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A ssim que o dia amanheceu, virei de lado, esperando encontrá lo Mamãe costumava trabalhar até quase a hora do almoço nos sábados, e

Daemon criara o hábito de ficar até o último momento, mas minha cama estava vazia.

Alisei o travesseiro extra e inspirei fundo, esperando sentir o perfume de natureza e especiarias tão típico dele, mas tudo o que consegui sentir foi um leve traço de limão. Será que eu havia sonhado com a presença do Daemon?

Credo, isso seria o cúmulo.

Franzindo o cenho, sentei e peguei o celular. Daemon me enviara outra mensagem por volta das duas da manhã.

Café da manhã: ovos e bacon. Vem pra cá quando acordar.

— Duas da manhã? — Olhei fixamente para o celular. Será que ele tinha ficado na rua até essa hora?

Meu coração começou a martelar enlouquecidamente de novo, e me deitei de costas, gemendo. Pelo visto eu era uma verdadeira idiota e o Daemon tinha ficado até de madrugada na rua sem a minha companhia.

Arrastei-me para fora da cama, tomei um banho e vesti uma calça jeans com um pulôver. Atordoada, sequei o cabelo mais ou menos, o enrolei num coque frouxo e segui para a casa ao lado. A porta estava trancada.

Apoiei a mão na maçaneta e esperei até escutar o clique das trancas. Assim que abri a porta, fui tomada por uma súbita ansiedade. Era fácil demais entrar na casa de qualquer pessoa, inclusive na minha.

Com um sacudir de cabeça, fechei a porta sem fazer barulho e inspirei fundo. A casa parecia um túmulo de tão silenciosa. Presumindo que todos ainda estivessem dormindo, subi a escada, tomando cuidado com os dois degraus próximos ao topo que costumavam ranger. Tanto o quarto do Dawson quanto o da Dee estavam fechados, mas escutei um suave zumbido de música vindo do quarto do Daemon.

Abri ligeiramente a porta do dele para dar uma espiada. Meus olhos recaíram imediatamente sobre a cama e, mesmo que quisesse, não consegui evitar a cambalhota em meu peito.

Daemon estava esparramado de barriga para cima, sem camisa, um dos braços estendidos num ângulo de noventa graus com o corpo e o outro apoiado sobre o abdômen. Os lençóis estavam amarfanhados em torno do quadril estreito. Seu rosto parecia quase angelical, as linhas marcantes atenuadas pelo sono e os lábios relaxados. Pestanas grossas roçavam o topo das bochechas.

Dormindo, ele parecia bem mais jovem e, de um jeito estranho, areia demais para o meu pobre caminhãozinho. Sua beleza masculina era de outro mundo, intimidante. Algo que só existia nas páginas dos livros que eu gostava de ler.

De vez em quando, tinha dificuldades em me convencer de que ele era real.

Aproximei-me pé ante pé e me sentei na beirada da cama, incapaz de desviar os olhos. Não queria acordá-lo. Assim sendo, fiquei ali sentada como uma perfeita maluca pervertida, observando o subir e descer ritmado daquele tórax definido. Imaginei se tinha sonhado com ele na noite anterior ou se Daemon havia realmente dado um pulo lá em casa para ver como eu estava. Meu coração deu outra cambalhota e quase consegui esquecer a ansiedade da noite anterior. Quase, mas…

Daemon se virou subitamente para mim e passou um braço em volta da minha cintura, forçando-me a deitar do seu lado. Em seguida, enterrou o rosto em meu pescoço.

— Bom dia — murmurou ele.

Um sorriso se desenhou em meu rosto enquanto apoiava uma das mãos em seu ombro. A pele dele estava quente.

— Bom dia.

Ele jogou uma das pernas por cima da minha e se aconchegou ainda mais.

— Cadê meus ovos com bacon? — Achei que você ia preparar.

— Até parece. — Virei de frente para ele. Daemon ergueu a cabeça, plantou um beijo em meu nariz e enterrou a cabeça no travesseiro. Eu ri.

— É cedo demais — grunhiu. — São quase dez da manhã. — Como eu disse, cedo demais.

Uma pedra se assentou em meu estômago. Mordi o lábio, sem saber ao certo o que dizer.

De maneira preguiçosa, ele passou um braço em volta do meu quadril e virou a cabeça para que eu pudesse ver seu rosto.

— Você não respondeu minha mensagem ontem à noite. Ele tinha que trazer esse assunto à tona.

— Imaginei que você estivesse ocupado e… acabei pegando no sono. Daemon arqueou uma sobrancelha.

— Eu não estava ocupado.

— Passei aqui ontem à noite e fiquei esperando um tempinho. — Comecei a brincar com a ponta do lençol, torcendo-a entre os dedos. — Você ficou na rua até tarde.

Ele abriu um olho.

— Então você recebeu a mensagem. Podia ter respondido. Eu tinha caído direitinho na armadilha.

Ele suspirou.

— Por que me ignorou, gatinha? Fiquei magoado.

— Tenho certeza de que a Ash te consolou. — Quis me socar assim que as palavras saíram da minha boca.

Ambos os olhos estavam abertos agora. Ele, então, fez algo que tanto me surpreendeu quanto me irritou: abriu um daqueles sorrisos de orelha a orelha.

— Você tá com ciúmes.

O modo como disse isso me deu a impressão de que era uma coisa boa. Fiz menção de sentar, mas seu braço me impediu.

— Não tô, não. — Gatinha…

Revirei os olhos e fui subitamente acometida por um caso crônico de diarreia verbal.

— Fiquei preocupada com a visita do antigo e você prometeu que conversaríamos depois. Mas você não apareceu. Em vez disso, resolveu sair com o Andrew, a Dee e a Ash. Sua ex-namorada Ash. E, como eu descobri? Através do seu irmão. E como foi que vocês se sentaram no restaurante, hein? A Dee e o Andrew de um lado e você e a Ash do outro? Aposto que ficaram superconfortáveis.

— Gatinha…

— Não vem com essa de gatinha pra cima de mim. — Franzi o cenho e continuei descascando. — Você saiu por volta das cinco, e voltou a que horas mesmo? Depois das duas da manhã? O que vocês estavam fazendo? E pode tirar esse sorrisinho idiota da cara. Não tem a menor graça.

Daemon tentou conter o sorriso, mas não conseguiu. — Adoro quando você mostra as garras.

— Ah, cala a boca. — Exasperada, empurrei o braço dele. — Me solta. Por que não liga pra Ash e pede para ela te preparar os ovos com bacon? Fui!

Em vez de me soltar, Daemon mudou de posição, erguendo-se acima de mim, as mãos plantadas uma de cada lado dos meus ombros. Ele agora estava rindo — aquela risadinha atrevida e irritante.

— Quero ouvir você admitir que está com ciúmes.

— Já falei, seu cabeça de minhoca. Estou com ciúmes. Por que não estaria?

Ele inclinou a cabeça ligeiramente de lado.

— Ah. Não sei. Talvez porque eu jamais tenha desejado a Ash, não como desejei você desde a primeira vez que te vi. E, antes que comece, sei que demonstrei isso de uma maneira terrível, mas você sabe que eu sempre te quis. Só você. Esses ciúmes não fazem o menor sentido.

— Não? — Lutei para conter as lágrimas de raiva. — Vocês namoraram.

— Nós estamos namorando.

— E ela provavelmente ainda te quer.

— Mas eu não a quero, portanto isso não tem a menor importância. Tinha importância para mim.

— Você é mais bonita. — Não tenta me bajular. — Não estou tentando.

Mordi o lábio, os olhos fixos em algum ponto acima do ombro dele. — Sabe de uma coisa? A princípio achei que mereci o cano de ontem. Agora sei como você se sentiu quando eu saí com o Blake. Senti como se o cosmos estivesse me dando uma lição, mas não é a mesma coisa. Nós não estávamos juntos na época e eu e o Blake não temos nenhum tipo de história.

Daemon inspirou fundo.

— Tem razão. Não é a mesma coisa. A saída de ontem não foi um encontro. Andrew deu uma passada aqui em casa e começamos a conversar sobre o Ethan. Ele estava com fome, de modo que decidimos sair para comer alguma coisa. Dee resolveu ir junto, e acabamos encontrando a Ash lá, porque, você sabe, ela é irmã dele.

Dei de ombros. Certo, o argumento era bom.

— No fim das contas, não jantamos em nenhum lugar. Apenas pedimos uma pizza, fomos para a casa do Andrew e ficamos conversando sobre o que pretendemos fazer amanhã. Ash está morrendo de medo de perder o Andrew também. Dee continua querendo matar o Blake. Passei horas conversando com eles sobre isso. Não foi uma festa para a qual você não foi convidada.

Senti vontade de dizer que festa ou não, eu não tinha sido convidada, mas isso seria estupidez.

— Por que você não me disse nada? Podia ter me avisado. Assim eu não teria ficado imaginando um monte de coisas.

Ele me fitou por alguns instantes e, em seguida, saiu de cima de mim, sentando-se ao meu lado.

— Pensei em dar um pulo na sua casa quando cheguei, mas estava tarde.

Então a noite passada tinha sido um sonho. Confirmado, eu era uma idiota.

— Olhe só, eu agi sem pensar. — Pelo visto, sim — murmurei.

Daemon esfregou o peito, logo acima do coração.

— Não achei que você fosse ficar tão chateada, juro. Imaginei que soubesse.

Eu continuava deitada de costas, cansada demais para me mover. — Soubesse o quê?

— Que mesmo que a Ash entrasse nua no meu quarto, eu a mandaria embora. Que você não tem nada com o que se preocupar.

— Valeu, agora vou ficar com essa imagem gravada no cérebro pelo resto da vida.

Daemon balançou a cabeça e soltou uma risada seca. — Essa insegurança é irritante, gatinha.

Meu queixo caiu e eu me sentei de imediato, acomodando-me sobre os joelhos dobrados.

— Como é que é? Por acaso você é o único que pode se sentir inseguro?

— Ahn? — Ele deu uma risadinha presunçosa. — Por que eu me sentiria inseguro?

— Boa pergunta, mas como você chamaria sua pequena cena com o Blake no corredor da escola ontem? E aquela pergunta idiota sobre eu querer ajudá-lo?

Ele fechou a boca.

— A-há! Exatamente. Você se sentir inseguro é mais ridículo ainda. Vou repetir mais uma vez. — Com a raiva, a Fonte veio à tona. Senti o poder envolvendo minha pele. — Eu odeio o Blake. Ele me usou e estava pronto para me entregar pro Daedalus. Além disso, matou o Adam. Eu mal consigo tolerar o cara. Como você pode sentir ciúmes dele?

Seu maxilar tremeu. — Ele te quer.

— Ah, por Deus, é claro que não.

— Não vou discutir. Eu sou homem. Sei o que os homens pensam. Joguei as mãos para o alto.

— De qualquer forma, não faz a menor diferença. Eu. Odeio. Ele. Daemon desviou os olhos.

— Mas você não odeia a Ash. Parte de você a ama. Eu sei que sim. Talvez não da forma como você me ama, mas existe afeto entre vocês… história. Pode me processar, mas isso é um pouco intimidante.

Levantei da cama, com vontade de sair pisando duro como uma criança birrenta. Quem sabe até me jogar no chão. Pelo menos assim eu conseguiria gastar um pouco de energia.

Daemon apareceu diante de mim e envolveu meu rosto entre as mãos. — Certo. Entendi o argumento. Eu devia ter te avisado. Quanto à história com o Blake… é, aquilo foi idiotice.

— Que bom que você reconhece. — Cruzei os braços. Ele retorceu os lábios.

— Mas entenda uma coisa de uma vez por todas: é você quem eu quero. Não a Ash nem ninguém mais.

— Mesmo que os antigos pressionem para que você fique com alguém como ela?

Daemon baixou a cabeça e roçou os lábios pelo meu rosto.

— Não dou a mínima para o que eles querem. Nesse sentido, sou incrivelmente egoísta. — Beijou minha têmpora. — Entendeu?

Fechei os olhos. — Entendi.

— Estamos acertados então?

— Se você me prometer que não vai mais encher minha cabeça com essa história de eu ir com vocês amanhã.

Ele pressionou a testa contra a minha. — Você não deixa nada barato.

— Verdade.

— Não quero que você vá, gatinha. — Suspirou e passou os braços em volta de mim. — Mas não posso te impedir. Só me prometa que vai ficar perto de mim.

Meu sorriso ficou escondido de encontro ao peito dele. — Prometo.

Daemon plantou um beijo no topo da minha cabeça.

— Você sempre consegue que as coisas saiam do seu jeito, não é mesmo?

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