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Análise das características do pesquisador/inventor

6. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

6.3. Análise das características do pesquisador/inventor

Na literatura internacional sobre empreendedorismo acadêmico apresentada na presente dissertação, as características do pesquisador/inventor são vistas como elementos fundamentais no desenvolvimento das práticas de capitalização do conhecimento na universidade. Neste contexto, Clark (1998) ressalta que a

acadêmicos no sentido de implantar uma nova ordem organizacional que favoreça a transferência de tecnologia da universidade para o mercado. De fato, a origem das iniciativas de apoio à inovação tecnológica presentes na UFMG está em parte relacionada à ação de alguns pesquisadores que já vislumbravam a necessidade de proteger o conhecimento nela gerado e levá-lo ao mercado na forma de novas tecnologias. Assim, neste item, serão analisados o perfil e as características identificadas nos pesquisadores/inventores da UFMG que contribuem para o desenvolvimento de suas práticas empreendedoras.

Determinadas linhas de pesquisa enxergam o empreendedorismo acadêmico como um reflexo da personalidade, habilidade, opção de carreira e disposição dos membros da comunidade acadêmica de adotarem uma atitude empreendedora, (O‟SHEA; HARVEEN; ALLEN, 2008). De fato, nos relatos dos pesquisadores/inventores entrevistados, é possível identificar alguns elementos relacionados ao perfil, à forma de pensar, às experiências e aos desejos pessoais, que contribuem para que estes desenvolvam atividades empreendedoras.

Uma primeira característica em comum identificada entre os pesquisadores/inventores é o olhar voltado para a identificação de novas oportunidades. Nesse sentido, parte dos entrevistados que se envolveram em práticas empreendedoras relataram vislumbrar, com certa frequência, oportunidades de novos produtos, processos ou negócios ao analisar resultados de pesquisas científicas. Tal visão está relacionada também ao desejo deles de construir algo relevante a partir da ciência, que contribua de forma significativa para a sociedade solucionando problemas, gerando empregos e diminuindo a dependência tecnológica do País. O trecho a seguir extraído da entrevista com um pesquisador/inventor da área de ciências biológicas demonstra claramente o perfil traçado.

Acredito que tenho um perfil empreendedor. Quando vejo uma pesquisa, identifico se tem uma oportunidade de negócio, se pode virar um produto gerando riquezas, emprego, impostos etc. Muitas bancas de tese que eu vou participar como examinador externo, eu vejo que ali dá para sair vários produtos e ninguém faz nada daquilo. Então, não é só a natureza da biologia que é mais propensa a geração de novas tecnologias sobre outras áreas, mas é a maneira pela qual você enxerga aquilo como produtos, utilidades, mudanças. Aqui no nosso departamento isso é muito comum. Eu já fui em bancas que achei que daria pra fazer um ótimo produto e não deu nada.... os resultados foram publicados e perdeu-se o direito de patente. (Pesquisador/Inventor)

com a visão de Schumpeter (1949) sobre os fatores que conduzem a uma atitude empreendedora. Segundo o autor, o empreendedor é responsável por introduzir novas formas de combinação produtivas, revertendo a ordem econômica existente, sendo que as atitudes que o fazem engajar na formação de uma empresa inovadora são movidas pela vontade de construir um empreendimento relevante, de se realizar pela criação de algo novo e pelo desejo de conquistar. Complementando esta percepção, foi identificado ainda nos pesquisadores/inventores entrevistados os seguintes elementos que os motivaram a se envolver na criação de uma EBT: 1. vontade de estar a frente; 2. reconhecimento pela criação de algo novo; 3. desejo de ver os resultados de suas pesquisas aplicados no setor produtivo; 4. desejo de contribuir e ser útil à sociedade.

Nessa mesma linha, Roberts (1992) cita que um dos fatores que motiva a realização de atividades empreendedora pelos acadêmicos é o lócus de controle interno, ou seja, a crença dos indivíduos em deter controle sobre os eventos que ocorrem em suas vidas (QUISHIDA, 2007). De fato, no discurso de um dos pesquisadores/inventores entrevistados, é identificada essa característica, já que o pesquisador teve oportunidade de transferir a tecnologia para uma empresa já consolidada, mas optou por criar uma nova empresa para explorá-la, a fim de continuar tendo controle e acompanhando a evolução de uma tecnologia que partiu de uma pesquisa desenvolvida em seu laboratório.

É interessante observar que o fator financeiro não é visto pelos acadêmicos como um elemento motivador às experiências empreendedoras, de forma que essas últimas se relacionam, sobretudo, às necessidades de realização pessoal mencionadas, conforme abordado no trecho da entrevista a seguir, por um ex- dirigente da universidade.

O que motiva os pesquisadores é principalmente o desejo por reconhecimento. Eu acho que esse é o principal motivador e que ninguém faz essas coisas por dinheiro ou, principalmente, por dinheiro. Faz isso para ser um cientista importante, fazer uma descoberta importante, quer dizer, contribuir para resolver um problema nacional ou internacional importante, uma doença incurável, ver se descobre um medicamento, ou seja, tudo isso é motivo de reconhecimento. Se isso vai dar dinheiro ou não, isso é outra coisa. Todo ser humano quer ser considerado, amado, reconhecido. Ele pode querer de alguma maneira contribuir para a sociedade, então isso tudo compõe a ideia de reconhecimento. (Ex-dirigente)

pesquisador/empreendedor, envolvidos no processo de pesquisa e desenvolvimento, e o empreendedor externo, que vislumbra a possibilidade de levar ao mercado tecnologias desenvolvidas nas universidades. Segundo o autor, o primeiro é motivado pela superação de desafios e pelo desejo de tornar aplicáveis os resultados de sua pesquisa, enquanto o segundo tem motivações, sobretudo, financeiras. Vale ressaltar que, apesar de o fator financeiro não ser visto como um estímulo à realização de atividades empreendedoras pelos pesquisadores, é considerado um elemento importante na realização de projetos em parceria com empresas privadas, no sentido de ser um recurso alternativo às fontes públicas de fomento à pesquisa. Nesse sentido, alguns entrevistados citaram que os recursos captados por meio desses projetos são importantes para melhoria e renovação da infraestrutura dos laboratórios que, em geral, são precárias para o alto nível de qualidade das pesquisas desenvolvidas na UFMG, conforme visto anteriormente. Outra característica em comum identificada no perfil dos pesquisadores/inventores entrevistados que se engajaram em experiências empreendedoras é a proatividade. Muitos deles mencionaram que as ações direcionadas para a realização de pesquisa aplicada, captação de recursos e busca de meios para levar os resultados dessas pesquisas para o mercado, partiram de iniciativas próprias e, não, com base em um estímulo da Universidade ou demais influências externas. Por outro lado, esses atores admitem que o perfil proativo, na maneira como ele fora abordado, não é comum entre os docentes, sendo que muitos procuram apenas cumprir suas obrigações acadêmicas em termos de ensino e pesquisa, sem se envolver em outras atividades que contribuam para o desenvolvimento econômico e social da região.

Ainda com relação ao perfil desses pesquisadores/inventores, nota-se que de uma forma geral, eles têm maior afinidade com o desenvolvimento de pesquisa de natureza aplicada, além de apresentarem alta produtividade acadêmica em termos de publicações científicas, sendo pesquisadores de excelência segundo critérios do CNPq. Além disso, o nível de qualificação dos pesquisadores foi apontado como um elemento importante na captação de recursos por EBTs de origem acadêmica, pois aumenta o nível de credibilidade dos investidores e fontes de fomento com relação ao empreendimento. Com base nisso, é possível concluir que a natureza da pesquisa e a qualidade dos pesquisadores aliadas a uma atitude empreendedora,

resultados passíveis de serem aplicados no mercado, bem como para a formação de spin-offs acadêmicos.

Há ainda fatores que motivam o envolvimento dos docentes em atividades empreendedoras que estão relacionadas a experiências pessoais, como vivência em universidades em que o processo de capitalização do conhecimento está mais avançado, experiência de mercado e acompanhamento de iniciativas empreendedoras da família ou amigos. Vale ressaltar que quase a totalidade dos pesquisadores/inventores entrevistados afirmou não ter formação na área de empreendedorismo, sendo que o conhecimento sobre esse tema foi adquirido por meio de informações que buscaram na literatura e em cursos oferecidos pela incubadora. Esses pesquisadores relataram também não deter formação e aptidão para atividades de gestão, mas acreditam que tal fato não deveria representar uma limitação para se envolverem na formação de uma EBT, já que a sua contribuição estaria, sobretudo, na parte de pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias. Finalmente, observa-se que alguns fatores externos ao indivíduo estão contribuindo aos poucos para uma mudança na forma de pensar dos acadêmicos com relação às atividades de capitalização do conhecimento, como o aparecimento de estruturas de apoio à inovação na Universidade e programas do governo de incentivo a estas práticas. De acordo com os atores entrevistados, tais iniciativas despertaram atenção da comunidade acadêmica para a importância do empreendedorismo de base tecnológica e da transferência de tecnologia para o mercado, estimulando uma visão mais ampla sobre o papel da universidade. Novamente, a mudança de gerações também é mencionada como um fator que contribui para maior aceitação e disseminação das atividades de capitalização do conhecimento na universidade, sendo que alguns pesquisadores/inventores da UFMG relataram que a parceria com alunos da pós-graduação com perfil empreendedor foi fundamental para que esses se engajassem em uma iniciativa empreendedora. É importante destacar, porém, que esse é um processo lento, que envolve uma mudança a nível cultural na universidade, conforme visto anteriormente.

O quadro 18 apresenta as características identificadas nos pesquisadores/inventores da UFMG entrevistados, que contribuem para o envolvimento destes em atividades de capitalização do conhecimento.

Quadro 18– Características do pesquisador/inventor que motivam a capitalização do conhecimento na UFMG

Características do pesquisador/inventor Perfil

Proatividade – busca de parceiros e recursos para o desenvolvimento de pesquisa aplicada e tentativa de levar os resultados desta para o mercado

Visão Empreendedora – identificação de oportunidades de novos produtos, processos e negócios a partir de pesquisas acadêmicas

Vontade de estar a frente – desejo de criar algo novo e ir além de suas responsabilidades como docente

Aptidão para o desenvolvimento de pesquisa aplicada Alta qualificação e produtividade acadêmica

Motivadores pessoais para envolvimento em iniciativas empreendedoras Busca por reconhecimento – ser reconhecido pela criação de algo novo

Desejo de ser útil à sociedade – contribuir de forma significativa com a solução de problemas presentes na sociedade

Orgulho de se fazer algo aplicado – ver os resultados de suas pesquisas serem aplicados no mercado, demonstrando sua importância e utilidade

Percepção de que a universidade não deve ficar entre muros – contribuir para o desenvolvimento econômico e social do país

Desejo de acompanhar todo o desenvolvimento de sua criação, desde sua ideação até o momento de sua aplicação

Motivadores pessoais para desenvolvimento de projetos em parceria com empresas Diversificação das fontes de recursos para pesquisa – captação de recursos de fontes públicas e privadas para investir na melhoria de infraestrutura dos laboratórios, bolsas e insumos

Desejo de contribuir de forma efetiva para solução de problemas do setor produtivo nacional Experiências Pessoais

Vivência em universidades de outros países, onde o processo de capitalização do conhecimento está mais avançado

Vivência de mercado

Acompanhamento próximo de iniciativas empreendedoras de familiares e amigos Desenvolvimento de pesquisas em conjunto com alunos que desejavam empreender

Fonte: elaborado pela autora da dissertação