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1 O ENFOQUE PATRIMONIAL E A GESTÃO INTEGRADA E COMPARTILHADA DOS RECURSOS NATURAIS E

22 Conforme Morin e Kern (2003, p 151-152), torna-se importante a

1.6 A ANÁLISE DO SISTEMA POLÍTICO EM DAVID EASTON: NOÇÕES PRELIMINARES

Os procedimentos políticos e administrativos efetivamente concretizados pelo Estado de Santa Catarina na condução do programa estadual de gerenciamento costeiro serão descritos no capítulo terceiro, com o objetivo de identificar os condicionantes

36 Para Amy Poteete, Elinor Ostrom e Marco Janseen (2011, p. 54), “os

dilemas sociais envolvem um conflito entre a racionalidade individual e os recursos melhores para um grupo”.

37 Recentemente, foi editada a Lei n. 13.240, de 20 de dezembro de 2015,

que dispõe sobre a administração, a transferência de gestão de imóveis da União e seu uso para a constituição de fundos. Ficou assentada a possibilidade de alienação de imóveis da União a particulares que os estejam ocupando. Tal diretriz revela uma tendência de privatização dos espaços costeiros e a ênfase na efetivação de instrumentos arrecadatórios, que serão instrumentalizados, progressivamente, pelos Municípios.

da instauração e manutenção da gestão integrada e compartilhada. No desenvolvimento das ações que conduziram o Gerco estadual, incluindo-se a fase legislativa de implementação, o Governo Estadual recebeu algumas influências do seu “ambiente”, as quais podem ter motivado eventuais ajustes, mais ou menos profundos, no curso dessas ações. Torna-se, assim, importante entender o comportamento dos sistemas políticos.

Entende-se a vida política como sistema38 de comportamento aberto e adaptativo inserido “num contexto a cujas influências o próprio sistema político está exposto e a que este, por sua vez, reage”. O sistema político recebe, portanto, a influência de outros sistemas sociais, deles fluindo “uma corrente de influências e acontecimentos que moldam as condições nas quais devem agir os membros do sistema” (EASTON, 1970, p. 186)39.

A sobrevivência do sistema político, quaisquer que sejam os impactos dos contextos que os envolvem, chama a atenção para a sua “capacidade de resposta aos distúrbios”40 e de adaptação às condições nas quais se encontram41, característica variável

38 David Easton entende sistema como um “conjunto qualquer de variáveis”,

sendo, para o autor, verdadeiramente importante saber se esse conjunto definido de variáveis é digno de interesse e “se nos vai auxiliar a compreender e explicar algum aspecto do comportamento humano que nos preocupa”. Em acréscimo, sustenta que: “um sistema político pode ser designado como as interações através das quais os valores são autoritariamente repartidos pela sociedade”, que é o que distingue o sistema político dos demais que estão no contexto (1970, p. 190, grifo nosso).

39Morin e Kern destacam, em análise mais recente, que: “em um cenário

de competição econômica – ou de depressão econômica -, o político fica reduzido ao econômico, que passa a constituir o problema político permanente: como há simultaneamente crise de ideologias e de ideias, o reconhecimento do primado do econômico determina um consenso frouxo que enfraquece o papel democraticamente vital do conflito das ideias (2003, p. 114) .

40 Distúrbios são as influências do contexto global que agem sobre o

sistema e, portanto, o modificam. Eles podem concorrer para a manutenção ou alteração do sistema (EASTON, 1970).

41 Meadows enfatiza que “um sistema dinâmico e auto-ajustável não pode

ser governado por uma política estática e inflexível”. É mais eficaz criar programas que mudam de acordo com a condição do sistema, especialmente diante de grandes incertezas, devendo conter laços de

conforme o sistema (EASTON, 1970, p. 187). Os sistemas políticos, assim, podem tentar “mediar com os demais contextos”, podendo “regular seu próprio comportamento, transformar sua estrutura interna e até mesmo reformular seus objetivos fundamentais”:

Com respeito a essas finalidades variáveis, é

característica primária de todos os sistemas a aptidão em adotar uma ampla escala de ações positivas, construtivas e inovativas, para prevenir ou absorver quaisquer forças de deslocamento. Um sistema não precisa reagir

a um distúrbio apenas pela oscilação na vizinhança de um ponto de equilíbrio anterior ou mudando para um novo ponto. Pode

controlar o distúrbio, procurando transformar seu contexto de maneira tal que as trocas entre este e ele próprio não continuem tensas;

pode tentar insular-se, protegendo-se de quaisquer outras influências; ou ainda, podem

os membros do sistema transformar suas próprias relações e modificar suas finalidades e práticas, de forma a aumentar suas possibilidades de lidar com os inputs do contexto. Através destes ou de outros

caminhos, um sistema tem capacidade para regular distúrbios construtiva e criativamente [...]

No final, o sistema pode conseguir afastar ou

incorporar, com sucesso, quaisquer

influências que o estejam pressionando (EASTON, 1970, p. 189, grifo nosso).

Easton explica que o contexto do sistema político pode ser dividido em duas partes: a) intra-societária, que contempla os conjuntos de comportamentos, atitudes e ideias, tais como a economia, a cultura, a estrutura social e as personalidades; b) a extra-societária: “são componentes funcionais de uma sociedade internacional, um supra-sistema de que é parte qualquer

realimentação que sejam capazes de alterar os rumos, incluindo a aprendizagem no processo de gestão (2006, p. 241).

sociedade”, dos quais a cultura internacional é um exemplo. Essas duas partes do contexto formam o seu contexto global (1970, p. 190).

Os sistemas políticos são considerados persistentes quando preenchem duas funções (variáveis essenciais da vida política): a) devem estar aptos a repartir os valores por uma sociedade; b) podem induzir a maioria dos membros a aceitar essa repartição como obrigatória. As tensões ocorrem quanto há perigo de que as “variáveis essenciais sejam arrastadas para além do que podemos designar como sua escala crítica”. Pode acontecer que a sociedade não entre em colapso e o sistema continue controlando os problemas, mantendo as duas variáveis em certa escala de operação normal, importando a capacidade de resposta à tensão (EASTON, 1970, p. 190)42.

Entendido o termo troca como as relações mútuas entre o sistema político e os demais sistemas do contexto, Easton usa os termos inputs e outputs, associando-os aos efeitos sentidos além de um sistema em direção a outro. Os inputs servem de variáveis- resumo, concentrando e espelhando tudo o que é relevante no contexto em função da tensão política (comportamento nos vários setores da sociedade que afeta o que aconteceu na esfera política). O autor restringe o conceito de input, focalizando os de maior relevância, quais sejam demandas e apoio: interessa a análise dos efeitos que têm os inputs sobre o que podemos chamar de outputs políticos. Dessa forma, estamos aptos a levantar as consequências do comportamento dentro do sistema político para o seu contexto:

existe um movimento de feedback cuja identificação nos ajuda a explicar os processos através dos quais o sistema pode lidar com a tensão. Através dele, o sistema

42 O autor dá como exemplos de acontecimentos no contexto que podem

provocar desorganização geral ou aversão ao sistema: uma derrota em uma guerra ou uma severa crise econômica. Em tais situações, pode acontecer que as autoridades tornem-se incapazes de tomar decisões, ou as decisões que tomam não são mais regularmente aceitas como obrigatórias. Assim, não são mais possíveis “as distribuições automáticas de valores e a sociedade entra em colapso pela falta de um sistema de comportamento que preencha uma das suas funções vitais” (EASTON, 1970, p 191).

aproveita-se do conhecimento do que

acontece, tentando ajustar o seu

comportamento futuro (EASTON, 1970, p. 195-196, grifo do autor).

A descrição dos procedimentos efetivamente adotados pelo Estado de Santa Catarina na concretização do programa estadual de gerenciamento costeiro pode ser enriquecida com esses conceitos contidos na obra de Easton (1970), tendo em vista que as principais decisões foram políticas e, no período de 2009 a 2016, os órgãos gestores da política costeira receberam algumas influências (inputs) do seu contexto global.