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70 Ver SASAKI, Yasuyuki O karate-dô e as filosofias do bu-dô.

4.4 ANÁLISE DO ESTATUTO DA CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE KARATE:

O estatuto da CBK, logo no seu artigo 5º faz uma declaração, no mínimo curiosa, quando define a Confederação Brasileira de karate como a única entidade de administração da modalidade “karate” em todo o território nacional.

Se auto-declarar a única representante de uma expressão cultural milenar, que há mais de cinqüenta anos teve início no país soa bizarro.

Já houve quem tentasse patentear a marca karate no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual, INPI, sem sucesso, é claro. Mas se autoproclamar como única entidade gestora de uma modalidade que se caracterizou ao longo dos séculos, pela diversidade, tanto na sua origem como na suas práticas é, no mínino, risível, além de inconstitucional. Aliás, a CBK fez um esforço muito grande, um lobby intenso, com o objetivo de fazer com que a lei Pelé mantivesse um artigo, o 17º, proposto pelo Comitê Olímpico Brasileiro, que previa o reconhecimento, pelo Estado, de apenas uma entidade, para acessar recursos públicos, oriundos da contribuição de todos os trabalhadores brasileiros. Esse artigo foi vetado no âmbito da Casa Civil, quando alertados pelos dirigentes das entidades que seriam discriminadas.

Um simples levantamento histórico-etnográfico traria à claro as origens dessa arte marcial. Há registros que remontam a mais de 5000 anos na antiga China e Índia.

O Karate é uma prática corporal desenvolvida com a proposta de aperfeiçoamento do espírito e do corpo humano. Os vários estilos de karate são arquivos corporais de uma tecnologia de gestão do corpo que antecedem em milhares de anos a hoje denominada Educação Física ou os Jogos Olímpicos.

O karate, através de suas organizações de estilo, preserva esse conhecimento e o reproduzem sistematicamente. Essas organizações têm sistemas próprios e são reconhecidos internacionalmente. Trata-se de uma estrutura que tem ramificações internacionais, formação de

professores e circuitos próprios de competição que não se esgotam apenas no circuito olímpico, esse é um apenas.

Desde 1987, quando a Confederação Brasileira de Pugilismo cumprindo edital publicado no Diário Oficial da União de 10 de agosto do mesmo ano, reuniu alguns presidentes de federações estaduais de karate, que eram filiadas ao departamento de karate da, então, CBP, para a fundação e eleição da primeira diretoria provisória da Confederação Brasileira de Karate, que surgiram novos conflitos no karate nacional e resultaram, conforme citado anteriormente, na criação de outras confederações. Mas, bem antes disso, já existiam várias entidades que administravam os diversos estilos de karate (shoto-kan, shito ryu, .wado ryu, goju ryu,

kyokushinkai, shorei ryu, shorin ryu, uechi ryu, isshin ryu etc).

Na verdade a CBK é apenas uma delas. Hoje é uma das mais competitivas por ter bons atletas e participar de um circuito internacional que tem representatividade em diversos países. Além de ser vinculada ao Comitê Olímpico Internacional.

Portanto, se autodenominar como a única entidade que administra o karate é um tanto quanto esdrúxulo e etnocêntrico.

A World Karate Federation, entidade internacional a qual a CBK está filiada, não se auto denomina a única representante do karate mundial. Porém, no artigo 21 do seu estatuto, no item intitulado Principles of Sporting Justice, proíbe que as suas filiadas, as confederações nacionais, se filiem a outras organizações de karate e que tenham relações esportivas com organizações não reconhecidas pela WKF.

Essa medida reduziu bastante o número de participantes nos circuitos nacionais da CBK. Portanto, se a estratégia foi se fortalecer, se preservar ou enfraquecer as outras entidades, não tem alcançado esses objetivos. A Confederação Brasileira de Karate Interestilos, outra dissidente da CBK, tem chamado a atenção da modalidade pelo grande número de atletas que participam dos seus eventos. Uns dos campeonatos da entidade registraram recorde de

participantes em torneios brasileiros de karate82. Embora o nível técnico dos seus atletas não seja destaque no campo esportivo internacional da modalidade, o número de atletas impressiona. Portanto, essa proibição da CBK não conseguirá desestruturar sistemas organizacionais internacionalmente consolidados. Agindo dessa forma, ela mais facilmente atrapalha o crescimento técnico da modalidade, uma vez que inviabiliza o maior intercâmbio entre atletas83 e demais praticantes. É sabido que no meio esportivo quanto mais oportunidades os atletas têm de competir, mais competitivos se tornam e melhores resultados trazem para o país em eventos internacionais.

Muito provavelmente, o intercâmbio entre as diversas organizações de karate, número não cadastrado pelo Ministério do Esporte, movimentaria o funcionamento de academias. Poderia estruturar melhor a vida profissional de milhares de prestadores de serviço, que dependem de sua atividade como professor de luta para sobreviver e sustentar sua família. Além de poder movimentar o turismo, pois os circuitos de competição em artes marciais é um setor muito promissor na economia internacional. Principalmente, nos EUA, os quais têm diversas organizações que administram o karate, e vários eventos contam com mais de três mil participantes cada que acontecem em parceria com empresas de turismo, hotelaria, restaurantes e congêneres.

A legislação esportiva é bem clara ao permitir que sejam criadas várias entidades de administração para uma mesma modalidade esportiva. O artigo 4º, parágrafo 3º da Lei 9615/98, que aborda a composição e objetivos do Sistema Brasileiro do Desporto, já prevê que a organização desportiva do País é fundada na liberdade de associação.

Mais do que ir ao encontro do desejo da comunidade esportiva de poder se agrupar de acordo com as afinidades e interesses comuns, essa permissão do legislador se fundamenta em alguns princípios gerais de direito, aqui entendidos como expressão máxima do direito, como o da liberdade e o da razoabilidade.