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Em alguns casos especiais, a extensão de um predicado pode até mesmo consistir de

No documento Lógica paraclássica e verdade empírica (páginas 30-33)

A Linguagem da Física

Q). Em alguns casos especiais, a extensão de um predicado pode até mesmo consistir de

um único indivíduo, por exemplo, este é o caso para a intensão “a equipe que foi vitoriosa na Copa do Mundo da Coréia/Japão em 2002”, cuja extensão consiste apenas do conjunto cujo único elemento é Brasil. Em outro caso, podemos ter uma intensão perfeitamente admissível, mas uma extensão nula ou vazia. Por exemplo, a intensão “o

conjunto das obras religiosas escritas por Kurt Gödel”, tem extensão vazia (pelo que tudo indica).

No caso da física especificamente, podemos construir muitas intensões, de acordo com nossos desejos, provendo apenas que elas sejam consistentes com as leis lógicas e com as conhecidas leis da física. Mas, muitas vezes, é um pouco difícil determinar a extensão correspondente a certas intensões em parte porque, com o objetivo de determinar uma extensão, é necessário sempre assumir uma boa porção da teoria. (Cf. Toraldo di Francia, p.21). Por exemplo, Frege falou das intensões “estrela da manhã” e “estrela da tarde”, que têm a mesma extensão (i.e., o planeta Vênus). É óbvio, porém que, com o objetivo de conseguirmos obter esta identificação, devemos conhecer a teoria dos movimentos planetários (ou algo de certo modo equivalente).

Um ponto importante a ser salientado aqui é que, com a finalidade de caracterizar uma certa extensão, deve-se assumir que os indivíduos em consideração sejam distinguíveis. O interessante é que isto é usualmente correto na matemática (padrão), mas se torna um tanto problemático na física moderna. Com efeito, sabe-se do problema ocasionado pela indistinguibilidade das partículas subatômicas, como os elétrons, prótons, nêutrons etc. Segundo as teorias físicas mais recentes, não há como dizer, em todas as situações, que elétrons são diferentes entre si, mas que, em certas circunstâncias, ‘eles são todos iguais’ (ou seja, têm todos as mesmas propriedades). Poderíamos pensar, primeiramente, que a localização espacial poderia ser tomada como sendo uma propriedade que diferenciaria um elétron do outro, mas a maioria dos filósofos da ciência e físicos em geral não vêem com bons olhos essa alternativa. Isso porque a localização espacial seria como um ‘rótulo’ que é tirado e colocado no elétron a cada momento, com infinitas alterações, e não teria o mesmo caráter de uma propriedade intrínseca do mesmo, que é invariante, como é o caso da carga elétrica, valor absoluto de spin etc. Além disso, tentarmos diferenciar os elétrons de acordo com a sua localização no espaço-tempo, é impossível nos chamados estados de superposição. Isto acontece quando um elétron A e um elétron B estão a uma distância menor ou igual ao chamado comprimento de onda de Broglie:  KS (onde h é a constante de Planck (1,05 x 10–27 g-cm2 /seg) e p é o momentum do elétron). Por exemplo, instantes antes de um elétron atingir uma tela de televisão e se encontrar com outro elétron, a distância entre eles é menor que o comprimento de onde de Broglie e acontece um estado de

superposição19. Neste momento a individualidade é perdida e se promove uma séria violação do princípio da Identidade dos Indiscerníveis (PII)20 de Leibniz, que diz, grosso modo, que objetos que têm todas as propriedades iguais são o mesmo objeto. Nestes casos, porém, não conseguimos dizer qual elétron é qual! Quando isso acontece, a extensão para tais objetos é indeterminada. (Cf. Toraldo di Francia e Dalla Chiara, 1993, p. 266-267 e Toraldo di Francia, 1981, p.21).

Desta forma, podemos notar que, apesar da ciência não utilizar uma linguagem formalizada, ela consegue trabalhar muito bem com a linguagem coloquial, restringindo seu discurso de forma que se evitem paradoxos e contradições. Com efeito, a linguagem realmente nunca foi um grande problema para a ciência e nunca evitou seu avanço, chegando à forma que a conhecemos hoje. Parece que, inconscientemente, os cientistas utilizam em sua linguagem própria um certo tipo de ‘formalização’, que os leva a construir suas teorias, ainda que grosso modo, de uma forma universal. Isso de certo modo mostra que se pode ser rigoroso, mesmo que procedendo informalmente, como foi salientado por alguns filósofos.

Não obstante a tudo isso, é interessante sabermos como é possível definir, de um modo rigoroso, as quantidades físicas obtidas experimentalmente e usadas nas teorias, como peso, volume, massa etc., e as relações que se dão entre elas. A forma como estas quantidades são prescritas encerra um conceito bastante interessante, a saber, o de definição operacional. Este estudo é tema do nosso próximo capítulo.

19 Vale ressaltar que tal característica é verdadeira em modelos matemáticos onde os elétrons se

comportam como onda e/ou partícula, ou seja, em modelos matemáticos que respeitam tal dualidade.

20 Alguns pensadores acham que a perda de identidade para os objetos acima descritos não existe e é, na

verdade, um pensamento dos físicos, digamos assim, e não um problema da física. Como bem ressaltado por van Fraassen (1991, p. 2): “An elementary particle is characterized first of all by certain constant features, which serve to classify it. Mass is such a constant: baryons have large mass, mesons intermediate, and lepton small. Other constants, such as charge, subdivide these classes. In terminology that philosophers dislike, physicists have often referred to particles characterized by all the same constants as ‘identical’. In that sense, two particles can be identical, and yet be in different states of motion – so the identity is not strict numerical identity, or even strict qualitative identity. But it is also possible that two identical particles are in the same state. Then they are certainly qualitatively the same, in all the respects representable in quantum-mechanical models – yet still numerically distinct. If that is so, the particles are ‘indistinguishable’ in a sense going beyond that of ‘identical’ as used above. At this point, philosophical puzzles went beyond terminology. As we shall see, physicists too became uneasy, and began to speak of a ‘loss of identity’ ”.

No documento Lógica paraclássica e verdade empírica (páginas 30-33)