E primeiro se pergunta se estas são as quatro virtudes cardeais, a saber, a justiça, a prudência, a fortaleza e a temperança [ 195 ]
15. Além do mais, diz o Filósofo no livro IV da Ética [ 210 ] , que a magnanimidade opera o grandioso nas virtudes, e é como o ornamento das demais virtudes Ora, isto
maximamente parece convir ao principal da virtude. Logo, parece que a magnanimidade é uma virtude cardeal. Portanto, as quatro virtudes cardeais, já ditas, estão enumeradas de um modo inconveniente.
Ao contrário
1. É o que diz Ambrósio[ 211 ] sobre o que se lê em Lucas 6, 20: Bem-aventurados os pobres de espírito: sabemos que as quatro virtudes são: a temperança, a justiça, a prudência e a fortaleza-
Respondo
Respondo, dizendo, que “cardeal” se diz da dobradiça, na qual se gira a porta, conforme o que se lê em Pr 26, 14: A porta gira nos seus gonzos, e o preguiçoso no seu leito. Por isso se chamam virtudes cardeais aquelas nas quais se fundam a vida humana, pela qual se entra pela porta. A vida humana, porém, é a proporcionada ao homem. No entanto, em relação ao homem se encontra, primeiramente, uma certa natureza sensitiva, na qual coincide com a dos animais irracionais. A razão prática, que é própria do homem se encontra conforme o seu grau, e o intelecto especulativo, que não se encontra de modo perfeito no homem, assim como se encontra nos anjos, mas segundo uma certa participação da alma. Por isso a vida contemplativa não é propriamente humana, mas sobre-humana. Contudo, a vida voluptuosa, que se apega aos os bens sensíveis, não é humana, mas bestial. Logo, a vida propriamente humana é a vida ativa, que consiste no exercício das virtudes morais. E, por isso, são chamadas propriamente de virtudes cardeais, aquelas pelas quais, de algum modo, a vida moral se funda e se altera, assim como em certos princípios de tal vida. Por causa disso também as virtudes desta natureza são chamadas de principais. No entanto, deve-se considerar que a razão do ato virtuoso inclui quatro condições. Das quais, a primeira é que a substância do mesmo ato esteja modificada em si mesma e, por isso, o ato se diz bom, como uma relação da devida matéria existente, ou como revestido das devidas circunstâncias. Contudo, a segunda condição é que o ato seja devido ao se relacionar com o sujeito, a partir do qual adere firmemente ao sujeito. A terceira condição, porém, é que o ato seja devido ao modo proporcionado por algo extrínseco assim como está para o fim. E estas três condições provêm da parte daquilo que é dirigido pela razão. No entanto, a quarta, se dá a partir da própria razão dirigente, isto é, o conhecimento. E o Filósofo mostra estas quatro condições no livro II da Ética[ 212 ], onde diz que não é suficiente à virtude que algumas coisas sejam justas ou moderadamente comparadas, o que pertence à modificação do ato. Mas outras três condições são requeridas por parte da operação. A
primeira, pois, que seja conhecida, o que pertence ao conhecimento que dirige. A outra, que seja eleita e reeleita por causa disto, isto é, por causa do devido fim, que pertence à retidão do ato em ordem a algo extrínseco. A terceira, que firmemente e de um modo imutável se adira à operação. Portanto, estas quatro coisas, isto é, o conhecimento que dirige, a retidão, a firmeza e a moderação, ainda que sejam requeridas em todos os atos virtuosos, todavia cada uma delas tem uma certa principalidade em algumas matérias e atos especiais. Por parte do conhecimento prático são requeridas três coisas. Primeira, o conselho: segunda, o juízo sobre o aconselhado; assim como também na razão especulativa se encontra a invenção ou a investigação, e o juízo. Ora, porque o intelecto prático ordena a fugir ou a prosseguir, o que não faz o intelecto especulativo, como se diz no livro III Sobre a alma[ 213 ], por isso, a terceira, premeditar sobre o agir, pertence à razão prática. E isto é o principal a que se ordena os outros dois requisitos. No entanto, em relação ao primeiro, o homem se aperfeiçoa pela virtude da eubolia, que é uma boa conselheira. Em relação ao segundo, porém, o homem se aperfeiçoa pela synesis e a gnomem, com as quais o homem faz bons juízos, como se diz no livro VI da Ética[ 214 ]. Ora, pela prudência a razão se faz bem preceptiva, como se diz no mesmo lugar. Por isso, é manifesto que convém à prudência o mesmo que é principal no conhecimento que dirige. E, por isso, sob esta perspectiva, se assinala a prudência como uma virtude cardeal. De modo semelhante, a retidão do ato por comparação com algo extrínseco, tem razão de bem e de louvor, inclusive naquilo que pertence ao uno conforme ele mesmo, mas é louvado maximamente nas coisas que são relativas a outro, isto é, quando o homem retifica o seu ato não apenas nas coisas que pertencem a ele mesmo, mas também na que se relaciona com os outros. Com efeito, diz o Filósofo no livro V da Ética[ 215 ], que muitos realmente podem servir-se da virtude por uma causa própria, contudo não podem fazer aquelas coisas que são relativas aos outros. E, por isso, sob esta perspectiva, a justiça é posta como uma virtude principal, pela qual o homem se adapta e é adequado, de um modo devido, aos outros, com os quais tem de comunicar. Por isso, vulgarmente se diz, que justas são aquelas coisas que são adaptadas de um modo devido. No entanto, sobretudo a moderação, ou o freio, é louvado e tem razão de bem, onde, principalmente impele a paixão, a qual deve refrear a razão, para que se situe no meio termo da virtude. Contudo, a máxima paixão impele a alcançar os máximos deleites, que são deleitações do tato. E por isso, sob esta perspectiva, se coloca como cardeal a virtude da temperança, que reprime as concupiscências dos deleites do tato. No entanto, a firmeza é principalmente louvada e tem razão de bem naquelas circunstâncias em que a paixão move maximamente à fuga. E isto, sobretudo, ocorre nos perigos máximos, que são os perigos da morte. E, por isso, sob esta perspectiva, a fortaleza é posta como uma virtude cardeal, pela qual o homem se comporta intrepidamente em relação aos perigos da morte. No entanto, destas quatro virtudes, a prudência está na razão, a justiça na vontade, a fortaleza, porém, no irascível, a temperança, contudo, no concupiscível. As únicas potências que podem ser princípios do ato humano, isto é, do ato voluntário. Por isso, é evidente a razão das virtudes cardeais, tanto pela parte dos
modos da virtude, que são como as razões formais, quanto também pela parte material, como também pela parte do sujeito.