Décimo terceiro, se pergunta se a virtude é um meio termo [ 177 ] E parece que não.
1. Toda a virtude é moral, ou intelectual, ou teologal No entanto, a virtude moral é
um meio termo, pois segundo o Filósofo, no livro VII da Ética[ 188 ], a virtude moral é o hábito eletivo que consiste em um meio termo. Também a virtude intelectual parece ser um meio termo, pelo que diz o Apóstolo, em Rm 12, 3: não tenha de si mesmo um conceito mais elevado do que convém, mas uma justa medida. De um modo semelhante também a virtude teologal parece ser um meio termo. Com efeito, a fé avança em meio de duas heresias, como diz Boécio no livro Sobre as duas naturezas[ 189 ], também a esperança é o meio termo da presunção e do desespero. Logo, toda virtude é um meio termo.
Respondo, dizendo, que as virtudes morais e intelectuais são um meio termo, ainda que umas de um modo e outras de outro. No entanto, as virtudes teologais não consistem em um meio termo a não ser, talvez, por acidente. Para que seja mais evidente, deve-se saber que o bem de qualquer um que possua regra e medida consiste em adequar-se à sua regra ou medida, por isso denominamos bom àquilo que não tem mais nem menos do que se deve ter. No entanto, deve-se considerar que a matéria das virtudes morais são as paixões e as operações humanas, como as coisas factíveis são matérias da arte. Por consequência, assim como o bem nestas coisas se realiza mediante a arte, consistindo em que os artefatos recebam a medida segundo o que exige a arte, que é a regra dos artefatos. Do mesmo modo, o bem nas paixões e nas operações humanas é o que se alcança pelo modo da razão, que é a medida e a regra de todas as paixões e as operações humanas. Com efeito, como o homem é homem porque possui a razão, é necessário que o bem do homem seja conforme a razão. No entanto, quando nas paixões e nas operações humanas algo excede à medida da razão, ou é deficiente em relação a ela, ou é um mal. Portanto, como o bem do homem é a virtude, se segue que a virtude moral consiste em um meio termo entre a superabundância e o defeito; de tal maneira que a superabundância, o defeito e o meio termo são considerados, segundo a regra racional. Contudo, dentre as virtudes intelectuais, que estão na própria razão, algumas são práticas, como a prudência e a arte, outras especulativas, como a sabedoria, a ciência e o intelecto. E, certamente, as paixões e as operações humanas ou as mesmas coisas artificiais são a matéria das virtudes práticas. Mas as coisas necessárias são a matéria das virtudes especulativas. No entanto, a razão se relaciona de um modo diverso com ambas. Pois a razão se relaciona como uma regra e medida em relação a essas coisas que opera, como já foi dito. Mas a razão se relaciona como o mensurado e o medido em relação à regra e à medida relativa a estas coisas que são especuladas. Com efeito, o bem do nosso intelecto é a verdade, o qual certamente o nosso intelecto alcança ao adequar-se à coisa. Portanto, assim como as virtudes morais consistem em um meio termo determinado pela razão, assim também a prudência, que é a virtude intelectiva prática relativa às coisas morais, pertence ao mesmo meio virtuoso enquanto o estabelece em relação às ações e paixões humanas. E isso é evidente pela definição da virtude moral, que, como se diz no livro II da Ética[ 190 ], é um hábito eletivo, o qual consiste em um meio termo, que o sábio determinará. Logo, o meio termo virtuoso da prudência e da virtude moral é o mesmo; mas é da prudência como do que o imprime, da virtude moral como do impresso, assim como é a mesma a retidão da arte como a do que retifica e a do artefato como a do retificado. No entanto, nas virtudes intelectuais especulativas o meio termo virtuoso será a própria verdade, considerado como tal, enquanto alcança a sua medida. Pois, certamente, não é um meio termo entre certa contrariedade que se dá por parte da coisa. Com efeito, as coisas contrárias entre as quais se considera o meio termo da virtude não são por parte da medida, mas por parte do mensurado, enquanto excede ou é deficiente em relação à medida, assim como é evidente a partir do que foi dito em relação às virtudes morais. Portanto, é necessário considerar os contrários dentre os que estão neste meio termo das virtudes intelectuais, por parte do intelecto mesmo. No
entanto, os contrários do intelecto são opostos, segundo a afirmação e a negação, como é evidente no livro II Sobre a interpretação[ 191 ]. Logo, o meio termo das virtudes intelectuais especulativas, que é a verdade, se considera entre as afirmações e as negações opostas. Assim, por exemplo, porque é verdadeiro quando se diz que algo é o que é, e não é o que não é. Mas algo será falso segundo o excesso, quando se diz que é o que não é, porém, segundo o defeito, quando se diz que não é o que é. Portanto, se no intelecto não houvesse alguma contrariedade própria fora da contrariedade das coisas, não haveria de se considerar nas virtudes intelectuais o meio e os extremos. No entanto, é manifesto que na vontade não há de considerar alguma contrariedade própria, mas apenas segundo a ordem das coisas apetecidas contrárias, porque o intelecto conhece algo segundo o que está nele mesmo, mas a vontade é movida à coisa segundo o que é em si. Por isso, se há alguma virtude na vontade conforme a relação com a sua medida e regra, tal virtude não consiste em um meio. Com efeito, não se consideram os extremos por parte da medida, mas apenas por parte do mensurado, segundo o que exceda ou diminua em relação à medida. No entanto, as virtudes teologais se ordenam à sua matéria ou ao objeto, que é Deus, mediante a vontade. E o que é manifesto sobre a caridade e a esperança, se diz de modo semelhante em relação à fé. Com efeito, ainda que a fé esteja no intelecto, contudo, está nele enquanto que este é dirigido pela vontade, pois ninguém crê a não ser que queira. Por isso, como Deus é a regra e medida da vontade humana, é manifesto que, propriamente falando, as virtudes teologais não estão em um meio, ainda que, às vezes, ocorra que alguma delas esteja em um meio por acidente, como depois será exposto.