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CAPÍTULO II: CONTEXTUALIZAÇÃO DA PRÁTICA

2.1. Macrocontexto concetual: A Observação e Análise de Jogo e a

2.1.4. A Observação e Análise de Jogo no Futebol: A ponte para o

2.1.4.2. Analisar antes de Intervir para dar sentido à

De acordo com o exposto na Figura 4, facilmente se constata que a observação apenas faz sentido caso esteja integrada num processo global, qual sucedendo a análise.

Ortega (2002) e Castelo (2004) atentam em várias dimensões da análise de jogo, como a análise da dimensão energética, análise da dimensão técnico- tática individual, análise da dimensão técnico-tática setorial ou análise da dimensão tempo. Cada uma destas dimensões conduz a uma variabilidade de perspetivas de investigação no futebol. No caso da análise das ações táticas, o objetivo passa por identificar os fatores e eventos críticos que condicionam a performance das equipas e dos jogadores (Borrie, et al., 2002; Garganta, 2007; Lago, 2009).

Vázquez (2012) explica que para se realizar o processo de análise de jogo, é necessário conhecer como se manifestam os diferentes formatos de organização interna das equipas a partir de diferentes padrões de comportamento individuais e coletivos que aparecem com maior regularidade durante o jogo. Isto é, o treinador ou o analista deve ser capaz de determinar de forma objetiva:

• Como é que a equipa se organiza relativamente ao adversário, tendo em conta a filosofia ou estilo de jogo assumido durante o processo de treino;

• A relação da equipa com o espaço de jogo, determinando a configuração da distribuição dos seus jogadores pelo campo; • A relação da equipa com a bola e o tempo, detetando qual a

utilização preferencial de certos princípios de jogo ofensivos e defensivos;

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Descrever estas tarefas táticas e as suas componentes constituem aspetos de grande relevância no processo de análise de jogo e da avaliação da forma de jogar das equipas de futebol. No entanto, trata-se de um procedimento complexo, que evoluiu de forma acentuada com a introdução e desenvolvimento de sistemas informatizados.

Num processo gradual, as novas tecnologias prevaleceram sobre a tradicional técnica do uso do papel e lápis, sendo que agora a informação observada é tratada através de programas informáticos, ampliando o conjunto de dados explorados e possibilitando diferentes modos de apresentação da informação. Atualmente é permitido digitalizar semi-automaticamente as ações realizadas pelos jogadores e pelas equipas, seguindo o jogo em tempo real e visualizando todo o terreno de jogo com a ajuda de várias câmaras (Sarmento, 2012). Esta evolução proporcionou importantes benefícios no que concerne ao conforto e economia de tempo, bem como na supressão de erros derivados de um visionamento analógico, permitindo uma intercambialidade altamente funcional e versátil de acordo com a estrutura sintática dos respetivos programas informáticos.

Ainda que a evolução tecnológica não se traduza necessariamente num aumento da eficácia da observação nem dos conhecimentos sobre determinada realidade, pode aumentar significativamente a qualidade e a celeridade do processo de observação e análise, desde que se faça o uso adequado em contexto de jogo (Garganta, 2001).

O Futebol tende a integrar cadeias de acontecimentos descontínuos, implicitamente relacionados não apenas com os eventos antecedentes, mas também com as probabilidades de ocorrência dos acontecimentos subsequentes (Garganta, 1997). Com o objetivo de efetuar um registo contínuo das ações de jogo e com a evolução das estratégias de codificação, surgiu a métrica sequencial. Este tipo de análise, conhecida como análise sequencial, abriu as portas para a obtenção de relações de fluxos de conduta ou padrões de conduta que jogadores e equipas desenvolvem durante o jogo, permitindo obter amostras

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de transições condutais portadoras de eficácia, seja no plano ofensivo como defensivo (Paulis e Mendo, 2002).

Ou seja, para Anguera et al. (2000), a análise sequencial refere-se a um conjunto de técnicas que têm como objetivo evidenciar as relações, associações e dependências sequenciais entre unidades de conduta obtidas diacronicamente. Com estas informações é possível saber qual a relação que a conduta estratégica e os contextos de interação têm entre si, bem como interpretar se estas condutas possuem afinidade ou não com um contexto, afetando assim a dinâmica de jogo da equipa dentro da competição.

A partir da deteção de configurações mais ou menos estáveis de conduta, é possível medir a probabilidade estatística das diversas condutas consideradas se relacionarem de forma prospetiva ou retrospetiva com uma outra determinada conduta. Estes fluxos ou padrões de conduta estáveis desenvolvidos pelas equipas em interação não são ao acaso. Se se repetem e surgem com maiores probabilidades, seja em relação ao uso do espaço, às condutas estratégicas, aos contextos de interação ou à combinação entre eles então é porque são treinados (Paulis e Mendo, 2002).

Desta forma, é possível desenhar a estrutura de conduta através dos padrões obtidos com aplicação da análise sequencial, sendo possível conhecer, em cada retardo, quais são as condutas excitadoras por existir entre si um grau de coesão superior ao simples encadeamento provocado pelo acaso, com algumas restrições metodológicas que é necessário acautelar (Campaniço e Oliveira, 2003).

As equipas possuem padrões, rotinas e sub-rotinas de jogo bem definidas, pelo que os contextos de interação atingem o ponto máximo durante o jogo: os contextos que se devem conseguir, os que são necessários evitar, os que permitem aceder a outros, os que permitem a transformar-se em outros, os que são pouco prováveis, e os que transportam o máximo de possibilidades ofensivas ou defensivas (Paulis e Mendo, 2002).

Bacconi e Marella (1995) referem que apesar da aleatoriedade do jogo, a partir de uma cuidadosa análise será possível identificar ordem, padrões e

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regularidades nos jogadores e equipas. Assim, a partir da análise dos padrões táticos obtidos, é possível retirar ilações acerca do fluxo de conduta de equipas e jogadores e, eventualmente, perceber de que forma ele se altera em função dos diversos contextos em que o jogo decorre. Quando nos referirmos à aplicação da análise de jogo em termos práticos, o principal objetivo é a identificação de padrões ou condutas de comportamento, e por isso, a análise sequencial constitui-se como um método eficaz para fazer emergir os procedimentos táticos adotados pelos jogadores e equipas (Anguera, 2004).

Como já referido, os princípios que alicerçam os modelos de jogo são construídos e consolidados no processo de treino. Como Carvalhal (2014) menciona, “o guia de todo o processo de treino deverá ser o modelo de jogo adotado, estando este dependente de um sistema de relações que vai articular uma determinada forma de jogar, não uma forma de jogar qualquer, mas subjacente a uma estrutura específica“. Portanto, os princípios inerentes ao Modelo de Jogo tratam-se de guias ou regras que induzem os jogadores a tomar decisões dirigidas em cada ação do jogo, enquanto o processo de treino é elaborado com exercícios que massifiquem estas ideias para que no jogo os jogadores as reproduzam. Quando observados várias vezes, os comportamentos dos jogadores e das equipas permitem a identificação de padrões de conduta, evidenciando assim as ideias que integram o modelo de jogo da equipa. Assim, analisar taticamente uma equipa é decifrar as orientações transmitidas pelo treinador aos jogadores, interpretar estas ideias e assim descrever os princípios do modelo de jogo em questão.

Contudo, devido ao caráter aleatório e ao “caos” inerente ao jogo de Futebol, Garganta (2001) afirma que os comportamentos dos jogadores e das equipas, embora repousando sobre uma organização sustentada numa isonomia de princípios, movem-se entre dois polos: o vínculo (o estabelecido, as regras); e a possibilidade (inovação). Sendo assim, quando se pretende analisar o jogo, além de devermos contemplar uma série de medidas de ordem metodológica imprescindíveis para garantir a validez e significação das observações extraídas, uma das coisas mais importantes é educar-se para separar as circunstâncias de jogo dos padrões de comportamento.

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No futebol, tanto a magnitude como a tipologia das ações desempenhadas pelas equipas e jogadores estão condicionadas por um conjunto de variáveis de natureza situacional, como o estilo de jogo das equipas, os objetivos das equipas durante o jogo (manter, igualar, reduzir ou ampliar o resultado momentâneo), a diferença de qualidade das equipas e as contingências do próprio jogo (inferioridade ou superioridade numérica, condições climatéricas, estado do terreno de jogo), etc., que deverão ser considerados para uma correta interpretação dos dados e conclusões obtidas (Vázquez, 2012). Assim, é necessário que o treinador ou analista adote uma atitude de análise aberta, interdisciplinar e multidimensional, por serem vários os fatores e elementos que influenciam o modelo de rendimento competitivo.

A correta utilização da análise de jogo implica necessariamente uma decisão antecipada da parte dos analistas e treinadores em relação à informação que é importante recolher e se esta poderá ser usada, seja para melhorar o rendimento dos jogadores, como para poder encontrar os motivos pelo qual o resultado da competição foi positivo ou negativo. Ser capaz de especificar de modo mais objetivo possível os motivos pelos quais uma equipa ganha ou perde representa, segundo Vázquez (2012), uma das qualidades mais importantes que um treinador deve possuir, visto que o conhecimento das razões que conduzem ao êxito ou fracasso competitivo representa o pilar principal sobre o qual se poderão implementar planos de jogo e/ou treino adequados para manter ou redirecionar o rendimento de uma equipa.

Garganta (2001) refere que a observação e análise dos comportamentos dos jogadores e das equipas tem-se constituído enorme argumento na preparação e ensino do treino nos jogos desportivos coletivos. Desta forma, identificados os fatores críticos que condicionam a performance das equipas e/ou dos jogadores, os treinadores podem retirar ilações relativamente a esses dados para que consigam perspetivar e orientar uma intervenção futura.

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2.1.4.3. Interpretar, Intervir e Planear para treinar e