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4 ANÁLISE DE DADOS

4.4 Os Desejos

4.4.4 Vistas ao futuro

A4: Preciso muito melhorar meu texto, do jeito que está não passo em uma faculdade boa. Eu preciso conseguir entrar em uma faculdade.

P: E como as aulas de Português poderiam te ajudar nisto?

A4: Se o professor depois de corrigir os textos que a gente faz não desse só a nota, mas a gente tivesse que voltar nele, reescrever, procurar as coisas que estão erradas e tentar descobrir como fazer para ficar certo, acho que seria mais produtivo.

P: Por que você acha que seria mais produtivo o trabalho desta forma?

A4: Acho que nós teríamos mais interesse.

A5: Tem que aprender de tudo, mas o mais necessário agora é aprender a escrever texto com as palavras adequadas. Mas quando eu encontrar um emprego aí vou ter que aprender várias coisas… tipo as regras de conjugação, porque os professores falam que eu não uso concordância.

P: Então você acha que seria importante que as aulas de Português fossem sobre o quê?

A5: Não sei exatamente, mas acho que seria bom que preparasse a gente para o mercado de trabalho. Poderíamos escrever textos que tenham a ver com o que as pessoas escrevem quando estão nas empresas.

A7: Uma das coisas que acho legal trabalhar é o vocabulário. Precisamos ampliar nosso vocabulário. Às vezes quando vamos conversar com alguém faltam as palavras e isso é ruim, principalmente se for numa entrevista de trabalho.

A10: Um dos assuntos que gosto é quando interpretamos histórias. Acho que isso pode me ajudar a interpretar um texto em alguma prova… num vestibular ou em uma entrevista.

A11: Preciso aprender a escrever textos… Uma coisa que é legal são os debates. Acho isso importante porque quando debatemos, você precisa arrumar justificativas, argumentos, senão perde o debate. Isso pode ajudar na hora de trabalhar.

Ao estudar língua materna, todo nativo é motivado pela consciência de que é de suma importância o conhecimento e domínio da língua nas habilidades de escrita e também oralidade, porém não se atribui grande relevância ao status que é o de saber articulá-la adequadamente, quando em uma entrevista de trabalho ou no vestibular. Essa é exatamente a reflexão apresentada pelos estudantes A4, A5, A7, A10 e A11.

Os cinco excertos aqui reportados apresentam desejos dos alunos por aulas que estejam relacionadas com sua vida profissional e futuro acadêmico (vestibular). Essa visão remete à consciência crítica por parte desses estudantes, que vislumbram a necessidade que terão da língua em seu futuro. Embora alunos de Ensino Médio e já em processo final do ensino regular, estes se mostram capazes de lançar um olhar ao futuro para perceber e identificar a importância de possuirem um vasto repertório linguístico que lhes garantirá a possibilidade de interação e arguição em diferentes contextos.

Os PCN-EM-LCT (BRASIL, 2000) declaram que a função do ensino de língua materna, para as séries finais, é proporcionar aos jovens estudantes habilidades e conhecimentos mínimos, capazes de inserí-los nos mais variados e diversos contextos de interação social, garantindo-lhes a possibilidade de estarem preparados para, no mercado de trabalho e na vida acadêmica, almejarem cargos e oportunidades idealizados. Os PCN-EM-LCT (BRASIL, 2000) afirmam, ainda, que esses jovens devem estar aptos a concorrerem às oportunidades sociais em igualdade com todo e qualquer cidadão.

A análise de necessidades pode, portanto, tornar-se um instrumento essencial, em que o estudante não seja mais um mero expectador do curso do qual participa, mas torne-se o protagonista da ação educacional, já que o objeto das aulas corresponde às suas necessidades, lacunas e desejos. Essas aulas podem, ainda, proporcionar aos estudantes maior participação nas atividades desenvolvidas e propostas pelo professor.

Ao acompanhar algumas aulas, pude perceber que o interesse dos estudantes, frequentemente, se esvaia após perceberem que a discussão dos textos literários ou mesmo que as explicações gramaticais trazidas pelo professor à sala de aula nada têm a ver com seu interesse naquele espaço e dado momento. Foram diversas as situações nas quais o professor da turma precisava parar sua reflexão ou mesmo interromper as explicações teóricas de determinados assuntos ou até mesmo correções de exercícios, supostamente realizados pelos estudantes, para lhes chamar a atenção de volta à aula. Depois de algumas semanas participando das aulas com a turma, sem realizar nenhum tipo de interferência, pude perceber que essa dispersão acontecia de modo recorrente e uma das motivações para tal comportamento dos jovens se confirmou após a realização das entrevistas, quando tive a oportunidade de descobrir, pelo discurso dos estudantes, que estes não atribuiam sentido à aula de Português, dado o modo como era realizada, e, consequentemente, a atenção dos alunos não era dispensada às propostas do professor.

Ao se ter em conta as necessidades dos alunos como ponto de partida para os estudos, é possível que o interesse seja despertado de modo mais explícito e contínuo. Além disso, o desenvolvimento dos alunos poderá ser mais eficaz, visto que não se tratam de aulas nas quais o estudante precisa participar por simples obrigação ou por imposição curricular e, ainda, realizar aquilo que lhe foi ordenado por alguém que, naquele espaço, exerce sobre ele o papel de uma autoridade, mas trata-se de uma oportunidade para que o aluno possa sentir-se considerado como um ser humano que apresenta necessidades a serem supridas e desejos a serem atendidos, coerentes e relevantes ao espaço escolar.

Por fim, é importante recordar que a análise de necessidades é, por excelência, um meio de, se bem aplicado, possibilitar aos estudantes papel ativo no espaço educacional e, consequentemente, no seu processo de aprendizagem. Essa possibilidade de participação ativa do estudante se dá, principalmente, pela importância que suas necessidades e desejos ocupam dentro da sala de aula e da atividade docente do professor. Quando o objeto de estudo da aula, por exemplo, passa a ser o texto produzido por um aluno e suas dificuldades, ou mesmo erros, temos como voz ativa do processo de realização daquela determinada aula o estudante, que desempenha, então, a figura central que motiva o objeto de estudo.

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