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3.1 Descrição sintética do objeto dos processos de perícia

3.1.2 Análise do objeto dos processos estudados

Se o objeto da Contabilidade é o patrimônio e se a perícia contábil é uma atividade de um segmento oriundo da própria Contabilidade, possui objetivos claros como a transferência da verdade contábil para o ordenamento da instância decisória e, ainda, se seus objetivos são a constatação, prova ou demonstração sobre o seu objeto, pode-se adotar o pensamento de Alberto (2002, p.51) segundo o qual a perícia contábil tem como objeto as “situações, coisas ou fatos oriundos das relações, efeitos e haveres que fluem do patrimônio de quaisquer entidades”.

Nesse sentido, procurou-se conhecer o objeto das perícias contábeis analisadas neste estudo, apresentou--se o resultado dos casos n. 2 e n. 5, dos quais foram realizadas apurações dos valores corretos dos haveres das massas inventariadas e investigada a existência de atos lesivos que visavam a fraudar o interesse de pessoas junto ao patrimônio a inventariar. A ação pericial nestes dois casos conseguiu salvaguardar o patrimônio destinado à partilha de bens entre os herdeiros.

Sobre os estudos de casos n. 1 e n. 3, em decorrência de uma morosidade da Justiça, a perícia, em relação à salvaguarda do patrimônio dos credores, não teve nenhuma eficácia, pois essas perícias foram determinadas em épocas inoportunas, e já havia acontecido o extravio de bens e direitos das requeridas nas ações de falências.

Quanto ao estudo de caso n. 4, não se pôde realizar a mesma análise, até porque não houve trabalho pericial, ficando, portanto, prejudicado o trabalho que viesse a conhecer o fenômeno investigado, que é o objeto.

A seguir apresenta-se a análise dos processos que estruturaram o presente estudo com os detalhes peculiares de cada um.

3.1.2.1 Estudo de caso n. 1

O processo n. 19910236241, objeto do estudo de caso n. 1, foi considerado pela 20ª Promotoria de Justiça como falência frustrada, em função da morosidade da Justiça. O Promotor lamentou que o condutor do processo não tenha atentado para a realização da perícia cautelar nos moldes dos art. 846 a 851 do CPC, assegurando o controle da riqueza patrimonial, que a empresa possuía na ocasião.

A perícia contábil judicial cautelar ou de futuro é aplicada para salvaguardar o patrimônio de entidade. Nesse caso, seria prudente aplicar a perícia cautelar, até porque houve denúncia por parte da requerente, alertando a Justiça de que os representantes da requerida estariam cometendo crime falimentar. Entre outros, cita a retirada ilegal de mercadorias para instalar uma outra empresa, em nome de terceiros, numa ação irresponsável e inconseqüente. Quando é aplicada a perícia contábil judicial cautelar, a Justiça determina o seqüestro dos bens, mantendo-os em sua guarda e garante, pelo menos em parte, a liquidação das dívidas. Em que pese a Justiça necessitar de prazos legais, houve exagero, talvez um excesso de zelo, no cumprimento desses prazos, pois a falência foi decretada em 13 de outubro de 1992 e o síndico foi nomeado somente em 02 de outubro de 2001, isto é, 9 anos após.

Se nomeado no mesmo ato da falência, o perito anteciparia todas as provas e salvaguardaria o patrimônio da massa falida, em benefício dos credores. A nomeação do síndico, definida posteriormente, não prejudicaria os interessados, pois os valores estariam resguardados.

Nesse processo, a atuação do síndico foi apenas para cumprimento da lei, ou seja, analisar os autos, verificar o laudo do perito, concluir que a falida não tinha valores a arrecadar e os possíveis crimes falimentares, que por decurso de prazo já estão prescritos.

Neste sentido, Andrade (2000, p.162) lembra que:

se não houver requerimento de credor, o síndico, dentro de oito dias, promoverá a venda dos bens que foram arrecadados, apresentando em seguida seu relatório para os efeitos dos §§ 3º, 4º e 5º do artigo 200. O juiz, atendendo o disposto no § 5º do artigo 200, proferirá em seguida sua decisão, encerrando a falência nos respectivos autos.

Führer (1995) alerta que não havendo bens a serem arrecadados ou quando forem insuficientes até para cobertura de despesas com o processo da massa falida, o Juiz deverá determinar o encerramento da falência.

Infere-se, do exposto, que a perícia contábil judicial cautelar deve ser considerada como um dos primeiros passos a ser determinado nos processos de falências, pois não se pode correr riscos de ver o patrimônio exaurir por influência da ação morosa da Justiça.

3.1.2.2 Estudo de caso n. 2

O estudo de caso n. 2 apresentado, que tem como base o processo n. 200101483668, mostra a importância da perícia contábil judicial cautelar ou de futuro, objeto deste trabalho.

Trata-se de um duplo inventário, em que o primeiro inventariante, interessado no resultado final da partilha, propõe um plano totalmente em desacordo com a legislação, gesto antiético, em tentativa de burlar a Justiça, beneficiando a si próprio e prejudicando outros herdeiros menores. Oferece uma avaliação fraudulenta e com vícios. A ação do Ministério Público foi providencial, manifestando que fosse nomeado um perito contábil para inibir intenções maldosas que estavam por vir e prejudicar os herdeiros menores.

O laudo do perito contábil vem comprovar a necessidade da realização de perícias cautelares também nos processos de inventário precedidos de partilha de bens, para fazer justiça onde se requer justiça. Com base nos estudos apresentados pelo perito, pôde-se comparar as duas situações invocadas.

As diferenças encontradas pelo perito, entre o primeiro plano de partilha apresentado na petição inicial e o segundo plano de partilha proposto e aceito pelas autoridades judiciais, são muito grandes, conforme pode ser observado no Quadro n. 12.

ORDEM NOME DO HERDEIRO PRIMEIRO PLANO DE PARTILHA DE BENS PARTILHA DOS MESMOS BENS COM NOVOS OS VALORES PLANO DE PARTILHA DE BENS REALIZADO DIFERENÇA 1 Bill Néri 685.290,14 2.384.909,59 1.055.214,03 -1.329.695,56

2 Pedro Ribeiro Néri 1.370.580,28 1.445.580,28 2.110.428,06 664.847,78 3 Esmeralda Ribeiro Néri 1.370.580,28 1.445.580,28 2.110.428,06 664.847,78

Total 3.426.450,70 5.276.070,15 5.276.070,15 -0-

Quadro 12 – Comparação dos valores entre os dois planos de partilhas de bens Fonte: Processo n. 200001468434 do Fórum de Goiânia.

A Contabilidade prestou um serviço relevante ao espólio e também ao Estado, por meio da perícia contábil judicial cautelar. Provou que o patrimônio da massa era muito maior do que o apresentado na inicial. Teria sido um inventário com partilha de bens totalmente fraudulento, se não houvesse a intervenção do Ministério Público, exigindo a produção de provas antecipadas, conforme prevêem os artigos 846 a 851 do Código de Processo Civil.

Com este desfecho, a perícia contábil judicial cautelar cumpriu a sua missão, salvaguardando o patrimônio de pessoas. Sem essa perícia, a massa inventariada teria uma distribuição muito diferente daquela prevista em lei. A Justiça, apoiada nas provas produzidas pelo perito contábil, fez valer a retidão e a imparcialidade no deslinde da causa.

Assim, observa-se, mais uma vez, a importância que este tipo de perícia tem para auxiliar a Justiça a prolatar suas sentenças, em processo de inventário e partilha de bens, de modo coeso, verdadeiro e justo.

3.1.2.3 Estudo de caso n. 3

O estudo de caso n. 3 refere-se ao processo n. 19940047371, de 23 de fevereiro de 1994, de natureza de falência, distribuído à 11ª Vara Cível da Comarca de Goiânia, tendo como requerente a Madeireira Araguaia Ltda e como requerida a Contran Construções Ltda. Nesta análise há de se levar em conta que o procurador da requerente agiu com muita segurança para salvaguardar o patrimônio da representada. Na petição inicial de falência já requereu fosse determinada a realização da perícia contábil judicial cautelar, que é a perícia judicial de futuro. No entanto, em virtude da morosidade da Justiça, que tem de seguir a legislação em vigor, em relação aos cumprimentos de prazos, a realização da perícia só foi determinada depois de ter transcorrido 1 ano, ou seja, em 13 de fevereiro de 1995.

A relação de bens que foram avistados pelo oficial de justiça no pátio da empresa, em 22 de março de 1994, talvez teria sido ampliada se houvesse uma atuação com mais perseverança da Justiça. Outros valores patrimoniais poderiam ter sido encontrados e relacionados, se a perícia tivesse sido determinada na época do requerimento. Garantir-se-ia, assim, pelo menos em parte, o pagamento da dívida aos credores ou das despesas da massa falida.

Apesar disso, há de se lembrar que a empresa não fica inerte ou paralisada por grandes períodos, aguardando soluções. Possivelmente, na interpretação dos empresários da requerida, não existia qualquer represália da Justiça ou dos credores que pudesse inibir suas ações. Pelo menos não havia nenhuma citação até aquela data.

Como estavam em situação financeira difícil, certamente retiraram ilicitamente, do local, os valores restantes, desviando-os para outros locais não sabidos e tirando proveito de algo que já não lhes pertencia.

Houve demora da Justiça em definir a realização da perícia contábil judicial cautelar. Com isso, beneficiaram-se pessoas que agiram de má-fé, que deram prejuízos a terceiros e,

ainda, tomaram posse de valores da falida, para, certamente, montar outros negócios em nome de terceiros.

3.1.2.4 Estudo de caso n. 4

O estudo de caso n. 4 refere-se ao processo n. 19910058181, de 12 de março de 1991, e tem como requerente a Cartográfica Papelaria e Tipografia Ltda e requerida a empresa J&C Indústria e Comércio de Couro Ltda, ação de falência, distribuída à 11ª Vara Cível da Comarca de Goiânia.

No presente processo, não houve requerimento de perícia, no entanto, a exemplo do estudo de caso n. 3, os bens que a falida tentou colocar à penhora, em 15 de abril de 1991, desapareceram no decorrer do tempo. Isso evidencia que a Justiça, muitas vezes, não cumpre bem sua finalidade, por força da burocracia e, com isso, perde muito tempo entre um ato e outro. Por exemplo, a decretação da falência aconteceu em 18 de março de 1992 e a nomeação do síndico em 02 de agosto de 2002, ou seja, 10 anos depois.

Nesse período, os bens que existiam na empresa desapareceram. É o que comprova o relatório do síndico, apresentado em 26 de agosto de 2002, atestando a inexistência de bens a serem arrecadados e sugerindo o encerramento do processo.

3.1.2.5 Estudo de caso n. 5

O estudo de caso n. 5 teve como fonte de pesquisa o processo n. 200001468434, de 31 de agosto de 2000, que trata de dois inventários, de Dona Germana Felipe da Silva, falecida em 13 de dezembro de 1976, e a conseqüente partilha de bens. A Sra. Delziane de Ataíde, brasileira, viúva, funcionária pública, requer a abertura de inventário e partilha de bens deixados pelos de cujus Germana Felipe da Silva, falecida em 13 de dezembro de 1976, e seu filho Walter de Ataíde, falecido em 16 de maio de 2000.

A 1ª de cujus deixou como meeiro, o Sr. Geovane de Ataíde, brasileiro, viúvo, aposentado e, como único herdeiro, o 2° de cujus Walter de Ataíde.

A suplicante é viúva do 2° de cujus, que a deixou como meeira, e, ainda, como herdeiros, três filhos menores púberes: Gerson de Ataíde, Fernando de Ataíde e Walter de Ataíde Júnior.

Mais uma vez se comprova a importância da perícia contábil judicial cautelar. Diferentemente do estudo de caso n. 2, o presente tem como ponto importante o esquecimento

de arrolar ao monte-mor um trator avaliado em R$ 8.000,00 e 168 cabeças de gado avaliadas por R$ 50.400,00.

O Ministério Público não qualificou de má-fé tal esquecimento. Preferiu aceitar as justificativas do inventariante, Sr. Geovane de Ataíde, de 92 anos de idade, que tem como família somente seus três netos menores e a suplicante, sua nora. Todos moram em uma única residência.

Se não fosse a intervenção da perícia contábil, produzindo provas antes da audiência de julgamento, no mínimo o Estado teria prejuízo nos cálculos do ITCD, pois não contaria com os valores atualizados, nem com os dois itens citados.

O laudo foi apresentado em 15 de fevereiro de 2001 e trouxe uma apuração a maior em R$ 66.400,00, provocados pela inclusão de um trator e 168 cabeças de gado bovino, além de algumas diferenças de avaliações de outros itens dos 2 espólios.

O plano de partilha constante do laudo pericial contábil foi adotado pelo Partidor Judicial, cujo documento foi apresentado ao Juiz e por este homologado. Assim, o documento homologado constituiu um Formal de Partilha, documento oficial da Justiça, que reconhece os valores pertencentes a cada um dos participantes da partilha.

D’Áurea (1962) alerta que a atenção é uma dádiva que fortalece a qualidade do trabalho pericial. No laudo apresentado, nessa partilha, observou-se que a atenção foi constante em todas as fases da execução do trabalho.

Schmidt (2000, p.41) observa que “nem todos os trabalhos periciais executados possuem como característica a qualidade necessária para sua apresentação àqueles que dela necessitem informações”.

Notou-se que esse laudo foi produzido com muita atenção e zelo e possui como característica a qualidade ideal para dar suporte a uma sentença. Não houve nenhuma contestação após a apresentação do trabalho do perito. A qualidade esteve presente desde os valores apresentados aos itens de partilha, até a sugestão que se apresentou para o formal de partilhas.

3.2 ESTRUTURA DAS PERÍCIAS CONTÁBEIS JUDICIAIS CAUTELARES