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PARTE 1 – ENQUADRAMENTO TEÓRICO

4. O TIPO DE TEXTO COMO FACTOR CONDICIONANTE DOS PADRÕES SINTÁCTICOS E LEXICAIS

4.6. A ANÁLISE DE CORPORA ESPECIALIZADOS E AS SUAS APLICAÇÕES NO ENSINO DO INGLÊS COMO LÍNGUA DE

Como vimos, de acordo com a situação comunicacional em que nos encontramos, utilizamos diferentes registos de língua, que se distinguem ao nível da gramática e do léxico: “registers share many linguistic features – such as nouns, pronouns, verbs, adjectives, etc., – and they are distinguished by the relative use of these features.” (cf. Biber et al., 1998: 136) Esta noção de registo é central no trabalho desenvolvido por Biber et al., mais concretamente a análise multidimensional de registo, que foca os aspectos relacionados com a caracterização de variedades textuais. Esses aspectos formam padrões, ou seja, conjuntos de traços típicos que co-ocorrem.

É no contexto do ensino do inglês que a utilização de corpora assume um papel preponderante, uma vez que permite analisar a linguagem em contexto, e, consequentemente, constatar que alguns padrões sintácticos e lexicais têm mais probabilidade de ocorrer do que outros, dependendo do registo em que se inserem. Esse é, portanto, um método empírico que se baseia na relação linguagem-texto, na medida em que não se pode analisar o texto sem considerar a linguagem, nem analisar a linguagem sem considerar o texto:

“Every time that we write or speak, we are faced with a myriad of choices: not only choices in what we say but in how we say it. The vocabulary and grammar that we use to communicate are influenced by a number of factors, such as the reason for the communication, the context, the people with whom we are communicating, and whether we are speaking or writing. Taken together these choices give rise to systematic patterns of use in English.”

Em Biber et al. 1999 os dados empíricos servem o propósito de descrever o uso real de características gramaticais em diferentes registos do inglês, nomeadamente na conversação, na ficção, no texto jornalístico e no texto académico. Este é um estudo de natureza comparativa, na medida em que só se consegue interpretar a média das frequências de um registo em comparação com outros registos. (cf. Biber et al., 1998: 137) Para além disso, a comparação dos dados da análise de corpora especializados com os dados de corpora gerais também se revela importante para compreender o que caracteriza o discurso de especialidade.

Howcroft, ao reflectir acerca do trabalho desenvolvido por Mindt (1997: 46), refere que o autor sublinha a importância dos dados sobre a distribuição das estruturas nos diferentes registos nas gramáticas usadas no contexto do processo ensino-aprendizagem:

“By this he means that we need to be able to find out the frequencies of different grammatical structures in different registers in order to represent natural language usage. Without distributional data there can be no informed grading of the functions of a grammatical form in a language course. The absence of distributional data in almost all preceding grammars results in a grading that is based on intuition rather than on empirical evidence and very often does not reflect the actual use of English.”

Howcroft (2002: 295)

Assim, no sentido de um ensino de línguas que reflecte o uso real da linguagem, é necessária a utilização de uma gramática baseada nos dados sobre a frequência das estruturas linguísticas em diferentes registos e não apenas na intuição. Para além disso, todo o ensino tem um objectivo definido e o ensino do inglês como uma língua de especialidade refere-se concretamente ao ensino da língua direccionado para as necessidades linguísticas e comunicativas de um grupo específico de utilizadores da L2:

“English for Specific Purposes (ESP) is a movement based on the proposition that all language teaching should be tailored to the specific learning and language use needs of identified groups of students – and also sensitive to the sociocultural contexts in which students will be using English.”

Johns & Price-Machado (2001: 43)

O movimento a que as autoras se referem foi fundado em meados dos anos 60 e de acordo com as mesmas tem na sua essência quatro características: vai de encontro às

necessidades do aprendente; vai de encontro às actividades em que o mesmo está envolvido; centra-se na linguagem própria dessas actividades no que respeita à sintaxe, léxico, discurso, semântica e à análise do discurso; e contrasta com o ensino do Inglês Geral. (cf. Johns & Price-Machado, 2001: 44)

Por outro lado, para além da caracterização dos registos, a análise de corpora através de técnicas de análise qualitativas permite constatar e analisar construções que constituem um desvio da norma:

“Corpus-based techniques are ideal both for providing comprehensive analyses of this type and for highlighting text chunks that depart from the expected norms.”

Biber et al. (1998: 130)

Este desvio da norma está directamente relacionado com as diferenças entre a língua materna (L1) e a língua estrangeira (L2) que resultam na interferência da L1 na L2. Lado 1957 considera a relação entre a dificuldade de aprendizagem da L2 e as diferenças entre a L1 e a L2 como estando directa e proporcionalmente relacionadas (cf. James, 1980: 188). Acerca do aprendente da L2 Lado tece o seguinte comentário:

“Those elements that are similar to his native language will be simple for him, and those elements that are different will be difficult.”

Lado (1957: 2)

Abbott & Wingard, por outro lado, apresentam uma outra análise da interferência de estruturas da L1 na L2. De acordo com estes autores não são as diferenças entre as línguas que causam dificuldade mas as semelhanças parciais:

“... it is the partial similarities that often cause great difficulties. (...) perhaps big differences are easier to remember.”

Abbott & Wingard (1981: 230)

Esses elementos da L2 que constituem diferenças ou semelhanças parciais com a L1 aumentam a probabilidade de interferência da L1 na L2 sendo, por isso, uma prioridade no ensino da L2:

“In the teaching of EIL it is important to distinguish linguistic differences that create problems of inteligibility from those that may engender negative attitudes. (...) Clearly, in the teaching of EIL, educators want to strive to minimize the first type of differences. Hence, particular pronunciation and grammatical patterns and, in some cases, lexical innovations that cause problems in inteligibility need to be addressed.“

McKay (2002: 127)

Assim, o professor de línguas estrangeiras deve considerar as causas prováveis de erros previstos para que os mesmos não prejudiquem uma correcta veiculação da mensagem, ou seja, uma distorção do sentido que o emissor confere ao texto. A precisão da comunicação traduz-se no termo ‘inteligibilidade’: “the accessibility of the basic, literal meaning, the propositional content encoded in an utterance.” (cf. James, 1998: 212) Se, por um lado, a correcção gramatical nem sempre é essencial a uma comunicação precisa (cf. Page, 1990: 104 apud James, 1998: 212), por outro lado, as incorrecções gramaticais poderão ter implicações práticas no que respeita à recepção do texto:

The majority of grammatical errors, taken separately, do not seriouly affect intelligibility, given a reasonable amount of good-will and intelligence on the part of the listener or reader. This of course cannot always be guarenteed, and in any case if a speaker makes a great number of such errors their effect becomes cumulative; the receiver is so busy re-formulating everything he hears or reads that his comprehension process is unable to function properly or he becomes impatient and stops trying. There is also the risk that if the speaker makes too many errors his opinion will not be treated very seriously.

Abbott & Wingard (1981: 241)

A respeito das alterações da linguagem, Potter (1975:118-22) refere a ocorrência das formas em -ing no aspecto progressivo com verbos estativos que pressupõe uma reacção do ponto de vista pedagógico:

Potter (1975:118-22) illustrates the growing tendency for stative verbs to occur combined with the progressive, yielding forms like the following from a satisfied choirmaster: At least it’s sounding good: I’m liking what I’m hearing. Today even present progressive passives are common: My father has been being treated for gallstones. Can turning a blind eye to a passing fancy bring about radical grammatical shifts in English of this nature? The issue is related to the pedagogic option of whether to allow the learner to make mistakes, which we then correct, or to prevent them from occurring in the first place.

Potter reflecte não só sobre a posição perante o erro linguístico, mas também sobre determinadas tendências para usar construções gramaticais que configuram um desvio linguístico. De acordo com Peres (1995: 41), os desvios linguísticos têm de obedecer a pelo menos duas condições: “(i) constituírem rupturas com o subsistema ou variante do que é suposto fazerem parte; e (ii) não serem integradas – pelo menos, plenamente- pela comunidade linguística de suporte.”

No entanto, a língua é um sistema em permanente evolução e quando se verifica que determinada estrutura é adoptada de forma permanente pela comunidade linguística de suporte, já não falamos de desvio linguístico, mas de uma alternativa sintáctica.

4.7. Conclusões

Resumindo, a noção de inteligibilidade é fundamental no que concerne o ensino de uma língua de comunicação internacional, uma vez que, nesse âmbito, para além da competência pragmática, ou seja, a capacidade do falante usar linguagem apropriada a um contexto específico, é necessário o domínio linguístico, o que implica da parte de quem ensina o emprego do princípio de agir localmente para comunicar globalmente.