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ANATOMIA DO ACESSO E DA PERMANÊNCIA NO PODER

CAPÍTULO VI CONQUISTA E MANUTENÇÃO DOS POSTOS DE PODER

6.2 ANATOMIA DO ACESSO E DA PERMANÊNCIA NO PODER

A análise do caso e das entrevistas mostraram que o PNOVO, o PGESTÃO, o PIM foram os mecanismos de força econômica que possibilitaram o projeto de poder da referida elite. Antes dos projetos, foram igualmente instrumentos o empréstimo, a licitação e o consórcio, cujas referências contaram com ativa participação dos gestores. De fato, esses os meios tradicionais socialmente utilizados para resolver problemas da administração pública.

O que singulariza o caso PNOVO, entretanto, é a forma como os indivíduos operaram, como procederam para ocupar e manter os cargos, com vistas a atingir suas metas culturais de poder, prestígio, visibilidade e de fama. O condicionante não foi o direito, nem a norma-dia do fato administrativo68 e nem competência notória, uma vez que a raiz do modus operandi não estava vinculada à tradição ou à meritocracia.

Os gestores operaram em uma base, o PNOVO. Foi no locus do Projeto que compuseram uma rede de pessoas aliadas que se instalou em fragmentos dos cargos dispersos. As relações que os indivíduos estabeleceram, obedeceram a um intercâmbio formado por uma elite, que se manifestou na estrutura econômica de significação e de prestígio dos cargos, numa escala de ascensão.

A esse respeito, é preciso lembrar que 80% dos entrevistados confessaram ter sido beneficiados graças a funções de apoio e de indicações que lhes permitiram atuar decisivamente, enquanto vivo o poder que os instalou. Percorreram, após o desenvolvimento do PNOVO, outros postos atuando em subgrupos, conjugados no

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Exemplo disso são as nomeações técnicas dos DAS 1, 2 e 3 até recentemente nomeados pelas chefias técnicas diretas, eram da responsabilidade de Ministro de Estado; DAS 4, 5 e 6, da responsabilidade política da Presidência da República. Atualmente, é total a centralização na Presidência da República.

ambiente interno da organização. Só após, clara e significadamente estabelecidos pelo PNOVO, os indivíduos se ajustaram e prepararam um novo movimento. A condução dessa linha, na dinâmica do percurso arquitetado, é que passa a ser a tônica dos diversos movimentos.

De fato, o primeiro movimento de mudança ocorre em janeiro de 2003, quando se instala o novo governo, poucos meses antes do encerramento do PNOVO. É dado pelo Coordenador de Qualidade, representante da Controladoria no PNOVO:

- o Coordenador de Qualidade representante da Controladoria no PNOVO, beneficiado com diárias corridas para ficar à disposição do Projeto, retornou a seu Estado de origem, São Paulo, e assumiu o cargo mais alto da instituição, com um DAS.4, em janeiro de 2003.

Portanto, ele só dá o primeiro passo de mudança quando vê consolidada a sua liderança na posição maior da organização econômica, em seu Estado de origem. Move-se apenas quando se certifica da dominação sobre a dinâmica interna do Projeto, valendo-se da atuação assegurada pelos seus outros agentes especiais, contando com a força de seus aliados, todos então já claramente estabelecidos.

Mais tarde, o segundo movimento ocorre com o arrasto de gerentes, coordenadores e participantes para o seu Estado. Seguem para participar de um novo projeto, o PGESTÃO, o novo mecanismo previamente assegurado pelo líder. Ou seja, ao ascender a uma posição de mandatário, em outro Estado, lá instituíra um outro mecanismo de sustentação, o PGESTÃO, decorrente do primeiro projeto âncora, o PNOVO, no qual seu grupo antes se estabelecera. Só após a transferência individual do líder já fortalecido, é que os seus aliados o seguem :

- o Coordenador representante da área Alfa no PNOVO, beneficiado com diárias corridas para ficar à disposição do Projeto, foi nomeado para um DAS.4 para ser o gerente do PGESTÃO, em São Paulo (2003);

- o segundo gerente do PNOVO vai compor grupo gerencial do PGESTÃO em São Paulo, em novembro de 2003, passando a receber diárias corridas. Perde seu DAS.4 em janeiro de 2004;

- os coordenadores de T.I e de Processos do PNOVO passaram a integrar o PGESTÃO recebendo diárias corridas (2003);

- os entrevistados 1.E, 2.E e 4.E seguiram, também para São Paulo, recebendo diárias corridas para comporem a equipe do mesmo projeto ─ o PGESTÃO (2003).

Desse modo é que o líder assegura a sustentação do grupo de sete indivíduos com a missão de adubar o processo executivo e de levar a termo o seu fortalecimento no mais alto posto da organização em São Paulo. O mecanismo de manutenção é inteiramente novo. Agora é o PGESTÃO que dá guarida aos recém-estabelecidos.

O terceiro é um típico movimento exemplar de extensão. Visa ampliar poder e equacionar a séria demanda de suporte tecnológico requerida em todos os mecanismos de sustentação, a partir do PNOVO.

- O Coordenador-Geral do PNOVO, DAS.4, deixa a organização econômica e assume uma Gerência de Relações Governamentais numa outra estatal do serviço público, que trata de informática, em fevereiro de 2004.

O quarto movimento surge quando convergem forças propulsoras, configurando situação favorável de mudança simultânea do grupo. A oportunidade ocorre com a mudança de Ministro em julho de 2005. O líder, em agosto, deixa a direção da organização econômica em São Paulo porque soerguido ao segundo mais alto posto do poder setorial de mandatário, no nível federal. Sua trajetória de líder é exemplar. Sai da linha de projeto, sobe para o poder regional e alça-se agora para o segundo posto de comando dominante no Ministério ─ o SEG. A mudança de seu grupo já não exige, portanto, tempo ou manobras de negociação. As nomeações seguem-no, simultaneamente, na mesma direção. Completa- se aí a trajetória de ascensão do grupo, fruto de um vôo bem coordenado pelo líder, com a colaboração de seus pares, tendo como alvo o ápice do círculo do poder, a cumeeira ministerial da administração direta (vide item 4.2).

A partir daí, no quinto movimento, instala-se o esforço de manutenção da conquista. O grupo passa a aumentar a sua força de grandeza. Converge esforços para a ocupação de espaços visando dilatar a capacidade de energia acumulada. A perspectiva é de expansão de poder :

- Muda a Diretoria-Colegiada da instituição e o SEG permanece (2005).

- Os novos dirigentes promovem uma reforma na estrutura orgânica da instituição, extinguindo a Diretoria-Colegiada e estabelecendo uma linha de comando vertical, com Presidente e Diretores.

Com essas medidas o grupo consegue ampliar o seu o espaço de poder por intermédio da dissolução da Diretoria-Colegiada. Em verdade significa o descarte do conceito e dos empecilhos da decisão compartilhada, participativa e democrática. Weber (1982, pp. 272-277) endossa esse ponto de vista ao conferir a noção de que o colegiado é um dos mais fortes meios educativos para a objetividade na administração, por combinar perícias especializadas, duradouras e impessoais. No entanto, como o colegiado demanda mais tempo nas tomadas de decisão o modelo vem sendo descartado na modernidade, de acordo com os interesses vigentes.

O sexto movimento sublinha a capacidade de aliciamento e de reforço expansionista do grupo:

- O gerente do PGESTÃO, ex-Coordenador representante da área Alfa no PNOVO sai dessa função e assume a recém-criada Diretoria de Gestão(DAS.5), na Direção Central da instituição em Brasília (2005).

- A ex-Coordenadora de Processos do PNOVO, sai do PGESTÃO para assumir uma das cinco Gerências – Regionais (DAS.4) recém-criadas no país.em 2005 (Ela, uma das idealizadoras das Gerências–Regionais presente no Produto P11 - Recomendações para a Estrutura Organizacional).

O sétimo é um movimento de consolidação para tornar mais forte o raio de influência da curvatura do poder. A dimensão expansionista do movimento tem cunho de prática estratégica de ocupação para multiplicar o alcance e a significação das conquistas:

- O segundo gerente do PNOVO, deixa a Coordenação – Geral da Diretoria Beta e é nomeado para Gerente (DAS.4) do PGESTÃO em Brasília (2005).

- A Coordenadora de Processos do PNOVO que fora para o PGESTÃO em São Paulo continuando a receber diárias corridas, é exonerada do cargo de Gerente Regional da instituição e posteriormente nomeada Assessora (DAS.3) do Diretor de Gestão. (2005)

- O entrevistado 3.E, ex-Coordenador-Geral do PNOVO que estava na estatal de informática, volta para a instituição em Brasília, e ocupa um cargo equivalente a um DAS.3.

O oitavo movimento é um movimento de preciso ajuste, aparentemente de circunstancial manutenção do processo de conquista:

- O Gerente do PGESTÃO, ex-segundo gerente do PNOVO, é exonerado em Brasília e volta para seu Estado de origem(2006).

- O entrevistado 2.E, que fora para São Paulo/ PGESTÃO e depois para o PIM em Brasília, é nomeado para um DAS.4 , desempenhando-o no Ministério e depois é nomeado para um cargo equivalente a um DAS 3 (2007).

- O entrevistado 1.E , que fora para São Paulo/ PGESTÃO e depois para o PIM em Brasília, é nomeado para um DAS.3 na instituição, pela primeira vez em sua vida profissional, sublinhada pelo exercício ocasional de Funções Gratificadas (2007).

- Encerra-se o mandato de Gerência-Executiva no DF para o entrevistado 4.E que assume um DAS.2 na instituição.

O nono movimento percebido no estudo em tela, aponta brusca interrupção pelo abalo de (inesperada!?!) mudança nos principais postos políticos do setor e da organização estudada, atingindo os cargos de Ministro e de Presidente da organização econômica.

No entanto, é tão sólida e tão resistente a força estruturada e estruturante monopolizada pelo líder que ele permanece inabalável em sua posição. Seu poder, proveniente desde o início dos projetos, se mantém inalterado. De seu grupo apenas dois retornam para o Estado de origem. E o processo certamente continua pois, um dos seus aliados se transfere do seu Ministério e para outro em vôo solo, talvez na expectativa de uma nova expansão de cunho horizontal, inter e transetorial:

- Muda o Ministro, permanecendo o SEG. Muda, também, o Presidente da instituição, em 2007.

- A entrevistada 1.O, que após o PNOVO fora para seu Estado de origem, assume cargo de Coordenação-Geral (DAS.4) da Diretoria de Gestão da instituição, em Brasília.

- O Diretor da Diretoria de Gestão da organização econômica, em Brasília é exonerado, mas não volta para sua UF de origem, São Paulo. Permanece em Brasília, onde é nomeado para um DAS.4 em outro Ministério.

- A Coordenadora de Processos do PNOVO perde o posto de Assessora do Diretor de Gestão e volta para sua UF de origem, em 2007.

- O segundo gerente do PNOVO e Gerente do PGESTÃO em Brasília, e foi nomeado Gerente-Executivo de uma das Gerências – Executivas em seu Estado de origem.

Essa é a trajetória do grupo estudado, pontilhada desde janeiro de 2003, ainda em pleno desenvolvimento dos trabalhos do PNOVO, até o início de 2008. O conhecimento desse percurso só se tornou possível pelo estudo ponto a ponto do PNOVO, os quais incentivaram o estudo documental. Os movimentos acima detalhados resultam desse estudo progressivo e, mais particularmente, das funções ocupadas antes e depois do Projeto.

Retratados, refletem um modus operandi e, mais que isso, um modelo de ação operado pelos estabelecidos do PNOVO para conquistar e manter cargos e funções no meio-ambiente da administração pública brasileira.

A definição gráfica desse modelo, a seguir apresentada, indica a complexidade dos movimentos descritos, cada um deles com uma cor específica. As linhas coloridas seguem, progressivamente, o sentido conseqüente da trajetória dos benefícios perseguidos no processo do PNOVO, desde a sua execução, passando pelo período posterior, até 2008.

Essa escalada ao poder, ora definida e demonstrada, traduz a singularidade e a requintada dinâmica de empoderamento de linhas de ação e de funções comissionadas, racionalmente conquistadas numa engenhosa sistemática engendrada pelo “poder em ação” ou seja, por estabelecidos empoderados.

SEGUNDO GERENTE N ÍV E L F E D E R A L PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA PNOVO SEGUNDO GERENTE 3.E COORDENADOR- GERAL COORDENADOR DE QUALIDADE CONTROL. COORDENADOR ÁREA ALFA COORDENADOR DE T.I. 1.E 4.E 2.E COORDENADOR DE T.I. 1.E 2.E COORDENADOR DE PROCESSOS COORDENADOR DE T.I. PIM 3.E ESTATAL DE INFORMÁTICA INSTITUIÇÃO 2.E 4.E – GERENTE EXECUTIVO 4.E PRESIDÊNCIA DA AUTARQUIA 2.E DIRETORIA DE GESTÃO COORDEN. GERAL GERENTE DO PGESTÃO 1.O COORDENADOR GERAL 1.E 1.O GERENTE REGIONAL DIRETORIA BETA 3.E GERENTE DO PGESTÃO COORDENADOR DE PROCESSOS ASSESSOR EM OUTRO MINISTÉRIO MINISTRO CASA CIVIL ASSESSOR N ÍV E L E S T A D U A L SEG 1º MOVIMENTO PGESTÃO 2º MOVIMENTO 1.E 2.E 4.E 3º MOVIMENTO 4º MOVIMENTO 5º MOVIMENTO 6º MOVIMENTO 7º MOVIMENTO 8º MOVIMENTO EX-GERENTE PGESTÃO 9º MOVIMENTO EX- ASSESSORA GERENTE EXECUTIVO

Não se tem dados sobre a continuidade desse processo, pois no início de 2008 se esgota o tempo de observação do Projeto, com a realização das entrevistas e dos estudos complementares. Supostamente, entretanto, quando se fecha o circuito dessa trajetória, no nono movimento, presume-se a possibilidade de retorno ao primeiro passo do processo de dominação, tendo em vista, agora, a expansão intersetorial entre Ministérios.