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CAPÍTULO II: CONTEXTUALIZAÇÃO DA PRÁTICA

2.1. Macrocontexto concetual: A Observação e Análise de Jogo e a

2.1.1. Modelo de Jogo: O ADN da equipa

2.1.1.3. A Organização dentro do Modelo de Jogo

Como já mencionado, o objetivo do jogo de futebol é perturbar o estado de equilíbrio do adversário, gerando desordem na sua organização. Para que isto seja alcançado, é necessário que as equipas possuam princípios de ação, regras de gestão e formas para o sucesso no ataque e na defesa, decorrentes de

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conceções e modelos de jogo. Ou seja, um caminho racional de ação e coordenação, a partir dos quais pode ser aferida a coerência das ações dos jogadores (Garganta, 1997; Carneiro, 2018).

As equipas de futebol recorrem contínua e persistentemente ao aperfeiçoamento da sua organização com o intuito de atingir os seus objetivos e a ultrapassar as suas próprias limitações momentâneas. Toda a atividade humana é organizada ou auto-organizada, o que dá origem a uma complexidade quando as ações dos intervenientes são realizadas para resolver os problemas inerentes ao jogo, podendo ser ações individuais, setoriais, intersectoriais ou grupais (Castelo, 2004). O facto de o Futebol englobar participantes em relações/reações constantes, combatendo pela obtenção da bola com uma dimensão estratégica e uma enorme competência de resolução de ações, torna o jogo com uma especificidade própria e única, apresentando vários vetores de organização interligados sucessivamente (Castelo, 2004).

Tratando-se de um jogo de decisões, na lógica da especificidade, o mais rápido, o mais forte e o mais resistente não obtém o êxito competitivo, mas sim o melhor organizado no conhecimento do jogo sobrevalorizando um saber sobre um saber fazer. É um jogo de múltiplos fatores, sistema aberto (conexões externas) e dinâmico (não permanece em simetria), onde opera relações de ordem (organização) e “caos” (desorganização), e auto-organiza-se em equilíbrio (Castelo e Matos, 2006, citado por Carneiro, 2018).

Gréhaigne (1989), citado por Carneiro (2018) define a organização de uma equipa como um resultado da interação de vários fatores:

• A ordem geral, isto é, a forma da ordem decorrentes de escolhas estratégicas gerais da equipa;

• As posições a ocupar, de acordo com instruções específicas recebidas por cada jogador;

• Posições produzidas pela influência do adversário;

• Adaptação da equipa e dos jogadores às condições do confronto (flexibilidade).

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No futebol, todo o comportamento individual está orientado para o coletivo, pelo que é necessária máxima coordenação e articulação entre os vários setores da equipa. Carneiro (2018) acrescenta que “a forma como os jogadores desenvolvem as suas ações dentro do sistema torna-se um dos maiores problemas de resolução no jogo, visto que o trabalho coletivo tem que ser distribuído pelo individual, setorial e intersectorial, sem perder a sua eficácia, que pode comprometer todo o processo. A forma como criam sinergias positivas, enquadra-se nas missões táticas atribuídas a cada jogador na sua especialização e no seu setor, de forma a criar articulações eficazes e com sucesso, potenciando desta forma o êxito coletivo”.

Deste modo, para falarmos da organização do jogo em futebol temos de falar, entre outras coisas, na distribuição dos jogadores no terreno de jogo em função da sua especialização e tarefa a executar por cada um no decurso de jogo, isto é, nos conceitos (Teodorescu, 1984; Castelo, 2004), citados por Carneiro (2018):

I) Fases de jogo;

II) Métodos de jogo ofensivo e defensivo; III) Princípios de jogo ofensivo e defensivo;

IV) Ações individuais e coletivas ofensivas e defensivas.

Relativamente às fases de jogo, Lucas, Garganta e Fonseca (2002) defendem que o jogo de Futebol está organizado segundo um modelo binário, em que os seus jogadores ora atacam, ora defendem. Já Castelo (2004) fala numa visão “dualista” repartindo o futebol nas mesmas duas etapas: o processo ofensivo e o processo defensivo. O processo ofensivo está conectado como ação positiva ou fim positivo, pois só com este comportamento poderemos atingir o fim (golo). Já o processo defensivo apresenta uma ação negativa ou fim negativo, porque a equipa não poderá concretizar o objetivo do jogo. Nas duas fases de jogo, a realização das ações técnico-táticas individuais e coletivas estão dependentes e são influenciadas por diferentes e complementares macroestruturas (tempo, espaço e tarefa).

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Porém, Queiroz e Ferreira (1983) deram um contributo fundamental ao futebol português ao apresentaram uma proposta de sistematização do jogo de Futebol, à atual visão do jogo sob quatro momentos (fases) fundamentais:

I) Momento de organização ofensiva, que comporta o conjunto de comportamentos que a equipa adquire aquando da posse de bola, para construir situações ofensivas para preparar o golo;

II) Momento de transição defensiva (ataque/defesa), que são os comportamentos a adquirir nos segundos seguintes à perda da posse de bola;

III) Momento da organização defensiva, privilegiar os comportamentos que evitem a equipa adversária de construir e criar situações de finalização;

IV) Momento de transição ofensiva (defesa/ataque), visa assegurar comportamentos nos segundos imediatamente após a conquista da posse de bola.

Relativamente aos métodos de jogo, Castelo (2004) refere-se a eles como a forma de organização geral das ações técnico-táticas individuais e coletivas dos jogadores tanto no ataque como na defesa, dentro do sistema de jogo utilizado pela equipa. São os métodos de jogo que estabelecem os princípios gerais orientadores da organização da equipa, quer quando ataca, quer quando defende, bem como o ritmo de jogo, isto é, a sequência e a velocidade de execução dos comportamentos técnico-táticos dos jogadores tanto no ataque como na defesa (Castelo, 2004).

Os princípios de jogo são as normas básicas que orientam as atitudes e os comportamentos técnico-táticos individuais e coletivos dos jogadores durante o jogo (Castelo, 2004). Construindo as linhas orientadoras dos comportamentos técnico-táticos dos jogadores, os princípios de jogo permitem uma melhor seleção e articulação destes comportamentos dentro da organização de base das equipas (Carneiro, 2018). De acordo com Teodorescu (1984), Garganta (1997), Quina (2001) e Castelo (2004), citados por Carneiro (2018), os princípios do jogo de futebol podem ser agrupados em duas grandes categorias:

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I) Princípios gerais – são as normas gerais que orientam as atitudes e os comportamentos técnico-táticos dos jogadores tanto em processo ofensivo como em processo defensivo;

II) Princípios específicos – são as normas que orientam as atitudes e comportamentos técnico-táticos específicos dos jogadores em função a. da variabilidade das situações momentâneas de jogo (fora do

centro do jogo ou dentro do centro do jogo);

b. da missão tática dos jogadores dentro do sistema de jogo utilizado. Por fim, Castelo (2004) refere as ações individuais e coletivas, ofensivas e defensivas, como sendo ações ou comportamentos técnico-táticos que os jogadores utilizam para resolverem as situações de jogo. O mesmo autor agrupa as ações técnico-táticas em quatro categorias:

I) Ações individuais ofensivas, como a simulação, receção, proteção, condução, passe, drible, remate e o cabeceamento;

II) Ações individuais defensivas, como a interceção e desarme;

III) Ações coletivas ofensivas, como as desmarcações,

compensações/permutações e as combinações táticas;

IV) Ações coletivas defensivas, como as marcações, compensações e as dobras.

A organização é fundamental na formação de um modelo de jogo. Qualquer treinador, na construção da atitude tática do seu modelo de jogo necessita de uma ideia bem definida com princípios muito bem estruturados para que estes sejam respeitados pelos seus jogadores. Estes princípios estabelecem-se como um “quadro de referências para os jogadores, orientando o pensamento tático dos mesmos” (Castelo, 2003). O processo de treino surge como capital e a figura do treinador é preponderante, sendo este o principal responsável deste complexo processo. Neste percurso e durante o processo de treino teremos que ter em consideração as vertentes individual, setorial e grupal em qualquer dos momentos revistos anteriormente, para alcançar um elevado nível de organização (Carneiro, 2018).

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