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COSTEIRO DE SANTA CATARINA: A ESTRUTURAÇÃO DO MODELO DE GESTÃO EM SANTA CATARINA (2009-2016)

3.1 A ESTRUTURAÇÃO DO PLANO ESTADUAL DE

GERENCIAMENTO COSTEIRO NO PLANO LEGISLATIVO Conforme a Constituição Federal de 1988, compete à União elaborar e executar Planos Nacionais e Regionais de ordenação do território e de desenvolvimento econômico e social (art. 21, inciso IX). Aos Estados são reservadas as competências que não lhes sejam vedadas (CF/88, art. 25, §1º). A competência para legislar sobre a matéria de meio ambiente e gestão de recursos naturais enquadra-se na disciplina da denominada competência

suplementar, que não pode colidir com as normas gerais federais107.

Por outro lado, a competência comum de tutelar o meio ambiente veio delimitada no art. 23 da CF/88, abrangendo a União, os Estados e os Municípios. Em 2011, foi editada a Lei Complementar n. 140, fixando normas para a cooperação entre os entes federativos, tendo sido definidas as seguintes ações administrativas a serem desenvolvidas pelos Estados (art. 8º): executar e fazer cumprir, em âmbito estadual, a Política Nacional do Meio Ambiente e demais políticas nacionais relacionadas à proteção ambiental (inciso I); exercer a gestão dos recursos ambientais no âmbito de suas atribuições (inciso II); formular e fazer cumprir a sua política de meio ambiente (III); promover, em seu âmbito, a integração de programas e ações de órgãos administrativos da União, Estados e Municípios (IV); organizar e manter o Sistema Estadual de Informações (VII).

No âmbito da Política de Gerenciamento Costeiro, note-se que a Lei federal n. 7.661/88, específica da matéria, dispõe, em relação ao Estados e Municípios, o seguinte (art. 5º):

§1º Os Estados e Municípios poderão instituir, através de lei, os respectivos Planos Estaduais e ou Municipais de Gerenciamento Costeiro, observadas as normas e diretrizes do Plano Nacional e o disposto nesta lei, e designar os órgãos competentes para a execução desses Planos.

§2º Normas e diretrizes sobre o uso do solo, do subsolo e das águas, bem como limitações à utilização de imóveis, poderão ser estabelecidas nos Planos de Gerenciamento Costeiro, Nacional, Estadual e Municipal, prevalecendo sempre as disposições de natureza mais restritiva.

107 CF/88, art. 24, caput: Compete à União, aos Estados e ao Distrito

Federal legislar concorrentemente sobre: VI – florestas, caça, pesca,

fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais,

proteção do meio ambiente e controle da poluição; VII – proteção ao

patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico. §1º No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais; §2º A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados.

O Decreto n. 5.300/2004, que regulamenta a Lei n. 7.661/88 (instituidora do Plano de Gerenciamento Costeiro), prevê que os Estados, na esfera das suas competências e nas áreas de sua jurisdição, devem planejar e executar as atividades de gestão da Zona Costeira em articulação com os Municípios e com a sociedade, cabendo-lhes: designar o Coordenador para a execução do Plano Estadual respectivo e promover a estruturação de um colegiado estadual (art. 13, caput, e incisos I e VIII). Conforme o art. 7º do aludido Decreto federal, os Planos Estaduais devem ter como base o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (art. 7º, III), e devem ser elaborados com obediência à legislação federal e ao PNGC (art. 13, inciso II).

No que se refere ao Plano Estadual de Gerenciamento Costeiro de Santa Catarina, esclareça-se que o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), da Constituição Estadual, em seu art. 25, prevê que “até a promulgação da lei que

instituir o Plano Estadual de Gerenciamento Costeiro não poderão ser expedidas pelos municípios localizados na orla marítima normas e diretrizes menos restritivas que as existentes sobre o uso do solo, do subsolo e das águas, bem como sobre a utilização de imóveis no âmbito do seu território”108.

Assim, o caminho definido pelos Poderes Legislativo e Executivo estaduais foi editar uma Lei Estadual de Gerenciamento Costeiro genérica (Lei estadual n. 13.553/2005, alterada posteriormente pelas Leis 14.465/2008 e 14.736/2009), que, em linhas gerais, repetiu os termos da Lei Federal n. 7.661/88 (que instituiu o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro)109. Tal escolha política teve o efeito prático de superar o obstáculo previsto no referido artigo 25 do ADCT da Constituição Estadual, sem que se avançasse substancialmente na estruturação do

108 Conforme informativo da Secretaria de Planejamento de SC, as

iniciativas administrativas relacionadas à implementação do GERCO estadual iniciaram-se em 1987, sem que houvesse ato formal de instituição (MPF, 2009, v. I, p. 177-178).

109 O Governo de Santa Catarina apontou para “dois importantes

momentos” antes da edição da Lei estadual n. 13.553/2005: Em 1995, realizou-se o Diagnóstico Ambiental do Litoral de Santa Catarina, mediante convênio com o IBGE; em 1998, o projeto “Aplicação dos Instrumentos de Gerenciamento Costeiro nos Municípios da Península de Porto Belo e Entorno e da Foz dos rios Camboriú e Itajaí, mediante Convênio com a UNIVALI (MPF, 2009, v. I, p. 177).

Gerco de Santa Catarina no plano legislativo. Tal tarefa foi deixada ao Executivo, que, por meio do Decreto Estadual n. 5.010/2006, deu os contornos gerais do Programa Estadual de Gerenciamento Costeiro do Estado.

Registre-se que o art. 4º da Lei Estadual de Gerenciamento Costeiro (Lei n. 13.553/2005) prescreve que:

O Plano Estadual de Gerenciamento Costeiro – PEGC será elaborado e, quando necessário, atualizado, pelo Poder Executivo, na instância técnico-administrativa de um

Grupo de Coordenação dirigido pela

Secretaria de Estado do Planejamento, cuja composição e forma de atuação serão definidas no decreto regulamentar a que se refere o art. 10 desta lei.

Não obstante o caráter centralizador desse dispositivo legal, a menção a um modelo de gestão integrada e participativa, idealizado pela legislação federal, foi reafirmado pelo Decreto estadual n. 5.010/2006 (arts. 2º, II, 4º, VI, 5º, III e VII, e 28)110, embora a natureza dúbia da previsão se tenha revelado, v.g., no art. 2º, III, ao estipular uma discussão pública apenas após a ultimação das recomendações técnicas do Zoneamento Ecológico-Econômico111. O art.5º, inciso VI, do citado Decreto

110 Decreto Estadual n. 5.010/2006: “art. 2º Para os fins previsto neste

Decreto, entende-se por: II – Gerenciamento Costeiro (GERCO): o

conjunto de atividades e procedimentos que, através de instrumentos específicos, permite a gestão dos recursos naturais da Zona Costeira, de forma integrada e participativa,[...]; art. 4º: São objetivos do Plano

Estadual de Gerenciamento Costeiro (PEGC): VI – Fomentar o

desenvolvimento, o planejamento e a gestão das atividades da Zona Costeira de modo integrado, descentralizado e participativo; Art. 5º: O Plano Estadual de Gerenciamento Costeiro será implementado através

das seguintes ações administrativas: III – o planejamento integrado e

participativo das ações governamentais na Zona Costeira; VII – a

integração dos instrumentos do Gerenciamento Costeiro, de forma

contínua, sequencial e sistemática; art. 28. – Será assegurada a

participação da sociedade civil organizada na aplicação dos instrumentos de execução do Plano Estadual de Gerenciamento Costeiro.

111 Art. 2º, III, do Decreto n. 5.010/2006: “Para os fins previstos neste

estadual prevê que o Plano Estadual de Gerenciamento Costeiro terá como uma das duas ações administrativas: VI – a definição dos mecanismos de participação e consulta às comunidades na implantação do gerenciamento costeiro112.

O Estado de Santa Catarina definiu que o Grupo de Coordenação (incluído no âmbito da Secretaria de Estado do Planejamento) deve acompanhar a execução do Plano Estadual de Gerenciamento Costeiro, promover articulações intersetoriais e interinstitucionais e orientar as Secretarias de Estado de

Desenvolvimento Regional na organização de Comitês Temáticos Regionais, nas Secretarias Regionais de Joinville, Itajaí, Grande

Florianópolis, Laguna e Araranguá (Setores 1, 2, 3, 4 e 5). (MPF, 2009, v. I, p.177-178)113,114.

No âmbito do Governo Estadual de SC, foi constituído, em 12 de agosto de 2008, o Comitê Gestor Integrado para o

instrumento básico de planejamento que estabelece, após discussão

pública de suas recomendações técnicas, inclusive a nível municipal,

diretrizes de uso e ocupação do solo e do mar e de manejo dos recursos naturais em zonas específicas, definidas a partir das análises de suas características ecológicas e socioeconômicas.

112 O caráter desenvolvimentista do Decreto estadual n. 5.010, de 22 de

dezembro de 2006, veio proclamado, também, no art. 4º, II, “a” e “, e III. Assim, constituem objetivos do Plano Estadual de Gerenciamento

Costeiro: impedir a degradação dos ecossistemas costeiros

remanescentes (ao contrário do Decreto federal n. 5.300/2004, art. 5º, IX, não há menção expressa, nos princípios ou nos objetivos do GERCO estadual, quanto à necessidade de preservação, recuperação e reabilitação de áreas degradadas); o objetivo inscrito no art. 4º, III, do Decreto estadual referido, por sua vez, está assim enunciado: “Promover a conservação dos ecossistemas da Zona Costeira considerando a necessidade de desenvolvimento socioeconômico”. No Decreto federal n. 5.300/04, art. 5º, III, consta como princípio fundamental da gestão da zona costeira a “utilização sustentável dos recursos costeiros em observância aos critérios previsto em lei e neste Decreto”;

113 A numeração a ser observada é a do documento em PDF disponibilizado

na internet, e não a numeração constante da parte superior da folha original (manuscrita).

114 As antigas Secretarias de Desenvolvimento Regional foram extintas e

transformadas em Agências de Desenvolvimento Regional, com a função de promover o fomento de ações para o desenvolvimento da região, como um órgão descentralizado (Lei estadual n. 16.795, de 16 de dezembro de 2015).

Planejamento Territorial da Região Costeira, incumbido de articular ações do Gerco estadual, com composição exclusivamente governamental115. Os demais órgãos de Governo, inclusive de outras esferas governamentais, devem ser chamados à discussão “à medida que ocorram demandas específicas aos temas pertinentes ao planejamento costeiro” (§2º do art. 2º do Decreto n. 1.591/2008). A Coordenação Geral incumbe à Diretoria de Desenvolvimento das Cidades, da Secretaria de Estado do Planejamento (SPG).

Ao Comitê Gestor Integrado incumbe (art. 3º do Decreto n. 1.591/2008): promover a articulação intersetorial e interinstitucional no nível estadual, regional e municipal na sua área de competência (inciso II); orientar e apoiar as Secretarias de Estado de Desenvolvimento Regional – SDRs, na estruturação e coordenação dos Comitês Temáticos Regionais de Gerenciamento Costeiro, dentro dos Conselhos de Desenvolvimento Regional – CDRs; efetivar a participação da sociedade civil organizada na aplicação dos instrumentos de execução do Plano Estadual de Gerenciamento Costeiro (inciso V).

No ano de 2009, com a contratação da empresa AMBIENS Consultoria Ambiental para a elaboração de Diagnóstico Ambiental, Zoneamento Ecológico-Econômico Costeiro e Planos de Gestão Costeira,116 foi estipulado pela Secretaria de

115 Decreto n. 1.591, de 12 de agosto de 2008, art. 2º, previu que o Comitê

Gestor Integrado seria composto por representantes das Secretarias de Estado do Planejamento; de Turismo, Cultura e Esporte; do Desenvolvimento Sustentável; da Agricultura e Desenvolvimento Rural; Companhia de Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina; Departamento Estadual de Infra-estrutura.

116 Conforme site da empresa “Ambiens Consultoria Ambiental” (Disponível

em:

<www.ambiensconsultoria.com.br/atuacao/planejamento_e_ordenamento _territorial.html>. Acesso em: 06 out. 2016), “Gerenciamento Costeiro do Estado de Santa Catarina: através da habilitação em processo licitatório realizado pela Secretaria Estadual de Planejamento, a Ambiens realizou o Plano de Gerenciamento Costeiro do Estado de Santa Catarina. O Projeto compreendeu a elaboração do Diagnóstico socioambiental, Zoneamento Ecológico-Econômico e Planos de Gestão Costeira dos cinco setores do Estado de Santa Catarina, divididos em Litoral Norte, Centro-Norte, Central, Centro-Sul e Litoral Sul.

Planejamento que, na primeira fase da concretização dos instrumentos do Gerco estadual, seria dada prioridade ao Zoneamento e aos Planos de Gestão (MPF, 2009, v. I); na segunda fase, haveria a implementação do Sistema de Informações (Sigerco), Sistema de Monitoramento Ambiental (SMA/ZC) e Relatórios de Qualidade Ambiental (RQA/ZC)117.

Na estrutura do Gerco estadual, com base no art. 6º do Decreto n. 5.010/2006, ficou determinado que cada Secretaria de Estado de Desenvolvimento Regional deveria designar um Coordenador Gerco regional para complementar a Coordenação Estadual. A essa Coordenação Regional caberia, então, organizar, juntamente com os Municípios, a escolha das representações para integrar os Comitês Temáticos Regionais118.

Os Municípios, por sua vez, no âmbito das Secretarias Regionais, deviam indicar um representante dos setores governamental, empresarial e sociolaboral. Conforme Informativo oficial de julho de 2009 (Secretaria de Estado do Planejamento - SPG), “os setores representativos da sociedade organizada do município deverão escolher seus representantes para integrar o Comitê Temático Regional, numa reunião convocada pelos Coordenadores Regional e Municipal”. Cada Comitê Temático Regional (CTR) devia ser homologado pelo respectivo Conselho de Desenvolvimento Regional (MPF, 2009, v. I, p. 183).

117 Conforme o Decreto Estadual n. 5.010/2006, art. 8º, constituem

instrumentos de execução do Plano Estadual de Gerenciamento Costeiro: o Zoneamento Ecológico-Econômico Costeiro (ZEEC), o Plano de Gestão da Zona Costeira (PGZC), o Sistema de Informações do Gerenciamento Costeiro (SIGERCO), o Sistema de Monitoramento Ambiental (SMA/ZC), o Relatório de Qualidade Ambiental (RQA/ZC) e o Projeto de Gestão Integrada da Orla Marítima (Projeto Orla).

118 Art. 6º, caput, do Decreto n. 5.010/2006: O Plano Estadual de

Gerenciamento Costeiro será disposto pelo Grupo de Coordenação através da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Sustentável em estreita colaboração com as Secretarias de Estado de Desenvolvimento Regional, municípios costeiros, a sociedade civil organizada e iniciativa privada. Na forma da alínea “d” do §1º, cabe ao referido órgão de coordenação: “orientar e apoiar as Secretarias de Estado de Desenvolvimento Regional, na estruturação e coordenação dos Comitês temáticos de Gerenciamento Costeiro, dentro dos Conselhos de Desenvolvimento Regional.

Os quadros abaixo relacionados retratam a estruturação do Programa Estadual de Gerenciamento Costeiro, no âmbito do seu órgão central (CGI – Comitê Gestor Integrado) e das 5 (cinco) regiões litorâneas (CTRs – Comitês Temáticos Regionais):

Fonte: MPF (2009, v. I).

A sequência dos trabalhos de concretização do Plano Estadual de Gerenciamento Costeiro previu (conforme Informativo da SPG), nos anos de 2009-2012, no âmbito das 5 regionais: a conclusão, pela empresa contratada, do diagnóstico

Figura 2 – Estrutura do comitê gestor integrado e dos comitês temáticos regionais do programa catarinense de gerenciamento costeiro

socioambiental (que serviu de base ao Zoneamento e aos Planos de Gestão); definição do Zoneamento Ecológico-Econômico119, pela empresa contratada (com a realização de um seminário regional posteriormente); conclusão dos Planos de Gestão (com a realização de um seminário regional posteriormente); uma audiência pública regional; após, a documentação referente aos Zoneamentos e aos Planos de Gestão seriam apresentados ao CONSEMA (Conselho Estadual do Meio Ambiente) e remetidas, finalmente, ao Poder Executivo para a edição do Decreto correspondente (MPF, 2009, v. I, p. 185-186).

3.2 O DIAGNÓSTICO SOCIOAMBIENTAL DO LITORAL