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7.6 | ANÁLISE DAS ENTREVISTAS

No documento Design de comunicação vs investigação (páginas 138-151)

Entrevista à Professora Doutora Elisabete Rolo

No âmbito do aprofundamento do conhecimento recolhido para este relatório, conduzimos uma entrevista à Professora Doutora Elisabete Rolo, designer e docente da Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa, focada na integração da investigação na componente de profissional da área e instrutora.

A Professora Doutora Elisabete Rolo começou por marcar a existência de uma dicotomia no que toca à natureza da investigação, face ao seu propósito. Para a docente, “quando se está a desempenhar a função de designer gráfica, a investigação faz-se num sentido muito prático, faz-se direcionada para o projeto que se tem em mãos, no sentido muito da resolução daquele problema”. Já “enquanto docente, a investigação é processada de uma maneira diferente porque preciso de fazer investigação para ensinar, e preciso de fazer a investigação que a escola nos dias de hoje nos requer”, defendeu.

Na sua opinião, em ambos os campos a investigação pode ser processada em níveis diferentes.

Enquanto designer, a opção pode passar por “investigar a fundo o tema que se está a tratar”, ou, por outro lado, a pesquisa pode centrar-se na peça que o profissional tiver em mãos, por forma a conhecer o mercado, por forma a “perceber o que está a ser feito, sempre, constantemente, para a partir daí eu desenvolver o meu projeto”, referiu Elisabete Rolo na nossa conversa.

Elisabete Rolo assinala também que, enquanto profissional, “é sempre enriquecedor ver o que é que os nossos pares estão a fazer em todas as áreas”.

Já no âmbito da docência, “é necessário investigar para melhorar ensinar”, uma vez que “ter uma carreira académica pressupõe uma grande componente de investigação, publicar artigos,

ir a conferências, fazer apresentações públicas, publicar livros, que é uma coisa que pouca gente consegue fazer, conjugando com uma vida profissional”.

Assim, a docente da Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa sinaliza a existência de um conflito, uma vez que antigamente era valorizada a experiência profissional dos académicos, existindo “uma ligação muito estreita entre aquilo que era a prática e aquilo que era o ensino”.

Hoje em dia, o paradigma é diferente, pois dá-se um “afastamento cada vez maior dessas duas realidades, porque é humanamente impossível a pessoa ter um atelier, ser um bom profissional, conseguir gerir uma empresa, e arranjar clientes e fazer um bom trabalho, e conseguir cumprir com todos os requisitos que lecionar implica, no sentido da investigação, do que está para além daquilo que é o ensino e que é a investigação que a própria pessoa já faz para dar as aulas”.

“Não sei se algum dia vamos voltar atrás ou não, mas parece-me que é um pouco mais empobrecedor daquilo que é o ensino”. Falando pela sua experiência pessoal, a entrevistada foi taxativa relativamente aos requisitos necessários para melhorar enquanto docente: “se eu não estiver ligada aquilo que acontece, se eu não souber o que é que está a acontecer, se eu não estiver a par das tendências, e se eu não conseguir executar essas novas tendências, e os próprios projetos na prática, eu, na minha opinião, penso que não serei um docente tão completo”. “No entanto, na parte de investigação na docência, aquilo que nos é exigido hoje em dia também é muito importante, mas numa questão mais de refletir, de pensar, de organizar, de estruturar o pensamento. Nesse sentido eu reconheço a sua importância”, frisou. Em jeito de balanço, Elisabete Rolo afirmou sentir “um esmagamento

cada vez maior, é uma exigência cada vez maior, que me deixa cada vez menos tempo para aquilo que eu mais gosto de fazer, que é por um lado a tal questão de ter tempo de preparar as aulas das pessoas o melhor possível e fazer chegar os conteúdos da melhor maneira possível, e cada vez melhores conteúdos e mais conteúdos, resultantes também do meu avançar da idade e da minha própria experiência. E por outro lado também a questão da prática profissional, que é sempre enriquecedora”.

Em conclusão, a docente Elisabete Rolo revela a existência de um afastamento entre as duas realidades referidas, a profissional e a carreira docente, que, na sua opinião “não está a ser benéfico” para o ensino desta disciplina prática na realidade que lhe é conhecida.

Entrevista ao Professor Doutor Gonçalo Falcão

No seguimento da utilização de uma nova metodolia de pequisa para o enriquecimento da investigação, foi efetuada uma

entrevista ao Professor Doutor Gonçalo Falcão, do corpo docente da Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa, e profissional do design.

Com opiniões bastante vincadas, Gonçalo Falcão proporcionou-nos uma visão mais abrangente deste tema que escolhi para dar corpo ao presente relatório, a integração da investigação no design. Gonçalo Falcão começou por me dizer que “o que vale dinheiro no design é a capacidade de diagnosticar as situações, de as problematizar e propor soluções novas. E nesse sentido, existe sempre uma investigação e ela é aquilo que vale dinheiro”. “Ou a pessoa se limita a reproduzir fórmulas que já estão em jogo, e em termos de valor tem pouco, portanto valor de mercado é um valor pequenino, ou tu estás sempre à procura de qual é o próximo movimento, qual é a próxima lógica”, advogou, descartando porém a terminologia ‘tendências’, por mim utilizada no guião da entrevista.

Apesar de considerar que este género de investigação, aplicada a uma determinada circunstância, pode acabar por ser condicionada, o docente frisa que “num certo sentido ela é investigação, e muitas vezes tão completa como outras que se fazem num contexto científico, porque ela implica perceber uma situação de uma forma muito ampla, ou seja, levantar dados sociais, económicos, levantar processões, fazer entrevistas, falar com pessoas”.

“E portanto eu acho que, de fato, a investigação em design existe no contexto aplicado, mas ela é sempre muito pragmática e adstrita a uma situação que te é apresentada”, acrescentou, durante a nossa conversa.

Gonçalo Falcão identifica também um outro tipo de investigação, que “não está obrigada a responder a nenhuma pergunta, que não tem de encontrar soluções. E essa investigação mais especulativa, ela é muito difícil de fazer no contexto da profissão”. Mesmo assim, o professor acredita que “a maior parte dos designers que se mantêm na profissão a fazem”.

“A investigação num sentido mais abstrato está presente, mas é uma investigação também muito diferente da académica, porque ela não tem um fim. Quer dizer, ela limita-se a observar e a refletir, com reflexões que depois podem ou não vir a ser aplicadas, ou podem vir mudar, acrescentou, fazendo o paralelo com a investigação académica, que “tem um fim, mesmo que esse fim não se conheça e que não seja prático ou aplicável, mesmo que seja um fim muito abstrato, e tem uma coisa muito importante que é um método”.

Assim, o docente admite integrar a investigação no seu dia-a- dia para procurar “elementos para diagnosticar uma situação e tentar enquadrá-la num futuro possível”- através da recolha de documentos e de informação, observação e perguntas – e depois numa forma mais abstrata, “observando aquilo que tem sido feito e especulando a partir de livros ou de situações que leio, de conversas que tenho ou de ideias que vi em programas de televisão. E normalmente muito associado a contextos de criação pura, criação artística, outras assim. Tento tirar e antecipar e perceber movimentos”. Gonçalo observou ainda que também no contexto académico recorre à indagação.

Ainda em termos académicos, o professor Gonçalo Falcão identifica a necessidade de acabar com dois mitos existentes: que os alunos sem da faculdade designers, e que são formados para irem trabalhar em agências, sejam de maior ou menor dimensão. Considerando que só é possível sobreviver muito tempo na profissão “se estiveres sempre atento ao fazer no dia-a-dia, e ao mesmo tempo a questionar a atividade em si”, o professor lembra o exemplo do colega de profissão Pedro Albuquerque (da Albuquerque Designers), entre outros, que “escrevem regularmente crónicas e críticas em jornais ou noutros locais sobre a atividade”, pois estão sempre atentos ao que os rodeia.

Conclusões finais

Dado o número reduzido de entrevistas, não podemos concluir de forma inequívoca os pressupostos. No entanto, a análise a ambas as entrevistas parece validar a experiência vivida durante o estágio.

8.1. | CONCLUSÕES

O presente relatório baseia-se na experiência alcançada ao longo de seis meses de integração no mercado de trabalho, através do estágio realizado no Centro de Investigação em Arquitetura, Urbanismo e Design (CIAUD), da Faculdade de Arquitetura da Faculdade de Lisboa. Entre os meses de fevereiro e julho, o autor teve a oportunidade de participar, projetar e executar diversos projetos em design de comunicação.

Apesar de todos os projetos merecerem a devida atenção por parte do autor, as dinâmicas e exigências do mercado e da concorrência impõem uma distribuição cuidada do tempo despendido para cada tarefa que um projeto exige. Assim, o autor apercebeu-se que as dinâmicas de um projeto não deixam uma grande margem de tempo para a realização de uma investigação muito aprofundada. É essa a principal conclusão deste trabalho, que tem como enquadramento teórico a relação entre a Investigação em Design de Comunicação e a prática profissional do Designer de Comunicação nos dias de hoje. A investigação revela-se assim “condicionada […] e adstrita a uma determinada circunstância”, mesmo sendo “aquilo que vale dinheiro” (Professor Doutor Gonçalo Falcão, entrevista realizada pelo autor, 2016).

Para esta conclusão contribuiu a também sobreposição de vários projetos que requeriam a atenção do autor, e que davam entrada todos os dias no local de estágio, aumentando a pressão sobre o profissional, e diminuindo o tempo a poder ser despendido com cada um.

Esta experiência permitiu ao autor estar, assim, em linha de pensamento com a designer e investigadora Professor Doutora Elisabete Rolo, quando se “está a desempenhar a função de designer gráfica a investigação faz-se num sentido muito prático, faz-se direcionada para o projeto que se tem em mãos, no sentido muito da resolução daquele problema.” (entrevista realizada pelo autor, 2016).

O fato do estágio ter ocorrido dentro de um centro de investigação e inserido dentro de um ambiente académico, pressupunha uma eventual abordagem ao processo de design diferenciado dos ambientes estritamente profissionais.

Na prática, verificou-se que o processo de design em si, independentemente do ambiente que o rodeia é muitas vezes conduzido única e exclusivamente pelas suas próprias condicionantes: a encomenda, o prazo para a sua realização e os recursos disponíveis. dado a experiência ter sido altamente prática e dependente do cumprimento dos prazos acordados com os clientes.

Esta investigação utiliza uma metodologia de natureza mista, assente em métodos intervencionistas de base qualitativa. Como tal, todos os projetos e horas decorridas no estágio foram indispensáveis para as conclusões que aqui se apresentam. Apesar de ter existido sempre apoio por parte do CIAUD em todos os momentos, foram identificados alguns obstáculos ao longo do estágio, que se listam de seguida. Os prazos para entrega dos trabalhos cumpriam, muitas vezes, uma pequena margem de tempo, o que aumentava o grau de dificuldade de cada projeto, e exigia uma atenta divisão de tempo e de tarefas.

Durante o estágio, o autor conseguiu uma boa relação com a equipa que o acompanhou, assim como um bom ambiente no Gabinete Editorial e de Comunicação da Faculdade, onde foi relativamente fácil a adaptação. O autor beneficiou ainda de uma abertura por parte da direção do centro de investigação à flexibilidade dos horários.

A experiência, que mediou o percurso académico e a entrada na vida profissional, permitiu ao autor adquirir bastantes

conhecimentos, trabalhar de perto com docentes, investigadores e alunos, aprender melhores técnicas e ferramentas e aplicá- las num contexto real, assim como atender pessoas e eventos exteriores à faculdade.

O estágio permitiu ao autor um sentimento de realização, uma preparação e um enriquecimento da vida profissional. Como tal, toda a experiência ao longo de meio ano de estágio é considerada positiva.

A ajuda e disponibilidade dos investigadores e professores envolvidos em cada projeto desenvolvido permitiu uma discussão e reflexão à volta de cada um deles, partilha que não é alcançada com tanta facilidade fora do ambiente académico.

Em contrapartida, o ambiente académico é mais exigente na medida em que são pedidos diversos trabalhos por diversos professores, investigadores, o que encurta ainda mais o tempo a poder ser dedicado a cada um. Admite-se então um rigor maior no trabalho desenvolvido neste ambiente, uma vez que existem muitos atores da comunidade académica a avaliar os projetos. Neste contexto o CIAUD se posiciona como um espaço privilegiado para o desenvolvimento da investigação pluri- disciplinar que promove, tal como descrito na sua missão, o avanço do conhecimento científico, tecnológico e artístico nos domínios da Arquitetura, do Urbanismo, do Design e da Ergonomia, interagindo com outras áreas disciplinares.

Como pudemos demonstrar, tal desenvolvimento só pode florescer forma autónoma à prática profissional diária do Designer de Comunicação.

A investigação alimenta de novos horizontes a prática do design, horizontes que dificilmente avistaríamos a partir da prática profissional diária.

A investigação deve ser uma atitude consciente do designer, que deve criar condições para que ela se faça em meio à sua vida profissional, como forma de manter o equilíbrio intrínseco do Design enquanto com uma atividade e uma disciplina teórico-prática. Como o CIAUD está integrado na Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa, o autor experienciou a possibilidade de os seus trabalhos serem avaliados e aprovados pelo seu Presidente, Professor Doutor João Pardal Monteiro, a par do Presidente do próprio centro de investigação, Professor Catedrático Doutor Fernando Moreira da Silva. Esta interação com profissionais tão credenciados permitiu uma experiência ainda mais gratificante ao autor. No geral, considera-se a experiência em ambiente académico muito boa, uma vez que existe a possibilidade de desenvolver algo em prol de uma academia, de alunos, de docentes e não docentes, ou de bolseiros. Isto permite ainda uma projeção dos trabalhos desenvolvidos para o grande público.

No documento Design de comunicação vs investigação (páginas 138-151)

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