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além de descrições da entoação das línguas do corpus dessa pesquisa em separado; há estudos comparativos que envolvem as línguas inglesa e portuguesa, a saber: cruz-ferreira (1983) e Hirst e di cristo (1998). o primeiro envolve o estudo por meio de ex- perimento perceptivo do inglês britânico e do português europeu, com vistas a analisar compreensão dos sentidos da entoação por não nativos. Já o segundo é uma compilação de resultados de análises da entoação de algumas línguas de forma isolada, incluindo o inglês norte-americano e o português brasileiro.

cruz-ferreira (1983) faz uma pesquisa sobre a compreensão de não nativos sobre a entoação do inglês britânico e do português euro- peu, para tanto, a autora se utiliza da notação para descrição da entoa- ção de o’connor e arnold (1961) e da proposta de análise da entoa- ção e seus sentidos de Halliday (1970), por conta de seus conceitos de tom, tonalidade e tonicidade, que a autora utiliza para marcar as dife- renças da forma para a produção de sentidos nas línguas em análise.

o estudo da entoação do inglês e do português empreendido por cruz-ferreira (1983) é de cunho perceptivo, seu experimento contrapõe as respostas, diante de diferentes padrões entoacionais, de nativos (grupo de controle) e não nativos, com o objetivo de notar como e por quê padrões entoacionais de uma língua não nativa são compreendidos ou não compreendidos. os sujeitos respondem por meio de dois testes: um perceptivo (notar se há semelhança ou dife- rença nas duas sentenças de cada par) e um interpretativo (relacionar a que sentido o par de sentenças ou cada uma das sentenças do par é associado – o sentido é veriicado por meio de um número inito de glosas oferecido ao sujeito participante da pesquisa), no qual busca- -se analisar a capacidade de identiicação e interpretação do não na- tivo diante dos padrões distintivos da língua estrangeira.

como o objetivo desse estudo é a compreensão do não nati- vo, o foco do estudo são as diferenças entre as duas línguas e não

suas semelhanças. uma das diferenças apontadas pela autora está na constituição do conjunto de contornos melódicos nucleares de cada língua; para o inglês, a autora utiliza a descrição de contornos melódicos de o’connor e arnold (1961), a saber: a) decrescentes: decrescente baixo e decrescente alto; b) crescentes: crescente baixo e crescente alto; c) bidirecionais: crescente-decrescente e decres- cente-crescente; e d) compostos: decrescente mais crescente.67 para

o português, a autora apresenta uma proposta de descrição, seguin- do os mesmos padrões do inglês, e destaca os seguintes contornos melódicos nucleares: a) decrescentes: decrescente alto, decrescente baixo e decrescente baixo baixo; b) bidirecional: crescente-decres- cente; c) crescente: crescente baixo e crescente alto; e d) contornos nivelados: nivelado médio e nivelado baixo.68

vale destacar que o trabalho referido não oferece uma descrição detalhada da entoação dos dois sistemas em análise e nem é esse seu objetivo, mas, ao comparar a compreensão de nativos e não nativos sobre as línguas inglesa e portuguesa, oferece indícios sobre as ca- racterísticas relevantes nas descrições da entoação das línguas, por considerar que a sensibilidade do falante nativo é uma base coniá- vel, em especial, para uma descrição semântica da entoação (cruz- -ferreira, 1983, p.339).

o trabalho de Hirst e di cristo (1998), por outro lado, é de natureza descritiva. os autores realizam um levantamento dos da- dos de características da entoação de 20 línguas, entre elas o inglês norte-americano e o português brasileiro. os autores salientam que deram mais atenção às diferenças do que às semelhanças na compa- ração entre os dados de cada língua. eles também indicam que não há um único quadro teórico de análise, em razão da falta de consenso 67 “according to o’connor & arnold (1973), the nuclear tones of english are: sim-

ple falling: low-fall (lf), high-fall (Hf), simple rising: low-rise (lr), high-rise (Hr), bidirectional: rise-fall (rf), fall-rise (fr), compound: fall-plus-rise (f+r).” (cruz-ferreira, 1983, p.65).

68 “the nuclear tones of portuguese are: three simple falling tones: high-fall (Hf), low- fall (lf), low low-fall (low lf), one bidirectional falling tone: rise-fall (rf), two simple rising tones: low-rise (lr), high-rise (Hr), two level tones: mid-level (Ml), low-level (ll).” (cruz-ferreira, 1983, p.79).

ainda existente sobre a forma de representação do elemento prosódi- co da entoação, porém procuram destacar as características fonéticas das línguas em discussão.

partindo das análises do inglês norte-americano de bolinger (1998), Moraes (1998) e Hirst e di cristo (1998) elencam semelhan- ças e contrastes entre as línguas em questão, considerando as carac- terísticas globais, locais ou recorrentes da entoação69 na descrição de

padrões básicos não enfáticos, de modos e expressividade, efeitos contextuais e focalização, formação de sintagmas e organização tex- tual e padrões estereotipados.

a partir do tipo de comparação proposto acima, os autores elencam as seguintes características como iguais no ia e no pb:

a) uma entoação invariavelmente crescente em perguntas eco;70

b) a não continuidade é marcada por entoação crescente ou altura melódica alta tanto em declarações como em perguntas; c) em de- clarações na ordem neutra (i.e., tema seguido de rema, de acordo com Hirst e di cristo, 1998, p.30) há um movimento crescente ou uma subida final.

por outro lado, também foram destacadas as seguintes diferen- ças entre o ia e o pb: a) quando o tema segue o rema, há um padrão melódico crescente ou sem acento para ia, enquanto para bp há um movimento decrescente baixo; b) a proeminência extra-advinda de uma focalização pode ser alinhada à principal sílaba acentuada em ia, em pb essa proeminência pode recair ou em uma sílaba não acentuada anterior ou em uma sílaba com acento secundário; c) o i- nal de uma unidade tonal é sinalizado por um movimento tonal inal

69 “[…] global characteristics – affecting the whole intonation unit, local characteristics – affecting a single point in the sequence and recurrent patterns which occur several times on a smaller sequence usually containing just one stressed syllable.” (Hirst; di cristo, 1998, p.19). (“as características globais afetam toda a unidade entoacional, as características locais afetam um ponto único na sequência e os padrões recorrentes ocorrem diversas vezes em uma pequena sequência que geralmente contém apenas uma sílaba acentuada”).

70 perguntas eco, são perguntas que ecoam a pergunta original ou pedem uma repeti- ção, como pode ser visto, respectivamente, nos exemplos de Hirst e di cristo (1998, p.26): “– How do you like it? – How do i like it?” e “– John came last week. – When? – last week.”

em inglês, e em português, é marcada pela presença do acento ou núcleo inal da sentença.

vale ressaltar que Hirst e di cristo (1998) propuseram um procedimento internacional de descrição da entoação, consideran- do alvos da altura melódica, o intSint (International Transcrip- tion System for Intonation); porém, esse padrão é seguido apenas na análise de Moraes (1998) e não na de bolinger (1998), que são a origem dos dados para a comparação apresentada. nesse sentido, é importante considerar a airmação de Hirst e di cristo (1998, p.40) de que:

it is very often dificult to decide whether differences between descrip- tions are due to different theoretical and/or methodological approaches or whether they are to be put down to genuine differences between the systems constituting language speciic prosodic parameters.71

Conclusão

considerando a revisão da literatura apresentada, a presente pesquisa se inscreve na perspectiva de comparação do elemento pro- sódico da entoação em duas línguas, a saber: ia e pb, dentro de uma mesma perspectiva metodológica e teórica. dessa maneira, espera- -se poder airmar a validade de algumas semelhanças e diferenças entre as línguas estudadas.

além disso, pode-se dizer que os estudos da entoação baseiam- -se muito em falas produzidas especialmente dentro da programa- ção dos experimentos desenhados para o conhecimento de determi- nado evento fonológico, regulando seu contexto de produção, com o intuito de controlar variáveis e poder realizar airmações válidas. com referência às análises realizadas a partir de fala laboratorial 71 “[…] é frequentemente muito difícil decidir se as diferenças entre descrições são de-

vidas a diferentes abordagens teóricas ou metodológicas ou se elas devem ser expli- cadas como diferenças genuínas entre sistemas constituindo parâmetros prosódicos especíicos da língua.”

(laboratory speech), Hirst e di cristo (1998, p.43) levantam as se- guintes questões:

how far does variability in the situations in which speech is produced inluence the results obtained under these conditions? to what degree do generalizations obtained from isolated sentences apply to more spontaneous situations of communication? do speakers make use of the same prosodic competence in all cases or are completely different processes at work?72

espera-se que essa pesquisa possa contribuir com os estudos já realizados sobre a entoação do pb e do ia, com relação às questões levantadas por Hirst e di cristo, apresentadas acima, pois analisa uma fala não preparada para im da pesquisa. por ser uma fala pro- duzida dentro do âmbito dramático (ilme de desenho animado), o corpus propicia a obtenção de dados próximos ao que se produziria em uma situação real de comunicação. por outro lado, por não con- trolar o contexto de produção dos dados, as observações obtidas nes- sa pesquisa se restringem ao uso especíico analisado e podem ofere- cer opções dos falantes, mas não generalizações sobre a totalidade de opções do falante no uso das línguas analisadas.

72 “quanto as variáveis das situações nas quais a fala é produzida inluencia os resultados obtidos nessas condições [fala laboratorial]? até que ponto as generalizações obtidas de sentenças isoladas se aplicam a situações mais espontâneas de comunicação? os fa- lantes fazem uso da mesma competência prosódica em todos os casos ou os processos que estão em funcionamento são completamente diferentes?”