• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO II: CONTEXTUALIZAÇÃO DA PRÁTICA

2.1. Macrocontexto concetual: A Observação e Análise de Jogo e a

2.1.1. Modelo de Jogo: O ADN da equipa

2.1.1.1. Modelo de Jogo muito mais do que uma “Ideia de

No campo das Ciências do Desporto e particularmente no âmbito do treino desportivo, os conceitos de modelo e modelação já estão completamente enraizados. Garganta (1997), referindo-se especificamente ao futebol, assume que “expressões como modelo de jogo, modelo de jogar e modelo de preparação, fazem já parte do vocabulário quotidiano de treinadores e investigadores”. As temáticas relacionadas com estes conceitos adquiriram uma importância crescente com os estudos de Queiroz (1986), Pinto e Garganta (1989), Castelo (1994) e Garganta (1997).

É reconhecido que a modelação tática no futebol constitui uma referência fundamental para a preparação dos jogadores e das equipas para a competição (Araújo e Garganta, 2002). Na conceção de Garganta (2007), o futebol só faz sentido se for entendido dentro de uma proposta tática, com o treino a visar a implementação de uma “cultura para jogar”. Assim, é com base no modelo de jogo formulado pelo treinador que se estrutura e orienta o processo de preparação e treino dos jogadores e das equipas (Lucas, Garganta e Fonseca, 2002). O treino surge para modelar os comportamentos e atitudes dos jogadores e das equipas, estando sempre orientado para a competição. Carvalhal (2001) confirma esse pressuposto, afirmando que o modelo de jogo deve ser o “cerne” de todo processo de treino.

Porém, surgiu um novo conceito: a “Ideia de Jogo”. Este conceito tem sido tratado como uma outra denominação à definição de “Modelo de Jogo”. Importa, portanto, distinguir ambos os conceitos, visto que é fundamental para o presente trabalho académico.

O que se entende por modelo de jogo? Queiroz (1986) começa por definir os modelos técnico-táticos, referindo que estes devem reproduzir de uma forma metódica e sistemática todo o sistema de relações que se estabelecem entre os diferentes elementos de uma dada situação de jogo, definindo de uma forma precisa as tarefas e os comportamentos técnico-táticos exigíveis aos jogadores,

18

em função dos seus níveis de aptidão e de capacidade; Graça e Oliveira (1994) afirmam que se trata de um corpo de ideias, relacionados como uma determinada forma de jogar, constituindo assim como um “perfil” de jogo da equipa; neste seguimento, Garganta (1997) refere que o modelo de jogo, decorrendo dos constrangimentos estruturais, funcionais e regulamentares colocados pelo próprio jogo, reflete, do ponto de vista ofensivo e defensivo, um conjunto de comportamentos típicos, regras de ação e de gestão do jogo; para Oliveira (2004), o modelo é essencial para arquitetar e desenvolver um processo coerente e específico preocupado em criar um jogar; Leandro (2003) menciona também que cada conceção de jogo produz um modelo de jogo próprio, pois as ideias inerentes a uma determinada cultura de jogo diferenciam-se.

Não existe uma definição universal para o conceito de modelo de jogo, sendo que cada autor ou investigador tem a sua própria conceção. Todavia, Frade (2006) considera que o modelo é… “TUDO”. Oliveira (2008) afirma que, quando um treinador é contratado por um determinado clube, traz consigo a sua conceção de jogo, porém, terá que se adaptar à cultura do clube que poderá ter um Modelo de Jogo padronizado a todas as categorias. Assim, o treinador terá que adaptar suas ideias de jogo em cima desse modelo preconizado. Tal como Ferreira (2019) menciona2, “Nesse domínio específico (do Modelo de Jogo) seria

reunido, conhecimento do jogo, da sua sistemática, história e contexto cultural, que permita idealizar uma forma rica de disputar o jogo, que traga à equipa organização, mas que simultaneamente não a torne mecânica e incapaz de dar resposta à aleatoriedade e “caoticidade” do jogo. E ainda, que essas ideias que tenham também em conta a sua adaptação ao tal “espaço” / contexto e “tempo” / evolução do jogo”. Resumidamente, o Modelo de Jogo é algo que identifica uma determinada equipa.

No entanto, Azevedo (2011) explica que as pessoas entendem mal o conceito de Modelo de Jogo, pois é falado como se fosse o sistema de jogo implementado ou a estrutura inicial da equipa em campo. O modelo de jogo engloba também a conceção de ideia de jogo. Frade, em entrevista a Tamarit

2 No website “Saber Sobre o Saber Treinar” (https://www.sabersobreosabertreinar.pt), consultado em

19

(2013), explica este entendimento “antes está a Ideia de Jogo e só depois está o Modelo de Jogo. O Modelo é o que se sujeita também às circunstâncias. O Modelo é tudo porque é a Ideia de Jogo mais as circunstâncias, e as circunstâncias podem relativizar aquilo que eu faria noutras circunstâncias, mas em termos de padrão é igual! (…) Agora a Ideia de Jogo é uma coisa, a fabricação da Ideia tem a ver com as circunstâncias e esse é o Modelo de Jogo, o que implica também a dinâmica existencial dos Princípios Metodológicos. E o Modelo é tudo, até algo que às vezes desconheço, e que me «incita» à modelação.”

Maciel (2011), aprofunda esta ideia, afirmando que o modelo de jogo é constituído “por um conjunto de inúmeros aspetos, alguns mais relacionados com opções do treinador, como a conceção de jogo, a metodologia de treino, a operacionalização do processo, outros mais relacionados com os jogadores e com a própria realidade do clube e o contexto envolvente. Aspetos que vão desde as crenças de jogadores ou dirigentes, à história do clube, dimensão estatuto e competência do departamento médico, a realidade competitiva, até as picardias e rivalidades históricas que possam existir dentro e fora do clube. Pode dizer-se que o Modelo é tudo.”. Este autor equipara o modelo de jogo com a imagem de um iceberg, isto é, enquanto a face visível “parece ser uma realidade circunscrita a uma determinada dimensão e complexidade, na verdade é algo mais complexo, pois estão presentes muitos aspetos não visíveis à superfície. O Modelo é tudo e resulta da interação altamente dinâmica entre os aspetos visíveis e dizíveis com os aspetos invisíveis e indizíveis que o compõem”.