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A anulação da venda na execução fiscal

No documento Temas de Direito Tributrio 2019 (páginas 100-119)

TEMAS DE DIREITO TRIBUTÁRIO –

IV. A anulação da venda na execução fiscal

A jurisprudência do STA tem qualificado como atos processuais os atos praticados pelo órgão de execução fiscal relativos à venda na execução fiscal, funcionando nesta parte nas vestes de órgão auxiliar do juiz. Ora, a partir de 2012, o n.º 4 do artigo 257.º do CPPT, com a redação introduzida pela Lei n.º 64-B/2001, de 30 de Dezembro, passou a atribuir ao órgão periférico regional da administração tributária (diretor distrital de finanças) a competência para decidir os pedidos de anulação de venda24, de cuja decisão cabe reclamação para o juiz nos termos do artigo 276.º do mesmo Código – n.º 7 do citado preceito legal25.

Como resulta do referido n.º 4 do artigo 257.º do CPPT, apresentado um pedido de anulação de venda, o órgão da AT deve ouvir todos os interessados. E em caso de falta de audição de um desses interessados quais são as consequências?

No acórdão do STA de 20/09/2017, proferido no processo n.º 0963/17, foi apreciada uma situação em que à data da apresentação do pedido de anulação de venda, o adjudicatário da venda de um imóvel já o tinha transmitido a terceiro por doação. Tendo sido apenas ouvido no procedimento o adjudicatário e determinada a anulação da venda pelo órgão de execução fiscal, veio aquele reclamar do ato e suscitando a questão da sua ilegitimidade passiva, por não ser já proprietário do imóvel.

Considerou o STA verificar-se uma espécie de «…“litisconsórcio passivo necessário” no procedimento de anulação de venda que não foi respeitado e não ocorre dúvida que o interesse imediato na contestação da anulação de venda é da actual proprietária sendo o interesse da adjudicatária, actual reclamante/recorrente mais mediato» e que «que o “litisconsórcio” no procedimento de venda é necessário como em sede geral o é sempre que, pela natureza da relação material controvertida, a intervenção de todos os interessados seja

24 “4 – O pedido de anulação da venda deve ser dirigido ao órgão periférico regional da administração

tributária que, no prazo máximo de 45 dias, pode deferir ou indeferir o pedido, ouvidos todos os interessados na venda, no prazo previsto no artigo 60.º da lei geral tributária. (Redação da Lei n.º 64- B/2011, de 30 de dezembro)”.

25 “7 – Da decisão, expressa ou tácita, sobre o pedido de anulação da venda cabe reclamação nos termos

do artigo 276.º (aditado pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro)”.

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II. Temas de procedimento e processo tributário. II.2. O processo. 1. Questões problemáticas colocadas nos Tribunais Superiores em matéria de execução fiscal necessária para que a decisão a proferir possa produzir o seu efeito útil normal que no nosso caso só é alcançável se a decisão de anulação de venda ou confirmação da mesma puder ser oponível quer ao adjudicatário do bem imóvel quer à sua actual proprietária que não se encontra sequer notificada da decisão de anulação de venda e por consequência, desde logo, não é parte na presente reclamação».

Conclui-se, assim, que:

“I – Na reclamação contra os actos praticados pelo órgão de execução, havendo pessoas com interesse na manutenção do acto reclamado, as mesmas devem ser notificadas para responder à pretensão do reclamante.

II – O pedido de anulação de venda deve ser notificado a todos os interessados e a respectiva decisão expressa de anulação carece de ser notificada não só à adjudicatária do bem imóvel como à sua actual proprietária que o adquiriu por doação.

III – Na falta de tais notificações o acto é ilegal por desrespeito a comandos legais imperativos do artigoº 257.º do CPPT e daí que, porque prejudica, desde logo a ora reclamante, não se possa manter.”

Sobre a questão da intervenção processual de todos os interessados no caso da anulação da venda pronunciou-se igualmente o TCA Sul. Estava em causa neste caso a reclamação de ato de indeferimento de pedido de revogação da decisão de adjudicação de imóvel a proponente preferente, em que o TCA, qualificando a reclamação apresentada ao abrigo do artigo 276.º do CPPT como uma ação de impugnação, entendeu verificar-se uma situação de ilegitimidade passiva, por ocorrer litisconsórcio necessário passivo26, em que devia haver lugar à demanda dos contra-interessados, nos termos do artigo 57.º do CPTA.

Como tal não tinha ocorrido considerou o TCA Sul que «a legitimidade passiva da administração tributária apenas estará assegurada se esse(s) titular(es) forem chamados a responder à pretensão formulada na reclamação, aplicando-se então a regra do artigo 57.º do CPTA».

26 Apoiando-se na doutrina do acórdão do STA de 14/02/2013, proc. 115/13, integrado na corrente

processualista já mencionada, e no qual se fizeram as seguintes considerações:

«Se a reclamação estiver estruturada de forma objectiva, como um processo feito a um acto, que visa

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II. Temas de procedimento e processo tributário. II.2. O processo. 1. Questões problemáticas colocadas nos Tribunais Superiores em matéria de execução fiscal É do seguinte teor o sumário do acórdão do TCA Sul de 26/10/2017, proc. 0912/17.2BELRS:

“I – No contencioso tributário o pedido em causa nos autos [de anulação do despacho de adjudicação da venda à sociedade que exerceu o direito de preferência, e de adjudicação ao reclamante, ora recorrido, por ter apresentado a licitação de maior valor] não deve ser formulado a título principal – seja mediante acção seja mediante incidente –, mas em sede da reclamação deduzida ao abrigo do disposto no artigo 276.º do CPPT em ordem a averiguar da legalidade da decisão do órgão de execução fiscal que tenha reconhecido ou negado esse direito. II – No caso presente, resulta claro que existem pessoas com interesse na manutenção do acto reclamado, desde logo, a sociedade a quem foi adjudicado o imóvel. Assim sendo, a legitimidade passiva da administração tributária apenas estará assegurada se esse(s) titular(es) forem chamados a responder à pretensão formulada na reclamação”.

Numa situação similar em que estava em causa reclamação da decisão do órgão de execução fiscal de anulação da venda executiva27, apresentada pelo adquirente de bem imóvel e que entretanto já o transmitira a terceiro, na 1ª instância foi julgada verificada exceção dilatória e a Fazenda Pública absolvida da instância, por falta de chamamento à ação do terceiro adquirente (“preterição de litisconsórcio necessário natural”, na expressão do tribunal de 1ª instância). Tendo sido interposto recurso para o STA, veio este tribunal, por acórdão de 25/07/2018, proferido no recurso n.º 0728/18 (proc. 396/17.5BELLE), a revogar a decisão de 1ª instância. Para o efeito concluiu-se (em sumário) no citado acórdão do STA:

«A reclamação é dirigida ao Tribunal que a vai decidir e, não pode este recusar-se a

delas tomar conhecimento invocando que devem estar presentes na reclamação

quaisquer outras partes, entidades ou pessoas não previstas na lei. O litisconsórcio necessário é um mecanismo verdadeiramente excepcional, ditado por razões pragmáticas e não pode ser utilizado como mecanismo que, de algum modo, coarte os direitos das partes. A reclamação das decisões proferidas pelo órgão da execução fiscal

não é uma acção que o reclamante vem intentar ex novo para ver reconhecido um seu direito.

«Não se vislumbra, pois, qualquer preterição de litisconsórcio necessário, artigoº 33.º

do Código de Processo Civil, aqui aplicável por força do disposto no artigoº 2.º do Código de Processo e Procedimento Tributário, por falta de consagração legal de qualquer litisconsórcio necessário para a reclamação do artigoº 276.º do Código de

Processo e Procedimento Tributário, pelo que a apontada necessidade de intervenção principal provocada, carece de fundamento legal como resulta do disposto no artigoº 316.º do Código de Processo Civil, aqui aplicável por força do disposto no artigoº 2.º do Código de Processo e Procedimento Tributário».

27 Anulação determinada na sequência de pedido apresentado por credor com garantia real.

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II. Temas de procedimento e processo tributário. II.2. O processo. 1. Questões problemáticas colocadas nos Tribunais Superiores em matéria de execução fiscal Como ressalta dos citados arestos, as diversas soluções adotadas têm subjacentes diferentes visões sobre a natureza dos atos praticados em sede de execução fiscal. Mas não subsistem dúvidas que a atual jurisprudência do STA tem afastado a visão processualista do processo de execução fiscal e assentado o entendimento da intervenção do juiz como de mero controlo de legalidade dos atos praticados pelo órgão de execução fiscal, seja na sua veste de exequente, seja na sua veste de órgão auxiliar do juiz. Todavia o entendimento da intervenção do juiz como de mero controlo da legalidade dos atos praticados pelo órgão de execução fiscal não deixa de ser um papel menorizado e objeto de crítica, como já foi realçado pela doutrina28. Na verdade, ainda que numa primeira fase a competência para a decisão do incidente de anulação de venda tenha sido deferido por lei ao órgão de execução fiscal (com as alterações introduzidas pela Lei n.º 64-B/2011, de 30/1229), seria suposto que coubesse ao tribunal, em sede de reclamação desse ato, dirimir de forma definitiva (princípio de jurisdição plena) o litígio entre as partes e demais interessados, ao invés de o tribunal se limitar a aferir da legalidade do ato do órgão de execução fiscal. Que seria essa a solução ideal, revela-se no último caso citado, em que o fundamento invocado pelo Reclamante não contendia com qualquer invalidade assacada ao ato do órgão de execução fiscal, mas sim com o fato de o bem adquirido ter sido entretanto transmitido a um terceiro, ato este que era do desconhecimento do órgão de execução fiscal aquando da decisão de anulação da venda.

28 Como se pode depreender da critica efetuada pelo senhor professor Rui Duarte Morais, que a este

propósito teceu as seguintes considerações: «O que importa vincar é que, ao apreciar a reclamação a

que nos referimos, o juiz exerce um poder de plena jurisdição, o que bem se compreende pela razão simples que decide num processo que, desde o início, é “seu”, pese embora, até aí, possa não ter acontecido a necessidade da sua intervenção. Naturalmente que caberá ao órgão de execução fiscal a realização material do decidido; mas não lhe caberá proferir nova decisão, pois a composição dos interesses em conflito compete ao (e terá já sido realizada pelo) juiz» – MORAIS, Rui Duarte – A

reclamação do artigo 276.º do CPPT: algumas interrogações. In: Cadernos de Justiça Tributária. – Braga: CEJUR – Centro de Estudos Jurídicos do Minho – N.º 20 (abr.-jun. 2018), p. 30-35. Pode igualmente

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II. Temas de procedimento e processo tributário. II.2. O processo. 1. Questões problemáticas colocadas nos Tribunais Superiores em matéria de execução fiscal

Apresentação Power Point

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