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Neste capítulo, verificamos que, apesar de todos os avanços nas pesquisas educacionais, o fenômeno da omissão geométrica ainda continua afetando as aulas de Matemática, tanto no ensino básico como nos cursos de formação de professores.

Essa omissão é influenciada pelo Movimento da Matemática Moderna, que propôs algebrizar o ensino da Geometria, a partir do formalismo e do rigor matemático. Além disso, fatores epistemológicos contribuem para esse quadro, especificamente, a relação dialética entre geometria do mundo sensível e a do mundo inteligível.

Ao longo da história humana, percebemos que os quadriláteros notáveis constituem um conceito em constante transformação e desenvolvimento. Algumas dificuldades conceituais de aprendizagem apresentadas por estudantes de diferentes níveis escolares possuem proximidades com as definições propostas por Euclides e Legendre, tais como não considerar o quadrado como retângulo e losango ao mesmo tempo.

Por fim, destacamos a importância do professor ao utilizar o livro didático de Matemática em sala de aula, abordar os quadriláteros notáveis a partir de diferentes situações didáticas que dão sentido a esse conceito. Assim, o estudante terá mais condições de obter sucesso no processo de conceitualização em Matemática.

3 PENSAMENTO GEOMÉTRICO: EM BUSCA DE UMA DEFINIÇÃO

Ao realizarmos um mapeamento sobre as pesquisas desenvolvidas no campo da educação geométrica, evidenciamos que diferentes autores (LABORDE, 1985; BISHOP, 1989; DELGRANDE, 1990; GUTIERREZ, 1991; PASTOR, 1993; MICHOUX, 2008; BLANCO, 2014; etc.) falam sobre pensamento geométrico. Embora exista uma concordância sobre a relevância de promover o desenvolvimento desse pensamento nos discentes do ensino básico, esses estudos não apresentam uma definição clara para esse termo, perdurando uma falta de consenso acerca do significado dessa instância do pensamento matemático.

Talvez, a falta de concordância sobre a caracterização do pensamento geométrico esteja fortemente ligada à própria natureza evolutiva da Geometria, ao grande número de objetos geométricos referentes ao seu campo conceitual, à mobilização de diferentes experimentos matemáticos e, ainda, pelas diferentes maneiras prováveis de considerar o pensamento em geral (ALMEIDA, 2016).

Perante essas circunstâncias, faz-se necessário, portanto, construir uma caracterização do pensamento geométrico que dialogue com o objetivo de nosso estudo, empregando como parâmetro pesquisas de alguns educadores matemáticos que mergulharam (e ainda mergulham) a investigar o assunto.

Fischbein (1993) tratou com muito cuidado sobre o processo de formação do pensamento geométrico, ao introduzir a noção de conceito figural. Na Geometria os conceitos dependem da fusão do aspecto figural e aspecto conceitual, isto é, o principal argumento do autor é que a Geometria pode ser compreendida a partir de entidades mentais (as chamadas figuras geométricas), que possuem ao mesmo tempo características conceituais e figurativas. Então, o pensamento geométrico é caracterizado pela interação entre esses dois aspectos.

Outro nome importante é Duval (1995), ao fornecer uma importante análise do pensamento geométrico ao apresentar a ideia de registros de representação semiótica, que são característicos da Geometria. Segundo o pesquisador, o aspecto crucial à compreensão geométrica é a diferenciação do objeto geométrico de sua representação. Os objetos geométricos são idealizações, construções mentais, enquanto que as figuras geométricas são representações desses objetos. Todavia, são essas representações que possibilitam o acesso aos objetos da Geometria.

É bastante evidente a proximidade entre as ideias de Fischbein (1993) e de Duval (1995), principalmente ao destacarem a importância das figuras geométricas na aprendizagem dos conceitos em Geometria, seja como entidades mentais na visão do primeiro autor, seja como representações semióticas, na ótica do segundo pesquisador.

Assim como Fischbein (1993), Luiz Carlos Pais (1996) também investigou sobre como ocorre a formação do pensamento geométrico. O autor brasileiro analisou as implicações do uso de desenhos, objetos materiais e de imagens mentais como recursos didáticos auxiliares e representativos do processo de produção dos conceitos geométricos, além do reconhecimento da presença de uma provável conexão desses componentes com as dimensões intuitiva, experimental e teórica do conhecimento geométrico.

Gravina (2001), uma educadora matemática que se dedica a pesquisar o tema, buscou realizar uma diferenciação entre o pensamento geométrico de natureza empírica e o de origem hipotético-dedutiva. Para a autora, por pensamento geométrico compreende-se “os raciocínios de natureza dedutiva e visual quando manipulam desenhos inseridos num quadro conceitual bem definido” (p.2). É o pensamento “que permite a construção de conhecimento, a geometria concebida como modelo teórico do mundo sensível imediato” (p.2).

Ainda acerca do seu entendimento sobre pensamento geométrico, Gravina (2001) considera que é aquele que está voltado para o entendimento das formas que estão no mundo em que vivemos.

Leivas (2009) investiga sobre a presença do pensamento geométrico de natureza avançada. Esse pensamento evolui por meio de experiências com objetos geométricos mais refinados, como por exemplo, os vinculados às Geometrias Não Euclidianas, à Geometria Fractal, à Topologia e à Geometria Diferencial, etc. Conforme esse autor, o “pensamento geométrico avançado é um processo capaz de construir estruturas geométricas mentais a partir de imaginação, intuição e visualização, para a aquisição de conhecimentos matemáticos científicos” (p. 136).

Aqui percebemos que há grande semelhança entre as características do pensamento geométrico avançado, sinalizado por Leivas (2009), com o de natureza

hipotético-dedutiva proposto por Gravina (2001), logo, podemos considerá-los como equivalentes.

Na construção da caracterização de pensamento geométrico que é adotada nessa tese, nos fundamentamos, sobretudo, nos estudos de Raymond Duval, Maria Alice Gravina e José Carlos Pinto Leivas, por apresentarem certa congruência com nosso estudo, sobretudo, com os quadriláteros notáveis.

Além disso, e não menos importante, apresentaremos uma discussão sobre os estudos de Efraim Fischbein e Luiz Carlos Pais por reconhecermos a importância desses pesquisadores para as reflexões sobre a formação do pensamento geométrico. É importante destacar que esses autores não serão considerados em profundidade na nossa definição de pensamento geométrico, pois eles vão além desse contexto, como, por exemplo, a discussão realizada por Fischbein sobre auto evidência em Geometria.

Por isso, esse capítulo foi organizado com cinco itens, cada um com uma compreensão de pensamento geométrico. O primeiro item apresenta a compreensão de Efraim Fischbein; o segundo traz a compreensão de Raymond Duval, seguida, em terceiro, pela de Luiz Carlos Pais; o quarto consiste na compreensão de Maria Alice Gravina; e o último debate a compreensão de José Carlos Pinto Leivas. Finalmente, finalizaremos esse capítulo com a caracterização de pensamento geométrico que adotamos em nosso estudo, produzida e apoiada nas compreensões desses pesquisadores.