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Capítulo 4 O GPS como previsor de chuva

4.3 Resultados

4.3.3. Algoritmo de aproximação linear

Os casos de estudo previamente analisados indicam que muitas vezes é observado um padrão no comportamento do PWV quando ocorre chuva intensa, resultando num crescimento gradual até a ocorrência de chuva e posterior decréscimo brusco do sinal. Apesar da análise desta característica simples, a relação entre estas variáveis pode ser bastante complexa resultando da heterogeneidade da distribuição da chuva tanto no espaço como no tempo. Esta característica revela uma relação causa efeito que não é reversível, o que significa que em muitas das variações bruscas no PWV não é verificado nenhum registo de chuva nas estações meteorológicas. De modo a averiguar mais profundamente a relação entre o sinal PWV e a chuva, é analisado um conjunto de dados contínuos em grupos de estações emparelhadas GPS – meteorológica, em função da distância mais próxima. Os pares definidos segundo a distribuição geográfica da Figura 3.1 são IGP0 - IDL (distância 1 km), CASC – Cabo Raso (distância 7.5 km), PAML – Setúbal (distância 3 km), e FCUL - Aeroporto (distância 3.5 km). A continuidade dos dados refere-se ao período anual completo de 2012.

A evolução temporal do comportamento do PWV obtido a partir de uma estação GPS é analisada através de um ajustamento linear por mínimos quadrados dos seus valores horários contínuos. A tendência do sinal é analisada de hora a hora, agrupando os registos estatisticamente semelhantes de PWV numa linha quebrada que representa o comportamento geral da tendência naquele curto período de algumas horas. O ajustamento linear dos dados é verificado para as 6 horas anteriores avaliando assim a tendência local do sinal, isto é, se está a crescer ou a decrescer significativamente em relação ao valor corrente. Se o sinal da verificação é revertido (critério de paragem), a análise é terminada resultando numa linha reta com uma tendência crescente ou decrescente representando uma aproximação local ao comportamento do PWV durante aquele número de horas. É também realizada uma quantificação da quantidade de precipitação horária acumulada e do número de horas correspondente a cada linha reta. Após uma corrida do algoritmo utilizando os dados anuais de PWV o resultado será um conjunto de segmentos de reta que indicam a monotonia da sequência temporal do vapor de água (sinal do declive do segmento de reta) identificando também os locais onde existem inversões significativas do sinal. Este algoritmo é semelhante ao piecewise linear que é utilizado no processamento GPS para modelar o ZHD (ver secção 3.2). Uma ilustração do algoritmo de aproximação linear aqui desenvolvido está presente na Figura 4.4.

O intervalo de 6 horas é definido para realizar o ajustamento ao longo do tempo com o objetivo de estabelecer uma janela temporal adequada para o propósito da previsão da chuva em tempo real (nowcasting). Desta forma algumas estruturas que por vezes são mais afetadas pelo ruído do PWV (ex. caso de estudo Figura 4.3c) são amenizadas. Diminui-se também a complexidade da análise e automatiza- se o processo de identificação dos picos de PWV com grandes gradientes, como os identificados nos casos de estudo da secção 4.3.2. Observando o exemplo para o par IGP0 – IDL, de um total de 8636 horas de observações GPS (com interrupções de algumas horas na continuidade anual dos registos na estação) são gerados 1186 segmentos de reta com tendências ascendentes e descendentes.

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Figura 4.4: Exemplo de performance do algoritmo de ajustamento linear. A linha vermelha e os pontos azuis representam os registos de PWV, as linhas azuis o ajustamento linear por mínimos quadrados a cada hora e as linhas verdes os segmentes de reta determinados no algoritmo.

Tabela 4.1: Chuva acumulada nas diferentes classes determinadas pelo algoritmo de aproximação linear aplicado aos dados de PWV. Os dados referem-se ao ano de 2012 e aos pares estações GPS – meteorológica. Entre parêntesis

são apresentados os resultados referentes apenas a um par (IGP0-IDL).

Os segmentos de reta foram categorizados de forma a avaliar melhor a correlação temporal entre o sinal GPS e os eventos de precipitação. São então definidas 4 classes da seguinte forma: (A) linha representando crescimento do PWV durante mais de 6 horas, (B) linha representando o decréscimo do PWV até 6 horas após a ocorrência de linhas da classe A, (C) linhas mais curtas representando crescimento do PWV até 6 horas, e (D) linha representando os restantes decréscimos não verificados após A. Na Tabela 4.1 são representadas algumas características estatísticas globais relativas ao ano de 2012 e a todos os pares estação GPS – meteorológica analisados, juntamente com os resultados apenas para o par IGP0 – IDL (entre parêntesis). A classe B corresponde a 10% do tempo total e é responsável por 50% da chuva anual. O seu rácio de precipitação (chuva total em mm sobre o número total de horas) é de 0.34 mm/h, sendo 5 vezes superior à média anual deste indicador. Em contraste a classe A regista 37% do tempo anual e é responsável por apenas 15% da chuva total, com um rácio de precipitação de 0.03 mm/h, que é duas vezes inferior à média anual. Entre as classes A e B existe uma diferença na variação do rácio de precipitação que atinge um fator de 11. Isto demostra que os episódios de chuva captados por cada uma destas classes são bastante distintos, sendo a elevada quantidade de chuva na classe B um forte indicador da sua capacidade para categorizar a chuva intensa. Alguma da chuva captada em A pode estar relacionada com alguns episódios de chuva intensa que transitam para a classe B, mas que resultam

Classe de classificação do comportamento do PWV (A) Crescimento longo do PWV ( > ) (B) Decréscimo do PWV até 6h após classe A (C) Crescimento do PWV até 6h ( ) (D) Decréscimo do PWV excluindo classe B Total Chuva total (mm) 327 (85) 1059 (319) 369 (111) 376 (99) 2131 (614) Número de segmentos de reta 884 (246) 884 (246) 914 (253) 1596 (441) 912 (1186) Tempo total (h) 11595 (3222) 3110 (865) 3512 (986) 12709 (3563) 30926(8636) Rácio de chuva (mm/h) 0.03 (0.03) 0.34 (0.37) 0.10 (0.11) 0.03 (0.03) 0.07 (0.07) Fração de tempo 0.37 (0.37) 0.10 (0.10) 0.11 (0.11) 0.41 (0.41) 1.00 (1.00) Fração de chuva 0.15 (0.14) 0.50 (0.52) 0.17 (0.18) 0.18 (0.16) 1.00 (1.00)

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possivelmente nalguma chuva em A devido à elevada dinâmica espácio-temporal na variação do PWV, ou de erros de classificação do algoritmo. As classes C e D apresentam resultados intermédios. Na classe C o tempo total é de 11% e é apresentado um rácio de chuva cerca de 0.10 mm/h. A classe D apresenta o tempo total mais longo de 41% com um rácio de chuva menor do que 50% da média anual, registando um valor semelhante ao obtido na classe A. A menor quantidade de chuva acumulada, distribuída pela maior duração dos eventos classificados como C ou D, são indicadores de que a maior parte da chuva fraca a moderada é aqui categorizada. Analisando os resultados obtidos apenas para o par IGP0 – IDL podemos verificar que as diferenças são bastante diminutas relativamente aos resultados de todos os pares, apenas variando residualmente nos índices da razão e fração de chuva nalgumas classes.

Figura 4.5: Probabilidade de chuva em 2012 em função de: (a) PWV máximo, (b) incremento PWV e (c) taxa de variação do PWV; PWV/ t. O eixo dos x representa o limite superior do intervalo de cada classe em cada índice. Dados do par de estações IGP0 - IDL (cima) e par de estações PAML - Setúbal (baixo).

Na Figura 4.5 é apresentada a fração de eventos de chuva para o par IGP0 – IDL analisando apenas os episódios classificados como classes A e B, ou seja, as linhas que representam as características onde existe a maior probabilidade de ocorrência de chuva intensa. São definidos 3 índices simples para caracterizar o comportamento do PWV e é feita uma classificação através dos valores observados no PWV de cada evento da seguinte forma: máximo do PWV, incremento absoluto do PWV durante o gradiente de crescimento ( PWV), e taxa de variação durante esse crescimento ( PWV/ t). Os círculos representam a percentagem de casos de chuva relativamente ao número de tendências que são identificados em cada um dos intervalos que definem uma classe. Observando a figura é de notar que a precipitação só acontece para picos máximos de PWV que excedam os 12 mm, e que a probabilidade de chuva em geral sobe de forma linear com o aumento desse valor máximo de PWV. Quando o PWV é superior a 39 mm a probabilidade de chuva é na ordem dos 70%. O índice de incremento absoluto de PWV mostra uma relação semelhante, onde sobressaí a probabilidade de chuva acima dos 60% para crescimentos de mais de 12 mm no PWV.

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69 Apesar das probabilidades manterem uma tendência de crescimento aproximadamente linear existe neste índice um pouco mais de dispersão comparando com o máximo do PWV. A taxa de variação do PWV apresenta uma relação praticamente linear entre a probabilidade de chuva e o incremento deste índice (com exceção do valor registado para a classe 3.15). Valores superiores a 1.75 na taxa de variação apresentam uma probabilidade de chuva em crescendo a partir dos 50%, chegando mesmo aos 100% na classe 3.50. Taxas de variação elevadas de PWV representam os casos de pico saliente observados no comportamento do PWV (ex. Figura 4.3a e 4.3b), que normalmente estão acompanhados de precipitação intensa. O mesmo tipo de análise é apresentado também na Figura 4.5 mas utilizando os dados do par de estações PAML – Setúbal. Este apresenta um padrão de resultados semelhante mas com um pouco mais de dispersão em todos os índices e piores resultados nos valores mais elevados das classes. Isto pode dever-se ao facto de não serem registadas tantas chuvas intensas nesta localização comparando com o caso anterior. Uma longa série temporal de dados que incluísse vários pares de estações GPS – meteorológica seriam necessários para validar os resultados apresentados nesta figura, mas contudo podemos concluir que existe uma clara correlação positiva entre a probabilidade de chuva e este comportamento específico do PWV visto a partir de uma estação GPS.

Tabela 4.2: Relação observada entre a intensidade de chuva e as classes de PWV do algoritmo de aproximação linear. Dados com respeito a todos os pares estações analisados para 2012, juntamente com dados referentes ao par

IGP0-IDL (entre parêntesis). A última linha (*) contem todos os eventos de 2010-2012 para este último par.

Na Tabela 4.2, o mesmo conjunto de dados analisados anteriormente é comparado com alguns níveis de intensidade de chuva. Estes níveis são definidos de acordo com a intensidade de precipitação registada numa hora: 0 representa ausência de chuva, ]0,5[ representa chuva fraca, [5,10[ representa chuva moderada e 10 significa ocorrência de chuva intensa ou severa. Considera-se ausência de chuva para registos inferiores à capacidade mínima de observação nas estações meteorológicas (0.1 mm/h). As classes são agrupadas em A+B e C+D de modo a simplificar a análise. Como é previsível, no agrupamento A+B, a maior parte das linhas obtidas do algoritmo são referentes a episódios de ausência de chuva, correspondendo a 74% do total de eventos. Nos restantes 227 eventos, apenas 18% excede os 5 mm e 10% excede os 10 mm de precipitação em 6 horas. O agrupamento de classes C+D regista 63% do total dos episódios anuais de chuva moderada (318 em 504). Contudo as classes A+B registam uma percentagem mais elevada, de 68% (19 em 28) para os eventos de chuva moderada, e de 82% para todos os eventos de chuva intensa (22 em 27). Percentagens muito semelhantes são observadas quando analisamos os dados neste agrupamento de classes contemplado apenas o par do centro de Lisboa IGP0 – IDL. Quando analisamos todos os registos de chuva severa durante os três anos de estudo aqui processados, verificamos que para o caso do par de estações IGP0 - IDL é obtido para as classes A+B um número muito elevado de eventos, representando 92 % do seu total (24 em 26). É de salientar ainda analisando a Tabela 4.2, que os valores da variação média do PWV em todos os 3 índices apresentados (máximo, incremento absoluto e taxa de variação do PWV) vão crescendo em função do aumento da intensidade das classes definidas para a chuva, registando valores ainda mais elevados quando analisamos apenas o par IGP0-IDL (sendo o par com menor distanciamento e consequentemente com maior fiabilidade na análise estatística).

Classe Variação média do PWV

Máximo da

razão de chuva A+B C+D ( )

mm/h # eventos mm mm mm/h 0 657 (189) 2178 (602) 18.89 (19.14) 3.32 (3.36) 0.69 (0.72) ]0,5[ 186 (46) 318 (88) 25.46 (26.25) 7.11 (7.95) 1.13 (1.20) [5,10[ 19 (6) 9 (3) 30.45 (26.26) 5.58 (7.22) 1.11 (1.24) 10 22 (5) 5 (1) 32.32 (35.15) 9.47 (10.62) 1.40 (1.50) 10* 24 2 31.40 8.08 1.31

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