, foram cultivados cerca de 44.000 pés de chá, que

impressionavam devido, justamente, ao caráter urbano da produção (RENDON, 1851). De tão importante, a cultura deu o nome ao Morro do Chá, que posteriormente daria lugar ao Viaduto do Chá, sobre o Vale do Anhangabaú. Cabe ressaltar também a persistência e a centralidade da Chácara do Barão de Itapetininga na produção de hortaliças no Vale do Anhangabaú até meados de 1910 (TOLEDO, 1989). Até então, a agricultura na cidade de São Paulo apresenta duas realidades distintas: chácaras diversas e produtivas, pertencentes a classe mais abastada, e lavradores e sitiantes de categoria considerada inferior, que produziam essencialmente para subsistência (MORSE, 1954; p. 24).

A pesca também era uma prática usual na cidade, envolvendo diversos grupos. Ainda na segunda metade do século XIX, a pesca de traíra e lambari no Rio Tamanduateí ainda era

abundante (DIAS, 1984). Até o início do século XX, havia pesca e caça de rãs em toda a região do Rio Anhangabaú e ao longo do Rio Tamanduateí, além de um grupo de mulheres marisqueiras no bairro da Penha, às margens do Rio Tietê e do Rio Aricanduva. Havia pescadores

profissionais na Santa Efigênia, no Brás e na Freguesia do Ó e o bairro do Pari era considerado o principal centro de pesca da cidade. Os peixes, mariscos e afim eram comercializados em

tabuleiros no centro da cidade até por volta de 1915 (SANT'ANNA, 2007).

Entre 1836 e 1854, a cidade de São Paulo passa a ganhar importância como

intermediário entre o porto de Santos e as fazendas de café em expansão no noroeste do estado. A cidade passa a ser local de residência dos barões do café, que ali se estabelecem, e iniciam um processo embrionário de importação de mão de obra. O chamado "surto do café" surge, em parte, como um produto urbano em projeção sobre o campo, a partir da relação que os novos fazendeiros possuem com a cidade, trazendo uma mentalidade urbana e empresarial como parte de um novo momento de desenvolvimento capitalista do país, marcado pela decadência da empresa açucareira e pelo fim do tráfico de negros escravizados (MORSE, 1954).

O início do processo de imigração inaugura um novo momento para a cidade de São Paulo, instaurando o primeiro crescimento urbano vertiginoso, principalmente entre 1855 e 1872, e o abandono de ocupações rurais para o exercício de atividades comerciais, industriais,

burocráticas e intelectuais. Ao mesmo tempo, o aumento populacional e o encarecimento dos produtos de primeira necessidade (uma vez que a cultura do café não possibilita o plantio consorciado de outros gêneros alimentícios) gera uma demanda cada vez mais crescente de

alimentos para a manutenção do crescimento urbano e da população imigrante. Dessa forma, entre 1872 e 1890, muitos imigrantes deixavam de ir para as fazendas de café e permaneciam na cidade de São Paulo para trabalharem nas indústrias em desenvolvimento, nos comércios e na agricultura para abastecimento da cidade (MORSE, 1954, p.187).

De forma a garantir o abastecimento alimentar para a população em crescimento, são criados os primeiros empreendimentos oficiais de duração mais longa que as experiências previamente tentadas, as colônias agrícolas, o embrião do que mais tarde veio a ser denominado Cinturão Verde. As colônias eram compostas, inicialmente, por italianos e tiroleses, mas com a presença de outras nacionalidades também, e foram instaladas ao longo dos anos de 1877 e 1878 em São Bernardo, São Caetano e Santana (MORSE, 1954; p.287). Em 1887, cerca de 1267 colonos cultivavam hortaliças, frutas, tubérculos, sorgo e vime para serem vendidos na cidade de São Paulo (SOUSA, 1946; p.54-55). Em Santana, a antiga propriedade rural dos jesuítas foi dividida em 68 lotes, com 136 habitantes, sendo 94 italianos e 39 brasileiros, voltados à produção de vinhedos, batata e milho (MENDES, 1958, p.214-216). Só em São Bernardo, esse número sobe para 2102 pessoas de diversas nacionalidades em 1907 (MORSE, 1954; p.287). Outro exemplo é a Freguesia do Ó que possuía, em 1876, cerca de 2.000 habitantes dedicando-se à plantação de cereais, lavoura de cana de açúcar e criação animal (MARQUES, 1876, p. 135-136).

A importância de São Paulo na economia nacional cresce no final do século XIX com a indústria cafeeira e o início do processo de industrialização do país. Com a abolição da escravidão e a mudança na economia brasileira da cana-de-açúcar para o café, intensificou-se o fluxo

migratório de trabalhadores livres para o país, vindo de inúmeros países, como italianos,

portugueses, alemães, espanhóis, sírio-libaneses e japoneses. Estes trabalhadores livres, chegados na cidade de São Paulo, eram direcionados para as fazendas de café no interior do estado para trabalharem em regimes de remuneração assalariada e passaram a compor a sociedade brasileira. Entre 1890 e 1893, a população paulistana dobra em número e o desenvolvimento da indústria férrea intensifica os fluxos do município de São Paulo com o restante do Estado, tanto no transporte de imigrantes para as fazendas de café quanto no transporte de mercadorias para escoamento no porto de Santos.

Figura 4. Vale do Anhangabaú em meados de 1900.

Fonte: Gaensly e Lindemann, recuperado de TOLEDO, 1996.

A agricultura, portanto, no início do século XX, não só era presente no cotidiano da cidade como entendida como essencial para o desenvolvimento urbano e abastecimento da população em crescimento, a ponto de estimular empreendimentos oficiais voltados à

constituição das colônias agrícolas. Nesse sentido, uma importante iniciativa digna de nota diz respeito à implantação, em 1904 no bairro da Água Branca, da Escola de Pomologia e

Horticultura pelo então prefeito Antônio Prado. A Escola teve como objetivo a promoção do cultivo de terras suburbanas não aproveitadas, focando na produção de pequenas culturas, árvores frutíferas e legumes. Em sua justificativa à Câmara Municipal, é feita alusão ao insucesso das experiências anteriores por inexperiência e falta de conhecimentos teóricos e práticos, que seriam diretamente sanados com a promoção da Escola (SÃO PAULO, 1904).

As atividades da Escola se iniciam em 1905 sob a direção de Giuseppe Bassoti com a instalação de viveiro e importação de plantas da França para enxertia, totalizando 37.850 indivíduos importados. A área foi dividida em talhões, contando com edifícios, estábulos, viveiros, horta, pomar, vinhas e espaço para cultivo de cereais e forrações. O curso continha 3 anos de duração e envolvia, para além dos conhecimentos diretamente relacionados à produção agropecuária, aulas de português e aritmética, além de aulas práticas que variavam de acordo com

o ano em que os estudantes estavam. O que era produzido na Escola era consumido diretamente pelos estudantes, assim como havia comercialização (principalmente de cardo, alcachofra,

aspargos e suínos), que garantia um saldo financeiro positivo para a Escola, e doação de mudas gratuitas (SÃO PAULO, 1905).

As ações ainda envolviam consultoria sobre plantio de certas culturas, visitação de estudantes e fazendeiros, troca de mudas e sementes com outros órgãos (como o Instituto Agronômico de Campinas - IAC) e experimentação para a construção de conhecimentos agronômicos e meteorológicos da cidade. O protagonismo de Giuseppe Bassoti é digno de destaque, uma vez que manteve constante comunicação com grupos e instituições brasileiras e internacionais para divulgação da Escola, assim como contribuiu largamente para o

desenvolvimento da horticultura no Brasil. Em 1911, a Escola Municipal de Horticultura e Pomologia deixa de existir com a mudança de gestão na prefeitura e seu terreno, posteriormente, viria a se tornar o Parque Estadual da Água Branca (Parque Fernando Costa).

A crise do café e o excesso de mão de obra na cidade intensificam o processo de pauperização da população, que demonstravam dificuldades em consumir os alimentos frescos produzidos nas imediações da cidade. Em 1914 é iniciado um processo de instalação de feiras livres, de forma a eliminar intermediários e reduzir o preço dos alimentos, assim como são realizados os primeiros estudos para a centralização da comercialização de alimentos na cidade (que antes era feita em casas mal asseadas às margens do Tamanduateí e em mercados na região central) (MORSE, 1954, p.225; OLIVEIRA, 2004, p. 127). Também são disponibilizados, nesse período, bondes com passagens gratuitas para lavradores que trouxessem produtos agrícolas dos subúrbios para o centro da cidade.

Duas vertentes foram explícitas nesse período em que, por um lado, os trabalhadores da cidade eram estimulados a tornarem-se sitiantes independentes no interior, valorizando o campo e a desurbanização entre 1914 e 1916 (MORSE, 1954). Por outro lado, houve um afã industrial que estimulava a criação do exército industrial de reserva que teve como auge a década de 1920. Com o início do processo de industrialização, muitos dos imigrantes, junto de migrantes internos vindos de outras regiões do país, se instalam na cidade de São Paulo, em suas periferias e em seus arredores, para atuarem como mão de obra barata e exército de reserva para possibilitar o

desenvolvimento da industrialização e a passagem de uma economia rural para a urbana (OLIVEIRA, 2013). Além do seu papel direto no trabalho operário, muitos imigrantes se engajaram em uma agricultura de subsistência e de produção de excedentes, tanto em meio rural quanto urbano, que também possibilitou, graças a sua exploração, a redução dos custos de

manutenção da força de trabalho pela produção de excedentes alimentares para as cidades (OLIVEIRA, 2013).

Tem-se à época de 1920 a estruturação mais clara dos núcleos suburbanos e satélites na periferia da cidade a partir de três funcionalidades distintas: núcleos residenciais e de recreio, núcleos industriais e núcleos agrícolas. Diversos autores, como Langenbuch (1971), Azevedo (1945; 1958) e Morse (1954) aprofundaram a análise das funcionalidades desses subúrbios no processo de estruturação e desenvolvimento da metrópole e não pretendemos discorrer aqui acerca de cada um deles, mas focar diretamente no que tange ao desenvolvimento de práticas agrícolas no território nesse período. Langenbuch (1971, p. 161) apresenta três facetas do desenvolvimento do meio rural dos arredores paulistanos no período de 1915 a 1940 que contemplam o equipamento hidrelétrico e hidráulico da cidade (nominalmente a formação das represas Billings e Guarapiranga); a recreação campestre dos paulistanos, pelo espraiamento de chácaras e sítios; e a agricultura comercial visando especificamente a cidade, com relação intrínseca ao desenvolvimento metropolitano. Como descreve Prado Jr. (1935, p.64):

(...)os grandes centros urbanos (...) para seu abastecimento em certos gêneros, cercam- se de uma auréola de chácaras dedicadas a cultura hortense: de legumes, batatas, flores etc. É esse particularmente o caso de São Paulo. À sua volta toda, num círculo que abrange não só propriamente o município da Capital, mas ainda os municípios vizinhos de Cotia, Parnaíba, Juqueri, Guarulhos, Mogi das Cruzes e outros tem-se constituído nestes últimos vinte anos principalmente numa zona de propriedade rural muito dividida e cultivada…

De forma similar, complementa Azevedo (1945, p.33):

Nos últimos 25 anos criou-se, em torno da cidade uma verdadeira zona hortense, com a multiplicação das culturas de legumes e também de flores; as chácaras, que já aparecem no próprio perímetro urbano, multiplicam-se através da região da Cantareira e nas vizinhanças da Penha e estendem-se mesmo muito além, na zona da 'Central'

Com o aumento populacional inflado pela industrialização, grande parte da zona rural foi ocupada por loteamentos que serviam puramente para a especulação imobiliária, esperando valorização no preço das terras na sua oferta para a expansão horizontal da cidade em número maior do que a real necessidade. A agricultura viu diminuir substancialmente seu espaço, mas mesmo assim manteve sua expansão comportando ampliação e diversificação das práticas. Toma corpo a horticultura, a floricultura e a fruticultura, assim como se estrutura o Cinturão Verde em volta da cidade (LANGENBUCH, 1971).

Inicia-se, a partir dessa ampliação e estruturação das práticas agrícolas e, de forma análoga, a partir do desenvolvimento intensificado da urbanização, um deslocamento da

agricultura para fora do núcleo urbanizado, rumo aos subúrbios e às periferias da cidade. Como afirma Penteado (1958, p.9),

(...) os novos arruamentos e a necessidade de aproveitar o mais possível o espaço urbano ocasionaram o deslocamento de numerosas chácaras, de flores ou de legumes, até então localizadas em plena cidade.

Tais fatos começaram a registrar-se a partir de 1920, principalmente, quando muitos chacareiros portugueses, em grande maioria, transferiram suas atividades para a área suburbana, deixando suas chácaras localizadas na Água Branca, em Vila Pompeia, na Lapa, no Tatuapé́, na Penha, no ltaim-Bibi, em Santana, na Casa Verde, etc.

Hoje, raras são as chácaras que ainda persistem dentro da área urbana, quase sempre situadas em fundos de vales, até onde a urbanização ainda não chegou.

Apesar de uma estruturação da prática para ampliar a produção alimentar e abastecer a cidade em crescimento, nota-se uma lógica pautada no domínio da natureza, na valorização do urbano-industrial como paradigma de modernidade e de modo de vida e no desenvolvimento da cidade-empresa, com valorização da propriedade privada especulativa e uso dos recursos urbanos para benefício de uma elite empresarial. Inicia-se o processo de expulsão sistemática da

população trabalhadora pobre das regiões mais centrais, forçada a morar cada vez mais distante, rumo às periferias da cidade onde o preço da terra é mais acessível. As práticas agrícolas de reprodução de vida dessas populações seguem como experiências isoladas e invisíveis em detrimento da lógica de dominação do campo pela cidade, como já abordado anteriormente. As chácaras tornaram-se loteamentos residenciais e comerciais, novos arruamentos são abertos e as paisagens naturais aos poucos passam a dar lugar à metrópole cosmopolita.

Com o crescimento e expansão da cidade, os subúrbios adquiriram importante função no desenvolvimento urbano, concentrando atividades industriais, residenciais e agrícolas, ora de forma homogênea (como Cotia, com função principalmente agrícola, e a Cantareira, com função principalmente residencial), ora de forma complexa, onde duas características coexistem e se sobrepõe. Boa parte dos subúrbios agrícolas e residenciais, nos arredores de 1950, demonstravam características dispersas, com residências modestas e agricultura com pouca expressão, tendo uma população que oscilava entre 5 e 10 mil habitantes e com presença marcante de grupos imigrantes (PENTEADO, 1958).

A imigração cumpre um papel essencial nessa reestruturação das práticas agrícolas da cidade, principalmente em relação aos imigrantes japoneses, transformando radicalmente a produção hortícola da cidade e modificando profundamente os hábitos alimentares dos paulistanos. Os fluxos da imigração a respeitos destes empreendimentos agrícolas na cidade de São Paulo apresentam dois momentos distintos com características próprias: no século XIX, a imigração alemã e italiana foram promovidas por meio de núcleos coloniais oficiais do governo, com maior concentração territorial e menor sucesso, enquanto a imigração japonesa, no século

XX, de forma diversa, se deu por iniciativa de empreendimentos em terras particulares, como é o exemplo da Colônia de Itaquera, possibilitando maior dispersão no território (LANGENBUCH, 1971).

A presença japonesa em São Paulo data desde 1908 nos diferentes subúrbios nos arredores da cidade, caracterizada por dois tipos distintos de imigrantes: aqueles que

abandonaram a vida de colono do café e aqueles que se dispuseram a tentar a vida na cidade, arrendando terras afastadas para o plantio de subsistência, principalmente de batatinha na região de Cotia, Juqueri, Taipas e Morro Grande. Essa agricultura era marginal às grandes lavouras comerciais que estavam presentes no estado de São Paulo, como a cana de açúcar e o café e pouco interferia na dinâmica da cidade (SAITO, 1961; p. 133-145).

Em meados da década de 1930, houve uma nova corrente de deslocamento dos imigrantes para as cercanias da cidade de São Paulo, consolidando e estruturando essa nova forma de agricultura de tipo suburbano em novos núcleos, como Suzano, Mogi das Cruzes, Itaquera, Jundiaí e outras localidades às margens do eixo ferroviário. Isso se deu graças, em parte, à crise do café que impactou os agricultores, causando a dispersão dos lavradores japoneses para áreas vizinhas (como São Roque, Itapecerica da Serra, Vargem Grande e Ibiúna) e aumentando a diversidade de culturas produzidas para além da batatinha, como frutas, verduras e aves. O desenvolvimento da agricultura de tipo suburbano está intimamente condicionado à formação das cooperativas agrícolas, como a Cooperativa Agrícola de Cotia (CAC, formada em 1927 por cerca de 83 agricultores) e a Cooperativa Agrícola Sul Brasil (antiga Cooperativa de Juqueri), formada em 1928 (SAITO, 1961; YONEYA, 2008).

Ambas as cooperativas se estruturaram ao longo do tempo, sendo que a CAC chegou a tornar-se a maior cooperativa agrícola do Brasil durante a década de 80, chegando a ter cerca de 15.000 associados no ano de 1986. Apesar de importantes instituições de comercialização e associação dos agricultores da comunidade nipo-brasileira que chegou a envolver boa parte dos agricultores da região Sul do município de São Paulo, essas cooperativas foram levadas à falência em 1994 devido à inúmeras dívidas contraídas ao longo do tempo. Nesta época é também construído o Mercado Municipal de São Paulo, em 1933, substituindo o então Mercado dos Caipiras, localizado nas várzeas do Rio Tamanduateí desde 1867 e formado por pequenas vendas em condições precárias de higiene que recebiam produtos para serem enviados ao litoral pela