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6. Enquadramento da proposta de regulamento relativa a um DECCV

6.10. Análise detalhada da proposta de regulamento sobre um DECCV

6.10.1. Regulamento

O Regulamento é composto por dezasseis artigos principais. Começa por especificar a finalidade e o objeto do regulamento (art. 1º), apresentando de seguida (no art. 2º) um rol de conceitos relativos à terminologia de que o regulamento faz uso. Alguns desses termos já são conhecidos do acervo legal neste domínio, outras noções são definidas de forma inaugural.

O carácter facultativo das regras de direito contratual estabelecidas pelo DECCV é perentoriamente afirmado (art. 3º). O seu âmbito de aplicação territorial, pessoal e material é delimitado conforme já vimos num ponto anterior.

É prevista (art. 8º) a necessidade de declaração expressa do consumidor (que se deve distinguir claramente da declaração de manifestação de vontade de celebrar o contrato), mediante acordo entre as partes, para que o DECCV se aplique.

Os deveres de informação não são descurados pelo DECCV (art. 9º) 64 e recaem sobre o profissional, em relação ao consumidor. Nesse sentido, é estabelecida a obrigatoriedade de os consumidores tomarem conhecimento de um conjunto de aspetos considerados essenciais do contrato. É neste contexto e com o objetivo de assegurar o cumprimento destes deveres de informação que é criada a ficha informativa incluída como Anexo II, que deve ser entregue pelo profissional ao consumidor aquando das negociações contratuais.

Os EM’s deverão garantir a existência de punições para os profissionais pelo incumprimento das obrigações e especiais requisitos relativos à exigência de declaração expressa do consumidor no sentido de querer a aplicação do DECCV e de deveres de informação que o profissional assume para com o consumidor (art. 10º).

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A opção pela aplicação do DECCV tem como efeito a exclusiva regulação de todas as questões que ele abranger pelos seus preceitos, sendo o único regime aplicável a tudo quanto seja regulado por ele (art. 11º), não se podendo fazer uma aplicação fragmentada do regime. Mas isto só acontece mediante uma escolha válida do DECCV para reger o contrato e tem efeitos retroativos para que assim possa abranger todo o cumprimento do contrato e os meios de defesa previstos para situações de incumprimento dos deveres de informação pré-contratual, todo o seu ciclo de vida, portanto.

O regulamento proposto não afeta a aplicação dos requisitos de informação da Diretiva 1006/123/CE relativa aos serviços no mercado interno (art. 12º).

Os EM’s podem, se for essa a sua intenção, aplicar o DECCV não só a nível transnacional mas também no âmbito nacional e até mesmo estender o seu âmbito também aos contratos celebrados entre profissionais, mesmo nenhum deles sendo uma PME (art. 13º)65.

6.10.2. Anexo I

O anexo I contém as normas de direito contratual, o DECCV efetivamente, encerrando as respetivas normas – constituído por oito partes e dois apêndices.

A “Parte I” é composta pelos princípios gerais de direito dos contratos pelos quais as partes devem reger o seu comportamento, designadamente o princípio da boa-fé contratual e o princípio da liberdade contratual (que permite às partes afastarem aquilo que o DECCV determina, exceto as normas imperativas, como as de proteção do consumidor).

A “Parte II” versa sobre o direito que assiste aos consumidores de terem conhecimento de todas as informações contratuais essenciais (informações pré- contratuais necessárias antes da aceitação pelo consumidor). Além disso inclui normas sobre a celebração de acordos entre as partes, bem como normas específicas que preveem o direito de resolução do consumidor quando estejam em causa contratos

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celebrados à distância ou fora do estabelecimento comercial e a possibilidade de anulação de contratos por motivo de erro, dolo, coação ou exploração abusiva.

A “Parte III” determina as normas gerais sobre interpretação das cláusulas contratuais em circunstâncias que suscitem dúvidas e normas quanto ao conteúdo e efeitos dos contratos e cláusulas contratuais que sejam abusivas e, por isso, se considerem inválidas.

Na “Parte IV” podemos encontrar normas exclusivas relativas aos contratos de compra e venda e (aos contratos) de fornecimento de conteúdos digitais que descrevem as obrigações do vendedor e do comprador, tal como normas relativas aos meios de defesa em situação de incumprimento, da responsabilidade de qualquer um dos contraentes.

A “Parte V” contém os deveres específicos e os meios de defesa aplicáveis aos contratos de prestação de serviços conexos, referentes “aos casos em que o vendedor presta em relação estreita com um contrato de compra e venda ou de fornecimento de conteúdos digitais, determinados serviços”66 (como os de instalação, reparação ou

manutenção). Clarificam-se ainda os direitos e obrigações que competem às partes neste tipo de contratos conexos.

A “Parte VI” debruça-se sobre normas comuns suplementares relativas a indemnização de prejuízos e juros de mora a título de atrasos no pagamento.

A “Parte VII” rege a restituição em consequência da anulação ou da resolução de um contrato.

Na “Parte VIII” podemos encontrar a prescrição do exercício de direitos ao abrigo de um contrato.

Finalmente, o Anexo I, apresenta-nos o “Apêndice I” do qual consta o modelo de instruções relativas ao direito de resolução, que o profissional tem obrigação de dar a conhecer ao consumidor, antes de celebrar qualquer contrato à distância ou fora do estabelecimento comercial, e o “Apêndice II” que se afigura um modelo de formulário da livre resolução.

6.10.3. Anexo II

66 Documento COM (2011) 635 final, de outubro de 2010, da Comissão – “Proposta de Regulamento”, p.

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O anexo II contém a ficha informativa quanto ao DECCV que o consumidor deve receber do profissional antes de manifestar o acordo em relação à aplicação do referido DECCV. Através da utilização desta ficha informativa pretende-se facilitar e garantir o cumprimento dos deveres de informação pré-contratual.

Conclusão quanto à proposta da Comissão

A proposta da Comissão, de tão ambiciosa, pode revelar-se verdadeiramente inexequível. Um regime de tal extensão e complexidade implica um estudo prévio aprofundado de cada matéria. O direito do consumo é regulado ao pormenor na proposta da Comissão e ainda assim revela-se insuficiente o seu campo de aplicação para que se possa utilizar em todos os EM’s efetivamente. Demonstrou-se um regime não desejado nos moldes apresentados.

Uma outra crítica que pode ser apontada ao trabalho da Comissão é o facto de ter sido incluída regulamentação para contratos entre profissionais. Afinal, se do que se quer tratar é do direito do consumo, porquê querer regular as relações entre profissionais, que não cabem no âmbito do direito do consumo? O que se conseguiu com isso foi adicionar complexidade a um diploma já de si pouco simples.