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Capítulo 3 Implementação e tratamento de dados

3.2. Processamento GPS

Os dados de entrada para a realização da tomografia GNSS, que são os perfis integrais SWD, só podem ser estimados a partir da determinação prévia dos perfis verticais de vapor de água na rede de estações definida na região de estudo. Estes perfis verticais são determinados através do processamento de dados GPS utilizando software especializado para a obtenção de parâmetros geodésicos e meteorológicos de elevada precisão nas estações GNSS. Este software permite utilizar um grande volume de dados e incluí um número considerável de parametrizações e modelos que se podem adotar. A determinação do posicionamento de uma rede de estações com elevada precisão garante a obtenção de erros diminutos em todas as fontes do sinal GPS (secção 2.5.1), que são condições fundamentais para determinação dos parâmetros troposféricos com a maior precisão possível (Tregoning et al., 1998). O software utilizado neste trabalho para este fim é o GAMIT/GLOBK (v10.3-v10.5) (Herring et al., 2010).

O GAMIT (GPS Analysis at MIT) organiza a informação GPS recolhida em cada estação em sessões diárias de processamento de dados, com o objetivo de obter as coordenadas das estações e os respetivos parâmetros atmosféricos com a maior precisão possível. São adicionadas à rede de estações da tomografia GNSS (ver secção 3.1) um conjunto de várias estações IGS (International GNSS Service) bem distribuídas por todas as localizações do globo. Deste modo é garantida uma melhor estimação no

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posicionamento, formando linhas de base suficientemente longas que permitam diminuir a correlação entre os parâmetros troposféricos e entre a altitude em estações separadas apenas por alguns quilómetros (Rocker et al., 1995; Tregoning et al., 1998). São utilizadas as órbitas precisas finais IGS. A cadeia de processamento de dados GPS foi configurada em duas etapas distintas, com vista a realizar a estimação dos parâmetros atmosféricos com a maior precisão possível.

Num primeiro passo é realizado o processamento diário de 24 horas no GAMIT, fixando um grande número de estações IGS (mais de 50) ao referencial terrestre ITRF08, aplicando posteriormente o GLOBK (Global Kalman filter VLBI and GPS analysis program) para estimar uma solução de coordenadas global para todas as sessões diárias, de forma a obter precisão milimétrica nas coordenadas das estações GNSS de Lisboa. Um segundo passo é realizado correndo apenas o GAMIT, fixando as coordenadas precisas estimadas no primeiro passo e configurando algumas opções do programa de modo a refinar as estimativas dos parâmetros atmosféricos e a separar melhor os erros das outras fontes não troposféricas (secção 2.5.1).

Neste passo é implementada uma estratégia de sobreposição de janelas temporais de modo a reduzir a discrepância no ZTD que surge entre estimativas de dias consecutivos (Haase et al., 2003; Champollion et al., 2004; Brenot et al., 2006). O primeiro e o último valor do intervalo do processamento diário nos dados GPS têm usualmente um efeito de fronteira causado pelo método estocástico da determinação dos parâmetros, resultando em vários milímetros de divergência (Jin et al., 2007). A metodologia da sobreposição de janelas temporais consiste em efetuar 4 processamento para cada dia, com sessões de 12 horas de duração, com início desfasados em 6 horas (21:00–09:00, 03:00–15:00, 09:00– 21:00, 15:00–03:00 UTC), utilizando apenas as 6 horas centrais de cada janela. Desta forma, após a fusão da informação anterior resulta um conjunto de dados processados correspondente às 24 horas de um dia, que é mais facilmente notável no esquema apresentado na Figura 3.5.

Figura 3.5: Esquema da estratégia de sobreposição de janelas temporais adotada para o processamento GAMIT.

As órbitas utilizadas no primeiro passo são ajustadas no sistema de equações normais do processamento GAMIT e utilizadas de forma fixa no segundo passo. Este procedimento evita a imprecisão que ocorre na estimação das órbitas quando se fazem sessões de processamento inferiores a 24 horas, principalmente quando a janela temporal de dados se sobrepõe por 2 dias. Com esta metodologia resultam estimativas do ZTD com maior precisão (Haase et al., 2003; Champollion et al., 2004; Jin et al., 2007). Testes realizados com diferentes configurações de janela, analisando os valores da estação IGP0 para dois dias com uma larga diferença às 0 horas, mostram que a diferença observada para uma sessão de 24 horas é 10 mm, para duas sessões de 24 horas aproveitando 12 horas centrais é de 6 mm e que para várias sessões de 12 horas aproveitando 4 ou 6 horas centrais a diferença diminui para 0.5 mm. A incerteza média do atraso diminui de 6 para 4.5 mm, com a diminuição da janela de processamento de 24 para 12 horas.

Inicialmente, o parâmetro troposférico ZTD é determinado para cada estação, a partir do valor aproximado estimado para o ZWD e do valor do ZHD determinado a priori com precisão. Os modelos utilizados para estimar o ZHD e o ZWD no GAMIT estão representados nas equações 2.7 e 2.8 respetivamente. Ao longo do processamento são determinadas correções ao ZTD que são calculadas com

Estimação do campo 3D do vapor de água através de técnicas de tomografia por GNSS e InSAR

45 base na variação temporal do ZHD, usando a interpolação linear piecewise em diferentes nodos temporais (função definida por partes ou segmentos de reta, com vários subdomínios da variável a determinar) (Herring et al., 2010). A esta função é constrangido um processo estocástico Gauss-Markov que tem um impacto significativo na estimação do ZTD (Jin e Wang, 2004; Brenot et al., 2014). As opções de parametrização desta função são a variação do ZTD, definida com o valor de 1 cm/h1/2 (Champollion et al.,

2004) e a variação no caso dos gradientes horizontais, definida com o valor 2 cm/h1/2 (Brenot et al., 2014).

Foram realizados testes avaliando a influência do parâmetro da variação do ZTD da função estocástica, na determinação final do ZTD, que são visíveis na Figura 3.6. Valores elevados do parâmetro (0.05) parecem criar demasiados artefactos no ZTD, enquanto valores demasiados pequenos (0.005) provocam suavização do ZTD, tal como foi verificado em estudos anteriores (Brenot et al., 2006; 2014). Posto isto, a escolha do valor de 1 cm para o parâmetro da variação do ZTD é uma opção equilibrada.

Figura 3.6: Comparação do ZTD determinado na estação IGP0 para diferentes valores do parâmetro da variação zenital, ligado à função estocástica Gauss-Markov.

O objetivo da determinação do ZTD com a melhor precisão possível é garantir estimativas do ZWD nas mesmas condições, sendo este último fundamental para a realização da tomografia GNSS. A frequência de estimação dos ZTD é definida em intervalos de 15 minutos (96 valores por dia) e os respetivos gradientes horizontais em intervalos de 30 minutos (48 valores por dia), criando um equilíbrio entre a cobertura temporal ao longo da série diária de dados GPS e o tempo consumido no processamento dos mesmos (Herring et al., 2010). Uma frequência temporal mais apertada para os parâmetros atmosféricos resultaria num aumento extraordinário no tempo de processamento GPS, devido à duplicação ou triplicação do número de parâmetros a determinar por sessão.

Geometricamente o ZTD é determinado tendo em conta a média pesada de todos os satélites observáveis no horizonte com diferentes linhas de vista, formando uma geometria de observação de cone invertido a partir de cada estação GNSS (Figura 2.6). Este peso é definido através das funções de mapeamento introduzidas na secção 2.5.5, onde o atraso oblíquo tem um peso maior quando o seu ângulo de elevação é mais próximo do zénite. Uma máscara de corte com um ângulo de 15º é definida no primeiro passo quando se calculam as coordenadas das estações, sendo este parâmetro relaxado para os 7º quando se determinam os parâmetros atmosféricos finais no segundo passo. Desta forma é observado o maior volume possível de vapor de água na área, que posteriormente vai ser reconstruído do ZWD na direção da linha de vista do satélite através dos SWD. Para tal são também aplicadas as funções de mapeamento VMF1 (Vienna Mapping Function 1) (Boehm et al., 2006). O ZHD foi modelado a partir de medições de pressão obtidas a partir de dados climatológicos, visto que na rede de Lisboa apenas a estação GNSS CASC possuí um barómetro acoplado. Para tal, foi utilizada a grelha global de dados ZHD (2.5ºx 2.0º) integrada nas funções de mapeamento VMF1, que foi determinada a partir de dados de reanálise

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meteorológica de 40 anos provenientes do ECMWF, com valores de 6 em 6 horas. Foi estimada uma exatidão global de 2 a 4 mm para o ZHD determinado por esta metodologia (Fernandes et al., 2013).

A temperatura à superfície para iniciar o ZWD (equação 2.8) é obtida a partir dos dados do modelo GPT (Global Pressure and Temperature), que contém também grelhas globais (15ºx15º) baseadas na reanálise de dados meteorológicos ECMWF mas com frequência de apenas um valor por dia, sendo bastante mais grosseiros que os dados de reanálise provenientes das VMF1 (Boehm et al., 2007). Neste caso o parâmetro da humidade relativa é mantido a 0.5 (Herring et al., 2010). Recentemente foi disponibilizada uma versão melhorada deste modelo, o GPT2, que fornece como dados de saída a pressão atmosférica, temperatura, lapse rate e pressão do vapor de água, com base numa grelha de 5º baseada nos dados do ERA-Interim (6 horas de intervalo) (Lagler et al., 2013). A escolha desta opção em futuros processamentos GAMIT será uma mais-valia para a determinação mais precisa do ZWD.

Outros modelos globais relacionados com a atmosfera e também configurados no processamento GAMIT são um modelo de carregamento oceânico derivado das marés (FES2004, Finite Element

Solutions 2004), sendo recomendado para o cálculo mais preciso dos parâmetros atmosféricos (Herring et

al., 2010), juntamente com um modelo de carregamento da pressão atmosférica com origem em dados de pressão atmosférica à superfície provenientes do NCEP (National Centers for Environmental Prediction) (Tregoning e van Dam, 2005).

Os gradientes horizontais do atraso zenital troposférico podem também ser calculados no GAMIT, seguindo a formulação da equação 2.10, sendo determinados em unidades métricas nas direções norte-sul e este-oeste e referidos aos 10º de elevação (Herring et al., 2010). Os resíduos pós ajustamento, que resultam no final do processamento GPS, são referidos a cada observação dada pelo par estação satélite, representando a diferença entre a observação inicialmente modelada e a observação final estimada (Champollion et al., 2004). Como já foi referenciado anteriormente (secção 2.5.3), este resíduo pode conter contribuições troposféricas não modeladas, possivelmente associadas a contribuições anisotrópicas do vapor de água tal como no gradiente troposférico (Flores et al., 2000). Em condições usuais a magnitude dos resíduos é próxima do 1 mm de atraso no zénite, mas que facilmente se amplifica quando é mapeado para ângulos de vista próximos do horizonte, para além de aumentar fortemente em situações meteorológicas severas com presença de chuva ou granizo (Champollion et al., 2004; Brenot et al., 2006).

O atraso ZWD determinado no final do processamento GAMIT é convertido em PWV, seguindo a relação descrita na secção 2.5.4. A constante de proporcionalidade relativa à equação 2.13 foi adaptada aos dados da rede de estações GNSS de Lisboa. É utilizada uma relação entre o integral da temperatura média Tm e a temperatura à superfície estimada a partir da análise de uma série anual de 3 anos de

radiossondas lançadas em Lisboa (Figura 3.1) (Mateus et al., 2014):

S m

47.2

0.8T

T

(3.1)

onde Ts representa a temperatura observada numa qualquer estação da rede GNSS utilizada neste trabalho. O erro médio quadrático estimado para a equação 3.1 é de 2.6 Kelvin. Os restantes valores da equação 2.13 definidos no GAMIT para determinar a constante apresentam os seguintes valores: Rv = 461.50

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