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5.2 O F AZER A RTÍSTICO NA S ALA DE A ULA 108.1 “Alfredo Volpi” na Sala de Aula

5.2.6 Aldemir Martins e o Gato Azul

Nesse novo encontro, notamos que a disposição espacial das carteiras era diferente das observadas em outras aulas, o arranjo das carteiras foi realizado de forma a dividir a turma em grupos distribuídos pela sala, cada qual com cinco crianças.

A professora solicitou que continuassem agrupadas, em seguida colou no quadro de giz um cartaz com reproduções de cinco obras do pintor Aldemir Martins, que explora sempre em seus trabalhos a figura de um animal, o gato. Então, chamou a atenção das crianças para os elementos: linhas, cores, formas e movimentos presentes nas reproduções. Algumas crianças observaram, compararam e participaram ativamente da discussão. Enquanto isso, outras conversavam, brincavam de empurra-empurra, provocavam os colegas, sem ouvir o que a professora dizia por estarem alheias à proposta da aula. Ao notar que alguns grupos

situados mais distantes do quadro de giz não se envolveram, a professora interrompeu a discussão e passou para a segunda fase da atividade.

Nesse momento entregou às crianças, ainda dispostas nos mesmos grupos, uma fotocópia do contorno do Gato Azul, conforme pode ser visto na Figura 12, retratado pelo pintor Aldemir Martins (2003). Pediu, então, que as crianças novamente observassem o gato presente na referida obra e perguntou-lhes: “Existe gato azul?” “É um gato ou a representação de um gato?”. Algumas crianças responderam e outras, por estarem envolvidas em conversas e brincadeiras, ignoraram os questionamentos. Com base nas respostas obtidas, a professora pediu-lhes que pintassem a folha contendo a reprodução do contorno do gato, usando de suas livres escolhas.

Figura 11 – Gato Azul com Vaso de Flores (2003)

Nessa etapa do trabalho surgiram várias interpretações do personagem, sendo que uma criança pintou os olhos do gato de cor vermelha e comentou que esse era: “O

gato mau”, porque esse tinha “Os olhos do terror”. Outras crianças fizeram algo similar

depois que ouviram esse comentário. Na execução do trabalho, algumas ficaram à parte, entretidas com divertidas conversas.

Observamos que três grupos trabalharam e os demais não se envolveram com o conteúdo artístico da aula. Mas, no geral, as crianças mostravam-se fascinadas por

personagens de uma novela que o SBT (Sistema Brasileiro de Televisão) transmitia chamada Rebeldes – que retratava o cotidiano de uma escola mexicana – e essas trocavam entre si figurinhas do álbum relacionado com os personagens da referida novela.

Realizado o trabalho de pintura, a professora entregou um retângulo de papel dobradura colorido e pediu que recortassem o contorno do gato e o colassem nesse papel. Ao final da aula, muitas crianças não haviam terminado a pintura e, assim, ela recolheu todos os trabalhos e os guardou. (Aula observada no dia 28 de agosto de 2006).

Julgamos importante, para a análise dessa aula, pensar a respeito das questões envolvendo: atividades de ensino, trabalhos ou projetos realizados em grupos. Os trabalhos de grupos têm por objetivo proporcionar o desenvolvimento infantil nos diversos aspectos e para todos os co-participantes. No momento em que as ações são pensadas no coletivo, gerando a co-participação efetiva dos sujeitos, o aprendizado, geralmente, ocorre mediante a interação e a co-participação ativa de seus membros e realizando, assim, um trabalho coletivo. Durante o trabalho em grupo, o diálogo e a busca de informações são imprescindíveis para atingir resultados esperados (PICHON-RIVIÈRE, 1982).

Mas, isso de certa forma não ocorreu nessa aula porque não houve momentos de co-participação coletiva, ou seja, as crianças não se envolveram com a proposta artística em questão. Pareceu-nos, então, que os integrantes de cada grupo não estavam estimulados para realizarem o trabalho envolvendo o gato azul com vaso de flores, apresentando pouco entusiasmo e sem voltar o olhar para as reproduções das obras expostas no contexto de um quadro de giz.

Notamos, ainda, que as crianças, ao realizarem a atividade artística proposta, praticamente não acrescentaram novas informações ou criaram novos elementos artísticos na figura em questão. Também observamos que não houve cooperação, nem diálogo relacionado com o trabalho que estava em processo de construção. A única característica que identificou a atividade em grupo foi a disposição espacial das carteiras organizadas na aula anterior.

Na proposta, conforme já foi registrado e que se relaciona com a leitura das reproduções criadas pelo pintor Aldemir Martins (2003), observamos que essas figuras artísticas não contagiaram a maioria das crianças. Entendemos que a leitura de imagens visuais não é um passatempo, nem tampouco uma forma milagrosa, mágica e mística para o ensino. Mas pode significar uma excelente estratégia pedagógica para ampliar ainda mais a competência visual da criança, como também do professor, porque requer embasamento teórico e recursos técnicos.

Mesmo considerando que a leitura de imagens possa ser utilizada como ferramenta importante na metodologia do ensino da arte, em especial, no geral, ainda não é adotada de forma a contribuir com o processo de ensino e aprendizagem. Conforme explica Dondis (2003, p.17) “[...] o sistema educacional move-se com lentidão monolítica, persistindo ainda uma ênfase no modo verbal, que exclui o restante da sensibilidade humana, e pouco ou nada se preocupando com o caráter esmagadoramente visual da experiência de aprendizagem da criança”.Isso possivelmente ocorre devido à inexistência de investimentos e à precariedade dos recursos audiovisuais e materiais de apoio didático-pedagógico utilizados nessa escola.

A precariedade de recursos didático-pedagógicos ficou evidenciada nessa aula, porque houve uma mínima distribuição de reproduções da figura do gato em tamanho reduzido que não contribuiu para despertar a atenção e o interesse das crianças pela proposta. Assim, sem estarem seduzidas ou despertadas para co-participarem do trabalho, as crianças não dialogaram nos grupos, nem trocaram opiniões sobre os diferentes olhares impressões e curiosidades relacionadas com as figuras apresentadas.

Além desse aspecto, a participação das crianças nessa aula em nossa concepção, foi mínima, provavelmente porque no seu cotidiano as imagens visuais a que têm acesso são mais atraentes e são apresentadas de maneira a seduzir o olhar infantil em relação a TV, cinema, videogames, internet entre outras mídias, que fascinam e prendem a atenção. Cabe citar, como exemplo, o encantamento das crianças pelas figurinhas contendo imagens de personagens da novela mexicana Rebeldes.

Assim, pensamos que a professora deixou de aproveitar algumas oportunidades para estimular as crianças no sentido de ver, olhar, enxergar e dizer o que sabiam a respeito do assunto em discussão sobre o que gostariam de saber mais em relação aos quadros ou a razão pela qual estavam inquietas diante da figura do Gato Azul Com Vaso

de Flores (2003). Além disso, a professora praticamente não exerceu seu trabalho de

mediadora do ensino artístico, deixando de trazer ou provocar a manifestação de conhecimentos relacionados ao cotidiano das crianças podendo relacioná-los com o contexto da referida novela. Assim agindo, abriria espaço para dialogar com as crianças que naquele momento se distraíam mais com as figurinhas dos personagens da novela do que com o fazer artístico.

Esperamos que isso aconteça na continuidade desse trabalho na próxima aula, e que a professora realize realmente um processo de mediação do trabalho artístico com as crianças.