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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.3 Análise de Necessidades

2.3.2 Análise de necessidades: conceito e prática

A análise de necessidades é um meio para se compreender o motivo de aprender do aluno, já que tem justamente como objetivo identificar quais são as necessidades apresentadas pelo grupo ou estudantes em foco. Mas, como saber o que são ou quais são as necessidades apresentadas? De acordo com Hutchinson e Waters (1987, p.53), a primeira pergunta a se fazer é: “Por que esses aprendizes

precisam aprender inglês?”. Poderíamos, então, nos valer de tal pergunta e, ao tranferí-la para outras áreas do conhecimento, indagar: “Por que esses aprendizes precisam aprender isto?”.

Para Hutchinson e Waters (1987), a análise de necessidades não é apenas um meio para se alcançar as necessidades dos aprendizes, mas também uma forma de identificar os conhecimentos já adquiridos e aquilo que, com estes, se pode realizar, além de despertar no estudante seus desejos de aprendizado.

É por isso que, ao tratarem de necessidades, Hutchinson e Waters (1987, p.53) enfatizam a importância da consciência a respeito do que é tido como

necessidade, distinguindo, ainda, learning needs de target needs, respectivamente entendidas neste trabalho como, necessidades de aprendizagem e necessidades alvo. Estes são conceitos importantes no momento de se determinar aquilo que, de fato, é uma necessidade do grupo que se atende, já que podemos, de acordo com tal proposta, estabelecer as necessidades de aprendizagem e as necessidades a serem alcançadas, os objetivos, ou o alvo.

Para os autores, a distinção entre os termos apresentados dá-se pelo interesse existente na aprendizagem. Pode tratar-se de uma necessidade com alvo definido, pontual e que conduz, motiva o estudante ao estudo - necessidades alvo; ou pode tratar-se do conhecimento e das habilidades que serão exigidas do aprendiz para participar com competência de uma situação específica - necessidades de aprendizagem.

Para a necessidade alvo, Hutchinson e Waters (1987, p.55-6) definem três componentes que podem estar conectados, ou até mesmo confundidos no momento da análise de necessidades, sendo: (1) necessidades - aquilo que o aprendiz precisa saber para desempenhar sua função na situação-alvo; (2) lacuna - o que ainda precisa ser aprendido sobre a situação-alvo; e (3) desejo - aquilo que o aprendiz julga ser necessário aprender para desempenhar sua função na situação-alvo.

Dudley-Evans e St. John (1998, p.126) afirmam que

[...] first, needs analysis aims to know learners as people, as language users and as language learners. Second, needs analysis study also aims to know how language learning and skills learning can be maximized for a given learner group. Third, needs analysis study aims to know the target situations and learning environment so that data can appropriately be interpreted2.

Para Hutchinson e Waters (1987, p.60-1), é necessário, ao se objetivar a análise de necessidades, acrescentar a seguinte pergunta: “O que um usuário

proficiente precisa saber para participar efetivamente desta situação?”. A esse respeito, os autores concluem que as respostas estarão em torno dos itens de linguagem, habilidades, estratégias e conhecimento da matéria; todos esses pontos,

2Tradução minha: “[…] primeiramente, a análise de necessidades tem como objetivo reconhecer os

alunos como pessoas, como usuários e estudantes da língua. Em segundo lugar, o estudo de análise de necessidades também tem como finalidade conhecer como o aprendizado de língua e habilidades pode ser maximizado para um determinado grupo de alunos. Em terceiro, o estudo de análise de necessidades visa informar-se sobre as situações alvo e o ambiente de aprendizado para que as informações sejam devidamente interpretadas” (DUDLEY-EVANS e St. JOHN, 1998, p.126).

segundo os autores, estão relacionados ao aprender, porém a análise não identifica como esses itens serão aprendidos.

O problema que persiste é a definição do que são necessidades. Berwick (1989, p.53) discorre sobre a subjetividade desse conceito, pois segundo o autor, é na definição de necessidades que está o fundamento, ou ainda, a base para que se chegue à análise propriamente dita. Berwick afirma que muitas vezes esta definição está ligada às concepções filosóficas que atendem a determinados interesses de aprendizagem.

Em consonância com Hutchinson e Waters (1987), Dudley-Evans e St. John (1998, p.121) explicitam que a análise de necessidades não conduz, simples e somente, ao “o quê” deve ser ensinado, mas contribui de modo objetivo para o “como” deve ser o curso. Os autores garantem que a “elaboração de um curso,

assim também como a avaliação, a produção de material e o processo de ensino- aprendizagem” são gerados como dados profundamente relevantes e essenciais a partir da análise de necessidades. É justamente por tal importância que a definição de necessidades é crucial a este processo, como afirma Berwick (1989).

Além disso, Ramos (2004), em consonância com Robinson (1991, p.16), afirma que a análise de necessidades deve estabelecer-se em um processo contínuo, ou seja, deve ser aplicada no pré-curso, durante o curso e no pós-curso. De acordo com os autores, essa atitude possibilita o redirecionamento do curso, caso necessário, e a verificação de sua validade a partir das necessidades identificadas no momento da análise inicial. Assim, um curso que apresente a análise de necessidades como ponto de partida está sempre no âmbito do fazer-se e do vir a ser, possibilitando, dessa forma, que as transformações e mudanças possam representar, a qualquer momento, um novo rumo no processo de ensino- aprendizagem.

Desse modo, é possível compreender a análise de necessidades como no esquema, a seguir, proposto por Dudley-Evans e St. John (1998).

Figura 1: Stages in the ESP process.

Fonte: Dudley-Evans e St. John (1998, p.121).

Estabelece-se, de acordo com a Figura 1, uma relação transdisciplinar entre os elementos que compõem o processo de ensino-aprendizagem por meio da análise de necessidades, visto que, como afirma Ramos (2004), este é um processo contínuo, recorrente e que interliga seus componentes, mútua e simultâneamente. Não se trata, portanto, de uma sequência lógica e unidimensionada.

Ao refletir sobre o processo de ensino-aprendizagem de línguas tendo como centro o aprendiz, Brindley (1989) afirma que existem duas orientações diferentes para a análise de necessidades. A primeira delas é direcionada ao produto, ou seja, objetiva-se o maior número possível de informações sobre o uso atual e futuro da língua; a segunda orientação é dirigida ao processo, tendo, portanto, seu foco no processo de aprendizagem, dando espaço, na análise de necessidades, a motivações, desejos, personalidade, estilo e expectativas que o estudante traz consigo.

Dudley-Evans e St. John (1998, p.123-4), por sua vez, classificam as análises de necessidades em quatro orientações: (1) análise da situação-alvo, resultante dos objetivos (necessidade baseada no produto); (2) análise de situação de aprendizagem, baseada na aprendizagem (necessidade baseada no processo); (3) análise da situação presente, baseada naquilo que o aprendiz conhece naquele determinado momento – que possibilita identificar as facilidades do aprendiz na língua (pontos fortes e fracos), assim como perceber as lacunas; e (4) análise do meio, fundamentada na observação do ambiente onde será ministrado o curso – que pode contribuir de modo específico com a escolha da metodologia a ser utilizada no curso.

A partir dessas diferentes possibilidades de análise de necessidades, Dudley- Evans e St. John (1998, p.125) produzem o esquema a seguir, com os elementos que podem e devem emergir ao se realizar a análise.

Figura 2: Modelo de informações que emergem da análise de necessidades

Fonte: Dudley-Evans e St. John (1998, p.125).

De acordo com o esquema apresentado e proposto por Dudley-Evans e St. John (1998, p.125), a análise de necessidades deve identificar:

a. informação profissional dos aprendizes: atividades nas quais os aprendizes utilizam a língua;

b. informação pessoal dos aprendizes: fatores que afetam a apredizagem, tais como a experiência que o aprendiz possui no aprendizado da língua; expectativas e atitudes ante a língua;

c. informação sobre a língua: habilidades e usos atuais da língua, bem como os pontos fortes e fracos que o aprendiz apresenta;

d. lacunas dos aprendizes: aquilo que não foi aprendido para participar da situação-alvo;

e. necessidades do aprendiz: aquilo que o aprendiz precisa saber da língua; f. necessidades de aprendizagem da língua: como o aprendiz aprende de modo

eficaz a língua, competências de aprendizagem;

g. comunicação na situação-alvo: o conhecimento de como a língua é utilizada na situação-alvo; e

h. situação do ambiente: características sobre o ambiente onde será realizado o curso.

A partir dos elementos constituintes da análise de necessidades, propostos por Dudley-Evans e St. John (1998, p.126), é possível conhecer o estudante como ser humano, na sua particularidade, como um aprendiz e usuário da língua, bem

como identificar as habilidades e conhecimentos que já possui sobre a língua e pela língua, conhecer sua situação-alvo e, também, o ambiente no qual se dará a aprendizagem para que o processo seja, de fato, eficaz.

Levando-se em conta os modelos e propostas apresentados para a análise de necessidades (HUTCHINSON e WATERS, 1987; BRINDLEY, 1989; DUDLEY- EVANS e ST. JOHN, 1998), tomo como conceito central de análise de necessidades, para a pesquisa apresentada nesta dissertação, a teoria proposta por Hutchinson e Waters (1987), que afirma ser importante para o processo pautado nas necessidades dos alunos não somente identificá-las, mas também conhecer seus desejos e lacunas. Além disso, acredito, de acordo com os mesmos autores, ser necessidade do estudante aquilo que o mesmo aponta, não havendo, portanto, um parâmetro ou princípio para validar o que seja sua necessidade ou não; esta surge de sua própria percepção, amparada, por vezes, no auxílio do professor, mas não determinada por este.

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