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CAPÍTULO 3 CAMINHO METODOLÓGICO DA PESQUISA

3.3 Análise dos dados

A análise do material colhido no campo considerou as advertências de Minayo (1998) que aponta três grandes obstáculos encontrados no processo de tratamento dos dados empíricos. O primeiro, que chamaria de “ilusão da transparência”, está relacionado ao perigo de compreender espontaneamente os dados como se o real estivesse claro, nítido ao pesquisador. O segundo é o que leva o pesquisador a sucumbir à magia dos métodos e das técnicas, deixando de levar em conta o essencial, que é ser fiel às significações constantes no material e que estão relacionadas diretamente com as relações sociais. O terceiro é a dificuldade de se juntar teorias e conceitos muito abstratos com o material extraído no campo. Para Minayo, a análise dos dados busca atingir três objetivos: a ultrapassagem da incerteza, o enriquecimento da leitura e a integração das descobertas.

Assim, com a finalidade de compreender a política pública para a juventude, fizemos uma análise contextualizada dos dados, com a tentativa de conhecer o que está por trás das palavras. É importante destacar que, independente do tipo de mensagem que possa ser interpretada dos instrumentos, ela tem um vínculo com as condições contextuais dos agentes que a produzem, estando essas condições relacionadas à evolução histórica da humanidade, às condições econômicas e socioculturais em que os sujeitos estão inseridos.

Ao falar da análise dos dados da pesquisa, precisamos ter clareza de que as diversas ações que envolvem o tratamento dos dados coletados, mesmo sendo listadas de forma separada, fazem parte de um processo contínuo e complementar, como nos alerta Laville e Dionne (1999, p. 198): “[...] para melhor descrever as diversas operações, distinguem-se, às vezes, preparação, análise e interpretação dos dados, deve-se ao mesmo sempre convir que as demarcações entre elas não são estanques, nem mesmo sempre claramente discerníveis”. O estreitamento entre esses três momentos contribui para que possamos aprofundar a nossa análise. Além do mais, corroboramos com Laville e Dionne (1999, p. 196) quando assinalam que existe a ligação íntima entre a análise e a interpretação dos dados, “de hábito, fazem-se paralelamente, conjuntamente, em uma operação em que a fronteira entre as duas é muitas vezes impossível de traçar com precisão”. Isso faz com que percebamos que esse momento da pesquisa aconteça de forma conjunta e concomitante, completando-se a partir do avanços dessas etapas.

A tarefa de tratar os dados coletados a partir dos questionários nos encaminhou para a utilização de instrumentos estatísticos, isso porque, como nos lembram Laville e Dionne,

a forma numérica permite o tratamento e a análise com a ajuda dos instrumentos estatísticos. Procede-se assim, mais freqüentemente, com os dados obtidos por instrumentos estruturados ou padronizados como os testes, grades de observação ou questionários com opções de respostas... (1999, p. 198).

Assim, optamos por trabalhar os dados dos questionários através do programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), que tem como função realizar testes estatísticos, como os de correlação, multicolinearidade e de hipóteses. Este programa também é útil para ajudar o pesquisador nas contagens de frequência, na ordenação e reorganização de dados (BISQUERRA et al., 2004). Com esse recurso estatístico, procuramos estabelecer diversas relações entre as respostas dos sujeitos pesquisados. Usamos também os recursos do SPSS para mapear as frequências de respostas nos questionários, contribuindo para a compreensão da opinião dos respondentes.

Laville e Dionne chamam a atenção para as dificuldades encontradas na organização dos dados brutos, isso porque não é possível ver muitas informações nesse momento do tratamento dos dados. Ele aponta alguns cuidados que são essenciais para que o pesquisador possa realizar essa atividade. Colocar os dados em ordem é a primeira ação, fazendo com que as informações possam estar organizadas de forma a serem analisadas e interpretadas. A segunda ação

Será seguida da própria análise estatística, que é habitualmente realizada em dois tempos: um primeiro em que se descrevem e caracterizam os dados e um segundo em que se estudam os nexos e as diferenças, em que se fazem inferências, etc. Como tais análises tomam a forma de cálculos matemáticos, a interpretação delas se distinguem mais do que na análise de conteúdo (LAVILLE; DIONNE, 1999, p. 199)

Sendo assim, Laville e Dionne (1999) afirmam que os instrumentos da estatística devem ser usados conjuntamente com a reflexão sobre o material a ser analisado, auxiliando o pesquisador a ter a melhor compreensão e explicação dos fenômenos, colaborando com a construção de novos conhecimentos.

Os testes estatísticos são apenas aplicações de procedimentos e de fórmulas que, de números, tiram outros números: estes últimos traduzem-se, em enunciados de caráter probabilísticos, enunciados preferentemente simples, que constatam a presença de relações estatisticamente significativas e que apreciam sua intensidade. Mas se contribuem desse modo, para a elucidação de fenômeno ou situações, esses instrumentos não possuem senão um poder limitado. [...] Para interpretar tais resultados, o pesquisador deve ir além da leitura apressada, para integrá-los em um universo mais amplo em que poderão ter um sentido. Esse universo é o dos fundamentos teóricos da pesquisa e o dos conhecimentos já acumulados em torno das questões aí abordadas (ibidem, p. 213).

O papel dos instrumentos estatísticos está em possibilitar ao pesquisador a leitura dos resultados presentes na pesquisa e a partir dos mesmos realizar as suas interpretações sobre o fenômeno. Nesse sentido, algumas etapas devem ser seguidas como a codificação, a transferência e a verificação dos dados, vindo posteriormente a análise propriamente dita.

Seguindo as orientações acima, buscamos no processo de análise correlacionar os dados coletados a partir dos questionários com os documentos utilizados e com as referências teóricas construídas no processo da pesquisa, conforme a organização e a seleção abaixo explicitadas.

Trabalhamos com os 560 questionários e organizamos a análise de acordo com os grupos de sujeitos que responderam os mesmos: alunos regulares e professores. Em alguns momentos foi possível estabelecer relações entre algumas respostas dos diferentes sujeitos. Esclarecemos que optamos por não analisar todas as questões presentes nos questionários e sim aquelas que tinham uma relação com os nossos objetivos de estudo.

O primeiro grupo foi composto pelos alunos que estavam em situação regular no Programa, sendo constituído de 392 (trezentos e noventa e dois questionários). O segundo grupo era formado pelos 168 (cento e sessenta e oito) questionários que foram aplicados aos professores responsáveis em executar a proposta pedagógica do Programa.

A análise dos 392 questionários destinados aos alunos regulares foi iniciada com a caracterização do grupo. Essa, por sua vez, foi dividida em três tópicos: o primeiro tópico refere-se às condições socioeconômicas dos alunos matriculados regularmente. Foram organizadas questões relacionadas ao sexo dos alunos, idade, raça/etnia, se os alunos tinham filhos e quantos eram e rendimento mensal dos

mesmos. O segundo tratou das questões relacionadas à vida escolar dos alunos. Questões relacionadas à última série e à quantidade de escolas em que o aluno havia estudado; quantidade de vezes em que o aluno havia iniciado os estudos e que por algum motivo parou de estudar; o motivo pelo qual o aluno deixou a escola; quantas vezes o aluno foi reprovado e se antes do Programa ele já frequentava alguma instituição de Ensino Fundamental. O terceiro e último tópico está relacionado ao envolvimento dos alunos com o mundo do trabalho. As questões levantadas trataram da remuneração recebida pelos jovens do Programa que trabalhavam, idade em que começaram a trabalhar, se trabalhavam sem carteira assinada, se trabalham em mais de dois turnos, se tinham vínculo empregatício, se haviam participado de curso de qualificação profissional. Foram exploradas questões relacionadas às maiores dificuldades para que os jovens pudessem entrar no mundo do trabalho, e se essas dificuldades estavam relacionadas aos seguintes motivos: ausência de vagas e oportunidade de trabalho, ausência de escolaridade exigida, qualificação profissional, conhecimento de informática adequado, experiência de trabalho, dentre outras dificuldades.

Além da caracterização dos 392 alunos participantes, foram analisadas questões relacionadas à avaliação do programa: materiais didáticos (linguagem, pertinências dos exemplos usados nas lições, qualidade e eficiência dos exercícios e atividades, presentes no material didático); recursos didáticos (material didático produzido pelo ProJovem, quadro negro, material extra preparado e reproduzido pelo educador, jornais e revistas, filmes, excursões e visitas, dramatização, debate em grupo, jogos em sala de aula, atividades no computador); elementos de

implementação do programa (o pagamento do benefício, os laboratórios de

informática, o material didático, a disponibilidade e a pontualidade da entrega de materiais de trabalho). Se o Programa havia atendido às expectativas dos alunos como também quais as contribuições, e por fim, quais os problemas apresentados pelos alunos que dificultam sua permanência no Programa.

O outro grupo formado por 168 (cento e sessenta e oito) questionários aplicados aos professores foi estruturado da seguinte forma: inicialmente uma caracterização do grupo de professores, com questões como: componente curricular ministrado, raça/etnia, sexo, idade, nível máximo de escolaridade, se tinham curso superior, tempo de formação, se havia estudo em instituição pública (federal ou estadual) ou privada, nível de formação, tempo de experiência na docência. Foram

identificados, ainda, os motivos que levaram os professores a trabalharem no ProJovem.

O segundo momento da análise das respostas desse grupo está relacionado especificamente à avaliação do Projeto Pedagógico Integrado realizada pelos professores. Aqui se tratou de questões relacionadas aos materiais didáticos usados pelos professores, a pertinência dos conteúdos selecionados e a adequação dos materiais à realidade dos alunos, os recursos didáticos e sua relação com a proposta do Programa, e por fim os elementos de implementação do Programa. Buscamos analisar, ainda, quais as expectativas que os professores apresentavam em relação ao futuro dos alunos; os principais problemas apontados pelos professores para a permanência dos jovens no Programa.

Dessa forma, buscamos através dessas estratégias metodológicas a obtenção de elementos fundamentais para desvelar os meandros da política pública para a juventude no município do Recife. Contudo, é importante advertir que a análise mais abrangente e aprofundada dos dados coletados em todo o país foi efetivada pelas universidades integrantes dos subsistemas do SMA do Projovem Urbano, ou seja, Subsistema de Monitoramento, Subsistema de Avaliação Externa de Alunos, Subsistema de Supervisão e Subsistema de Avaliação de Programa, conforme relatórios de pesquisas e publicações específicas do Projovem Original e do Projovem Urbano, que se encontram à disposição dos pesquisadores na Secretaria Nacional da Juventude. Os próximos capítulos destinam-se a apresentar nossas observações e os resultados das análises a partir dos dados levantados, buscando dar conta das questões e dos objetivos dessa pesquisa.

CAPÍTULO 4 OS JOVENS PARTICIPANTES DO PROGRAMA E A EXCLUSÃO