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3. AS ANÁLISES

3.11. Ai momentos de físico amor (1975)

1. Ai momentos de físico amor, 2. Ai reintrancias de corpo...

3. Meus lábios são que nem destroços 4. Que o mar acalanta em sossego. 5. A luz do candieiro te aprova,

6. E... não sou eu, é a luz aninhada em teu corpo 7. Que ao som dos coqueiros do vento

8. Farfalha no ar os adjetivos.

3.11.1. Análise poética

v. Poema XI Estrutura Rítmica Estrutura Métrica Estrofe Ictos Células Métricas

1 Ai momentos de físico amor 1 - 3 - 6 - 9

/- /- -/- -/ quadra troqueu + anfíbraco + jâmbico 2 Ai reintrancias de corpo 1 - 4 - 7 /- -/- -/- troqueu + anfíbraco 3 Meus lábios são que nem

destroços 2 - 4 - 6 - 8

-/- /- /- /- anfíbraco + troqueu

Que o mar acalanta em sossego

jâmbico + péon terceiro + anfíbraco

5 A luz do candieiro te aprova 2 - 5 - 8 -/- -/- -/-

quadra anfíbraco

6 E... Não sou eu, é a luz

aninhada em teu corpo (1) 4 - 6 - 9 - 12

/--/ --/ --/- -/- coriambo + anapesto + péon terceiro + anfíbraco 7 Que ao som dos coqueiros do

vento 2 - 5 – 8

-/ --/- -/-

jâmbico + péon terceiro + anfíbraco

8 Farfalha no ar os adjetivos 2 - 4 - 8

-/- /- --/- anfíbraco + troqueu +

péon terceiro Quadro 27 – Organograma do poema Ai momentos de físico amor...

Este poema, formado por duas quadras, é o menor do ciclo. Tal como os anteriores, não há rimas e nem estrutura única na composição dos versos. Encontramos assonância nas vogais /a/ e /o/ e aliteração nas consoantes [m], [n] e [r]. Não há problemas de prosódia na canção e nas passagens de maior dificuldade técnica, o compositor deu um tratamento que favorece tanto a dicção quanto a emissão vocal. No entanto, algumas passagens na canção diferem da métrica poética pois quase não há elisões na versão cantada do poema, como é possível verificar nos exemplos: a) fí-si-co a-mor ([]) em vez de fí-si-coa-mor ([]) (v. 1, c. 7 e 8); b) que o mar ([]) em vez de queo-mar ([]) (v. 4, c. 15), e assim sucessivamente.

3.11.2. Análise musical

Fluxograma musical

Canção Forma Dinâmica Tempo Centricidade Tessitura vocal

XI Intr. – c. 01-04 A – c. 04-20 Interlúdio – c. 21-24 A’ – c. 25-42 p/mf/f/ff



= 66 Improvisando

Lám Ré # 3-Sol4

Quadro 28 – Fluxograma da canção Ai momentos de físico amor...

Esta canção, inspirada na modinha, pode ser dividida em seções de duas formas. A primeira, que me parece ser mais coerente para cantores, é baseada no

texto e na linha vocal. A segunda, embora, também coerente, seria totalmente baseada na escrita da parte do piano.

Baseado na linha vocal, posso dizer que se trata de uma canção estrófica, dividida em duas seções, sendo a seção A (c. 04-20) a quem contém a primeira estrofe e A’ (25-42) a que contém a segunda. Antecedendo a primeira seção há 4 compassos introdutórios na linha do piano em que, a partir da nota Mi no grave do piano, há uma sequência de quartas, como se fosse um acorde de quartas sobrepostas arpejado de forma lenta (semínimas). Entre as seções A e B há um interlúdio na linha do piano (c. 21-24) durante o qual a linha da voz está em pausa. Este interlúdio soa como uma ponte que liga as duas seções.

Contudo, embora não seja a forma que escolhi para “pensar” a canção e tomar minhas decisões interpretativas, não posso deixar de destacar que a linha do piano tem uma organização diferente da apresentada acima e, logo após os quatro primeiros compassos introdutórios, apresenta uma estrutura A – A’ – A’’ – formada por 14 compassos que se repetem duas vezes, sendo a terceira incompleta (c. 05-18; c. 19-32; c. 33-42). Com exceção dos quatro compassos introdutórios, a escrita pianística é bastante regular, com repetição de materiais, baseada no contraponto e no uso bastante recorrente do intervalo de quartas, seja de forma melódica como acordes arpejados, seja de forma harmônica, com acordes de quartas sobrepostas.

Considerando minha divisão baseada na linha vocal (A e A’), posso ainda dizer que cada uma das seções é dividida em três frases de tamanho irregular, sendo as duas primeiras de menor duração e a terceira mais longa conforme figuras abaixo:

Frase 1

Frase 3

Figura 72 – Frases da seção A; melodia descendente, característica da modinha na canção Ai

momentos de físico amor... – c. 4-20.

Frase 1

Frase 2

Frase 3

Figura 73 – Frases da seção A’ na na canção Ai momentos de físico amor... – c. 25-42.

Martins (2004) enfatiza a independência da parte do piano em relação à linha do canto nesta canção, explicando a quebra que há no discurso musical entre as frases. Para ele, esta quebra não interrompe o fluxo, que é sempre “natural e comovente” (MARTINS, 2004, p. 167).

Em algumas das frases é possível observar características da modinha logo nos primeiros compassos, pois o contorno melódico é predominantemente descendente, característica deste tipo de canção, como já visto no primeiro capítulo deste trabalho.

A tessitura vocal é confortável para o cantor de classificação vocal média, em especial para vozes médias femininas. As notas mais agudas são sempre de passagem e as vogais favorecem uma boa emissão aliada a inteligibilidade do texto.

Figura 74 – Passagens em que a tessitura vocal atinge seu ápice na na canção Ai momentos de

físico amor... – c. 13-17; c. 31-32

A indicação inicial Improvisando merece especial atenção por parte dos intérpretes, pois, em toda canção, é possível verificar 14 indicações de rall. e a tempo. Em relação à centricidade, esta canção está mais próxima da tonalidade. O piano começa com um grande arpejo ascendente em intervalos de quartas sob o pedal de Mi, funcionando como uma introdução. Os seis primeiros compassos apresentam-se como um grande pedal da dominante de Lá, resolvendo-se nos c. 7 e 8, onde a tônica claramente se estabelece.

3.11.3. Relação texto-música e aspectos interpretativos

No décimo primeiro poema o personagem inicia a despedida. Com a interjeição Ai..., repetida duas vezes e que tanto pode ser de prazer quanto de dor, os ‘destroços’ do adeus são apaziguados pelo sossego do mar. Musicalmente, a canção inicia com a linha do piano fazendo um arpejo em quartas, entrando em seguida o canto, na mesma intensidade como um grito de gozo e lamento, antecipando as dores da inevitável partida.

Na segunda estrofe o personagem poético contempla a amante adormecida. O lirismo da linha melódica do canto em piano no v. 5 contrasta com o

forte súbito no verso seguinte: E... não sou eu (v. 6). As linhas do piano, por sua vez,

mais que acompanhar o canto, proporcionam estes contrastes: o interlúdio de quatro compassos entre as duas estrofes prepara o enlevo do personagem.

Enquanto a linha melódica do canto nos remete à modinha, as linhas do piano são inspiradas nas canções seresteiras do início do século XX, que eram

tocadas ao violão: os acordes arpejados na m.d. nos c. 08, 22 e 36, assim como os feitos ao violão, fazem referência direta a este instrumento.