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Capítulo 2 Enquadramento

2.7. Caraterísticas interferometria SAR

A técnica interferometria SAR consiste na medição da diferença da fase entre duas imagens de satélite adquiridas sobre a mesma região e pelo mesmo sensor, aproximadamente da mesma posição orbital, mas em duas épocas distintas. A aquisição das imagens é feita através da emissão de radiação micro-ondas a partir do sensor SAR instalado num satélite e captação do sinal refletido da superfície terrestre, tendo em conta que o sinal atravessa a atmosfera e por isso é atrasado devido à diferente distribuição do vapor de água pela camada troposférica, tal como é descrito na secção 2.1. O sinal é reproduzido em duas variáveis aleatórias distintas que são a amplitude e a fase, estando a primeira ligada à resposta do terreno no momento da reflexão do sinal e a segunda às propriedades físicas do meio envolvente durante o seu trajeto. As diferenças entre os píxeis das duas imagens são medidas em diferença de fase e em diferença geométrica (distância do terreno ao sensor espacial), contendo informação da distribuição do atraso do sinal entre as duas aquisições, onde a imagem de referência é definida como

master e a outra como slave (Hanssen, 2001). À diferença de fase no interferograma é removida a

componente relativa ao terreno através da aplicação de um MDT combinada com um algoritmo de desenrolamento de fase (Nico e Fortuny, 2003; Hooper et al., 2007). Desta forma resulta uma imagem da fase desenrolada do interferograma que pode ser expressa sob a forma de soma das seguintes componentes:

k

2

N O I T D (2.21)

onde D corresponde à deformação observada no terreno, T ao atraso troposférico, I ao atraso

ionosférico, ao erro no modelo digital do terreno, O corresponde à imprecisão orbital, N contém

Capítulo 2: Descrição teórica geral

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ao termo constante de ambiguidade de fase resultante da operação de desenrolamento. A componente de fase devida à influência da camada ionosférica é residual e mantem-se aproximadamente invariável no tempo decorrido entre as várias aquisições (Mateus et al., 2013a), e como a fase é uma medida diferencial esta quantidade acaba por se anular. Outras componentes com valores residuais na contribuição total da equação 2.21 são o erro do MDT quando este tem uma elevada resolução espacial, o erro das órbitas quando são calculadas de forma precisa e a componente devida aos ruídos termais e de processamento (Hooper et al., 2007).

Normalmente os efeitos atmosféricos na troposfera são tratados no InSAR como uma limitação da técnica, mas em condições particulares estes podem até ser aferidos com bastante precisão (Mateus et al., 2013b). Se as componentes descritas em 2.21, particularmente a da deformação observada no terreno, forem suficientemente pequenas a grande maioria da estimação da diferença de fase é devida ao conteúdo de vapor de água presente na troposfera aquando da aquisição das duas imagens SAR (Catalão et al., 2011; Mateus et al., 2013b). A coerência interferométrica, que é uma forma de medir a qualidade do interferograma, deve ser suficiente para que estas medições possam na sua maioria ser estimadas como efeitos atmosféricos (Hanssen, 2001; Hooper et al., 2007). Os dois fatores principais que influenciam negativamente a coerência num interferograma são a base temporal, que se define pelo período de dias entre a aquisição de duas imagens SAR, e a base espacial, que representa a diferença geométrica entre a posição precisa das órbitas no instante da aquisição das duas imagens. Na Figura 2.8 é visível uma representação da formação de um interferograma através da passagem pela mesma órbita de duas imagens SAR e as respetivas componentes geométricas. R1 e R2 representam as distâncias entre as imagens SAR 1 e

2 e o ponto P no terreno, 1 representa o ângulo de incidência dos sensores e H a altitude. A base espacial B resulta da relação espacial entre a base paralela B e a base perpendicular B .

Figura 2.8: Representação esquemática da aquisição de duas imagens SAR para gerar um interferograma. A base espacial B resulta da relação espacial entre a base perpendicular B e a base paralela B (Benevides, 2009).

Outros fatores que influenciam a coerência e estão diretamente relacionados com o terreno são a vegetação, que é bastante influenciável quer pela intervenção antropogénica quer pelas variações sazonais e climáticas, e a água, cuja rugosidade da superfície é dependente do vento e das correntes hidrológicas de diversa natureza (oceano, rio ou lago). A grande vantagem das imagens de deteção remota SAR relativamente a outras multiespectrais ou de sensores óticos é a sua capacidade de observação em todas as condições atmosféricas (cobertura de nuvens), independentemente da presença de radiação solar (durante a noite). Uma explicação teórica mais aprofundada sobre os princípios da interferometria SAR está presente em Benevides (2009) e Mateus (2013).

As séries temporais InSAR são utilizadas usualmente para medir a evolução temporal da deformação do terreno causada por diversos fenómenos naturais como sismos, subsidência, deslizamentos

Estimação do campo 3D do vapor de água através de técnicas de tomografia por GNSS e InSAR

39 de terra, erupções vulcânicas ou o degelo de glaciares. Por outro lado, o processamento de uma série temporal de interferogramas SAR numa região onde o terreno não é afetado por deformação significativa ao longo dos anos (confirmando com outras medições independentes), permite estudar o sinal captado nos interferogramas do ponto de vista da atmosfera (Mateus et al., 2014). Nestas condições, removendo as restantes contribuições residuais da fase, a variação temporal do atraso húmido pode ser determinada num interferograma (Hanssen, 2001). À semelhança do que acontece com o sinal GPS, o atraso medido na linha de vista do radar que percorre a troposfera depende da refratividade que influencia o sinal na altura da aquisição dos dados (Mateus et al., 2013a). Uma expressão baseada na constante aplicada aos dados GPS para converter os valores de atraso húmido obtidos do processamento em valores integrais de PWV (secção 2.5.4) pode ser aplicada às medições de ZWD determinadas a partir dos interferogramas SAR (Mateus et al., 2014). Desta forma a diferença de fase no atraso medido pela interferometria SAR é aproximadamente proporcional ao vapor de água integrado presente no sinal, em função do ângulo de incidência radar e do comprimento de onda da frequência do sinal, e pode ser determinado com uma incerteza muito pequena utilizando a seguinte expressão (Mateus et al., 2013a):

) cos( 1 = Mf , Mf 4 = PWV SAR (2.22)

onde corresponde ao comprimento de onda do sensor SAR em metros, representa o ângulo de incidência do sinal, a diferença de fase desenrolada medida pela interferograma, Mf representa a função de mapeamento que descreve a dependência do atraso em relação ao ângulo de incidência e corresponde à constante de proporcionalidade entre o atraso e o PWV, estabelecida por Bevis et al. (1992). Como o PWV calculado nesta metodologia é relativo à diferença entre os instantes de tempo de aquisição da imagem master e slave, é assumido que a componente da atmosfera presente na fase relativa ao atraso hidrostático seja aproximadamente a mesma nas duas épocas. Além do mais, Zebker et al. (1997) demonstram que esta componente atmosférica é eliminada quando os planos orbitais são estimados e removidos do interferograma. Consequentemente o atraso hidrostático presente na fase interferométrica é eliminado devido ao processamento diferencial, resultando um mapa PWV de precisão suficiente (Mateus et al., 2013b). Contudo, se pretendermos aumentar ainda mais a precisão, é possível estimar o atraso hidrostático recorrendo a medidas externas de alta resolução espacial (NWP) e retirar a componente da diferença no atraso hidrostático, da diferença de fase calculada na equação 2.21.

Os mapas PWV derivados do InSAR necessitam ainda de ser calibrados com medidas externas, devido à constante arbitrária introduzida no processo de desenrolamento de fase do interferograma (Mateus et al., 2013b). Uma forma prática de o realizar consiste no cálculo dos PWV nas estações GNSS que se encontrem dentro da área do interferograma, fazendo a respetiva diferença entre os valores absolutos observados nas estações à época da imagem master e slave. Uma função de custo C é aplicada para minimizar os valores, permitindo efetuar a calibração entre as duas técnicas através da determinação de uma constante K da seguinte forma (Mateus et al., 2013a):

2 N 1 n N 1 i P SAR GPS GPS P K N PWV - PWV C (2.23)

onde PWVSAR, PWVGPS são as variações do vapor de água precipitável entre as duas épocas das imagens SAR medidas pelo InSAR e pelo GPS respetivamente, NGPS é o número de estações GPS, Np o conjunto de

píxeis no interferograma delimitado por um círculo, que representa a área da atmosfera abrangida pela geometria de cone invertido centrada em cada estação GPS (Hanssen, 2001). A média dos valores dos píxeis do interferograma no interior desse círculo é utilizada para determinar a constante, que será somada aos valores finais de PWV determinados na equação 2.22.

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Um exemplo para aplicação desta técnica pode ser realizado recorrendo aos dados do satélite EnviSat operacionalizado pela ESA (presentemente obsoleto), no qual está instalado um sensor ASAR que emite sinal na frequência da banda C (correspondente a um comprimento de onda de 5.6 cm) e tem um tempo de revisita médio de 35 dias. O processamento de todas as séries temporais presentes e futuras de mapas PWV obtidos das diferentes plataformas espaciais contendo a bordo sensores SAR, poderá abrir uma nova perspetiva na medição da atmosfera, que já foi batizada de meteorologia SAR (Mateus, 2013; Mateus et al., 2013b). Presentemente medições desta natureza podem ser realizadas recorrendo aos sistemas de satélites ou missões com diferentes bandas de aquisição como o ALOS-2, TerraSAR-X, Cosmo-Sky-Med e Sentinel-1, onde o período de revisita sobre a mesma região do planeta combinando todos os sensores pode diminuir para apenas alguns dias. Contudo não é possível obter interferogramas de imagens SAR com origem em diferentes órbitas, ângulos de incidência e área de rastreamento no terreno (Mateus et al., 2013b). A existência de uma cadeia de processamento de mapas atmosféricos provenientes do InSAR poderá fornecer informação de alta resolução espacial da variação do vapor de água a uma escala que presentemente não é possível de alcançar com outras técnicas de medição.

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Capítulo 3

Implementação e tratamento de dados

3.1. Descrição das experiências e configuração da rede GNSS

O primeiro passo para a realização do trabalho proposto neste tema de doutoramento consiste na obtenção de dados para implementação da tomografia GNSS, através da configuração de uma rede de estações permanentes disponível na região da Grande Lisboa e Vale do Tejo. A região de estudo abrange aproximadamente uma área de 100x150 km2, incluindo um conjunto de 15 estações permanentes

distribuídas pela área visível na Figura 3.1. Parte das estações é administrada pela Direção Geral do Território (DGT); nomeadamente CASC, GRIB, IGP0, PAML, SCAC e a restante está sob a responsabilidade do Instituto Geográfico do Exército (IGeoE); em particular ALCO, ARRA, CRAI, FVFI, IGEO, MAFR, PCAR, SMAR, VNOV. Existe ainda a estação FCUL que é propriedade da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. A estação CASC é a única deste conjunto que faz parte da rede europeia de processamento EPN (EUREF Permanent Network).

Figura 3.1: Distribuição das estações GNSS disponíveis para realizar a tomografia GNSS na área de estudo, com zoom sobre a área metropolitana de Lisboa onde são visíveis as estações meteorológicas e de radiossondagem.

Na Figura 3.1 é também observável um MDT, a rede de estações meteorológica utilizada neste trabalho, que faz parte do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) e a estação regional de radiossondagens administrada pela mesma entidade. As altitudes das estações GNSS são referidas ao elipsoide GRS80, variando desde os 75 m observados em PACO até aos 409 m registados para a estação ARRA. O relevo na região não é acentuado mas manifesta alguma complexidade, sendo relativamente plano nas áreas circundantes à margem do estuário do Tejo, localizadas a oeste de ALCO, e com duas regiões montanhosas de destaque que são a serra de Sintra, localizada a norte de CASC, e a serra da Arrábida localizada a oeste de ARRA e PAML. A sua configuração costeira revela um maior grau de